1 DE ABRIL DE 2021
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crueldade para com os animais e pela contestação que gerou, e substituída, e bem, pelo recurso a alvos
artificiais.
Veja-se que, para além do abate das aves, nesta atividade, os pombos são transportados em caixas exíguas
e escuras, são-lhes arrancadas algumas penas da cauda para provocar um voo irregular e são, depois, largados
em carreiras de tiro, no âmbito de provas, para apurar a perícia dos atiradores. Em cada uma destas provas são
largados centenas de pombos, dependendo do número de atiradores. Muitos animais são abatidos no momento,
outros caem feridos no local das provas e outros conseguem fugir acabando por morrer na sequência dos
ferimentos. Na maioria dos casos, não ocorre a morte imediata dos animais, que acabam por ser sujeitos a um
sofrimento cruel, atroz e prolongado.
Este cenário é absolutamente incompreensível à luz dos valores atuais por que se rege a nossa sociedade
e não existe um único argumento válido que justifique a perpetuação desta prática no nosso País.
Este não é, porém, um tema novo nesta Casa. Com efeito, o «tiro aos pombos» motivou inúmeras
intervenções nesta Assembleia da República em defesa da sua abolição definitiva, como foi o caso, já em 1995,
pela voz do Deputado social-democrata António Maria Pereira, autor da lei que hoje debatemos e propomos
alterar, ou em 1999, pela voz da então Deputada socialista Rosa Maria Albernaz, que referia que «a prática do
tiro aos pombos é um atavismo bárbaro já banido de toda a Europa, implicitamente proibida pela Lei n.º 92/95»,
interpretação que, de resto, vai ao encontro da atual opinião de vários académicos, como os ilustres Professores
Jorge Bacelar Gouveia, Carla Amado Gomes, Fernando Araújo, entre tantos outros.
Infelizmente, de forma completamente injustificável, os promotores do tiro aos pombos têm conseguido, nos
últimos anos, contornar a legislação, manter a organização das provas no máximo sigilo possível, sem divulgar
a data e o local onde as mesmas se realizam. É curioso que também têm procurado esconder a verdadeira
crueldade da modalidade, alterando a designação dos próprios clubes, que passaram a chamar-se «clubes de
tiro a chumbo» em vez de «clubes de tiro aos pombos».
Esta prática colide também com os princípios do artigo 13.º do Tratado sobre o Funcionamento da União
Europeia, que reconhece os animais como seres sensíveis, bem como com o próprio Código Civil, que
reconheceu também um estatuto jurídico próprio e que, em Portugal, determina que «os animais são seres vivos
dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica em virtude da sua natureza.» Contudo, temos permitido
esta atividade no nosso País, em contraciclo com a legislação e com o espírito da lei de proteção dos animais.
Existem, hoje, outras propostas que iremos acompanhar, certos de que, em sede de especialidade, será
possível harmonizar as diferentes preocupações. Contudo, não podemos continuar a fechar os olhos ao
sofrimento dos animais e temos possibilidade de impedir esse mesmo sofrimento. A abolição de um desporto
que consiste em abater milhares de pombos a tiro, por mera diversão, constitui um avanço civilizacional
inevitável no nosso País.
Sr.as e Srs. Deputados, este é um passo que há muito deveria ter sido dado e que cabe a todos e a cada um
de nós dar aqui hoje, contribuindo, desta forma, para pôr cobro à violência gratuita e, em contrapartida, promover
a empatia e o respeito que é devido aos animais, valores que o PAN defende e continuará a defender.
Esperamos que hoje, pelo menos nesta matéria, esta Assembleia nos acompanhe.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para apresentar a iniciativa do Bloco de Esquerda, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola.
A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proteção dos animais ficou já
consagrada em 1995 na lei que proíbe todas as violências injustificadas contra animais e, nesta, incluem-se os
atos em que é provocada a morte e o sofrimento a um animal sem qualquer necessidade. Esta tarde falamos,
precisamente, da clarificação desta lei para que seja inequívoco que criar animais em massa para serem
abatidos viola estas disposições.
A prática do tiro ao voo, do tiro ao pombo ou, ainda, do tiro a chumbo é já proibida há décadas, ou mesmo
há séculos, em vários países. Nesses clubes de tiro ou campos de treino, não se podem utilizar pombos ou
outras aves produzidas com o fito de serem maltratadas e abatidas a tiro. Mas em Portugal não. As aves são
criadas em cativeiro, em regime intensivo, e transportadas em jaulas até aos locais da prática. Ali são-lhe
arrancadas penas da cauda para tornar o seu voo irregular, sendo depois lançadas em frente aos atiradores