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30 DE SETEMBRO DE 2021

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Em relação à pergunta do Sr. Deputado João Almeida, estou convicto de que, tal como na pandemia, o PS

vai cumprir alguns dos compromissos, mas de certeza que não terá verbas para cumprir metade, sequer,

daqueles que foram assumidos pelo Primeiro-Ministro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem agora a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao longo dos últimos 10 anos, o Parlamento investigou os crimes, as fraudes e o abuso de uma elite que viu na banca o passaporte para o poder

e o enriquecimento fáceis. Do BPP (Banco Privado Português) ao BES (Banco Espírito Santo), passando pelo

BPN (Banco Português de Negócios), pelo BCP (Banco Comercial Português) ou pela Caixa Geral de Depósitos,

estas histórias foram contadas e documentadas.

De todos estes casos, ficou quase sempre o sabor amargo da impunidade resultante de um sistema incapaz

de prevenir estes crimes, bem como de castigá-los. Até hoje, o Banco de Portugal não consegue explicar ao

País por que razão passou tantos anos a olhar para a banca portuguesa sem querer ver nada: as fraudes no

BPP, o banco fantasma do BPN, as contas offshore que insuflavam as ações do BCP, o suporte da Caixa ao

assalto ao mesmo BCP, a drenagem de recursos do BES para o GES (Grupo Espírito Santo), a lavagem de

dinheiro dos bancos angolanos em Portugal e dos bancos portugueses em Angola. Nada disto foi visível para

um supervisor que, mais do que supervisionar, queria estar nas boas graças dos regulados.

Na justiça, os processos arrastam-se, testando a paciência de um País que assiste, impotente, à sucessão

de escândalos financeiros. Bem sabemos como a investigação do grande crime económico é difícil e complexa.

É gritante a disparidade de meios entre investigados e investigadores. Os megaprocessos arrastam-se no

tempo, a prescrição tem prazo curto e os crimes de intenção demoram a provar, mas pouco, ou quase nada, se

fala da verdadeira causa das coisas.

Neste jogo viciado, quando se segue o percurso de um euro, da origem até ao destino, atravessa-se sempre

um emaranhado de contas offshore, veículos financeiros e testas de ferro, um labirinto cuidadosamente

desenhado por reputados consultores e advogados. Tão reputados que os encontramos, aqui, no Parlamento,

a exclamar que chega de corrupção ou, diariamente, nos média, comentando os assuntos do dia. No caso de

Rendeiro, um desses juristas arquitetos de labirintos foi José Miguel Júdice, célebre avaliador televisivo dos

vícios e das virtudes da praça.

Face a qualquer contratempo de um banqueiro como João Rendeiro, os seus advogados e consultores

sabem que terem colocado um elo desta cadeia na Suíça, no Panamá ou nas Ilhas Caimão, garante meses de

atraso das investigações judiciais à espera de um acordo de troca de informações.

No fim de tudo, mesmo que a justiça tenha completado o puzzle a tempo, haverá ainda quem argumente, do

alto da sua reputação, que tudo foi feito por meios legais. Quem tem os recursos certos usa a lei para fugir à lei.

Ainda assim, às vezes, os astros alinham-se, as vontades organizam-se e é possível uma justa condenação.

Às vezes, é possível ter três condenações, como no caso de João Rendeiro. É aqui que, ao problema da

regulação e da investigação, vem somar-se um outro: o problema do efetivo cumprimento de penas. O sistema

insiste em provar que a impunidade é um privilégio que o dinheiro e o poder podem mesmo comprar.

Em 2013, João Rendeiro foi condenado pelo Banco de Portugal a uma multa de 1,5 milhões de euros. Em

2015, foi a vez da CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários) determinar uma sanção de 1 milhão

de euros. Ambas as coimas foram confirmadas pelos tribunais, mas ficaram por pagar.

Em julho de 2020, João Rendeiro foi condenado a cinco anos e oito meses de prisão efetiva por falsidade

informática. Passado um ano, o Tribunal Constitucional confirmou que não admitiria o recurso, o que quer dizer

que há meses que se sabe que esta sentença seria definitiva.

Em maio de 2021, Rendeiro foi condenado a 10 anos de prisão efetiva por crimes de fraude fiscal, abuso de

confiança e branqueamento de capitais.

No dia de ontem, o ex-banqueiro foi novamente condenado a mais três anos e seis meses por burla, mas,

desta vez, Rendeiro não estava no tribunal para ouvir a sentença do juiz, porque se encontrava em Londres, de

onde comunicou ao País que não tem qualquer intenção de voltar e cumprir a sua pena.