I SÉRIE — NÚMERO 88
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Por isso, não posso dizer o contrário: compreendemos o problema, compreendemos a sua natureza e somos
favoráveis à necessidade de encontrar uma resposta, porque, efetivamente, como aqui também já dissemos, a
existência de unicamente dois juízes, dois juízes que, ainda por cima — e não há dia nenhum que seja uma
exceção —, concentram em si todo o essencial dos principais processos de combate à fraude, ao
branqueamento, à corrupção no País, dois juízes de que, independentemente do conteúdo e da integridade e
seriedade com que qualquer um deles exerce as suas funções, a perceção pública é a de que têm quase que
duas linhas de orientações diversas, uma mais garantística, a outra mais exigente ou mais justicialista, por assim
dizer, em relação aos arguidos. Esta é a perceção pública, independentemente da justeza das decisões que
tomem.
Isto, obviamente, levanta um problema que tem de ter uma solução. E a solução só pode ser, sendo clara,
como é evidente, o aumento do número de juízes. De resto, a maior parte dos órgãos ligados à magistratura, o
próprio Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, enfim, inúmeras entidades, têm-se pronunciado nesse
sentido e nós estamos de acordo com essa solução.
Não creio, também, que isto venha resolver a questão dos megaprocessos, apesar de fazer referência a ela,
porque isso tem mais que ver com a conexão, de que já tratámos, noutra altura e noutra sede, do que
propriamente com o número de juízes, até porque da análise do diploma já verificámos que não está prevista,
muito menos com caráter obrigatório, uma redistribuição destes mesmos processos, ainda que aumente o
número de juízes e ainda que o tribunal acumule as competências com o tribunal de Lisboa. Portanto, há uma
acumulação, não há uma redistribuição, e há um aumento do número de juízes, o que é um dado positivo.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Em relação à solução em si — e termino, Sr. Presidente —, quero dizer que nós teríamos várias hipóteses. A que nos parece mais óbvia é o puro aumento do número de juízes, sem
integrações nem fusões. A outra seria ou descer a outro tribunal ou uma solução ascendente, por assim dizer,
que é a de integrar o tribunal. Esta é uma solução, uma solução que acho que pode ser aprimorada em sede de
especialidade, e contribuiremos para isso, não a inviabilizando, obviamente, em sede de generalidade.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN.
O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Os problemas da atual organização do Tribunal Central de Instrução Criminal e o consequente impacto negativo
na opinião pública são já muito conhecidos, uma excessiva pessoalização da justiça aliada a um mediatismo por
vezes nocivo.
É óbvio que não se entende que o juiz deva ser anónimo, mas quando chegamos a um ponto em que as
personalidades e a excessiva exposição pessoal dos juízes são usadas para descredibilizar a justiça, isto é um
sinal mais do que claro de que alguma coisa tem de mudar.
A solução de orgânica proposta pelo Governo não extingue o Tribunal Central de Instrução Criminal,
mantendo a especialização na mesma unidade orgânica e incorporando os magistrados que estão atualmente
no Tribunal de Instrução Criminal, passando, assim, de dois para nove magistrados.
Concordamos que, neste momento, a extinção não é solução. Neste momento, existe um grau de
especialização e experiência adquirida em processos de grande complexidade, com conexões interterritoriais,
que não devemos nem podemos descurar.
Problema grave é o que se tem vindo a verificar até ao momento e, principalmente, o que se verificava antes
de 2015, quando o Tribunal Central de Instrução Criminal operava com um juiz nos seus quadros.
Temos sérias dúvidas se alguma vez poderia ter existido nestas condições, e mesmo agora, com apenas
dois juízes, a dúvida mantém-se, porque se torna clara a dificuldade na necessária garantia de aleatoriedade do
juiz na distribuição processual, a de uma imagem pública de imparcialidade, do afastamento da ideia criada na
opinião pública de personalidades e dicotomias como a do «juiz bom» e a do «juiz mau», de juízes com
«superpoderes», da própria transparência e a eventual ingerência da opinião pública na justiça. A salvaguarda
destas situações só poderá ser possível com uma pluralidade de magistrados.