23 DE OUTUBRO DE 2021
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Além disto tudo, acresce o recurso a esteroides anabolizantes, a efedrina, a arsénico, a estricnina e outras
substâncias que as investigações publicadas na imprensa portuguesa e os relatos e denúncias das
organizações não-governamentais vêm denunciar.
Falam-nos ainda de treinos com animais amarrados nas noras ou colocados em tapetes de corrida, para
que sejam forçados a correr a altas velocidades, ou no recurso a choques elétricos para estimular os animais
mais lentos a correrem mais depressa. Ao fim de dois anos, a verdade é que estes animais se encontram
absolutamente desgastados, diminuindo a sua esperança média de vida e incapazes de participar nestas
competições, sendo facilmente descartados pelos seus detentores.
A reportagem recente transmitida na TVI sobre o lado oculto das corridas de galgos, os maus-tratos, os
treinos violentos e, até, o tráfico de sangue associado aos animais que deixam de servir esta atividade, pôs
precisamente a nu o tal extraordinário espetáculo que, pelos vistos, alguns senhores nesta Sala tanto
apreciam.
Estamos todos familiarizados com esta realidade. É por isso altura de travar este tipo de competições que
em nada contribuem para um País que deve respeitar os animais e ter um ordenamento jurídico coerente,
alinhado com um estatuto jurídico próprio que reconhece os seres vivos dotados de sensibilidade — aliás, com
um estatuto jurídico aprovado nesta mesma Assembleia da República. E, hoje, Sr.as e Srs. Deputados, temos
essa oportunidade.
Contrariamente ao que vêm habitualmente dizer, não é uma questão de gosto, não é uma questão de
mundo urbano versus mundo rural. É uma questão de respeito e de sensibilidade para com os animais de
companhia, aqueles que tão depressa dizemos serem os nossos melhores amigos, como tão depressa
permitimos, depois, que sejam explorados, abusados, abandonados ou, até, deixados a morrer à fome, como
no caso, que se tornou público, dos animais de João Moura e que gerou forte indignação social.
Os projetos hoje apresentados e a mobilização cívica em volta deste assunto que nos traz esta iniciativa
legislativa de cidadãos, com mais de 21 000 assinaturas, demonstram bem a extrema crueldade das corridas
de cães, o seu anacronismo e a vontade que existe na sociedade portuguesa em travar este negócio e esta
atividade cruel.
Resta saber se as demais forças políticas vão fechar mais uma vez os olhos, se vão ignorar a voz destes
milhares de cidadãos e os direitos dos animais que, dia após dia, treino após treino e corrida após corrida, são
descartados.
E, não, Sr.as e Srs. Deputados, não voltemos a fechar este debate em torno do mundo urbano versus
mundo rural, porque em nada nos eleva e, menos ainda, em nada ajuda a proteger os animais no nosso País.
Aplausosdo PAN.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.
OSr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola, do BE.
A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar por cumprimentar cada uma das 21 306 pessoas que, com a sua mobilização, conseguiram apresentar a esta
Assembleia uma das cerca de meia dúzia de iniciativas legislativas de cidadãos que até nós chegou. Isto traz-
nos mais responsabilidade na discussão desta matéria e também a seriedade de ouvir os proponentes.
Ouvimos já aqui, esta manhã, a evocação de vozes de médicos veterinários. Pois bem, ouvimos em
Comissão uma médica veterinária de uma associação reconhecida nacionalmente que confirma que este tipo
de corridas são contrárias ao bem-estar animal e são uma forma de instigar violentamente os animais a um
comportamento que não ocorre se não existir esta utilização.
As corridas de galgos acontecem de forma organizada em países como a Austrália, Irlanda, Macau,
México, Estado Espanhol, Reino Unido e Estados Unidos da América, onde existem pistas profissionais e
sistemas de apostas semelhantes aos das corridas de cavalos. Nestes países, as corridas de galgos
acarretam treinos violentos, aliados a um elevado número de abandonos, ora porque à partida os animais não
dispõem de características e velocidade pretendidas, ora porque se lesionam, ficando incapacitados para a
prática de corrida.