I SÉRIE — NÚMERO 51
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O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.
O Sr. BrunoDias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs.
Deputados: Dos temas em agenda para esta próxima reunião do Conselho Europeu, há duas matérias que
neste tempo disponível importa destacar — aliás, não por acaso já foram suscitadas nesta sessão plenária por
parte do PCP —, que é a questão das vacinas no combate à COVID-19 e a questão do digital e das opções
políticas nesse âmbito.
A primeira pergunta que se coloca ao Governo, à Presidência portuguesa, ao Conselho Europeu, é sobre a
estratégia da União Europeia neste processo e sobre este quadro de subordinação aos interesses das
multinacionais farmacêuticas. Não há ilações e consequências a retirar do que está a acontecer em Portugal e
na União Europeia, Sr. Primeiro-Ministro? Que balanço fazem os senhores deste processo?
Para os laboratórios, o balanço é largamente positivo, pois claro. Foram subsidiados em milhares de
milhões de euros pelos Estados e pela Comissão Europeia para a investigação e desenvolvimento das vacinas
e para a produção das doses. Houve dinheiros públicos para todas as fases do processo, para seguros de
risco, para compras antecipadas.
E, ao mesmo tempo, a União Europeia, Estados-membros da União Europeia, incluindo Portugal, assumem
que são contra o levantamento das patentes das vacinas da COVID-19, o que foi proposto pela Índia e África
do Sul e apoiado por mais de uma centena de países na OMC, respondendo ao apelo da OMS.
A União Europeia abdicou de quaisquer direitos de propriedade sobre a invenção que financiou, a favor
dessa meia dúzia de multinacionais — literalmente meia dúzia de multinacionais —, e defende essas mesmas
multinacionais, colocando esses interesses à frente das vidas de milhões de pessoas.
Sr. Primeiro-Ministro, por favor, não diga que não há capacidade de produção para assegurar vacinas para
todos. Naturalmente, não haverá capacidade para assegurar os termos e as exigências daqueles laboratórios,
mas a prioridade tem de ser a saúde pública, a vida das pessoas, e não os negócios e os lucros das
multinacionais.
O Sr. Primeiro-Ministro discorda desta leitura? O Governo discorda? Então, que posição defenderá no
Conselho Europeu? Mais do mesmo na subordinação e na estratégia que tem sido aplicada? Ou uma
mudança de rumo, que se impõe pela realidade como urgência incontornável?
É que a «vacina como bem público e universal» é claramente uma promessa por cumprir. O problema é
que pode muito bem ser, afinal, uma promessa falsa.
Para terminar, Sr. Presidente, refiro-me ao tema da chamada «transição digital» e das opções políticas,
desde logo no que às relações de trabalho diz respeito.
Insistimos neste ponto: o Sr. Primeiro-Ministro afirmou, há pouco, que «é necessário um novo direito do
trabalho para responder às novas realidades da digitalização». Pergunto: mas qual é o problema de fazer
cumprir o direito que está em vigor? Isso é que é necessário e urgente.
Falo de um salário justo, de um horário de trabalho definido e com limites, de segurança social, de
estabilidade no emprego, de seguros de acidentes, de férias e feriados, de reserva da vida privada, de
contratação coletiva. Os senhores consideram que o problema é a lei ou o incumprimento da lei? Para nós, é
claramente necessário fazer cumprir a lei e reiteramos que a questão central é a de a convergência ter de ser
no progresso social e não no retrocesso.
E já não é a primeira vez que na União Europeia e em Portugal, e aqui, nesta Assembleia, ouvimos falar
em «novas realidades», que, na verdade, são muito velhas, e em «novas leis», que, afinal, servem para
legalizar, branquear e normalizar a sobre-exploração.
A questão que colocamos é se, mais uma vez, é essa receita e esse modelo que se vão preconizar neste
processo.
Aplausos do PCP e do PEV.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida, do CDS-
PP.