I SÉRIE — NÚMERO 90
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E foi este caldo de contradição continuada e sistemática que alimentou o vale tudo: o «fecha, fecha» quando
se abria, seguido do «abre, abre», quando a preservação da saúde obrigava a encerrar; que deu cobertura à
irresponsabilidade, como quando ouvi aqui, no Parlamento, ser dito que «a variante britânica não determina o
encerramento das escolas, a variante britânica é uma desculpa do Primeiro-Ministro.» Pasme-se! Ouvimos isto
aqui!
O ataque à Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia teve o seu momento pífio quando uma
Eurodeputada do PSD comparou Portugal à Hungria de Orban, escrevendo que «em matéria de regime político,
parece ser cada vez mais o que nos aproxima do que o que nos separa.» Orban saiu do PPE a custo, mas, pelo
visto, o estilo ficou.
Aplausos do PS.
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, numa democracia, o estado da Nação é também o estado da
oposição. Uma oposição negativista, sem uma visão para a recuperação, é uma oposição que falha ao País.
Quanto a isso, nada podemos fazer, mas temos feito a parte que nos toca.
Antes da pandemia, estávamos a crescer acima da média europeia e tínhamos excedente orçamental, antes
da pandemia, a nossa agenda progressista já estava em marcha: a aposta no digital, aplicado na saúde ou na
educação, por exemplo, não a descobrimos na pandemia, o combate às desigualdades e à pobreza, a aposta
na habitação, no emprego digno, nos serviços públicos, numa transição climática justa, na mobilidade
sustentável, na coesão territorial, na descentralização. Não esperámos pela pandemia para avançar em nenhum
destes domínios e a nossa agenda anterior à pandemia preparou o País para a extraordinária resposta que os
portugueses deram a este desafio.
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, estamos prontos para o futuro e queremos partilhar a
responsabilidade de juntar as forças de todos aqueles que, nos últimos anos, foram construindo um caminho de
progresso, onde Portugal só pode estar bem se os portugueses estiverem melhor.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nos últimos anos e, em particular, nos últimos meses, está a bater-nos à porta a realidade
brutal para a qual cientistas e ativistas climáticos alertam desde há muito.
Aquilo que os negacionistas disseram ser ficção científica depressa entrou pelas nossas casas em
reportagens de Telejornal. Aquilo que ontem parecia ser apenas um retrato de um qualquer território distante
entra hoje pelas nossas vidas como uma realidade cada vez mais perigosa e cada vez mais próxima. Aquilo a
que as notícias ainda tratam como «catástrofes naturais», de natural têm mesmo muito pouco.
O sistema económico assente no extrativismo desenfreado e na irresponsabilidade climática colhe hoje as
suas dramáticas consequências. Isto é apenas o início de um mundo novo que o capitalismo criou e essas
consequências são pagas ao longo do tempo por todos nós, em particular pelos mais pobres do mundo e pelos
mais pobres dentro de cada país.
No deserto do Mojave, na Califórnia, os termómetros registaram este mês mais de 50 graus. Pela primeira
vez, a Amazónia emite mais dióxido de carbono do que aquele que absorve. No centro da Europa, em particular
na Bélgica e na Alemanha, as violentas cheias levaram nos últimos dias mais de 200 vidas e destruíram milhares
de habitações. No sul da Europa e aqui mesmo em Portugal, os incêndios são uma aflição que se agudiza com
o aproximar de cada verão.
A catástrofe climática não é uma opinião, é um facto. Não podemos gastar tempo, que já não temos, a debater
com negacionistas. O debate do nosso tempo é, sim, sobre as medidas de que precisamos para enfrentar as
alterações climáticas.