O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3006

II SÉRIE — NÚMERO 123

Maria Margarida Ribeiro Martins Ramos de Carvalho, Natália de Oliveira Correia, Norberto Lopes e Paulo Sacadura Cabral Portas.

Aprovada em 17 de Maio de 1984.

O Vice-Presidente da Assembleia da República em exercício, Fernando Monteiro do Amaral.

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei n.° 110/111 (sobre a defesa dos direitos do homem perante a informática).

O presente projecto de lei pretende regulamentar a utilização da informática de modo a salvaguardar a defesa dos direitos do homem.

O artigo 35.° da Constituição define um conjunto de princípios fundamentais sobre a defesa dos direitos do homem perante a informática que necessitam de ser regulamentados.

O desenvolvimento que a utilização da informática tem tido nos últimos anos tem levado, em diversos países, à elaboração de diplomas legais que, não colocando restrições desnecessárias a esse processo, têm, contudo, procurado assegurar o direito à privacidade dos cidadãos.

Entre nós o único diploma legal com o objectivo de salvaguardar a privacidade até agora aprovado foi a Lei n.° 3/73, de 5 de Abril. Essa lei, aliás, seguiu-se à Lei n.° 2/73, de 10 de Fevereiro, que instituiu o chamado «registo nacional de identificação», o qual foi regulamentado pelo Decreto-Lei n.° 555/73, de 26 de Outubro. Esta lei representava um grave perigo para a defesa das liberdades dos cidadãos, na medida em que possibilitava, designadamente, a interligação entre o ficheiro central da população e os demais ficheiros sectoriais através do número individual. De acordo com essa lei, a cada pessoa física, bem como às pessoas colectivas e sociedades, era atribuído um número nacional exclusivo e invariável, formado por um conjunto de dígitos numéricos uniformes e significativos.

Este facto levou a que o projecto fosse suspenso pelo Ministro da Justiça do governo provisório Salgado Zenha até estar garantida nesta matéria, através de um diploma legal, a defesa das liberdades públicas e da privacidade. É importante recordá-lo para compreender a proibição da atribuição de um número nacional único aos cidadãos que consta do n.° 5 do artigo 35.° da Constituição.

A defesa dos direitos do homem face à utilização da informática não justifica, no entanto, como refere o preâmbulo deste projecto, a protecção de situações de evasão ou fraude fiscal ou uma atitude conservadora perante o progresso científico-técnico.

A jurisprudência constitucional tem tido esta preocupação, como o demonstrou o facto de a Comissão Constitucional não ter considerado como ferida de inconstitucionalidade a criação do número do contribuinte pelo Decreto-Lei n.° 463/79, de 30 de Novembro. Entre os motivos invocados pela Comissão Cons-tucional contam-se o carácter sequencial e não significativo do número do contribuinte e o facto de

ele não coincidir com qualquer identificador utilizado como chave de pesquisa para acesso a outro ficheiro informativo.

A ASDI, com vista à regulamentação da utilização da informática, apresentou, sucessivamente, os projectos de lei n.os 214/1, 202/11 e 110/III.

O primeiro não chegou a ser discutido; o segundo foi aprovado na generalidade, por unanimidade, não tendo, contudo, sido votado na especialidade. Foi este projecto retomado nesta legislatura sob o n.° 110/111.

O facto de já ter sido objecto anteriormente de aprovação unânime nesta Assembleia poderia levar a pensar que a sua discussão estava simplificada.

Não podemos esquecer, no entanto, as mutações técnicas, constitucionais e a nível do direito comparado entretanto verificadas.

O artigo 35.° da Constituição tem hoje uma nova redacção.

A utilização generalizada de pequenos sistemas de microprocessadores dotados de notável capacidade de memorização e de sistemas de microfilmagem modificou os pressupostos tecnológicos e técnicos em que assentavam os autores do projecto.

Paralelamente, tem-se assistido à revisão das legislações reguladoras desta matéria em diversos países — é, por exemplo, o caso das leis sueca, austríaca e alemã — e à tentativa de harmonização de legislações dos diferentes países.

A Convenção n.° 105 do Conselho da Europa, destinada à protecção das pessoas relativamente ao tratamento automatizado de dados de carácter pessoal e a recomendação da OCDE sobre as «linhas directizes reguladoras de protecção da vida privada e dos fluxos transfronteiras de dados de carácter pessoal» foram ambas subscritas por Portugal.

Ora, o projecto não foi revisto, sendo integralmente retomado, embora numa atitude de abertura «aos contributos úteis que fosse merecer».

Há que tê-lo presente ao considerar as questões fundamentais que levanta, das quais destacaremos as seguintes:

l.a A sujeição a apreciação e parecer fundamentado por parte da Comissão CCNL de todo e qualquer projecto de aplicação e tratamento automático de informação do sector público ou privado;

2.a A composição da Comissão;

3.° Os poderes da Comissão.

1.° Têm existido diferentes pontos de vista e orientações no que se refere à melhor forma de assegurar a protecção dos direitos do homem face à utilização da informática.

O projecto de lei em apreço inspira-se confessada-mente no modelo da lei de protecção de dados do Land do Hesse de 7 de Outubro de 1970, idêntica à lei sueca de 11 de Maio de 1973, de acordo com a qual se verifica a existência de uma autorização prévia de novos bancos de dados, a qual deve ser recusada no caso de o órgão com competência para efectivar o controle do sistema concluir que o mesmo não oferece garantias do ponto de vista das liberdades públicas ou da privacidade. Este sistema assenta na confiança nos organismos de controle administrativo (José António Barreiro, «Informática, liberdades e privacidade», in Estudos sobre a Constituição, vol. i, Lisboa, 1977, pp: 119 a 141).