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II SÉRIE —NÚMERO 2

A crescente complexidade do direito, gerada num desenvolvimento nem sempre harmónico das relações sociais, fez com que cada vez menos fosse possível confiar a função judicial a pessoas sem uma adequada preparação profissional.

A experiência demonstrou, por outro lado, que o recrutamento directo nas profissões jurídicas capaz de satisfazer àquela exigência é insuficiente. O recurso a jovens juristas continuará a ser o maior garante do equilíbrio dos quadros.

Mas daqui uma questão.

Até que ponto não caminharão para a degradação instituições judiciárias entregues a um escol de juristas academicamente habilitados mas sem uma razoável experiência de vida e sobretudo sem provas dadas no respeitante à sensibilidade e aptidão que se lhes vai exigir?

Para responder a esta e a interrogações semelhantes tem-se procurado encontrar meios de selecção e formação que realizem os objectivos de uma verdadeira educação judicial: familiarizando os candidatos com os tribunais, mostrando-lhes que a técnica não resolve tudo numa função que não actua em abstracto mas num quadro vasto de intervenção de outros homens, sensibilizando-os para a necessidade de uma reflexão crítica permanente, despertando-os enfim para a obrigação de estarem definitivamente disponíveis e atentos à evolução do homem e da sociedade.

3. Equacionada entre duas ordens de problemas — os da educação e os da justiça— e confrontada frequentemente com situações de reminiscência corporativista, coexistem na formação de magistrados várias dificuldades: a necessidade de evitar que as actividades se transformem em meras acções de pós-graduação apenas dirigidas ao desenvolvimento teórico de anterior aprendizagem; a necessidade de fugir a esquemas utilitaristas em que se privilegie excessivamente o adestramento prático em prejuízo da investigação, da reflexão e da elaboração doutrinal; a necessidade, sobretudo, de repudiar fórmulas que imponham ou insinuem modelos de comportamento impeditivos do enriquecimento da personalidade.

Dificuldades tanto mais graves quanto é certo projectarem-se em sector particularmente sensível e, por isso, rebelde a todas as mutações — a justiça.

Donde poder mesmo concluir-se pela impropriedade do termo «formar magistrados», dada a sua carga voluntarista.

Formar magistrados não será obviamente impregnar nos candidatos à magistratura ideologias ou modelos profissionais. Será, antes de tudo, criar um amplo espaço de diálogo e reflexão que proporcione aos futuros magistrados oportunidade de desenvolvimento intelectual, de aperfeiçoamento da personalidade, de sensibilização à função judiciária.

4. Em traços muito gerais, pode afirmar-se existirem hoje na Europa três sistemas de formação.

Um, de que é exemplo a Alemanha Federal, em que as actividades formativas são realizadas por meios não institucionais. A formação de magistrados insere-se aí num quadro mais amplo: o da formação nas profissões jurídicas. Depois dos estudos universitários e do subsequente Exame de Estado, os candidatos à magistratura, à advocacia ou ao notariado

fazem um tirocínio judiciário comum, em regime mais ou menos livre, no fim do qual se submetem a novo Exame de Estado (igualmente jurídico). A nomeação para uma das funções realiza-se, de seguida, através de um processo meramente burocrático.

Outro sistema, de que são expoentes a Espanha e a França, confia a formação de magistrados a estabelecimentos especializados (na Espanha a Escuela Judicial, na França a École Nationale de la Magis-trature), em que se pratica uma pedagogia de cariz mais ou menos prático, acusada, aqui e além, de certo academismo e de escolaridade.

Uma terceira corrente, com expressão nomeadamente na Itália e na Holanda, utiliza um sistema misto, só relativamente institucionalizado, em que os estágios se cumulam com actividades lectivas e formativas sob a direcção de comissões especiais compostas predominantemente por magistrados.

Refira-se, no entanto, a tendência para uma aproximação entre os sistemas apontados em segundo e terceiro lugar. Os holandeses criaram recentemente um centro de estudos judiciários e a École Nationale de la Magistrature ensaia uma nova pedagogia

que Georges Liaras, seu director, desenvolvia no

Plano de Actividades para 1976, a partir dos seguintes tópicos: «uma formação prática, generalista, não exclusivamente jurídica ou judiciária, incentivadora de métodos rigorosos de trabalho».

5. Parece, de qualquer modo, adquirida a conclusão de que é necessário um mínimo de institucionalização.

O sistema de estágios, vigente entre nós, revelou-se dispersivo e insusceptível, por isso, de assegurar uma rentabilidade plena. Estagiar, de manhã, num tribunal, e participar, de tarde, em actividades formativas complementares é dificilmente praticável, sobretudo em grandes centros urbanos. A sobrevivência do esquema acaba por se realizar à custa de um dos programas, à margem de uma metodologia verdadeiramente pensada e coerente.

A solução estará, pois, em concentrar os vários esquemas formativos a partir de um estabelecimento que possa coordenar as actividades lectivas e as de contacto, observação e estágio.

É o que se propõe alcançar com a criação e estruturação do Centro de Estudos Judiciários.

Junta-se, em anexo, o projecto do diploma que cria e estrutura o referido Centro.

António de Almeida Santos.

Proposta de lei de autorização legislativa

Usando da faculdade conferida pelo n.° 1 do artigo 170.° da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:

ARTIGO 1.º

O Governo fica autorizado a legislar sobre a criação, estruturação e regime de funcionamento de um Centro destinado à formação profissional de magistrados judiciais e do Ministério Público.