22 DE JULHO DE 2021
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Não faltará quem faça juras de combate às alterações climáticas com a única condição de que não se faça
nada para combater as alterações climáticas, a começar pelos eco-oportunistas, que trazem na lapela o discurso
climático, mas não hesitam em esquecer o clima de cada vez que o negócio fala mais alto.
Não faltarão também os ecoliberais, cujo modelo económico provoca os males que os ecoliberais dizem
querer combater. Nessa lenda, a salvação do planeta é um negócio como qualquer outro, que, certamente por
ser rentável, fechará o ciclo do aquecimento global gerando novas fortunas baseadas no mérito.
A Humanidade depressa perderá a paciência para semelhantes falácias.
Sr.as e Srs. Deputados, num País com salários baixos como Portugal é inegável que o preço dos combustíveis
é insuportável para a maioria das pessoas. Perante esse facto, há quem orgulhosamente lance a crise climática
para de trás das costas e apoie a subsidiação dos preços dos combustíveis fósseis. Outros há que,
envergonhadamente, atiram para uma futura transição para o automóvel elétrico individual, sabendo que essa
resposta é em nada sustentável, igual até ao atual modelo. Apostar na proliferação de automóveis individuais
nas grandes cidades é como tentar parar o vento com as mãos.
A solução tem de passar, isso sim, por partilha de veículos e transportes coletivos, com mais oferta e
tendencial gratuitidade. E passa também por uma política de território que, em vez de promover a especulação
e o abuso imobiliário, assegure cidades e vilas sustentáveis e garanta o direito à habitação. Sem isso não haverá
transição justa que proteja o planeta, sem isso estaremos apenas a perder o tempo que já não temos.
Mas o mais espantoso destes dias, deste dia, talvez, foi ouvir o Primeiro-Ministro, neste debate, elogiar a
Presidência portuguesa por ter incluído preocupações climáticas e sociais na política agrícola comum, enquanto
a Ministra da Agricultura — que tem só para a agricultura um pacote financeiro comparável a todo o Programa
de Recuperação e Resiliência, 10 000 milhões — se ocupa a torcer os mesmos critérios aprovados durante a
Presidência portuguesa da União Europeia para desviar os recursos do desenvolvimento rural e da produção
biológica para latifundiários rentistas que a sul do Tejo acumulam privilégios há décadas e comprometem a
coesão territorial e a transição ecológica da agricultura e da floresta.
O discurso climático do Governo parece ter como maior inimigo a própria ação do Governo. O Observatório
Técnico Independente entregou ontem um relatório ao Parlamento sobre o Sistema de Gestão Integrada de
Fogos Rurais onde afirma mesmo que a falta de propostas de ação sobre as alterações climáticas é «a mais
grave omissão do Programa Nacional de Ação» sobre fogos florestais.
No clima, como no resto, o que conta é para onde vai o dinheiro. Se vai para as rendas pagas a uns poucos
grandes proprietários rurais e não para a transformação da floresta ou para o povoamento do território, então
ficamos a saber que o Governo se resignou à sina dos incêndios. E nada seria mais irresponsável.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem! A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o estado da Nação é marcado pela
pandemia que estamos a viver. Há um ano, não fomos os únicos a avisar que esta crise não seria rápida, que
contratações a quatro meses para os hospitais não responderiam ao esforço pedido ao SNS e aos seus
profissionais, que apoios de curto prazo e fraco alcance não responderiam às necessidades da economia e das
famílias, mas o Governo recusou sempre fortalecer as medidas de resposta à crise.
Apostou que o verão passado já seria de retoma, não preparou a segunda vaga pandémica, nem a terceira,
nem a quarta. Pediu ao Parlamento um Orçamento Suplementar e depois não usou o dinheiro. Fez um
Orçamento para 2021 que já estava desatualizado no momento em que foi aprovado. O Governo recusou as
propostas do Bloco e passou este ano a acrescentar medidas avulsas, insuficientes e tardias para conter os
estragos.
No SNS, os profissionais esticam uma manta curta demais e estão exaustos. A emergência COVID foi
deixando outros cuidados para trás, o objetivo da fixação de profissionais foi adiado a favor de contratações
precárias, o número de utentes sem médico de família aumentou. Até na resposta COVID aquela manta está a
encolher: com a recusa em aumentar contratações e fazer vinculações, o processo de vacinação teve de ir
buscar gente aos rastreios e agora um quarto dos infetados não chega a ser contactado pela saúde pública.
Nos apoios, Portugal manteve-se nos mínimos europeus e o Governo preferiu levar as famílias e as empresas
para as moratórias. Num País já endividado, a omissão da resposta pública cria uma situação ainda mais pesada
e pagaremos caro esta omissão.