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II SÉRIE — NÚMERO 88

mica e monetária que às demais instituições de crédito obrigam e convêm.

Estas intenções não tiveram até agora concretização, com a consequente continuação da vigência de um regime jurídico causador, porque desadaptado, de graves riscos e inconvenientes que devem de imediato ser atalhados.

A este estado de coisas e ainda à necessidade de regulamentar nesta matéria o Código Cooperativo acorre o Governo com o presente diploma [...J»

4 — O primeiro grupo de argumentos contra a validade constitucional do Decreto-Lei n." 231/82 cifra-se, como já foi referido, no facto de o mesmo ter sido publicado muito para além do prazo de 90 dias fixado nc n." 4 do artigo 3." da Lei n." 46/77, daí se derivando a afirmação de violação da alínea p) do artigo 167." da Constituição.

Afigura-se-nos ser manifestamente insubsistente esta argumentação.

Ela pressupõe que no n." 4 do artigo 3.° da Lei n." 46/77 se confere ao Governo uma autorização legislativa e que o Decreto-Lei n.° 231/82 veio definir os sectores económicos em que é lícita ou vedada a actividade de empresas privadas e outras entidades da mesma natureza.

Ora nenhum destes dois pressupostos é exacto.

A Constituição conferiu à Assembleia da República competência exclusiva (embora delcgável no Governo) para definir os sectores de propriedade dos meios de produção, incluindo a dos sectores básicos nos quais é vedada a actividade às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza [artigo 167.", alínea p), do texto original] •

A Assembleia desempenhou-se directamente dessa função, por jorma completa, através da Lei n." 46/77. Quanto ao sector do crédito —que ora nos interessa —, o n." 1 do artigo 3." vedou-o às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza, mas o subsequente n.° 2 permitiu a actividade das caixas económicas, das caixas de crédito agrícola, das sociedades de desenvolvimento regional e das instituições parabancárias, designadamente sociedades de investimento.

No n." 4 desse artigo 3.° não se delega no Governo a competência legislativa reservada da Assembleia da República para delimitar os sectores da actividade económica privada. Apenas se confia ao Executivo que, em certo prazo, regule o exercício das actividades referidas nos dois números anteriores, em termos tais que respeitem os limites das características próprias dessas actividades e a proibição contida no n." 1 do preceito.

Ora a regulamentação do exercício da actividade das caixas de crédito agrícola não está contida na reserva de competência legislativa da Assembleia da República. Trata-se de matéria sujeita à competência legislativa concorrente da Assembleia e do Governo, e, assim, não carecia este de autorização daquela para editar o respectivo regime jurídico.

Por isso mesmo, o Decreto-Lei n.° 231/82 foi aprovado pelo Governo «nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 201." da Constituição» («Compete ao Governo, no exercício de funções legislativas: a), fazer decretos-leis em matérias não reservadas ao Conselho da Revolução ou à Assembleia da República»], e não nos termos da alínea b) («fazer decretos-leis em maté-

rias reservadas b Assembleia da República, mediante autorização desta») ou sequer da alínea c) («fazer dccretos-lcis de desenvolvimento dos princípios ou das b:\ses gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam»).

Qual, então, o sentido e valor jurídico da norma contida no n." 4 do artigo 3." da Lei n.° 46/77?

Embora as leis e os decretos-leis sejam actos legislativos de igual dignidade hierárquica, a preeminência política da Assembleia da República (perante a qual o Governo é responsável — artigo 193." da Constituição) possibilita-lhe, por um lado, que confie ao Go-vtrr.o a produção de legislação em certo prazo e em determinado sentido e, por outro lado, atribui às bases fixadas por lei da Assembelia (nomeadamente em matéria da sua reserva de competência legislativa) o carácter de parâmetros materiais que os decretos-leis devem respeitar (cf. o n." 2 do artigo 115." da Constituição revista) (4).

Assim, o incumprimento do prazo fixado ao Governo pela Assembleia da República para a publicação do decreto-lei releva apenas em termos de responsabilidade política do Executivo perante o parlamento, mas não constitui, por si só, factor dc invalidade do oVcrelo-le aprovado e ou publicado após aquele período, como sucederia se se tratasse de uma verdadeira e própria autorização legislativa (5).

Aliás, no presente caso, a Assembleia da República viria como que a aceitar a omissão legislativa do Governo, quando, através do artigo único da Lei n." 14/78, de 23 dc Março —que ratificou, com emendas, o Decreto-Lei n." 344/77, de 19 de Agosto, que criou a Instituto Financeiro de Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas (IFADAP)—, deu a seguinte redacção ao artigo 3.° deste último diploma:

1 — O Governo procederá dentro de 180 dias à revisão da legislação em vigor aplicável às caixas de credito agrícola mútuo, consideradas como instituições especiais de crédito, de acordo com o Decreto-Lei n." 41 403, de 27 de Novembro de 1957.

2—Transitoriamente, e enquanto a legislação prevista no número anterior e no n." 4 do artigo 3." da Lei n." 46/77. de 8 de Julho, não entrar em vigor, o Instituto, ouvido o Banco de Portugal, definirá as condições em que as caixas de crédito agrícola mútuo poderão beneficiar directamente das operações previstas no artigo 3.° do estatuto anexo a esta lei, sem prejuízo do actual sistema aplicável àquelas caixas. [Sublinhado nosso.]

Ê certo que este novo prazo de 180 dias também não foi respeitado, mas, pelas razões já aduzidas, esse facto, se pode ser gerador de responsabilidade política do Governo perante a Assembleia da República, não é idóneo, só por si, para implicar a invalidade do decreto-lei que, finalmente, viria a ser publicado em 17 de Junho de 1982.

Nem, por outro lado, se vislumbra como é que o atraso havido pode implicar violação da alínea p) do primitivo artigo 167.° da Constituição, pois não vem alegado nem se prova que o Decreto-Lei n." 231/82 tenha definido os sectores económicos em termos conflituantes quer com os preceitos constitucionais, quer com a Lei n.° 46/77, na redacção então vigente.