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II Série — 2.° Suplemento ao número 15

Quarta-feira, 3 de Dezembro de 1986

DIÁRIO

da Assembleia da República

IV LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

SUMÁRIO

Comissão de Economia, Finanças e Plano:

Acta da reunião de 24 de Novembro.

Acta da Reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano de 24 de Novembro de 1986

O Sr. Presidente (Octávio Teixeira): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para a reunião com o Sr. Ministro da Justiça, que está marcada para as 11 horas. Em virtude do horário a que começamos, o inicio da referida reunião terá de ser ligeiramente adiado.

Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, para fazer uma introdução geral sobre o Orçamento Geral do Estado para 1987 que vamos discutir, isto é, os Encargos Gerais da Nação.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Coube-me representar o Governo junto desta Comissão para fazer a análise dos aspectos gerais e a apreciação dos vários orçamentos que constituem os Encargos Gerais da Nação, sendo acompanhado pelo Sr. Secretário de Estado da Juventude para análise do sector por si tutelado.

Como é sabido, os Encargos Gerais da Nação englobam os orçamentos das grandes áreas do Estado e reflectem, na generalidade, o funcionamento da Presidência da República, da Presidência do Conselho, da Assembleia da República, do Tribunal Constitucional, do Conselho Nacional do Plano e, ainda, do Provedor de Justiça, dos Gabinetes dos Ministros da República para as Regiões Autónomas e também de serviços que dependem de Secretarias de Estado não integradas em nenhum ministério, como é o caso das Secretarias de Estado da Juventude e do Turismo, tuteladas pela Presidência do Conselho, e da Comunicação Social, tutelada pelo Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.

As verbas relativas a 1987 reflectem as grandes alterações que passo a expor.

No caso dos Ministros da República para as Regiões Autónomas, ao contrário de anos anteriores, é nos seus respectivos orçamentos que se englobam as transferências de verbas para as ditas regiões. Portanto, as transferências para a Região Autónoma da Madeira estão orçamentadas no Gabinete do respectivo Ministro da República e as transferências para a Região Autónoma dos Açores estão no Gabinete do Ministro da República para os Açores.

No orçamento da Presidência da República existe uma divisão autónoma onde se incluem os encargos com o Gabinete do ex-Presidente da República, Sr. General Ramalho Eanes.

O orçamento da Presidência do Conselho de Ministros engloba o da respectiva Secretaria-Geral, de entre cujas verbas significativas se destaca uma para o início da informatização dos seus serviços. É neste orçamento que estão previstas as verbas de toda a produção legislativa, aprovada pelo Governo ou referendada pelo Sr. Primeiro-Ministro. Este mesmo orçamento inclui, também, o do Sr. Ministro de Estado, o do Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares e os dos Srs. Secretários de Estado que os coadjuvam. Ainda no orçamento da Presidência do Conselho de Ministros existe o chamado quadro de efectivos interdepartamentais (QEI) através do qual se paga ao pessoal ai inserido.

Fundamentalmente, as verbas relativas ao pessoal são as resultantes da previsão das reclassificações do Decreto-Lei n.° 248/85 e, ainda, as da integração, no quadro desta Secretaria-Geral, de pessoal cujos serviços foram extintos, ou de pessoal cujas admissões ou requisições se processaram ainda durante o ano de 1986.

O orçamento da Alta Autoridade contra a Corrupção passou a ser integrado no orçamento da Assembleia da República que, como os Srs. Deputados sabem, tem autonomia administrativa e financeira, tendo saído da órbita dos Encargos Gerais da Nação.

Todo este orçamento é a expressão de um conjunto de projectos de actividades que foram apresentados ao Governo que os escolheu e lhes concedeu prioridades e há ainda a verba de aquisição de serviços, a qual aumenta ligeiramente nalguns casos que se prendem

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com uma reclassificação de verbas, que estavam na rubrica «Outras despesas correntes» e que este ano aparecem correctamente classificadas em aquisições de serviços. É o caso das verbas relativas às comemorações do 25 de Abril e do 10 de Junho, portanto daquelas verbas que se destinam ao pagamento de serviços, estudos e encargos de pequenas obras, etc.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Deve ter uma para o 28 de Maio...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Essa não tenho, mas há o Livro Negro do Fascismo____

Em termos do orçamento dos Encargos Gerais da Nação não há muito a dizer, mas ainda há duas verbas que aparecem com uma variação grande: a da Direcção-Geral da Juventude, que, tendo sido criada em 1986, vai actuar durante todo o ano de 1987 e que, portanto, é uma verba que aumenta bastante em termos percentuais, mas cujo aumento está justificado por essa razão; a outra verba é a da aquisição de serviços do Secretariado da Modernização Administrativa. Este Secretariado foi criado, não tem quadro de pessoal e as funções são desempenhadas por pessoal que pertence a outros serviços do Estado e até por pessoal requisitado a outros sectores da actividade empresarial, como, por exemplo, do sector público estatal. Este Secretariado está a dar apoio a uma recém-criada Comissão sobre Remunerações da Função Pública e a outros tipos de actividades que o Governo entenda levar a cabo em matéria da modernização e da desburocratização da Administração Pública.

Existe ainda a verba relativa ao Serviço Cívico, que, até certo ponto, está relacionada com a área da Secretaria de Estado da Juventude. Há que se orçamentar verbas para o Serviço Cívico a prestar por aqueles jovens que, sendo objectores de consciência, não prestam serviço militar obrigatório. Trata-se de uma verba que aparece em 1987 e que não existia em 1986.

Pela minha parte, considero terminada esta abordagem geral e estou à disposição dos Srs. Deputados para esclarecer as perguntas que desejarem fazer-me.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Carvalho.

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Sr. Secretário de Estado, creio que não se referiu concretamente ao orçamento respeitante à comunicação social. Temos aqui presente o orçamento da Direcção-Geral da Comunicação Social sobre o qual gostaria de lhe fazer algumas perguntas.

Há uma verba de 1 996 000 contos, não especificados quanto a critérios de apoios específicos à comunicação social. Aliás, no ofício que capeia este documento, o orçamento refere o porte pago e a extinção do subsídio de papel, mas diz que estes aspectos vão ser regulamentados por legislação, a sair não se sabe quando.

Inclusive, as verbas que são citadas para este efeito não aparecem aqui — creio que será através da Secretaria de Estado do Tesouro — nem contemplam o problema das indemnizações compensatórias à RDP, à RTP, à EPDP, à EPNC e à própria ANOP.

Gostaria que o Sr. Secretário de Estado me pudesse esclarecer quanto a este ponto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.8 Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Secretário de Estado, na sequência das anteriores, aproveitava para fazer algumas perguntas acerca desta matéria da comunicação social.

Quanto ao apoio à imprensa, as verbas de 181 000 contos, de 12 000 e de 16 000 contos indicadas para as transferências para as empresas públicas são relativamente baixas. Mas, depois, nas transferências para as empresas privadas de comunicação social aparecem, para as mesmas rubricas, as verbas de 544 900 contos, 358 000 contos, 37 000 contos, etc.

Gostaria que o Sr. Secretário de Estado explicasse em que se baseia esta discrepância entre apoios tão reduzidos a empresas públicas e apoios tão elevados a empresas privadas do sector da comunicação social.

Quanto ao sector do turismo, gostaria que me fosse explicado o que se prevê em relação aos programas de promoção turística. De acordo com os elementos que vêm referidos no PIDDAC, prevê-se que acabem em 1987, todos os programas de promoção turística, quer no País quer no estrangeiro. Como não é credível que estas acções terminem todas em 1987, gostaria de ser informada sobre o que se vai pensar nesta matéria, em anos subsequentes.

Em relação às escolas no sector do turismo, também gostaria de ser informada acerca das fontes de financiamento alternativas, uma vez que o Orçamento Geral do Estado para 1987 só cobre parte do investimento previsto.

Em relação ao Fundo de Turismo, gostaria de saber quais são os critérios para aplicação das verbas de 9 000 000 de contos previstos.

Finalmente, em relação à Madeira e aos Açores gostaria que o Sr. Secretário de Estado nos explicasse o que se passa com a dívida de cada uma destas regiões autónomas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, gostaríamos de sugerir que abordássemos as questões dos Encargos Gerais da Nação, como, de resto, creio que tem sido hábito considerar as questões gerais, ou seja, a apreciação das evoluções das diversas variáveis numa óptica global, passando depois à análise de cada uma das entidades cujos orçamentos estão compreendidos nos Encargos Gerais da Nação.

Creio que haveria vantagem em examinar, de acordo com a ordem por que estão classificados, problemas tão distintos como a Presidência da República, a Presidência do Conselho de Ministros, a Direcção-Geral do Turismo, etc, porque, de contrário, seremos remetidos a um casuísmo do qual não creio que resultem grandes vantagens em termos de disciplina dos trabalhos. É esta a nossa sugestão e, se o Sr. Presidente me permitisse, começaria por aí.

O Sr. P?ssidente: — Sr. Deputado, julgo que não há inconveniente nenhum a que assim se proceda, mas, no entanto, gostaria de alertar o Sr. Deputado para o facto de que, se fizer primeiro uma intervenção genérica e depois aguardar uma segunda ou terceira volta para abordar os aspectos específicos, poderá não ter tempo para o fazer.

Tem a palavra a Sr.a Deputada Helena Torres Marques.

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A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, penso que a sugestão do Sr. Deputado José Magalhães é muito interessante e só foi pena ela não ter sido feita no início da reunião.

Creio que para a seguir teríamos agora de voltar atrás e repetir intervenções, o que não seria benéfico relativamente à economia dos factos, pelo que seria melhor o Sr. Secretário de Estado do Orçamento responder de imediato.

A sugestão do Sr. Deputado José Magalhães era melhor do que o método que seguimos, mas uma vez que já vamos neste ponto não valerá a pena voltar atrás.

O Sr. Presidente: — Assim sendo, cada um dos Srs. Deputados fará como entender. Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, vou reportar-me por agora às questões globais sobre os Encargos Gerais da Nação.

Fazendo-se a comparação homóloga, isto é, sem as transferências para as regiões autónomas, verifica-se que há um aumento global de dotação de 34 % em relação ao Orçamento inicial. Gostaria de saber como é que foi feita a execução nesta área?

Por outro lado, os aumentos mais significativos reportam-se ao pessoal, mais 33,3%; aquisição de serviços, mais 53,7%; transferências correntes, mais 30,8%, e subsídios, mais 183%. Porquê Sr. Secretário de Estado do Orçamento?

No que respeita a certas evoluções que mereçam ser sublinhadas, há um caso particularmente significativo no Gabinete do Primeiro-Ministro, que é o aumento das remunerações certas e permanentes dos quadros aprovados por lei ser cerca de 71,7%.

Na aquisição de serviços, contemplada nos Encargos Gerais da Nação, verifica-se que cerca de metade do aumento, correspondente a cerca de 350 000 contos, incide nos serviços não especificados. É uma praga com dimensões que neste campo são também de sublinhar.

Eram estas as questões globais que queria colocar ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento a nível da evolução dos Encargos Gerais da Nação. Depois gostaria de colocar algumas outras perguntas sobre a Presidência do Conselho de Ministros, Presidência da República, etc.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — É

melhor fazê-las já todas, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Se V. Ex.a prefere dessa forma, passo a fazê-las de imediato.

Em relação à Presidência da República, verifica-se que há determinadas rubricas onde me parece que, ignorando eu, no entanto, os dados sobre a execução, as verbas estão subdotadas.

Isto é, se bem percebo, desde logo a verba sobre combustíveis e lubrificantes regista um aumento de 200 contos, portanto decresce e a verba de transportes e comunicações em termos reais também decresce. Por outro lado, seria interessante apurar um pouco em que é que se traduz esta verba para serviços não especificados, bem como saber qual a situação do Instituto de Pesquisa Social Damião de Góis, que também vê decrescer as suas dotações em termos reais.

Como é que o Governo calculou estas verbas em relação à Presidência da República, uma vez que pelo menos algumas das que aqui estão referidas não chegarão para o nível de execução verificado em 1986, isto segundo o que sabemos, porque não temos informações rigorosas sobre esta matéria?

Em relação à Presidência do Conselho de Ministros, para além do facto estranho que já sublinhei, ou seja, o acréscimo de remunerações certas e permanentes dos quadros aprovados por lei, segundo creio houve também a transferência para a Presidência do Conselho de Ministros do GATL (Gabinete de Apoio Técnico Legislativo), que existia no âmbito do Ministério da Justiça, e isso não figura aqui neste mapa mecanográfico. Esta situação há-de acarretar as operações consequentes que são do nosso conhecimento, mas gostava de saber em que termos é que se encontra esta questão.

Por outro lado, verifica-se que há uma verba em aquisição de serviços não especificados, outras despesas, de 30 000 contos no Gabinete do Primeiro-Ministro e seria interessante saber a finalidade desta verba.

Ainda em relação às questões da Presidência do Conselho de Ministros, estão previstas para 1987 obras no respectivo edifício no montante de 30 000 contos. Na residência oficial do Sr. Primeiro-Ministro, a verba prevista para certas obras, cujo conteúdo ignoramos, é de cerca de 20 000 contos. Isto contrasta gritantemente com a política de primeiras pedras em estradas, etc, em que são inscritos montantes irrisórios para o arranque. Gostávamos de saber o que significa este forcing para as instalações ministeriais, designadamente nestas duas áreas que acabei de citar.

Na Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, as verbas para transportes e comunicações aumentam 26,7%. Porquê, Sr. Secretário de Estado?

Em relação àquilo que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento referiu como as comissões comemorativas, há um desequilíbrio de verbas nas comissões comemorativas do 25 de Abril e do 10 de Junho. Uma tem uma dotação de 1000 contos e a outra de 19 000 contos.

As comissões não se medem a peso, nem provavelmente a escudos, mas os escudos não são indiferentes, pelo que gostaríamos de saber a que se deve esta situação, designadamente se este desênfase quanto ao 25 de Abril é transitório ou qual foi a ideia que presidiu a esta desigualdade de inscrição de um para dezanove, que é realmente uma desproporção brutal.

Por outro lado, a Comissão Instaladora do Museu da República e da Resistência é um dos órgãos que marca passo no Orçamento desde há uns bons anos, pelo que gostaríamos de saber o que é que em termos logísticos e práticos está encarado e ensejado no âmbito governamental, designadamente quanto às acções que vão ser desenvolvidas com a verba, aliás pequena, que aqui está consignada.

Por outro lado ainda, o Conselho Superior de Informações dispõe de uma verba não especificada de 35 000 contos. Se possível, a especificação dessa verba seria relevante nesta sede.

Ainda nesta área, o SNPC (Serviço Nacional de Protecção Civil) tem previstos no seu orçamento para este ano 195 876 contos, e gostaríamos de saber se isto significa uma opção expressa ou somente implícita de estagnação e não reestruturação e aperfeiçoamento do serviço, designadamente quanto à sua expansão territorial.

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Finalmente, creio que o INA (Instituto Nacional de Administração), ele próprio, está subcontemplado neste orçamento, pelo que gostaríamos de saber a que é que isso se deverá, se o Governo encara a possibilidade de um reforço a meio do caminho ou qual é a ideia subjacente a esta verba que aqui está consignada.

De momento e em relação a estas rubricas eram as questões que queria formular. Outros camaradas meus colocarão novas questões respeitantes a outros sectores.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Odete Santos.

A Sr." Odete Santos (PCP): — Sr. Secretário de Estado do Orçamento, gostaria de lhe colocar algumas questões relacionadas com o orçamento para a Direcção-Geral de Família e para a Comissão da Condição Feminina.

É com alguma surpresa que verificamos que em relação ao orçamento da Comissão da Condição Feminina há um decréscimo em termos nominais em relação ao orçamento do ano anterior.

Tendo em conta o programa apresentado pela Comissão, que refere a necessidade de um reforço financeiro, tendo em vista as questões que se colocam à Comissão na promoção da igualdade efectiva entre mulheres e homens e as orientações internacionais sobre este aspecto, gostaria de perguntar ao Sr. Secretário de Estado por que razão, em vez do reforço financeiro que a Comissão pretendia, há de facto um decréscimo em termos nominais.

Em relação ao orçamento da Direcção-Geral de Família já não se verifica a mesma situação, visto haver um acréscimo de 19,3%. Contudo, analisando a verba deste orçamento, gostaria de saber o que é que faz a citada Direcção-Geral para além da concessão de subsídios e a quem e com que objectivos são concedidos os subsídios.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Moreira.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — No que se refere à Secretaria de Estado da Juventude, gostaria de obter alguns esclarecimentos que me parecem úteis.

Sr. Secretário de Estado, a rubrica de aquisição de serviços, em particular do FAOJ, tem um acréscimo extraordinariamente significativo, passa de 34 000 contos para 95 000 contos, ou seja, quase triplica.

Podemos dizer que um procedimento semelhante é também espelhado no global das despesas da Secretaria de Estado que passam de 46 000 contos para 123 000 contos. Creio que era útil um esclarecimento, o mais rigoroso possível, a respeito do acréscimo significativo desta rubrica.

Uma segunda questão, relacionada com as transferências para as delegações regionais do FAOJ: daquilo que me pude aperceber, há uma diminuição das verbas destinadas a despesas de funcionamento de 142 000 contos para 107 000 contos no corrente ano. Creio que também seria útil compreender o que é que está subjacente a esta evolução negativa nas despesas com esta área.

Quanto aos programas de ocupação dos tempos livres (OTL), Sr. Secretario de Estado, já obtivemos o esclarecimento, em sede da discussão que procedeu a análise na generalidade, de que se pretendia alargar o

número de jovens abrangidos por estas acções de 35 000 para 38 000. As verbas atribuídas o ano passado foram da ordem dos 526 000 contos e este ano está prevista uma verba de 570 000 contos. Ou seja, não se prevê qualquer acréscimo daquilo que é, ao fim e ao cabo, a retribuição dada aos jovens que prestam o serviço OTL.

Gostaria de saber exactamente porque razão o procedimento previsto é este, ou seja, se o Governo não tem inscrita qualquer verba que permita o reforço do apoio que é dado aos jovens, ao fim ao cabo o seu salário, embora não entendido como tal.

Uma última questão, Sr. Secretário de Estado: estão inscritos 108 000 contos para apoios a associações juvenis, mas não se prevê o apoio às associações de estudantes do ensino secudário. O facto de essas verbas não estarem aqui inscritas significa que elas estarão consignadas no orçamento do Ministério da Educação e Cultura ou o Governo omite, uma vez mais, as verbas que todos em geral e a Assembleia da República em particular consideram indispensável serem atribuídas às associações de estudantes do ensino secundário para estas desenvolverem a sua actividade.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Gostaria de colocar uma primeira questão relacionada com o orçamento da Assembleia da República. Trata-se de um orçamento que esta Casa vai ter de aprovar a curto prazo e sucede que do material que nos foi distribuído relativamente a esse orçamento surge uma referência a uma comunicação da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, no sentido de que fosse retirada das despesas de capital da Assembleia da República, a verba de 200 000 contos, que estava prevista para a aquisição de um novo edifício pela Assembleia.

Gostaríamos de ver melhor esclarecido este problema porque se trata, do nosso ponto de vista, de um investimento que a Assembleia da República não deveria retardar. Para esse esclarecimento era bom sabermos se o Governo tem previsto que esta verba seja inscrita num outro sector ou se se trata apenas de adiar por um ano a capacidade de a Assembleia da República poder proceder à aquisição deste conjunto de edifícios, que lhe dariam um novo espaço para utilização, suprindo desse modo gravíssimas carências de espaço que neste momento se fazem sentir.

Uma outra questão, ainda neste âmbito, é a relacionada com o curso da transferência da responsabilidade sobre os serviços da Alta Autoridade contra a Corrupção do âmbito governamental, para o âmbito parlamentar.

Temos uma informação da despesa a inscrever e gostaríamos que, se o Governo estiver em condições de o fazer, nos fosse dada uma informação de como está o processo de transferência desses mesmos serviços.

Quero ainda colocar-lhe duas ou três questões no âmbito da Direcção-Geral da Comunicação Social.

Em primeiro lugar, quero dizer que lamentamos não ser possível ao Sr. Secretário de Estado responsável pelo sector estar aqui, pois, haveria algumas questões cadentes a colocar-lhe, neste momento. Ainda assim, haverá duas ou três questões que, desde já, poderão ser colocadas, o que passo a fazer.

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A primeira questão tem a ver com os investimentos previstos para empresas públicas do sector, que não a RTP e a RDP — pois quanto a estas o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares recusa-se a fornecer-nos qualquer informação em sede de comissão especializada. Porém, passados dois dias, deu uma conferência de imprensa em que anunciava esses mesmos investimentos, esquecendo-se, contudo, de se referir a todas as outras empresas do sector, ou seja, falando apenas na RDP e na RTP.

Também gostaríamos de saber o que se passa quanto à Empresa Pública Notícias e Capital, à Empresa Pública Diário Popular e à ANOP.

A segunda questão prende-se com as verbas inscritas para o funcionamento de agências noticiosas, onde neste orçamento se inscreve uma verba de 382 500 contos. Gostaríamos de saber qual o processo seguido para calcular esta verba. Designadamente gostaríamos de saber se foi apresentado pela ANOP algum pedido de verba à Direcção-Geral da Comunicação Social ou se o número que foi encontrado é apenas uma operação contabilística, tendo em conta a verba inscrita no ano anterior.

Finalmente, Sr. Secretário de Estado, gostaria de perguntar-lhe algo sobre a Lei n.° 20/86, lei que tem a ver com a publicação do património das empresas públicas de comunicação social, que, neste aspecto — como noutros, aliás — continua por cumprir. Julgo que o Sr. Secretario de Estado tem muitos elementos para nos fornecer, dado que, no essencial, se trata de um inventário de bens — talvez o Sr. Secretário de Estado do Orçamento nos possa dizer qualquer coisa sobre como o processo está a correr, já que o Sr. Secretário de Estado da tutela se tem mostrado muito avesso a falar sobre isso...!

Isso seria essencial para nós, dado que o conhecimento deste inventário dos bens das empresas públicas de comunicação social é essencial, para podermos analisar correctamente o orçamento desta Direcção--Geral.

O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados do CDS e para completar o conjunto das questões levantadas pelo PCP, permitia-me colocar duas ou três questões ao Sr. Secretário de Estado, relacionadas com o Fundo de Turismo e com o sector do turismo, em termos globais.

Em relação ao orçamento para o turismo propriamente dito, gostaria que fosse dada uma explicação para o aumento das verbas inscritas em «Investimentos do Plano», com a promoção do turismo no estrangeiro, já que se prevê um aumento de 35,8%, o que, face às evoluções registadas para outras despesas, parece demasiado elevado.

Em relação ao Fundo de Turismo e dado que pela primeira vez aparece uma transferência de 120 000 contos — se não me falha a memória — do Fundo de Turismo para a Direcção-Geral de Turismo, gostaria de saber as razões que levam o Governo este ano a financiar a Direcção-Geral de Turismo através do Fundo.

Gostaria ainda de ver clarificada uma questão em relação ao Fundo de Turismo e no que se refere ao problema das transferências, designadamente para empresas privadas — digo designadamente na medida em que a verba para transferências para empresas

públicas registada no orçamento, é igual à do ano anterior e destina-se a pagamento de bonificações de juros —, que aumentam de 120 000 para um milhão de contos.

Quanto às transferências para particulares, que aumentam de 140 000 contos para 230 000 contos, o que, em termos percentuais, é também um aumento significativo, gostaria que me fosse explicado o porquê deste aumento.

Finalmente, gostaria que me fosse explicitada a natureza dos investimentos inscritos na rubrica «Construções diversas» no valor de 1 793 000 contos.

Realçadas estas questões, concedo a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, aproveito a sua presença nesta reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano para lhe colocar algumas questões.

O primeiro problema que nos aparece no orçamento dos Encargos Gerais da Nação é o de, comparando o orçamento inicial de 1986 e o orçamento revisto, verificarmos que a revisão elevou o orçamento em cerca de 1 milhão de contos e que há também um acréscimo de encargos por comparação entre este orçamento e o de 1986. Esse acréscimo é, em grande parte, explicado pelas transferências de verbas para as regiões autónomas e os gabinetes ministeriais, mas mesmo assim resta uma importância de cerca de 3 milhões de contos.

A questão que lhe coloco é, pois, sobre qual o processo de revisão que levou o Governo a elevar este orçamento em cerca de 1 100 000 contos.

Uma outra questão diz respeito ao orçamento do Secretariado para a Modernização Administrativa. Compreendo a natureza da actuação deste Secretariado, sei quais são os seus objectivos, mas parece-me que, pelo conjunto de verbas que lhe aparecem aqui afectadas — e, fundamentalmente, são verbas com pessoal —, não estarão previstas actuações para 1987 que permitam prosseguir o seu verdadeiro objectivo, que é fundamental, como já tivemos ocasião de salientar no contexto da questão da Administração Pública.

Eram estas as duas questões que, nesta «primeira volta», queria aqui deixar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Gomes de Almeida.

O Sr. Abel Gomes de Almeida (CDS): — Sr. Secretário de Estado, constatamos que o orçamento da Direcção-Geral da Comunicação Social para o próximo ano é inferior em cerca de 7000 contos ao do ano de 1986. Todavia, no orçamento que se está a preparar, o grosso das verbas destinadas a apoios e subsídios vários à comunicação social transitaram para a Secretaria de Estado do Tesouro, de onde, da nossa parte, temos uma certa dificuldade em avaliar e fazer a discriminação desses quantitativos e em conhecer o critério da sua atribuição.

Há também um problema final de natureza mais abstracta, mas igualmente importante, que é o de saber quem vai fazer a afectação dessas importâncias. Será por despacho conjunto? Será o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto? Será apenas o Sr. Secretário de Estado do Orçamento?

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E, para além disso, gostaria de saber se, numa perspectiva, que se deseja próxima, de revisão de toda a situação na comunicação social, é um orçamento, digamos, de manutenção e continuidade ou se já encara a possibilidade — também anunciada pelo Governo — de proceder ai a uma larga reforma neste domínio da comunicação social.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento para dar os esclarecimentos que entender.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Responderei às questões que não dizem directamente respeito à Secretaria de Estado da Juventude, as quais serão respondidas pelo meu colega Secretário de Estado da Juventude.

Começarei, até pela própria hierarquia, pelos «Corpos de Estado», a que se seguirão as questões sobre comunicação social e sobre turismo.

Assim, quanto ao orçamento da Presidência da República, o Sr. Deputado José Magalhães perguntou como é que o Governo fez o cálculo do referido orçamento. O Governo não fez cálculos para este orçamento, limitando-se a inscrever a verba que lhe foi enviada pelos serviços de apoio da Presidência da República e introduzindo, na parte das verbas com pessoal, as correcções correspondentes ao delta salarial para 1987.

Portanto, se as verbas estão subdotadas, não especificadas — nomeadamente as respeitantes a combustíveis, transportes e comunicações —, esse foi um cálculo que, suponho, passa pelas grandes economias que vão haver, por exemplo, na parte de combustíveis na Presidência da República, porque a Presidência da República tem estado a renovar o seu parque automóvel com carros de dezasseis e vinte anos, dentro das possibilidades orçamentais do Ministério das Finanças (Direcção-Geral do Património). Isto resulta em poupanças bastante elevadas superiores até às que seriam razoáveis, pois havia viaturas com consumos superiores a 20 1/100 km.

Ainda aqui, há um outro aspecto, que é o que diz respeito às chamadas «visitas de Estado», que não se encontram orçamentadas na Presidência da República, mas no Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Quanto ao Instituto Damião de Góis, que depende da Presidência da República, está a proceder-se a uma análise do seu futuro. Naturalmente, seja qual for o futuro do Instituto, as suas verbas pertencerão ao orçamento da Presidência da República.

Quanto à questão levantada com os aumentos de verbas para pessoal no orçamento da Presidência do Conselho de Ministros, estes aumentos destinam-se ao pagamento de remunerações de pessoal de outros serviços públicos requisitado na Presidência do Conselho de Ministros, bem como à integração do pessoal do extinto Gabinete de Estudos e Coordenação da Reforma Administrativa (GECRA).

Na parte de pessoal, o cálculo é a cobertura orçamental para a aplicação do Decreto-Lei n.° 248/85, sobre carreiras.

Quanto às verbas que não são de pessoal, o que aparece de extraordinário no orçamento da Presidência do Conselho de Ministros são as verbas respeitantes a equipamento de microfilmagem — por absurdo que seja, a Presidência do Conselho de Ministros não dispunha deste equipamento — e informático para a Secretaria--Geral.

A Presidência do Conselho de Ministros dá apoio não só ao Gabinete do Primeiro-Ministro mas também a todos os ministros e secretários de Estado que estão na esfera da Presidência do Conselho e, ainda, fez toda a ligação com uma série de serviços e organismos heterogéneos, quer financeira quer administrativamente; está, portanto, espalhada por diversos edifícios em Lisboa — basta dar como exemplo que todo o expediente da Presidência do Conselho, mesmo que seja endereçado ao Primeiro-Ministro, dá entrada e saída num edifício que se encontra na Rua de Gomes Teixeira e a residência oficial é em São Bento. De facto, talvez por ter obedecido a uma filosofia diferente, é um processo anacrónico, envolvendo encargos bastante elevados, que se estão a minorar e a racionalizar. É evidente que, de início, essa redução dos encargos terá uma curva ascendente, que se deve à implantação do processo de microfilmagem, a qual é necessária porque há espaços muito grandes que estão ocupados com meros arquivos que, embora não sejam arquivos mortos, ocupam um grande espaço e, além disso, não há nenhum tratamento informático de toda a documentação e da informação que entra na Presidência do Conselho de Ministros.

As obras de investimentos na residência oficial do Primeiro-Ministro decorrem exactamente da hipótese de se instalarem serviços de apoio no edifício junto a este Palácio, que não tinha quaisquer instalações para ter um serviço de apoio. Por exemplo, os serviços de secretaria estão na Rua de Gomes Teixeira, a umas centenas de metros do local onde se reúne o Conselho de Ministros.

Além disso, aproveita-se o edifício que actualmente está abandonado, na Rua de Almeida Brandão, onde em tempos funcionou o Secretariado da Integração Europeia e onde irá funcionar o Secretariado da Modernização Administrativa. Devo dizer-lhe que estas obras, se não me engano, rondam os 17 000 contos, até são pequenas e têm de se fazer — aliás, elas nem sequer têm grande expressão. A outra alternativa era, pura e simplesmente, deixar estar tudo como está.

Esta é, em suma, a justificação para as variações das verbas da Presidência do Conselho de Ministros.

Relativamente ao projecto inicial de transferências de capital para a Assembleia da República, devo dizer que houve uma rectificação, com o acordo da própria Presidência da Assembleia da República. A Assembleia da República tinha 396 000 contos, ou melhor, tinha 200 000 contos para aquisição de edifícios e 70 000 contos para obras de reparação do Palácio de São Bento e, dentro de um espírito de poupança orçamental, optou-se pelas obras de reparação do Palácio de São Bento — e devo dizer que o Governo não cortou nada —, ficando para ulterior oportunidade a aquisição do edifício. Mas, nesta matéria, a Assembleia da República é soberana . . .

A verba que está inscrita no orçamento relativa à Alta Autoridade contra a Corrupção é a que foi apresentada pelo próprio serviço. Porém, dado que, uma semana antes do prazo limite de entrega do orçamento foi publicada no Diário da República a transferência da Alta Autoridade contra a Corrupção para a Assembleia da República, o orçamento da Alta Autoridade deixou de constar de um capítulo próprio dos Encargos Gerais da Nação, tendo passado para o orçamento da Assembleia da República. Mas, repito, a verba inscrita é a que foi proposta pelo serviço.

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Relativamente as despesas relativas à Secretaría-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, a verba inscrita destina-se, fundamentalmente, ao material informático de que há pouco falei, à admissão de pessoal administrativo feita este ano e à integração de alguns técnicos superiores que estavam no ex-GECRA. Além disso, inclui ainda o aumento de vencimentos para 1987.

A Sr.a Deputada Helena Marques colocou uma questão relativa aos gabinetes dos ministros da República e, embora a Sr.* Deputada não tenha perguntado como é que foi calculada a verba para estes gabinetes, vou esclarecê-la. Esta verba foi calculada com base na dotação de transferências de 1986, tendo esta sido actualizada em 10%. No caso da Madeira, a transferência foi ainda acrescida de 1 2S0 000 contos para suportar o pagamento de dívidas no âmbito do programa de reequilíbrio financeiro que foi celebrado com a Região Autónoma e de que, segundo suponho, os Srs. Deputados tiveram conhecimento a título reservado.

Cada orçamento tem ainda uma verba que corresponde ao cálculo dos encargos com a bonificação do crédito à habitação, o qual será suportado pelos respectivos orçamentos.

Neste caso, será inscrito no orçamento de cada região autónoma o montante previsto para os encargos com a bonificação dos empréstimos à habitação e, em 1987, o Orçamento do Estado compensá-los-á nesse montante. Assim sendo, os Açores receberão 7 060 000 contos decorrentes dos custos de insularidade, de desenvolvimento económico, de comparticipação no desenvolvimento da Região, e ainda uma verba de 100 000 contos destinada a suportar a bonificação do crédito à habitação. Por seu lado, a Madeira receberá 4 480 000 contos para cobrir os custos de insularidade, comparticipação no desenvolvimento da Região, etc, 15 000 contos para os encargos previstos com as bonificações do crédito à habitação e ainda 1 250 000 contos, que não constituem propriamente uma verba «livre» para a Região, mas que servirá, isso sim, para pagar estas dívidas da Região.

Quanto à questão relativa à situação do programa de reequilíbrio financeiro, sugeria que ela fosse colocada quando se debatesse o orçamento do Ministério das Finanças. No entanto, posso dizer-lhe que essa situação está a ser coordenada e acompanhada pelo Sr. Secretário de Estado do Tesouro, com o apoio da Inspecção--Geral de Finanças, e o que se sabe é que, até agora, a Região Autónoma da Madeira tem estado a cumprir os timings e a «disciplina orçamental» de solidariedade financeira que foram acordados nesse tal programa.

No que se refere à verba destinada ao Museu da República e da Resistência, devo dizer que, de facto, ela não é significativa, mas havia que tomar prioridades e isto não significa que não haja outras hipóteses para esses museus, até no âmbito da Secretaria de Estado da Cultura. Mas a verdade é que não foi considerada, dentro deste programa de um certo rigor orçamental, uma verba muito significativa para o sector.

A verba considerada para as comemorações quer do 25 de Abril quer do 10 de Junho foi a que se achou suficiente para que elas tenham a necessária dignidade. E a este respeito, recordo-vos, há sempre comparticipações por parte de entidades que não o Orçamento do Estado, como, por exemplo, as autarquias, as associações de solidariedade social e ainda os próprios cidadãos. Portanto, não será por falta de dotação que esses eventos serão, digna e profusamente, celebrados.

Quanto à verba destinada ao Instituto Nacional de Administração, devo dizer que é suborçamentada. E uma crítica que se pode fazer a qualquer orçamento, seja ele qual for, é que nunca tem as dotações que seriam as desejáveis; no entanto, consideramos que as dotações indicadas são suficientes.

No caso do INA há ainda outro aspecto, pois uma parte das dotações são com compensação e receita. Ou seja, o INA tem competência para angariar receitas próprias, vendendo serviços e, nos casos em que os organismos do Estado possam cobrir uma parte das suas despesas com serviços que realizam, é conveniente que estes sejam estimulados a fazê-lo.

É muito natural que o INA não tenha qualquer problema — aliás, nunca teve problemas em matéria orçamental —, exactamente porque, como tem vindo a suceder de ano para ano e à medida que se vai consolidando no sector da formação não só administrativa, mas também empresarial do Estado, é provável que também possa vender os seus serviços e, se os vender, cobre todos os seus compromissos que sejam acrescidos àqueles que já estão no orçamento com um aumento da receita própria. Acho perfeitamente salutar esta posição.

A verba que se encontra inscrita para o Serviço Nacional de Protecção Civil tem um aumento de cerca de 120 000 contos para cobrir catástrofes e incêndios florestais, mas há ainda um complemento desta verba que está consignada no Ministério da Administração Interna. Assim, sugeria ao Sr. Deputado José Magalhães que colocasse essa questão ao Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna quando se discutisse o orçamento deste Ministério, pois é uma a acção integrada que não pode ser vista de uma forma desagregada departamento a departamento.

No entanto, para este ano, ao contrário dos anteriores, há verbas para a prevenção dos incêndios florestais, que são a maior catástrofe que pode surgir, e naturalmente que as verbas para atender exactamente a essas calamidades, no sentido da imprevisibilidade do termo, caberão na dotação provisional.

Mas, ao contrário dos outros anos, em que tudo cabia na dotação provisional, a prevenção do incêndio está prevista no Orçamento do Estado, nos orçamentos dos serviços privativos, como é o caso do Serviço Nacional de Bombeiros (em que uma parte significativa da verba vem do financiamento de receitas próprias) e do Serviço Nacional de Protecção Civil, que tem uma função de coordenação — é preciso não esquecer este aspecto —, e cuja verba tem uma parte destinada a indemnizações e outra, que é a parte imprevisível. Aliás, essa será uma das vocações, porventura a mais nobre, da dotação provisional. Esperemos que a função «prevenção» consiga gerar poupanças na função indemnização de calamidade que são os incêndios florestais.

O Sr. Deputado José Magalhães colocou também uma questão de âmbito geral, dizendo que as despesas com o pessoal aumentam. Na verdade, elas aumentam se se analisar o aumento de pessoal em termos de Encargos Gerais da Nação — nesse caso suponho que o aumento andará pelos 33% a 34%. Mas no que se refere aos Encargos Gerais da Nação, o aumento tem de ser visto, não numa perspectiva globral e sim numa perspectiva de departamento, porque esse é talvez, dos diversos sectores do Estado, aquele que, de um ano para o outro, mais flutuações tem em termos de universo — é, digamos assim, um conglomerado de organismos.

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Portanto, os aumentos de despesas, serviço a serviço, que foram analisados com um grande rigor, são justificados exclusivamente pelas reclassificações das portarias de reclassificação de quadros, decorrentes do Decreto-Lei n.° 248/85 e explicados pelo aumento de vencimentos e ainda pelos serviços da área da juventude. De facto, a área da juventude terá de preencher os seus quadros em 1987, sendo que, assim, logo esse sector irá provocar um significativo aumento do pessoal em 1987.

O Sr. Deputado Nogueira de Brito colocou uma questão genérica: por que é que o orçamento revisto é superior ao inicial.

Bem, a justificação é muito simples: é superior ou porque tem compensação e receita ou porque tem reforços, por exemplo, da dotação provisional — é o caso do Serviço Nacional de Protecção Civil, que recebeu este ano reforços da referida dotação provisional.

Além disso, como se devem recordar, afirmei que os aumentos de vencimentos dos serviços autónomos, em 1986, teriam contrapartida, quando tal fosse extremamente necessário — infelizmente é quase sempre necessário —, na dotação provisional.

Ora, relativamente aos Encargos Gerais da Nação deste orçamento, há muitos serviços com autonomia. Portanto, para o final do ano — e isso vai até tendo um crescimento, que não é harmónico, mas, digamos assim, exponencial —, vão pedindo reforços da dotação provisional para compensar os aumentos de vencimentos. É, assim, natural que o orçamento revisto seja, ao longo do ano, cada vez mais superior ao orçamento inicial — isto num primeiro aspecto.

Noutro aspecto, há nesse orçamento contas de ordem significativas, decorrentes da existência do Fundo de Turismo e do Fundo de Apoio aos Organismos Juvenis (FAOJ), sendo que o Fundo de Turismo, ou outro serviço, pode aplicar mais despesas do que aquelas que tem, desde que tenha receitas consignadas.

Portanto, é esta a justificação para que o orçamento revisto, na rubrica «Encargos Gerais da Nação», seja superior àquele que foi votado na Assembleia. Aliás, isso decorre da própria lei e da própria filosofia da receita consignada, ou do duplo cabimento — como também se chama em contabilidade pública.

Quanto ao Secretariado para a Modernização Administrativa, suponho que não foi bem uma questão; foi mais uma reflexão sobre o assunto.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, para além de uma reflexão, era a questão de saber que tipo de acções é que, com este orçamento, se prevêem no Secretariado para a Modernização Administrativa.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado Nogueira de Brito, posso responder-lhe que as acções do Secretariado para a Modernização Administrativa são acções de provocação, no sentido da modernização do aparelho do Estado. E de provocação através de anteprojectos de decreto-lei, ou ante-TMOJfcCtOS de lei, que serão apresentados ao Sr. Pri-

meiro-Ministro com uma justificação: desburocratizar a Administração, racionalizar circuitos e melhorar a relação entre a Administração e o cidadão administrado.

O Secretariado não vai substituir-se a nenhum serviço, pois tal seria um mau serviço; equivaleria a criar outra vez o cancro da reforma administrativa que foi o velho Secretariado da Organização Administrativa do final dos anos 60, o qual começou por ser um secretariado, uma comissão, e acabou num superministério da reforma administrativa.

Não é, portanto, isso que se pretende, pois, na prática, não se fez qualquer reforma administrativa, mas uma contra-reforma administrativa. O que se pretende é que esse secretariado, que não tem quadro de pessoal — vai chamando as pessoas ...

Vozes inaudíveis na gravação.

Bem, todos tiveram responsabilidade nessa matéria.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Todos, cuidado!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Todos os partidos tiveram responsabilidades na contra-reforma administrativa.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Ai protesto! Todos não!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Todos, menos os que a não tiveram!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Bem, este não é propriamente um debate sobre a reforma administrativa. Não me furto a ele, mas, de facto, está aqui muita gente que tem, pelos mais diversos prismas, conhecimento dessa matéria.

Portanto, como ia dizendo, o que se pretende é, fundamentalmente, que a reforma administrativa não seja uma mera reforma de Diário da República.

Julgo, assim, que aquilo que chamo — e já o chamei várias vezes — o cancro administrativo não será o objectivo a atingir, constituindo antes uma tentação que não poderá acometer o Secretariado da Modernização Administrativa.

Neste caso, a ideia é ir buscando personalidades altamente qualificadas, quer do sector público, quer até do sector privado. Digamos que é um espaço pelo qual se provoca que cada ministro terá de olhar para o seu ministério e terá de ver onde é que esse ministério está virado para si e onde é que está virado para a sociedade.

No entanto, não há aqui uma duplicação de funções, mas um acompanhar, um motivar dos ministérios e dos próprios ministros para a modernização do seu departamento — algumas acções já estão a ser preparadas nesse sentido e, no tempo devido, serão anunciadas e implementadas.

Passando agora à parte da comunicação social, e quanto à questão das empresas públicas do sector, elas são vistas numa perspectiva de sector empresarial do Estado. Portanto, aquando da discussão do orçamento do Ministério das Finanças — porque é no Ministério das Finanças que se encontram as dotações de capital para as empresas públicas —, penso que será explicado com a necessária pormenorização o calculo das dotações para as empresas públicas da comunicação social.

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Aliás, quando se fala em dotações, também terá de se falar em alienações do capital. Assim sendo, este sector é, digamos assim, um sector de gestão integrada e de viabilização financeira dessas empresas.

É uma matéria fundamentalmente financeira, e já notei que o Sr. Secretário de Estado Adjunto que detém o pelouro da Comunicação Social —sei, aliás, pelo relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que o Sr. Secretário de Estado acompanhou e teve oportunidade de apreciar o orçamento da Comunicação Social— já deu os esclarecimentos, na altura considerados oportunos, sobre esta matéria.

É o caso, por exemplo, do porte pago, que está no capítulo 60 do orçamento do Ministério das Finanças, o qual terá como função não só que o Estado honre os seus compromissos perante os CTT/TLP em matéria de pagamento do porte das empresas da comunicação social, dos jornais, mas também o pagamento daquilo que estava atrasado.

Naturalmente que isto terá uma compensação, a qual se traduz em que essa empresa pública pague ao Estado as chamadas rendas, que constituem a participação que o Estado tem nas receitas quer dos CTT quer dos TLP. Aliás, isso foi esquecido nos últimos anos, embora em 1987 tenha de haver essa comparticipação.

O Sr. Gomes de Almeida (CDS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretario de Estado?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Almeida (CDS): — Sr. Secretário de Estado, relativamente às verbas da Direcção-Geral, V. Ex.a prestou e proporcionou elementos escritos suficientes. Porém, a dúvida remanescente, a dúvida que nós, e eu pessoalmente, mantemos também diz respeito às dotações previstas na Secretaria de Estado do Tesouro para as empresas públicas.

De facto, quanto a este segundo aspecto é que a informação foi escassa. Aliás, o Sr. Secretário de Estado remeteu, quanto a este assunto, para o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Secretário de Estado, permite-me que o interrompa também?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — O Sr. Secretário de Estado da pasta respondeu a tudo menos ao que não respondeu. E creio que já ficou aqui esclarecido quais as questões a que ele não respondeu e que tivemos oportunidade de lhe colocar aqui. Assim, era precisamente sobre essas questões que gostaríamos de ouvir a sua opinião.

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Já agora, Sr. Secretário de Estado, permite-me que o interrompa também?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Sr. Secretário de Estado, ainda a propósito das empresas públicas da comunicação social, e reforçando o que há pouco foi

dito pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, levanta-se a questão de continuarmos a não saber qual é a situação económico-financeira dessas empresas, a despeito de, em 10 de Março deste ano, o Sr. Secretário de Estado Adjunto ter dito que o Governo mandou elaborar estudos após o levantamento da situação económico--financeira das empresas da comunicação social, a fim de tomar decisões que tinham em vista a concretização no Programa do Governo.

Bem, a semana passada o Sr. Secretário de Estado continuava a dizer que ainda não tinha esse estudo, que era muito pouco tempo: que eram quinze dias ou praticamente um mês que havia sobre a lei que saiu. Contudo, a verdade é que não são quinze dias nem um mês.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Mais de três meses!

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Creio que são nove meses ou coisa que o valha. E assim, continuamos exactamente sem conhecer essa situação e sem saber quais são as indemnizações compensatórias — nesse aspecto continuamos em branco.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Volto a repetir que as empresas de comunicação social estão inseridas no sector empresarial do Estado e que é no orçamento do Ministério das Finanças que se encontram quer as dotações de subsídios quer as dotações de capital —indemnizações compensatórias e dotações de capital— para as empresas públicas. Nessa altura poderão, portanto, ser dados esclarecimentos sobre esse sector.

De qualquer maneira, lembro que os anexos enviados à Assembleia da República, aos Srs. Deputados, incluíam uma descrição sobre a situação financeira das empresas públicas. Não me recordo qual dos anexos era, mas sei que dele constava a situação das empresas públicas, e suponho que também integrava as dotações das empresas de comunicação social — não sei se os Srs. Deputados tiveram ocasião de consultar esses anexos sobre empresas públicas.

De qualquer forma, os esclarecimentos que o Governo está em condições de prestar poderão ser dados na reunião de sexta-feira, quando for ouvida a equipa do Ministério das Finanças, pois esse é um assunto que, repito, está a ser tratado na órbita do sector empresarial do Estado.

Quanto à distribuição de verbas — os chamados subsídios— pelas empresas da comunicação social, ela é baseada no parecer de uma comissão técnica paritária, constituída pelas entidades mais representativas do sector da comunicação social.

Quanto às verbas para as agências noticiosas —ANOP e NP—, elas foram calculadas no pressuposto da fusão dessas duas empresas e também tendo já em conta o Imposto sobre o Valor Acrescentado. Decorrem, portanto, do contrato celebrado entre a Direcção--Geral da Comunicação Social e essas empresas, as quais passarão, no próximo ano, a constituir uma só.

A diferença das verbas previstas para as empresas de expansão nacional públicas e privadas resulta do facto dos subsídios serem aplicados segundo critérios únicos e de existirem catorze empresas privadas para somente três empresas públicas. Tal justifica, portanto, que a verba para as empresas privadas seja superior à destinada às empresas públicas.

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Portanto, quanto ao critério de distribuição dos subsídios, ele ainda está a ser ultimado, mas procurou-se garantir uma isenção quanto à sua atribuição.

A este respeito, recordo que no próprio relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, se faz precisamente referência a um problema que estava a suceder, que era o de que os jornais com maior tiragem recebiam os maiores subsídios, sendo que, portanto, o fosso entre uns e outros ia-se agravando pois quanto mais lucros tinham mais recebiam do Estado. Havia, pois, qualquer coisa aqui que não estava certa e, assim sendo, o modelo, a fórmula tinha de ser revista.

Passando agora ao Turismo, direi que as verbas de promoção turística se encontram no PIDDAC, havendo, de facto, um aumento, na ordem dos 32%, de promoção do turismo no estrangeiro.

Em termos percentuais e relativamente ao ano anterior, este aumento atinge, nuns casos, 85% (é o caso do Canadá, do Brasil, da Suíça e da Itália), sendo noutros casos menor, embora as verbas também sejam muito superiores (é o caso da República Federal da Alemanha, que, embora aumente 28%, passa de uma verba de 95 000 contos para uma verba de 122 000 contos).

Incluem-se aqui actividades ou de promoção directa ou de apoio. Havia determinados centros de turismo que estavam estagnados ou que se limitavam a pagar as despesas de funcionamento, não tendo, portanto, verbas para actuar, e naturalmente que, face a uma prospecção de mercado, resolveu-se atacar os mercados que são susceptíveis de aumentar significativamente o fluxo de turistas para Portugal.

Ainda no que se refere ao turismo, mais concretamente às escolas de turismo ...

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Com

certeza Sr.a Deputada.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Secretário de Estado, acontece que a pergunta que lhe fiz não foi essa, e não levará a mal que lhe diga que, relativamente à resposta que me deu, até eu sabia mais que o Sr. Secretário de Estado.

É óbvio que estes centros de turismo estavam desactivados e que, com o aumento das verbas, foram tentando relançar algumas actividades que não tinham sido relançadas até agora. Nesse aspecto até me parece que tudo está bem, embora seja preciso ter em atenção que, quando falamos em 32%, estamos a falar de escudos, quando em muitos outros casos falamos de moedas estrangeiras. Portanto, o aumento não é tão grande como isso.

O que lhe perguntei foi por que é que já não há mais verbas a partir de 1987. E que estes centros têm vindo a actuar durante estes anos todos e agora o PIDDAC diz-nos que a partir de 1987 não haverá mais verbas.

Era esta a pergunta que lhe tinha feito, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr.a Deputada, a resposta é simples: é que isto é um orçamento para 1987. São programas anuais e, portanto ...

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Dá-me licença que o interrompa outra vez?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Faça favor.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — É que todos os programas são anuais, e se o Sr. Secretário de Estado quiser fazer o favor de olhar para a página onde estão inscritas as verbas do PIDDAC verá que todos os outros se prolongam até ao ano de 1990 e seguintes e só este é que termina em 1987. Por isso, gostava de saber se, a partir de 1987, os centros de turismo no estrangeiro vão fechar ou se continuarão a funcionar, de acordo com a lógica que o Sr. Secretário de Estado acabou de expressar, ou seja, a de que são muito importantes para cativar os mercados estrangeiros, para actuar e fazer promoção no estrangeiro.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr.a Deputada, no futuro até poderemos reclassificar o tipo destes investimentos, mas para já dir-lhe-ei que estes investimentos de turismo não são propriamente investimentos corpóreos, são aquisição de serviços. Logo, obedecem a contratos, que futuramente passarão para uma outra entidade, que é o Instituto de Promoção Turística, o que nascerá de uma cisão da Direcção-Geral do Turismo e terá uma perspectiva de actuação diferente da do serviço administrativo que é a Direcção-Geral do Turismo. Digamos que é uma tentativa nova do Governo para alterar a concepção burocrática da promoção do turismo no estrangeiro. Assim, passar-se-á de uma promoção estática, a do funcionário que está e que desempenha determinadas funções, para uma promoção de apoio e até de conjugação com outros sectores (agências de viagem privadas, operadores nacionais e estrangeiros), podendo, portanto, haver uma mobilidade, uma maleabilidade, com uma redução de custos, de encargos — a ideia é também reduzir os encargos —, na medida em que serão menos pessoas (isto na parte da promoção turística no estrangeiro) a produzirem mais. Esta é a nova aposta que se faz, dado que o modelo de promoção turística no estrangeiro que existiu até aqui teve os seus frutos, teve as suas potencialidades, mas revela-se que já está esgotado.

A filosofia será, por conseguinte, esta: a partir de 1988 surgirá um novo organismo (o Instituto de Promoção Turística), não fazendo muito sentido ou, pelo menos, tendo uma base de irrealismo muito elevada, estar a fazer agora uma projecção plurianual na promoção turística quando já se sabe que nem sequer serão estas entidades que estão actualmente a funcionar que irão fazer essa mesma promoção artística.

A Sr.8 Helena Torres Marques (PS): — Permite-me uma nova interrupção, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Com

certeza, faça favor.

O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada, se não se importa, gostaria de a chamar a atenção paia o seguinte: já vários Srs. Deputados puseram a questão de necessitarem de uma segunda volta de intervenções para se pronunciarem, pelo que lhe pedia para ter em atenção que estamos com um certo aperto de tempo.

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A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Tentarei ser muito rápida, Sr. Presidente.

Sr. Secretario de Estado, é claro que sei que foi criado o Instituto de Promoção Turística. Só que o Sr. Secretario de Estado começou por dizer que era muito importante fazer promoção turística no País e no estrangeiro — por isso as verbas tinham sido aumentadas —, que era importantíssimo aumentar o fluxo destes mercados, mas agora acaba de dizer que eles funcionam mal, que não devem continuar a funcionar nesta perspectiva e que, portanto, para o ano irão funcionar de acordo com o tal instituto e serão financiadas não se sabe muito bem como, mas pelos vistos não pelo Orçamento do Estado. Quer dizer, da intervenção do Sr. Secretário de Estado terei que concluir que para o ano fecharão os centros de turismo no estrangeiro. É isso?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr." Deputada, posso ser um pouco confuso a explicar estas questões relacionadas com o turismo, mas agora a Sr.a Deputada ainda conseguiu ser mais confusa do que eu.

O que pretendi dizer foi que o facto de haver uma instituição que funciona mal não significa que não se faça nada! A Sr." Deputada conhece tão bem ou melhor do que eu qual é a estrutura do Estado e, portanto, suponho que percebeu bem aquilo que eu disse.

Efectivamente, há uma determinada instituição que tem centenas de funcionários e que tem de ser reciclada, havendo, nalguns casos, que fazer um melhor aproveitamento das pessoas que lá estão. O facto de ainda não existir neste momento um Instituto de Promoção Turística a funcionar a 1% não significa que para o ano não tenha que continuar a promoção. Esta «passagem de mão», digamos assim, de competência em matéria de promoção turística, terá de ser feita sem saltos muito bruscos, em termos da própria orgânica do serviço.

Conheço por dentro a que é que obedeceu a criação do Instituto da Promoção Turística e posso dizer que foi precisamente por haver uma Direcção-Geral do Turismo apenas com funções de controle, regulamentares e de disciplina do sector que houve necessidade de criar um outro organismo, que é o Instituto — podia chamar-se um fundo ou outra coisa qualquer —, tendo como função promover o turismo no estrangeiro. É evidente que ele não pode estar completamente de costas voltadas para os serviços internos, quer para os serviços do Estado dependentes da Administração Central, quer para as comissões de turismo regionais e outros sectores. Portanto, terá de haver aí uma coordenação aproveitando as verbas. Ou seja, a ideia é a de evitar promoções de turismo paralelas, que, na prática, não aumentam, em termos marginais, nada na promoção de turismo no estrangeiro, e potenciar as escassas verbas do Estado para essa promoção do Turismo. Esta é a filosofia.

Agora, se vamos discutir se deverá ser desta maneira ou doutra, tenho a impressão que, neste momento, esse debate seria um bocadinho deslocado.

Quanto às escolas de formação hoteleira, gostaria de dizer que as verbas inscritas no Orçamento para esse fim ainda poderão ser acrescidas durante o ano — e é natural que o sejam — através de apoios do Fundo Social Europeu. Neste caso ainda se está numa fase de regulamentação ou de acordo, mas é muito natural que durante o ano de 1987 haja um aumento das dotações

para os cursos de formação hoteleira, o qual será originado por aprovação de projectos pelo Fundo Social Europeu. Acresce que esse é um sector para o qual o Fundo Social Europeu está vocacionado para comparticipar, mas, por enquanto essas verbas ainda não se encontram neste orçamento ordinário das escolas hoteleiras.

No que diz respeito à verba de transferência do Fundo de Turismo para a Direccão-Geral de Turismo, posso dizer que ela se destina a cobrir as despesas com campanhas de marketing do turismo, quer em Portugal, quer no estrangeiro.

A Sr." Deputada Odete Santos colocou questões sobre a Direcção-Geral da Família e a Comissão da Condição Feminina.

Posso dizer-lhe que as verbas orçamentadas para a Comissão da Condição Feminina são as que foram julgadas suficientes. Em anos anteriores houve uma certa emulação entre a Comissão da Condição Feminina e a Direcção-Geral da Família. O Governo entende que são serviços públicos que têm de prosseguir fins comuns e ainda que têm vocações diferentes, porque no dia em que se considerar que têm a mesma vocação extinguem--se ambos.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Ou fundem-se!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Já

houve quem defendesse isso!

O Sr. José Magalhães (PCP): — Eu não defendi nada!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — No

caso da Comissão da Condição Feminina, ela tem uma vocação ...

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Faça favor.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Secretário de Estado, não lhe perguntei qual era a vocação da Comissão da Condição Feminina porque ela até tem um programa muito bem elaborado que tenho presente na minha frente.

O que lhe perguntei foi em relação à Direcção-Geral da Família e foi o seguinte: para além da verba para pagamentos aos funcionários — onde há até um aumento substancial — e daquela que se destina à concessão de subsídios por parte desta Direcção-Geral, há uma outra verba para subsídios. Ora, gostaria de saber o que são estes subsídios, quais os seus objectivos e por que razão há um decréscimo nominal em relação ao orçamento da Comissão da Condição Feminina e há um aumento em relação à Direcção-Geral da Família, que realmente não sabemos muito bem o que é que faz.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Não há, não!

A Sr." Odete Santos (PCP): — Há sim, Sr. Deputado. Peço-lhe desculpa mas no orçamento do ano anterior estavam previstos 97 855 contos e este ano estão previstos 16 013 contos — isto no que respeita

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à Direcção-Geral da Família. No caso da Comissão da Condição Feminina há um decréscimo, pois no ano passado estavam orçamentados 64 632 contos e para 1987 estão orçamentados 63 042 contos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr.8 Deputada, os orçamentos dos serviços foram, elaborados com base em actividades, novas e em curso. Como já expliquei, não houve um método incremental e cada serviço apresentou as suas actividades. Houve serviços que apresentaram e justificaram actividades novas.

No caso, a Direcção-Geral da Família apresentou duas actividades em curso e cinco actividades novas, designadamente a da formação e promoção familiar e uma de desenvolvimento e associativismo familiar.

A Sr." Odete Santos (PCP): — Não é isso, e não acho que dê vontade de rir.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Assim, entendeu o Governo que estas acções, que são acções novas, deveriam ser estimuladas e avançar. Daí as verbas.

No caso da Comissão da Condição Feminina, esta apresentou apenas duas actividades novas: a informatização do atendimento jurídico e actividades no âmbito das Comunidades Europeias. Esta última consiste na participação num comité sobre a matéria que funciona em Bruxelas.

Neste caso, não podemos estar a confrontar uma coisa com outra ou a ver se uma aumenta ou não mais do que a outra. Além disso, há actividades em curso. O Governo entendeu que em cada momento se considera. ..

O Sr. José Magalhães (PCP): — Mas há um corte de verbas, nominal até.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Corte de verbas não pode haver. Há é actividades que se desenvolvem e outras que não.

Neste caso, considera-se que a Comissão da Condição Feminina tem verbas suficientes.

Aliás, entendo sempre que um serviço público é um instrumento de política. No caso, o Governo entende que a Comissão da Condição Feminina poderá prosseguir as suas funções, é útil e as verbas que lhe estão cometidas são suficientes. Isto é razão mais do que justificável para a variação das verbas.

No caso da Direcção-Geral da Família, esta tem uma acção de apoio à promoção da família, principalmente na formação das associações de famílias.

Bom, penso que já expliquei suficientemente para que é que servem umas e outras. Acho que não vale a pena dizer mais.

Risos.

Quanto à parte da juventude, passaria a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Juventude.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude (Couto dos Santos): — Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Rogério Moreira, diria que não é possí-

vel fazer qualquer comparação, em termos de rubricas orçamentais da Secretaria de Estado, nomeadamente do FAOJ, entre este ano e o ano anterior. E não é possível porque o orçamento foi elaborado com base em actividades — conforme, aliás, o Sr. Deputado conhece pela distribuição que foi feita à Assembleia da República —, não só no seu quantitativo, mas também pela discriminação dessas actividades.

Por outro lado, o FAOJ sempre foi uma confederação de associações que emitia cheques. Acabou-se, pois, com essa confederação e, no âmbito dessas actividades, as delegações regionais passaram a ter orçamento próprio. Ou seja, aparecia a rubrica — «41» ou «42» — «transferências», que representava um montante e não discriminava o seu destino, nem os Srs. Deputados tinham conhecimento de para onde ia esse dinheiro. Depois, atribuía-se esse dinheiro ao longo do ano, quer pagando-se a animadores, quer conce-dendo-se subsídios. Ao fazer isto por actividades, cada delegação regional dispõe de verbas em todas as rubricas orçamentais — na «14», na «28», na «29», na «30» e assim sucessivamente, conforme essas actividades.

Daí que não seja possível comparar entre este ano e o ano passado.

No que diz respeito à aquisição de serviços, resulta fundamentalmente não só desta distribuição, mas também porque foi aqui introduzido um programa novo, que é o do intercâmbio juvenil quer ao nível externo quer ao nível interno. Ou seja, pela primeira vez o Governo consagra verbas especificamente para intercâmbio de jovens.

Por outro lado, consagra também, pela primeira vez, uma verba a um plano de informação e divulgação para jovens no próprio FAOJ, o que também faz através da conta «aquisição de serviços», que se situa, como sabe, entre as rubricas «28 e 31». O programa do intercâmbio está sobretudo na rubrica «30», que se destina a pagar as viagens desses jovens.

O Governo faz também subir esta rubrica da «aquisição de serviços», sobretudo ao nível da formação de animadores juvenis, que é outro aspecto que também nunca tinha sido consagrado e para o qual este ano se consagra uma actividade própria, a fim de que as associações disponham dos seus animadores juvenis.

Por isso, não faz sentido colocar a questão da transferência para as delegações regionais, porque as transferências resultam das actividades e não de um bolo global, como normalmente parecia, que se destinava depois a ser gasto nas delegações regionais.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado da Juventude: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, acho que as suas afirmações são do maior interesse, mas elas dificilmente justificam os cheques que continuam a ser passados por algumas delegações regionais do FAOJ e de que temos conhecimento por via do Diário da Republica. Mas esta será outra conversa para outra ocasião.

Quando o Sr. Secretário de Estado — e ainda há pouco o próprio Sr. Secretário de Estado do Orçamento referiu este aspecto — diz que os orçamentos foram elaborados com base em novas actividades a

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lançar de novo, por comparação com actividades em curso, remetê-lo-ia para o documento que nos entregou a respeito do FAOJ, no qual se diz: «Actividades em curso: 1 — Participação em organismos internacionais.» É esta a primeira e a única, a única actividade em curso no FAOJ.

Depois diz-se: «Actividades novas: 1 — Formação de animadores e dirigentes juvenis.» O FAOJ já tinha no ano passado em curso o programa de animadores bolseiros e outros.

Diz-se também: «2 — Apoio a informação e documentação às associações, movimentos e agrupamentos juvenis.» Isto é aquilo que no FAOJ, bem ou mal (mal no nosso entender), sempre foi feito.

Quanto a «3 — Plano editorial informativo» como mais uma actividade nova, o FAOJ sempre dispôs dos seus meios de informação, etc.

E por aí adiante.

Penso que é de anotar e registar a sua afirmação em relação àquilo que o FAOJ tem sido. E interessante é que se refiram aqui como actividades novas actividades que o não são, mas que, quando muito, poderão ter alguns complementos, algumas ideias novas a introduzir, que, por sinal, até se verifica serem poucas em face dos documentos que nos foram fornecidos. Agora, chamar actividades novas a coisas que sempre foram feitas é que me parece um pouco exagerado.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude: — Certamente que ou o Sr. Deputado não leu mais sobre as actividades ou, então, não quis ser informado sobre isso.

A questão que se coloca é a seguinte: ao se discriminar por actividades, certamente que elas têm mais de novo do que de velho e é por isso que são novas. Não vou chamar velho àquilo que é novo. É por essa razão que elas aparecem discriminadas como novas.

Assim, no que diz respeito à informação, designadamente aos animadores juvenis, o programa que existiu foi um programa inserido no próprio apoio do Fundo Social Europeu. Não tem nada a ver com o programa que aqui está previsto para este ano, pois é completamente novo e dirigido para as associações juvenis, enquanto o outro é dirigido internamente. É essa a grande diferença e é por isso que a actividade é nova.

O mesmo acontece com o plano de informação e divulgação. Introduziram-se novas metodologias, até porque o próprio projecto de base de dados avança e necessariamente tem de ser apoiado por isto.

Passando à outra questão que me colocou — a dos OTLs —, o princípio que adoptámos foi o de mantermos o mesmo subsídio, daqui resultando protocolos a celebrar com as entidades que possam cobrir o que resulta do aumento da inflação ou da desvalorização dos 500$ que atribuíamos, através de apoio em transportes e alimentação. Este é um objectivo ambicioso, mas que penso ser possível conseguir-se mediante protocolos a celebrar directamente com as entidades que recebem os jovens inscritos nas OTLs. O Governo prefere aumentar o número de jovens, exigindo dos seus serviços esse tal acordo ou protocolo que permita cobrir l essas despesas e até ultrapassar a taxa de inflação. I Quanto às transferências para as associações juvenis, ! compara o valor deste ano com o do ano anterior. Não I faz sentido essa comparação porque, relativamente ao apoio às associações juvenis, há um salto muito grande em termos orçamentais. O que aparece consagrado para

apoio a associações juvenis são apenas os subsídios às actividades ou às infra-estruturas das próprias associações, e não aparece integrado no todo, como acontecia nos anos anteriores.

Sobre as associações de estudantes, trata-se de uma verba que está inscrita na Direcção-Geral do Ensino Superior.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa novavemente, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado da Juventude: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Secretario.de Estado, referi-me às associações de estudantes do ensino secundário, pois, quanto às outras, já sei que está inscrita. Gostaria de saber é se, em relação àquelas, está ou não inscrita em algum dos departamentos do Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude: — Sr. Deputado, a Secretaria de Estado da Juventude não tem verbas inscritas para apoio a associações de estudantes, encontrando-se tudo inscrito no Ministério da Educação e Cultura.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, havendo ainda alguns Srs. Deputados que pretendem colocar algumas questões, pediria que tentássemos fazer um esforço de síntese, de modo a não ultrapassarmos as 12 horas e 15 minutos. Encontramo-nos já com um atraso substancial, e o Sr. Ministro da Justiça já se encontra a aguardar há um certo tempo. Agradecia, pois, que tentássemos ser rápidos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, desde a apresentação do Programa do Governo que estamos esclarecidos sobre a intenção que tinha presidido ao desmembramento da estrutura da reforma administrativa e à criação deste Secretariado da Modernização Administrativa.

Devo dizer-lhe que desde há muito tempo que estou de acordo com esse tipo de estrutura. Simplesmente, há várias coisas que temos a lamentar nesta matéria.

Em primeiro lugar, nesta reunião de discussão do orçamento dos Encargos Gerais da Nação estão presentes o Sr. Secretário de Estado do Orçamento e o Sr. Secretário de Estado da Juventude, mas não está presente, por exemplo, ninguém que responda directamente pela modernização administrativa. Eia decorre no âmbito da Presideência do Conselho. O Sr. Secretário de Estado é quem tem a gestão da Administração Pública nesse sentido, e a parte da gestão que anteriormente pertencia à reforma administrativa passou para o seu departamento.

Digo-lhe que seria salutar que houvesse até um certo grau de conflitualidade entre quem gere e tem de pagar que é o caso do Sr. Secretário de Estado, e quem tem de modernizar e lançar essas tais acções «provocató-rias». E realmente não está aqui ninguém que tenha isso a seu cargo, o que é de facto um sintoma, o primeiro sintoma.

O segundo sintoma é o seguinte: na realidade, não notamos em 1986 que tenha sido desencadeada alguma acção de «provocação» e também não vemos para 1987

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nenhuma acção de «provocação». Estou a servir-me de um termo, colocando-o, obviamente, entre aspas, que o Sr. Secretário de Estado utilizou e com o qual não estou em desacordo. Também não vemos aqui programado nada nesse sentido. Designadamente, o que vemos é que o artigo 10.° da proposta de lei do Orçamento é até bastante mais pobre do que o antigo artigo 12.° (salvo erro) do Orçamento para 1986. De facto, vemos pouco nesta matéria.

Por outro lado, isso tem um certo reflexo nas verbas que são afectadas à modernização administrativa e ao próprio Instituto Nacional da Administração, como já aqui foi salientado. Aqui, poderia ser outra sede orgânica em que se desenvolveriam acções também de «provocação», embora a sua principal vocação seja a da formação, como o Sr. Secretário de Estado anunciou.

É que, comparando nós estas verbas com, por exemplo, as verbas que se distribuem por vários gabinetes, em várias secretarias de Estado, para aquisição de serviços não especificados, o que, aliás, explica o crescimento dessa rubrica em termos gerais na classificação económica do Orçamento, não conseguimos vislumbrar exactamente qual é a razão de ser disto.

No que respeita ainda à Direcção-Geral da Família, questão que foi aqui hoje levantada em ligação com a Comissão da Condição Feminina, devo dizer-lhe que, apesar de tudo, considero escassas as verbas que lhe são afectadas.

É claro que o CDS não vai intervir neste Orçamento numa perspectiva «despesista» e de aumento das verbas da despesa. No entanto, quero esclarecer e surpreender as políticas do Governo em conexão com as inscrições que são feitas no Orçamento.

E vejo mesmo que esta verba que causou tanto escândalo na bancada do Partido Comunista, os 46 000 contos previstos para transferências em subsídios a associações de defesa da família, não permitirá dinamizar este tipo de associações — estou, por exemplo, a pensar nas associações de pais, que desenvolvem a sua acção no âmbito da educação. Assim sendo, não vejo que com orçamentos deste tipo se consiga, efectivamente, lançar uma política com o mínimo de credibilidade neste domínio.

Por outro lado, não vejo que o Orçamento tenha levado a peito a defesa da família.

Têm-nos sido dadas algumas explicações no que respeita à recuperação ou à tentativa de neutralização da fiscalidade imposta aos funcionários públicos e aos titulares de cargos políticos. Aí aponta-se num sentido a favor da família no que respeita aos seus reflexos em termos de imposto complementar.

Sr. Secretário de Estado, mais do que perguntas propriamente ditas, estas são observações que lhe coloco, embora nelas estejam também implícitas algumas questões.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Carvalho.

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Uma vez que não está presente o Sr. Secretário de Estado Adjunto, talvez o Sr. Secretário de Estado do Orçamento me possa esclarecer no seguinte aspecto: no ponto em que aqui se fala nas indemnizações compensatórias, nomeada-^r,.v; \ RDP e à RTP, vai ou não concretizar-se o aumemo de taxas? Porque de duas uma: ou se con-

cretiza um aumento das taxas, e não se justifica que a RTP tenha inscritas mdernnizações compensatórias no valor de 1 100 000 contos, ou, a não verificar-se o aumento das taxas, retira-se esta verba das indemnizações compensatórias.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Pela parte do PCP, temos três anotações e duas perguntas para colocar.

A primeira anotação tem a ver com o ambiente de gargalhada governamental aquando do debate do orçamento respeitante à Comissão da Condição Feminina. Pela nossa parte, não nos dá vontade de rir e, naturalmente, não interpretamos a gargalhada senão como um sinal de bom humor. Isto porque o orçamento é um pouco lúgubre e vai implicar uma desaceleração daquilo que estava já em desaceleração vertiginosa desde há uns bons tempos. Encaramos com bastante preocupação a situação orçamental da Comissão da Condição Feminina e, portanto, o exercício das suas actividades.

Em relação ao orçamento da Direcção-Geral da Família, não vimos respondidas as perguntas sobre o súbito aumento da verba para pessoal, que passa para cerca de 40 000 contos, e aguardamos as explicações quanto aos critérios de subvencionamento de entidades privadas.

Uma outra anotação tem a ver com a promessa de informação sobre a situação das empresas públicas de comunicação social. É a terceira ou a quarta vez que essa promessa nos é feita, pelo que esperemos que desta vez seja para valer e que, em tempo útil, venhamos a ter essas informações, que são tão importantes para podermos ajuizar não só sobre a situação do sector da comunicação social como também sobre as eventuais propostas alternativas.

Devo, aliás, dizer que nos parece que a rubrica respeitante ao destino das verbas para a comunicação social carece de ser ponderada, designadamente no sentido de uma verdade orçamental, de uma maior especificação, etc.

A terceira anotação é relativa às regiões autónomas.

Creio que o debate sobre as verbas a transferir para as regiões autónomas, desta vez correctamente inseridas nos Encargos Gerais da Nação, não pode ficar-se pela troca de impressões que aqui foi feita, designadamente pelo apor informativo do Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Ouvimos com bastante atenção aquilo que foi dito, o que, no entanto, não vaie por uma explicação de como está a decorrer o processo de aplicação do famoso Acordo de Reequilíbrio Financeiro para a Região Autónoma da Madeira, como não vale para a Região Autónoma dos Açores, uma vez que os próprios órgãos do Governo Regional já introduziam nesse debate algumas observações picantes e polémicas que, a ouvir-se o Sr. Secretário de Estado, dir-se-ia não existirem.

Em todo caso, a Assembleia da República tem de tomar conhecimento da situação em toda a sua dimensão, o que não aconteceu agora.

Portanto, Sr. Presidente, independentemente do que agora venhamos a fazer por compressões de tempo, creio que deverá ficar em aberto, designadamente para efeitos de debate sobre o Ministério das Finanças, toda esta questão da transferência de verbas para as regiões autónomas.

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Apesar de o PSD se manter mudo neste debate, não acredito que essa posição se possa manter face à situação que está publicamente colocada. Se se mantiver, trata-se de mais uma questão um bocado surrealista.

No entanto, quero deixar esta precisão.

As perguntas que passo a colocar referem-se ao Tribunal Constitucional e ao Conselho Permanente de Concertação Social.

No que respeita ao Tribunal Constitucional, o orçamento passa de 109 366 contos para 124 684 contos. Não vou comentar a distribuição das despesas, mas tenho de colocar uma só pergunta em relação a uma verba aqui prevista.

Com efeito, prevê-se para «Prestação de serviços em regime de tarefa ou outro» e «Outras despesas», respectivamente, 1300 contos e 5870 contos. Creio que esta última verba terá a ver com a realização da VII Conferência dos Tribunais Constitucionais Europeus, a ter lugar em breve.

Sr. Secretário de Estado do Orçamento, creio que deve haver algum erro no cálculo das verbas, pois não se pode pretender, designadamente para efeitos de aquisição de serviços não especificados, com 4600 contos, custear a utilização de uma sala de conferência, pagar certos materiais, alugar equipamentos de tradução simultânea, editar uma brochura comemorativa sobre

0 Tribunal Constitucional, imprimir um programa em várias línguas, assegurar tradutores, bem como a deslocação a Coimbra num autocarro com guia, um almoço de trabalho para várias pessoas, um banquete para 200 pessoas, arranjos florais, viaturas de luxo, alojamento de elementos de segurança, transporte diário para participantes, etc.

O que quero dizer é que esta verba foi calculada em «cima do joelho» ou, então, o Tribunal Constitucional iria ter uma desfeita, o que não acredito que vá acontecer.

Portanto, seria bastante útil ver os termos em que isto foi ponderado e, sobretudo, em que termos é possível emendar a mão, se é que é possível fazer contas no ar, como aparentemente estas forem feitas, e, para não se estar em apertos, adicionar mais 1500 contos. Creio que não deveria ser essa a forma de actuação.

Em relação ao Conselho Permanente de Concertação Social, a questão coloca-se num outro plano. Com efeito, neste órgão há uma verba prevista para «Subsídios a entidades privadas» no montante de 32 400 contos.

Folheando o Decreto-Lei n.° 74/84, alterado pelo Decreto-Lei n.° 8/86, não se vislumbram nas atribuições e competências do Conselho Permanente de Concertação Social o que quer que seja que legitime esta actividade. O Conselho tem funções de se pronunciar sobre políticas de reestruturação, propor soluções conducentes ao regular funcionamento da economia, fazer relatórios, informar e consultar, etc, mas não tem nenhuma competência de subsidiação directa de enti-| dades privadas, quaisquer que elas sejam. Ao abrigo de que disposição legal é que se prevê esta actividade?

1 O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado |João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Presidente, reservamo-nos o direito de, eventualmente, fazer propostas no sentido de melhor especificação de algumas das rubricas da Direcção-Geral da Comunicação Social,

nomeadamente quanto à «Aquisição de serviços não especificados». Sabemos que parte substancial dessas aquisições é especificada, dirige-se às agências e como tal tem de o ser, não cabendo dentro da rubrica de aquisição de serviços não especificados e não estando de acordo com a informação que nos foi concedida.

Por outro lado, no que diz respeito à rubrica «Subsídios a empresas privadas», a redacção parece-nos que tem de ser mais conforme com a intenção.

Na altura própria apresentaremos, portanto, propostas nesse sentido.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Moreira.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Quero apenas referir que é de registar a concepção do Sr. Secretário de Estado em relação àquilo que é novo e o que não é. Com efeito, para o Sr. Secretário de Estado o que é de 1987 é novo, o que é de 1986 não é novo, passou. Isso, todos nós, de alguma forma, sabemos já, mas o problema que se coloca é o de saber se estão actividades em curso e se se manteriam. Caso não se mantenham, a respectiva explicação não foi adiantada pelo Sr. Secretário de Estado, e daí que a dúvida persista e que dificilmente concordemos com a interpretação algo fácil deste problema.

Referirei apenas que, em relação aos programas de ocupação de tempos livres, o Sr. Secretário de Estado confirmou, por um lado, não se prever qualquer reforço do apoio aos jovens, mas, por outro lado, lançou a dúvida dizendo o seguinte: «Vamos fazer uns grandes esforços para que as instituições que recebem os jovens lhes possibilitem determinado tipo de subsídios de refeição e transporte.»

Tratando-se de departamentos do Estado, a generalidade das instituições que recebem jovens ao abrigo dos programas de ocupação dos tempos livres, pergunta-se onde estão verbas já consignadas no próprio orçamento para fazer face à possibilidade dè ser concedido este tipo de apoios? De outra forma, dizer isto é uma maneira de agora «aliviar a água do capote» para, depois, a questão surgir novamente e serem os próprios departamentos a dizer que não dispõem de verbas para tal.

Regista-se, naturalmente, o facto de a Secretaria de Estado dizer que não tem verbas para as associações de estudantes do ensino secundário. Ao que parece, nenhum outro departamento governamental as tem e vale a pena registá-lo.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado Nogueira de Brito, de facto, o Secretariado da Modernização Administrativa tem como funções dar apoio ao Gabinete do Sr. Primeiro-Ministro, mas também o faz em relação aos ministérios em que entenda que essas acções de apoio sejam úteis para a modernização, racionalização e desburocratização dos respectivos serviços.

Há, de facto, uma ligação hierárquica entre o Secretariado da Modernização Administrativa e o Sr. Primeiro-Ministro, mas, também, há uma estreita relação funcional entre esse Secretariado e outros membros do Governo, como sejam os Srs. Ministro Adjunto e Secretário do Orçamento.

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Por exemplo, a Revista da Administração Pública está dependente do Secretário de Estado do Orçamento que, no entanto, entendeu que a direcção da mesma cabe à directora do Secretariado da Modernização Administrativa. Isto, para haver sempre uma ligação, uma triangulação, com o presidente do conselho científico que é o presidente do Instituto Nacional da Administração e para que haja uma ligação entre a gestão corrente dos efectivos da Administração Pública e a modernização da mesma, modernização essa que não é só de carreiras e quadros. Aliás, o grande defeito dos últimos anos, foi o de se ter visto a modernização da Administração Pública apenas em matéria de carreiras e quadros de efectivos. A modernização é algo mais; fundamentalmente a ligação e os processos de desburocratização entre a Administração e o Estado, concretamente em três sectores nos quais temos já medidas prontas para avançar; são eles os sectores fiscal, judiciário, sectores fundamentais em matéria de desburocratização, bem como no levantamento das situações de outros sectores como sejam o ensino, a saúde, nos quais há muitos processos, muito expediente, que se têm mantido para justificar serviços. Neste caso, também se pode ver que a existência dos serviços gera logo burocracia.

Tem, portanto, havido bom relacionamento, que, aceito que tenha de ser conflitual em termos de conceitos entre o que está e o que deve ser, mas que não se deve limitar a isso.

Quanto à questão que me foi colocada relativamente às taxas da RTP e das indemnizações compensatórias, Sr. Deputado Costa Carvalho, dir-lhe-ei que uma coisa não é dissociada da outra mas também não é função dela.

De facto, as taxas obedecem a um determinado princípio e há até determinados níveis de isenção de pagamento de taxas, havendo, depois, indemnizações que decorrem das dotações para as empresas públicas a título do serviço público que prestam. Penso que remeto o assunto para o debate sobre o Ministério das Finanças para que se possa resolver essa situação.

Quanto às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado José Magalhães, registo apenas que um debate desta natureza não deve ser feito de modo lúgubre porque não foi de maneira nenhuma minha intenção pôr em causa a Comissão da Condição Feminina. Se da minha parte houve gargalhada ...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Retira a gargalhada!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — ...

retiro a gargalhada, pois suponho que o Sr. Deputado também retira a expressão «lúgubre». De facto, no meio termo fica a virtude.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sim senhor, mas a verba é grave.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Quanto à Comissão da Condição Feminina, tenho o maior respeito por ela da mesma forma que tenho pela Direcção--Geral da Família, principalmente pelas pessoas que trabalham.

Tenho a certeza que tanto num serviço como noutro quem lá trabalha procura cumprir o seu dever o melhor que pode.

Se as verbas são escassas, digo que muitos outros serviços que consideram essas verbas escassas e quaisquer deles não são propriamente serviços operativos, pois são serviços mais conceptuais que dentro da Administração devem ter um papel de estímulo a que os serviços de «linha», os serviços operativos, tenham respeito pela actividade dos cidadãos e determinados grupos sociais que, a determinada altura, podem ser prejudicados por essa mesma Administração. É o caso da defesa das garantias, e dos direitos da mulher e o caso do associativismo familiar. Neste caso, até, é premente aquilo que o Estado possa fazer, não em termos monetários, mas em termos de esclarecimento do agregado familiar, em especial em zonas que não são tão bafejadas pelos mass media e em que, portanto, essa Direcção--Geral pode ter uma acção muito importante de associativismo da família, numa sociedade que tende a desumanizar-se e a considerar a família como uma mera unidade estatística.

Quanto ao Tribunal Constitucional, corrijo o Sr. Deputado José Magalhães, pois a verba que se encontra inscrita no seu orçamento relativa à conferência dos tribunais constitucionais europeus é de 8490 contos. Esta verba é afecta a essa conferência e foi considerada suficiente pelo serviço, portanto não a contestámos.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Secretário de Estado, será lapso meu, mas não vejo essa verba inscrita. Vejo é uma verba de 4000 e tal contos ...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Isso é a verba do 31.00.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sim, além da verba do 31.00, há outras?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Há

outras verbas, pois. Naturalmente que a prestação de serviços, a requisição de pessoal para trabalhos à tarefa, tudo isso corre ...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Mas a pergunta não foi essa. A pergunta originária era se considerava que a verba de 4000 e tal contos chegaria para as despesas que estão elencadas, incluindo o famoso banquete para as 200 pessoas, os transportes, os autocarros, essas coisas todas. Naturalmente que os juízes do Tribunal Constitucional também serão remunerados, mas não estou a computar estas verbas nas despesas da conferência.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — A

informação é de que a verba anda pelos 8 500 contos e se fizeram esse programa de recepção e de trabalhos é porque a consideram suficiente, portanto não faz sentido estarmos a dar mais do que pedem.

Quanto ao Conselho Permanente da Concertação Social, a verba que se encontra inscrita no 41 como transferências para entidades privadas é para dar apoio aos parceiros sociais representados neste Conselho e, designadamente, para as acções no âmbito do Comité Económico Social das Comunidades Europeias. Portanto, o Governo entendeu que a rubrica do Conselho Permanente da Concertação Social seria a mais apropriada para lá se inscrever a verba destinada ao apoio dos representantes dos parceiros sociais no Comité

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Económico Social das Comunidades Europeias. Portanto tanto a própria CGTP-Inter, tal como a UGT, a CIP e outras entidades — peço desculpa de as não citar todas, mas não quero esquecer nenhuma —, que são os representantes sindicias e patronais, contam com o apoio financeiro para representação dos seus interesses no Comité referido através da verba inserida no orçamento do Conselho Permanente da Concertação Social.

Há pouco, o Sr. Deputado Octávio Teixeira fez-me uma pergunta sobre as verbas para investimento do Fundo de Turismo. Na altura, não lhe respondi porque não estava suficientemente informado, mas agora posso dizer que essa verba de 1 800 000 contos vai ser aplicada em planos de obras relativas ao turismo aprovadas pelo Governo e a efectuar nos concelhos onde se localizem os casinos. Portanto, trata-se de pagamentos a empreiteiros, a empresas de construção civil, de pagamentos de estudos de implantação, de engenharia, de arquitectura, etc. O facto de o valor desta verba ser mais elevado do que nos anos anteriores deve-se ao novo contrato da zona de jogo do Estoril.

No caso do Fundo de Turismo, as outras transferências para instituições particulares são para suportar o pagamento das bonificações no âmbito do regime de incentivos financeiros ao turismo, de acordo com o Decreto-Lei n.° 459/80. São estas as justificações que faltava dar a propósito do orçamento do turismo.

Passo agora a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Juventude.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude (Couto dos Santos): — Queria apenas fazer uma correcção ao que foi dito pelo Sr. Deputado Rogério Moreira, esclarecendo que menos de 15% das verbas dos OTLs (ocupação de tempos livres) é que são afectas à administração central.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, damos por encerrada esta reunião sobre o orçamento dos Encargos Gerais da Nação.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos dar início à reunião sobre o orçamento do Ministério da Justiça. Como já tive oportunidade de anunciar aos representantes de todos os grupos parlamentares, o Sr. Ministro da Justiça só poderá estar presente até às 12 horas e 45 minutos, mantendo-se depois o Sr. Secretário de Estado da Justiça durante o tempo que for necessário.

Sr. Ministro da Justiça, gostaríamos de começar por lhe pedir desculpa pelo atraso e, por outro lado, agradecer-lhe ter estado à espera que iniciássemos esta reunião por o debate sobre os Encargos Gerais da Nação se ter prolongado um pouco mais do que estava previsto.

Como é norma, solicitaria ao Sr. Ministro — que se assim o entender — que fizesse uma apresentação geral do orçamento do Ministério da Justiça, e, entretanto, informo os Srs. Deputados que vou solicitar sejam fotocopiados, de imediato, alguns elementos sobre as contas de gerência dos'cofres do Ministério, que o Sr. Ministro agora nos trouxe.

Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Justiça (Mário Raposo): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, apresento a todos os meus cumprimentos e, como sempre,

estarei inteiramente ao vosso dispor até para numa relação institucional, aperfeiçoarmos e melhorarmos a nossa própria actuação.

Acabei de entregar ao Sr. Presidente os elementos que faltavam e a que alude o ofício da 1." Comissão, ou sejam os resumos de despesas dos cofres geridos pelo Ministério da Justiça, de 1981 a 1986.

No que se reporta ao orçamento para 1987, é evidente que, como resulta dos números, ocorre uma nítida melhoria em todas as áreas do Ministério da Justiça. Pela primeira vez, há um conjunto de verbas inscritas na PIDDAC que asseguram um plano de investimentos, que evidentemente não será o óptimo, mas que é o possível ou que, pelo menos, foi o possível neste ano. Sobretudo tem algo de emblemático ou de simbólico. É que, pela primeira vez, há um envolvimento do Estado — nesta inevitável polissemia da palavra «Estado», em que o Estado é considerado em geral em relação àquele pequeno espaço que tem sido sempre o Ministério da Justiça — em matéria de investimentos. Há, portanto, um conjunto de actuações que estão programadas, e que já foram expostas à 1." Comissão, daí tendo resultado o seu relatório exaustivo e, como sempre, bem elaborado.

Queria, apenas, complementar esta primeira fase da minha intervenção, confirmando o que, salvo erro, afirmou o Sr. Ministro das Finanças quando disse que tinha havido ao longo deste ano, aliás em cumprimento de uma norma da Lei do Orçamento de 1986, um grande esforço de racionalização, de metodizaçâo e, sobretudo, de aproximação da actividade dos cofres do Ministério da Justiça em relação à actividade geral do Estado em matéria financeira.

Perguntar-se-á por que razão ainda não foi publicada a Lei Orgânica dos Cofres do Ministério, que será a expressão formal de toda esta actividade prévia. A Lei Orgânica está pronta e tenho aqui um exemplar já assumido. Devo dizer que houve uma primeira versão que data de há alguns meses. Entretanto, foi substituído o Sr. Director-Geral, e, necessariamente, novos métodos de trabalho postularam um dever de ouvir novas perspectivas e, sobretudo, de ter uma nova e própria perspectiva geral sobre o que deverá ser a actividade dos Cofres.

A meu ver — e insisto um pouco neste tópico que me parece dever servir de pano de fundo a todas as reflexões que se façam sobre o Ministério da Justiça —, por via da regra os verdadeiros problemas do Ministério não são aqueles que se afloram perante a opinião pública. Evidentemente que os Srs. Deputados têm a noção de quais são. Fundamentalmente, os problemas passam por uma grande degradação do parque judiciário português, que se foi desenrolando ao longo dos anos sem acudimento. Como é óbvio, chegou-se a um momento em que, necessariamente, haveria de transparecer essa sua degradação já notada por toda a gente; com efeito não houve uma queda súbita na qualidade. Só que, por virtude de diversos factores, e até, talvez, por uma falta de assunto na Comunicação Social, ultimamente os problemas da Justiça têm tido honras de ribalta nalguns jonais, embora nem sempre negativamente. Claro que há sempre uma compreensão deficiente do que se passa com a Justiça — e já me habituei a essa inevitabilidade, embora entenda ser um dever do Ministério da Justiça fazer tudo que puder para que tal não se verifique com tanta frequência.

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Devo dizer aos Srs. Deputados que 95% da correspondência recebida no Ministério da Justiça diz respeito à actuação concreta de magistrados (judiciais e do Ministério Público).

Por outro lado, os números são sempre mal interpretados. Por exemplo, no que respeita às Estatísticas da Justiça, quando se falava que existia, salvo erro, 1 065 000 processo pendentes, isso foi entendido como havendo 1 milhão de processos em atraso, o que é evidentemente uma idiotice. É lógico e até será escusado dizê-lo que o que há é 1 milhão de processos em curso nos tribunais portugueses e o que releva é saber o que é que se está a fazer nesse sentido.

Muito rapidamente diria que a solução para este problema passa pela concretização de novos métodos de actuação nos tribunais, quer ao nível processual e administrativo, quer, designadamente e com relevo significativo, ao nível da informatização dos tribunais, tal como passa também pela efectiva assunção por parte dos magistrados judiciais portugueses da aplicação nessa parte dos princípios do Código Penal.

Enquanto se continuarem a aplicar penas privativas de liberdade para bagatelas penais, é evidente que as prisões estarão permanentemente bloqueadas e que não haverá capacidade de resposta por parte dos tribunais, sobretudo devido ao facto de haver aquela noção, que se tem de ultrapassar de uma vez para sempre, de que o tratamento penitenciário não é tendencialmente cri-minógeno, por mais humanizado que seja. Há, portanto, um conjunto de actuações que não releva propriamente de meios financeiros.

Entretanto, nas grandes apostas do Ministério da Justiça, para além daquelas clássicas apostas que são a Polícia Judiciária, os estabelecimentos prisionais e os serviços judiciários — e sobre isso o Sr. Secretário de Estado certamente também quererá dizer alguma coisa a esta Comissão, se ela assim o entender — está--se a fazer um esforço criativo em matéria de prevenção e combate à droga e em matéria de reinserção social.

Pela primeira vez aceitou-se ao nível dos meios financeiros — porque pela minha parte o problema esteve sempre no plano das verbas disponíveis — que o Instituto de Reinserção Social possa efectivamente começar a funcionar, vencendo aquele círculo vicioso em que estava envolvido: não funcionava porque não tinha dinheiro e não tinha dinheiro porque não funcionava, aliás como ainda há dias o Sr. Secretário de Estado da Justiça evidenciou.

E para não tirar mais tempo à Comissão considero esta intervenção como o ponto de arranque, estando obviamente à vossa disposição para tudo o mais que for necessário.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro da Justiça, não cheguei a perceber se o Sr. Secretário de Estado também gostaria de intervir agora ou se aguardaria apenas para responder a questões que fossem colocadas pelos Srs. Deputados.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, através de V. Ex.a e do Sr. Deputado Alípio Dias, já dei conta à Comissão de que um compromisso de carácter diplomático obriga-me a sair por volta das 12 horas e 50 minutos.

Penso talvez nestes quinze minutos que nos restam pudesse ouvir os Srs. Deputados e depois o Sr. Secre-

tário de Estado falaria sobre os outros assuntos. Isto porque creio que há algumas matérias em relação às quais desde já posso dar algumas explicações.

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Ministro. Aliás, já tinha colocado esta questão a todos os grupos parlamentares e houve um consenso no sentido de que assim fosse.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de colocar uma questão metodológica.

Tenho conhecimento das limitações de tempo do Sr. Ministro e, portanto, creio que era útil procurarmos esgotar o tempo disponível, que é muitíssimo pouco, com o Sr. Ministro, analisando as grandes questões que ficaram pendentes na sequência dos debates preliminares deste ano, que foram bastante profícuos em termos de recenseamento da situação do Ministério.

Portanto, creio que valeria a pena nesta fase fazer perguntas bastante precisas sobre questões de orientação política, para as quais não encontrámos resposta na fase preliminar dos debates. Poderíamos deixar as outras, se existirem, para um período ulterior.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, estou certo de que, se os restantes grupos parlamentares estiverem de acordo, poderíamos seguir esta metedologia.

Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Estou perfeitamente de acordo com o que o Sr. Deputado José Magalhães acabou de dizer.

Para mim, a dificuldade é saber quais são essas questões ...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Por exemplo, Sr. Deputado, a entada em vigor do Código de Processo Penal é uma grande questão, bem como a gestão dos cofres que, além disso, é também uma dor de cabeça.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — E, por exemplo, a questão do acesso ao direito não é também uma grande questão?

O Sr. José Magalhães (PCP): — Também acho!

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Mas o Sr. Deputado está a ver que isso depende da medida de cada um. O critério é muito bom, a medida é que pode ser diferente!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a questão está colocada e cada grupo parlamentar apontará as grandes questões que entender.

Tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): — Sr. Ministro, a minha questão é relativa à entrada em vigor do Código de Processo Penal e à preocupação que os magistrados do Ministério Público manifestam sobre esta matéria.

Ainda não sabemos quando é que o Código vai estar em vigor, não estão ainda sequer publicados os diplomas complementares que desejavelmente e de acordo com a lei de autorização deveriam ser entretanto publi-

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cados para permitir que o início da sua vigência coincidisse com o inicio da vigência do Código de Processo Penal, mas temos alguns indicadores que nos levam a pensar que o Código entrará em vigor durante o ano de 1987.

E a ser assim, a questão que se nos coloca é a seguinte: tenho muito dificuldade em lidar com números, mas constato que, por exemplo, a rubrica das remunerações certas e permanentes nas despesas destinadas a magistrados e respectivas secretarias tem um aumento que não ultrapassa muito os 107b.

Isto leva a que me interrogue sobre se efectivamente, tendo em vista o acréscimno de trabalho que as secretarias do Ministério Público vão passar a ter e, eventualmente, os próprios magistrados do Ministério Público, estão criadas as condições financeiras para realmente o Código de Processo Penal entrar em vigor e para quando é que se prevê essa entrada em vigor, porque com certeza que esse facto terá um qualquer reflexo nas verbas orçamentadas.

Gostaria ainda de colocar outras questões ao Sr. Ministro da Justiça, mas porque conheço as limitações de tempo de V. Ex.a, para já ficar-me-ia por aqui.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — O Sr. Ministro e nós próprios temos muito pouco tempo, pelo que serei breve e vou colocar uma única questão ao Sr. Ministro da Justiça, reservando uma outra para o Sr. Secretário de Estado da Justiça, que sei ser a pessoa indicada para a responder.

Há muitos anos que existe em todos nós a preocupação de acesso ao direito, concretamente o Sr. Ministro da Justiça teve-a mais nítida quando foi bastonário da Ordem dos Advogados e eu tenho-a tido enquanto responsável por conselhos da Ordem dos Advogados. Os anos foram passando, existem vários sistemas vigentes na Europa e em Portugal, pela primeira vez aparece prevista no Orçamento do Estado uma dotação para o acesso ao direito.

Embora não encontre com muita clareza essa verba, não vou perguntar ao Sr. Ministro onde ela está. A pergunta que lhe faço, embora o Sr. Ministro provavelmente ainda não tenha possibilidade de me responder, é a seguinte: qual vai ser o critério de distribuição ou pagamento dos serviços?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Carvalho.

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Sr. Ministro da Justiça, se a memória não me falha, numa reunião que tivemos também com o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado da Justiça, o Sr. Director-Geral da Polícia Judiciária, referindo-se ao tráfico de droga e à utilização do território nacional para esse tipo de tráfico, terá apontado que nesta altura a droga estaria a provocar em Portugal mais mortes do que os acidentes de viação.

Atendendo à gravidade do assunto e até porque em particular a droga visa as camadas juvenis, parece-nos que a verba de 240 000 contos é muito pequena para os objectivos e as necessidades do planeamento e coordenação no combate à droga.

Uma outra questão, Sr. Ministro, diz respeito aos estabelecimentos prisionais e às condições em que os jovens lá se encontram, nomeadamente a mistura que é feita com adultos de grande cadastro.

O Sr. Ministro já reconheceu na reunião da Comissão que as cadeias se estão a transformar em escolas ou em universidades de crime para as camadas juvenis.

Como é que V. Ex.a procurará atender a todo este aspecto no Orçamento?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Tenho algumas questões específicas sobre o Ministério da Justiça a colocar, mas neste momento e atendendo ao critério escolhido para atacarmos os problemas, colocaria ao Sr. Ministro apenas uma questão de ordem genérica.

Esta questão, em que todos reparamos quando olhamos para o aumento dos tribunais e para o número de juízes e magistrados, não só judiciais, mas também do Ministério Público, que existem neste país, prende--se com os processos atrasados.

O Sr. Ministro referiu-os e sendo evidente que há processos atrasados em todos os tribunais o problema é muito grave e tem de ser resolvido. Se, por exemplo, olharmos para uma simples estimativa do número de magistrados judiciais e do Ministério Público que existiam em 1973 —com base num mapa do relatório que a 1." Comissão apresentou— verificamos que, em relação a 1985, esse número dobrou. Só que, sintomaticamente, o número de processos por magistrados também dobrou, o que significa que o número de processos quadriplicou em relação ao número existente em 1973.

Quer dizer, a circunstância de se ter aumentado o número de magistrados não resolveu o problema, só o mitigou, porque ele agravou-se substancialmente. O que interessa para que as pessoas possam ver satisfeitos os seus interesses judiciais é que cada magistrado nao tenha mais processos do que tinha em 1973, o que não acontece hoje porque cada magistrado tem o dobro dos processos que tinha na altura.

Isto significa que o atraso dos processos se vai manter e até agravar se não acudirmos ao problema dos magistrados. Atendendo a que o aumento do número de magistrados existentes tem implicações naturais no Orçamento, coloco-lhe esta questão, Sr. Ministro: como é que o Ministério da Justiça entende atacar a curto prazo este problema?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro da Justiça, nesta circunstância não vai haver condições nenhumas para se realizar um debate, mas ao menos deixarei as interrogações.

Em relação à organização da gestão financeira do Ministério da Justiça, a Assembleia da República conseguiu dar este ano alguns passos positivos —e na parte em que o Governo foi chamado a colaborar também houve envio de elementos— no conhecimento dos recursos afectos à Justiça e, portanto, penso que quebrámos um dos mitos existentes, que é a penúria. Ela existe, mas não tem a dimensão que o Governo diz ter!

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Em todo o caso gostaria de saber que medidas é que estão encaradas para tornar mais transparente a gestão financeira do Ministério da Justiça.

O relatório da 1.a Comissão faz alguns alvitres e é entendimento da minha bancada que o Orçamento do Estado deveria consignar em forma de lei algumas dessas orientações da política de estruturação, por isso gostávamos de saber qual o pensamento do Governo sobre a matéria.

Quanto à execução do orçamento do Ministério — e era esta a segunda questão—, os dados revelam que não vai chegar até ao fim do ano, pelo que gostaria de saber quais são as medidas ensejadas.

Em relação às grandes reformas para 1987, o exame dos dados que nos foram facultados revela não haver condições materiais, organizativas, técnicas, etc., para garantir a entrada em vigor em 1987 do Código de Processo Penal, pelo menos em condições que não provoquem um caos na administração da Justiça, pelo que gostava de saber qual a posição do Governo sobre esse assunto.

Idem, idem, aspas, aspas, em relação à Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, que não se encontra sequer em formulação final. É, portanto, inviável pensar na sua entrada em vigor em 1987. Em todo o caso, gostaria de saber a opinião do Governo.

A reforma do Código de Processo Civil, essa não depende da verba inscrita, pois, de contrário, também não a teríamos a olhar para o Orçamento. Em todo o caso, o Governo ainda não clarificou qual é o timing em relação à reforma do Processo Civil, que seria ela próprio factor de economia.

O debate que fizemos em sede de comissão, e que consta de volumosas actas que serão publicadas oportunamente, dispensa-me de repetir tudo aquilo que foi dito na altura e permite «fazer ao osso» perguntas precisas sobre a situação de alguns departamentos.

Não vou eíencar todos nesta circunstância de emergência, apenas referirei os seguintes:

Polícia Judiciária: não há verba para o funcionamento, mas há verba abundantemente para o pessoal, para o PIDDAC (um terço do PIDDAC do Ministério que não é aquilo que se diz), mas verbas para funcionamento também não há. A ideia do Governo é, portanto, fazer um reforço a meio do ano? Que ela não chega está nos autos e é uma evidência para quem leia.

Direcção-Geral dos Serviços Prisionais: a verba para manutenção e funcionamento também não chega. No ano passado a Direcção-Geral teve orçamento para meio ano, coisa que só descobrimos um pouquinho mais tarde e no meio de desmentidos profusos da parte do Governo. Desta vez não haverá desmentidos — estou em crer —, mas que a verba não chega, ai isso não!

Qual é a ideia do Governo sobre a manutenção e funcionamento? Idem, idem, aspas, aspas, em relação à capitação para alimentação e calçado, que é — creio eu — ainda 220$. Como sabemos todos o que isso significa, gostava que o Sr. Ministro nos deixasse uma reflexão antes de abandonar a sala.

Em relação à questão da droga estamos nisto: em 1990 vão existir, no seu conjunto, dez unidades de tratamento que vão cobrir não mais do que 30% e 40% das necessidades. Foi esta a previsão aqui deixada nos debates preparatórios e só isto dá ideia de que é possível um grande esforço criativo, sobretudo na parte ima-

ginativa, porque na parte das verbas não há definitivamente com que apoiar os 10 000 tóxico-dependentes graves que há, em Portugal, neste momento.

Creio que este é um dos pontos mais graves e uma das debilidades mais graves do orçamento do Ministério da Justiça.

O orçamento do Gabinete de Planeamento e de Coordenação do Combate à Droga é realmente calamitoso sob este aspecto. Gostava de saber como é que o Sr. Ministro encara aquilo que já nos foi transmitido na parte preliminar.

Em relação às construções, o PIDDAC é um «PIDDAC de socorro». Toda a gente sabe que o parque judiciário está degradadíssimo e, nesta fase, as perguntas são só relativas a situações particularmente calamitosas. Estou a pensar no Tribunal da Boa Hora e em certos tribunais das regiões autónomas — talvez, esteja a ser injusto em relação a outros tribunais que estão a cair aos bocados pelo País fora.

Em todo o caso, estas preocupações são flagrantes e o que gostava de perguntar ao Governo era se não encara, mais do que o seu PIDDAC, que é um «PIDDAC de salvação ao de sobrevivência» de baixíssimo nível, 733 000 contos, se não encara um programa de emergência para que não tenhamos de enfrentar um dia destes aquilo que aconteceu no Tribunal de São João Novo, no Porto.

Também lhe deixava a pergunta de como é que vai ser em relação aos tribunais criminais e correccionais do Porto, que estão na situação que sabemos.

Finalmente, perguntas breves: o Instituto de Reinserção Social, (IRS) vai ter os 56 000 contos que lhe faltam para poder fazer o orçamento mínimo, mínimo, mínimo, que nos foi enunciado? Nos «menores» os cortes frustrantes estão indiciados nos autos e gostava de perguntar como é que vai ser a articulação com os outros ministérios, como, por exemplo, do Trabalho, da Educação, e com a Secretaria de Estado da Juventude, uma vez que, ao que parece, a esperança dos menores não está na Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores — há-de estar, quando muito, na articulação com outros departamentos, porque o orçamento que existe, embora tenha tido um aumento na parte de manutenção e funcionamento, é um «orçamento de escape».

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Sr. Deputado José Magalhães, peço-lhe desculpa pela interrupção, mas não posso deixar de interpelar a Mesa no seguinte sentido : o critério de intervenção foi condicionado às grandes questões. Quando intervim segui esse critério, pelo que não coloquei outras questões que não fosse uma grande questão para agora, e pelo que vejo, para deixar tempo ao Sr. Deputado José Magalhães levantar as pequenas questões.

Portanto, a minha interpelação dirige-se ao Sr. Presidente, uma vez que é V. Ex.a que está a dirigir os trabalhos, e vai no sentido de saber se o critério é ou não aplicado a todos os intervenientes. É porque se não for peço outra vez a palavra para fazer as outras perguntas que não fiz antes, mas que gostava de ver respondidas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Correia Afonso, a questão da metodologia a seguir foi colocada no inicio do debate e na altura o Sr. Deputado disse que cer-

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tamente não haveria consenso sobre o que seriam as grandes questões, pelo que se deixou o problema à consideração de cada urna dos grupos parlamentares.

De qualquer modo, atendendo à questão do tempo levantada desde logo pelo Sr. Ministro e previamente colocada aos diversos grupos parlamentares, peço ao Sr. Deputado José Magalhães que agora termine o mais rapidamente possível a sua intervenção e deixe para mais tarde as outras questões.

O Sr. José Magalhães (PCP): — certamente. Sr. Presidente, mas devo dizer-lhe que esta bancada não considera que a questão do combate à droga seja uma «pequena questão» ou que a da degradação do parque judiciário seja uma «pequena questão». Ficámos agora a saber qual é o conceito de «grande questão» do PSD: «boa tarde!»...

Acabei aqui a minha intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Só agora?

O Sr. José Magalhães (PCP): — Teria mais e bastante grandes questões, Sr. Deputado, pois infelizmente este tema é desastroso.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados agradeço que não entrem agora nesse tipo de discussão, se não atrasamos ainda mais o debate.

Tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: — Respondendo, em pri-meito lugar, ao Sr. Deputado Andrade Pereira, direi que está prevista a entrada em vigor do Código de Processo Penal para 1 de Junho de 1987. Será revogado o Decreto-Lei n.° 477/82, relativo aos delitos incaucio-náveis ope legis. Portanto, entra em vigor imediatamente o regime anterior àquele decreto-lei, que consta de norma do novo Código de Processo Penal.

Os diplomas complementares estão quase todos terminados. A Lei Orgânica dos Tribunais já está na fase de redacção definitiva, a nível do Ministério da Justiça, obviamente. Devo dizer que a demora se deve ao facto de entender que na exposição de motivos se deve dar uma informação completa, explicar a razão de ser das opções assumidas. Isto foi tarefa que reservei para mim próprio, que gostaria de cumprir com a atenção e o cuidado que a entidade destinatária da exposição de motivos justifica.

Por outro lado, também há um projecto de diploma sobre o júri, o qual, como sabem, não é diploma muito complexo e difícil de fazer. Ao nível do Ministério não há total concordância quanto a alguns pontos que talvez complexificassem a instituição e o seu funcionamento. Mas será uma matéria que rapidamente se des-bloquerá.

Sobre as perícias médico-legais, idem.

A Lei Orgânica da Policia Judiciária é que está visivelmente mais atrasada. É o único diploma que não está em termos de ser presente à Assembleia da República, depois de, obviamente, passar pelo Conselho de Ministros, o que acontecerá em tempo próximo. No entanto, isto não significa que se não possam fazer, intercalarmente, algumas modificações no actual regime.

Quanto à questão posta pelo Sr. Deputado Correia Afonso devo dizer...

O Sr. Andrade Pereira (CDS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): — A questão essencial que tinha colocado a V. Ex.a — para além dessa informação que acaba de referir e que muito agradeço — era a de saber se havia cabimento orçamental para o acréscimo de despesas que a entrada em funcionamento determinará.

O Sr. Ministro da Justiça: — Tem toda a razão, Sr. Deputado, peço desculpa.

É evidente que não se sabe, neste momento, com precisão quais serão as verbas necessárias para fazer face a esses encargos. Mas, como todos os Srs. Deputados compreenderão, uma das causas da degradação ou da incapacitação financeira dos cofres foi a assunção por parte destes dos encargos com os magistrados auxiliares, quer judiciais, quer do Ministério Público. Como, por outo lado, os oficiais da justiça estão a cargo, evidentemente, do Ministério da Justiça, não haverá por aí problema sensível. Isto porque a adequação do número de magistrados e de funcionários será feita através do meio até agora utilizado, que têm sido exactamente os cofres do Ministério da Justiça.

Portanto, estará aí o dispositivo de segurança para acudir às necessidades, que neste momento, com um critério objectivo, são impossíveis de estimar.

Quanto ao acesso ao direito, questão posta pelo Sr. Deputado Correia Afonso, devo dizer que há uma comissão a trabalhar sobre essa questão. Detesto a existência de comissões, pois normalmente demoram muito e não produzem com a capacidade ou a eficiência necessárias. Só que esta é uma comissão extremamente produtiva, pois já elaborou uma sére de trabalhos.

Curiosamente, vai ser amanhã celebrado o protocolo entre a Ordem dos Advogados e o Ministério da Justiça para a criação do Gabinete de Consulta Jurídica, que vai começar a funcionar e que já está completamente apetrechado. Também já está tudo acordado com a Ordem e vai ser feito o protocolo, nos termos do qual ficará assegurada, em permanência, a assistência jurídica a quem dela careça nos termos previstos para essa vertente do acesso ao direito.

Continua a haver uma grave lacuna na actividade do Ministério da Justiça e que é a execução do dever de informar. No entanto, estão já feitos estudos preparatórios nesse sentido. É que não se pode começar «sacudida» e precipitadamente a informar sem se estabelecer primeiro um plano de actuação, plano que já está concretizado e que dará os seus primeiros passos efectivos dentro de algum tempo.

A lei sobre o apoio judiciário que é, designadamente, postulada pelo Código de Processo Penal está também a ser preparada. Curiosamente, sobre esta matéria, suponho que há uma grande identidade de pontos de vista entre todos os sectores da Assembleia, porque todos aceitamos a ideia de que só através de um apoio judiciário eficaz e dignificante se poderá dignificar a justiça e quem dela careça.

Portanto, quanto ao acesso ao direito não só existem trabalhos de preparação como actos — em começo de execução nalguns aspectos —, como virão a existir outros através do PIDDAC. Chamo a atenção do

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Sr. Deputado para a verba inscrita no PIDDAC, no capítulo «Gabinete do Ministro», no valor de 90 000 contos, tripartida por 30 000 contos para cada uma das actividades.

Quanto ao problema posto pelo Sr. Deputado Costa Carvalho, é evidente que concordo inteiramente em que o problema da droga é um problema fundamental, que terá uma prioridade decisiva a nível de Ministério da Justiça, tendo vindo o Sr. Secretário de Estado Adjunto a ocupar-se especialmente desta questão. Assim, e caso o Sr. Deputado concorde, poderá o Sr. Secretário de Estado depois, mais detidamente, dar conta dos meios, dos métodos e das ideias que temos.

É evidente — e com isso já avanço um pouco em relação a uma questão posta pelo Sr. Deputado José Magalhães — que não pode ser considerado como possível a meta de estatizar toda a actividade do combate à droga. Tem de haver, necessariamente, uma interacção de esforços entre o Estado e a actividade privada — as iniciativas da Comunidade.

Para além de verbas, tem de haver calor de alma, tem de haver crença no que se está fazer, tem de haver empenho. E isso creio que há. A verba proposta para o combate à droga, representando já um significativo aumento em relação ao ano passado, poderá ajudar a este arranque necessário, sobretudo quanto à ultrapassagem de uma certa incapacidade, que, no entanto, nunca caiu numa atonia. Sempre houve pulsar dentro do Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga, e isso em muito se fica a dever aos seus dirigentes, quer ao actual director-geral dos Serviços Prisionais, quer ao subdirector-geral, Dr. Joaquim Rodrigues.

Porém, é evidente que a boa vontade não basta; são também necessários meios financeiros, e creio que estes já têm alguma aptidão para que a situação de bloquea-mento de alguns aspectos se ultrapasse.

Quanto à questão que focou sobre a mistura que existe nos estabelecimentos prisionais, devo dizer que concordo inteiramente com o Sr. Deputado e que neste momento, pela primeira vez, e desde há uns meses, está a ser feita realmente uma selecção dos estabelecimentos. Ou seja, estes passaram a ser classificados — aliás, de acordo com a reforma penitenciária de 1979 — e estão a ser utilizados, tanto quanto possível, em função da perigosidade, da identidade e da personalidade do delinquente. E isto curiosa e contrariamente àquilo que se passa em alguns países, onde há a tendência para mesclar os delinquentes, até como método. Nós não aceitamos esse método, pois acreditamos na pessoa humana e acreditamos que ela tem que ser encarada tal como a sua verdadeira identidade. Daí que não só se fez já uma classificação dos estabelecimentos prisionais como também estão a ser encaminhados para eles os condenados ou os detidos preventivamente em função da sua identidade, ou seja, da sua personalidade.

Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado Armando Lopes sobre os processos em atraso e o número de magistrados, devo dizer ao Sr. Deputado — aliás, meu querido amigo e colega — que até agora é a primeira vez que me colocam o problema da falta de magistrados judiciais. Inclusivamente o próprio Conselho Superior da Magistratura, que é a entidade a quem cabe gerir, nos termos da Constituição e da lei, a actividade dos magistrados judiciais, até agora não fez nenhuma solicitação para a criação de um lugar de

juiz auxiliar que não tivesse tido imediata resposta por parte do Ministério da Justiça. Por isso, Sr. Deputado, não faltam juízes.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Dá licença que o interrompa, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Armando Lopes (PS): — O Sr. Ministro possivelmente não teve oportunidade de ler este relatório que fizemos ...

O Sr. Ministro da Justiça: — Li, sim, Sr. Deputado!

O Sr. Armando Lopes (PS): — Nesse caso, V. Ex.a teve oportunidade de ler, em nota da p. 3, que os processos pendentes e entrados em 1973 foram, em média por magistrado, de 712 e em 1985 de 1345, o que significa que, embora o aumento de magistrados tenha sido grande (aumentou para um pouco mais do dobro), não resolveu o problema, havendo ainda mais processos por magistrado.

O Sr. Ministro da Justiça: — Exactamente, Sr. Deputado. Permita-me, no entanto, que lhe diga que essa média que acaba de indicar é uma média normal.

Para solucionar o problema terá de existir um conjunto de dispositivos que libertem os magistrados de tarefas menores, e isso será proposto na lei orgânica, imputando aos secretários judiciais tarefas de gestão que não relevem da função jurisdicional. E terão de haver métodos de informatização dos tribunais — e nesse sentido há um plano que já está a ser testado em tribunais piloto. Em suma, terá de se retirar aos juizes uma série de tarefas que neste momento estão a seu cargo, mas que na verdade não deveriam estar.

Em Portugal, preocupamo-nos muito em dizer que a justiça não funciona, porém ainda ninguém se preocupou — e talvez devesse ser o Ministério da Justiça o mais preocupado com essa tarefa — em divulgar a imensa gama de mecanismos alternativos que agora se abrem com a Lei de Arbitragem, aprovada nesta Assembleia, e com os centros de arbitragem institucionalizados, cuja legislação, em cumprimento do disposto nessa Lei, o Ministério da Justiça já preparou e submeteu ao Conselho de Ministros, onde foi aprovada, estando agora para publicação no Diário da República.

Em 1982 ou 1983 tive ocasião, num colóquio na Faculdade de Direito de Coimbra, de dizer exactamente que enquanto não se convolarem meios alternativos de administração da justiça, parte daquilo que actualmente cabe à chamada justiça judicial, os tribunais estarão tendencialmente bloqueados. Os Srs. Deputados ainda há dias ratificaram aqui, na Assembleia, o Protocolo n.° 9 à Convenção Europeia. Aliás, a justiça judicial é tão co-naturalmente lenta que o próprio processo da justiça, ao nível do Conselho da Europa, é excessivamente lento.

Portanto, o que temos é que libertar os tribunais de tudo aquilo que inquina a sua «disponibilidade de espírito» e de actuação, criando meios que imputem a outros mecanismos a administração da Justiça, que previnam a existência de litígios ou que ulteriormente assegurem a sua composição.

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O que ocorre é que grande parte das pessoas recorre aos tribunais exactamente por não saber os direitos que têm. É para isso que servirá o Centro que amanhã irá começar a funcionar, embora não ainda para o público, já que haverá depois a necessidade de a Ordem dos Advogados estabelecer os quadros dos advogados que intervirão na sua actividade.

Vai existir como que um mecanismo de conciliação, que não é assim expressamente designado, mas que aponta para a composição de litígios através da tomada de consciência das pessoas no sentido de que não estão numa situação de inevitabilidade, de fatalismo, mas que devem aceitar uma forma natural de resolver um litígio. Quer dizer: aquele velho brocardo que diz que «mais vale um mau acordo que uma boa demanda» tem que acabar; temos que ir para mecanismos de conciliação que apontem para uma justiça justa e não para uma justiça apócrifa ou injusta.

Vão ser repristinados os julgados de paz.

Devo aqui assumir um mea culpa, pois talvez tenha sido eu que os inviabilizei em 1980, não na Assembleia, mas no Governo, na medida em que aí dei a minha opinião nesse sentido; aliás, ela está publicada no Boletim do Ministério da Justiça e só por isso é que poderá ser influenciado o meu grupo parlamentar. Na verdade, entendo que é de tentar novamente uma justiça rural e de boa vontade. Portanto, estamos a pôr toda a nossa capacidade de imaginação para, com prudência, ultrapassar as dificuldades.

Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado José Magalhães — com quem já tantas vezes tenho trocado impressões sobre o assunto, o que leva a que o Sr. Deputado conheça, perfeitamente, os meus pontos de vista —, limitar-me-ei, até pela muralha do tempo que cada vez se ergue mais sobre mim, a dizer o seguinte: quanto ao Código de Processo Civil, compartilho inteiramente as preocupações do Sr. Deputado. No entanto, devo dizer que, através da Comissão, tomei conhecimento de que até fins de Dezembro o projecto de Código estará pronto. Trata-se, pois, de um diploma, cujas actas estão, aliás, a ser publicadas, que tem sido maduramente pensado e que me parece que, dentro da linha do diploma intercalar, virá ajudar a que se simplifique a administração da Justiça na área do processo civil.

Em relação à execução do orçamento e aos problemas estritamente financeiros, devo dizer que o Sr. Deputado José Magalhães, aliás ao arrepio daquilo que costuma ser, é um pouco contraditório e confuso dentro da sua linearidade expositiva. Por um lado, diz que há uma melhor cooperação entre o Governo e a Assembleia por aquele colocar à disposição desta os elementos respeitantes aos seus clássicos fundos próprios que são os cofres — ora, a Assembleia sabe que não há tanta falta de dinheiro no Ministério da Justiça como se diz para aí. Por outro lado, todas as críticas que fez resultavam da inexistência de verbas adequadas para fazer face às necessidades existentes, o que significa que, do seu ponto de vista, tudo somado, não restariam verbas suficientes para fazer face a tais necessidades.

Porém, entendo que as verbas são suficientes e que com a racionalização dos cofres — e aqui emprego uma palavra que já está um pouco oficializada no Governo, e que neste caso, mais do que nunca, emprego com toda a verdade (aliás, como tem acontecido em relação a outros aspectos, como, por exemplo, no campo

da Saúde — nós estamos a evitar todo o desperdício e a fazer uma política de «austeridade total». Isto é: não se gasta um tostão — desculpem-me a expressão — que não seja para um fim directa, necessária e imperativamente útil. Isto é o mais que podemos fazer!

Por parte do Governo, mais concretamente do Ministério das Finanças, houve uma grande compreensão já que é evidente que ocorreu um salto em matéria financeira como até agora ainda não tinha havido no Ministério da Justiça e houve, sobretudo, aquilo que comecei por dizer: o abrir de uma nova época para os meios financeiros do Ministério da Justiça.

Se o parque judiciário português está no estado que todos nós conhecemos — e a sua expressão, Sr. Deputado, é também a minha nalguns aspectos «ele está a cair aos bocados» —, na realidade, também reconheço isso, no entanto os «bocados» não começaram a cair agora, mas sim, há vinte anos, e a verdade é que ao longo desses anos ninguém acudiu a essa lenta degradação.

O mesmo se pode dizer em relação aos estabelecimentos prisionais. Aqui o problema, hoje, tenderá a ser ultrapassado, pois apenas temos dois pontos de rotura que só se poderão resolver com a cooperação da Assembleia. Em relação ao caso de Monsanto devo dizer que já expus ao Sr. Presidente da Assembleia a necessidade de transferir, nos termos legais, o arquivo da ex-PIDE/DGS do Forte de Caxias para outro local — o Ministério da Justiça tem que dar uma total segurança no tratamento desse espólio.

Mas, como dizia, só os estabelecimentos prisionais de Monsanto e do Funchal é que estão em condições tão graves como a maioria das prisões espanholas ou francesas. Não tenhamos relutância em dizer isto, pois, felizmente, os restantes estão em melhor estado.

Ainda há pouco disse ao Sr. Deputado Correia Afonso que bastava ler o Paris Match — o Sr. Deputado certamente que o lerá, mas com certeza saltou por cima desse artigo — para ver o estado em que estão as prisões francesas. É certo que o mal dos outros não justifica o nosso. Devo, no entanto, dizer que o que temos, com um esforço de racionalização de meios e de maior afectação de recursos, certamente bastará!

O Sr. Deputado José Magalhães provavelmente dirá que nós não resolveremos tudo. De facto, não, mas começaremos a resolver!

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — A minha pergunta foi só esta: o que é que vai acontecer em relação à verba de manutenção e funcionamento da Direcção--Geral dos Serviços Prisionais? Não queria pôr o Sr. Deputado Correia Afonso mais perturbado...

Quanto ao Instituto de Reinserção Social, o que é que vai acontecer aos 56 000 contos? Os cofres entram com os 56 000 contos ou não? E o que é que se passa em relação à Direcção dos Serviços Tutelares de Menores?

Estas são perguntas muito pontuais e curtas e todas elas são, infelizmente, sobre assuntos gravíssimos.

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Relativamente aos magistrados, toda a gente está preocupada com a tributação do imposto complementar. Como o Sr. Secretário de Estado não nos pode informar sobre a forma como a compensação vai ser feita, será que o Sr. Ministro o pode fazer?

O Sr. Ministro da Justiça: — Pura e simplesmente, não sei, Sr. Deputado!

Uma voz do PCP: — Não está especificado no Orçamento e depois diz que não sabe!

O Sr. Ministro da Justiça: — Quanto à Direcção--Geral dos Serviços Prisionais, é evidente que é de crer, aliás, como ultimamente se tem verificado, que haverá uma diminuição da população prisional, sobretudo com a entrada em vigor das normas sobre prisão preventiva e com a consciência que começa a haver, da parte dos tribunais portugueses, sobre a necessidade da aplicação de medidas alternativas às penas privativas de liberdade. Pela primeira vez, no 1.° semestre deste ano aplicaram-se mais penas de multa do que penas privativas de liberdade, pelo que é de crer que os meios previstos para despesas de funcionamento dos serviços prisionais sejam bastantes.

Quanto ao Instituto de Reinserção Social, devo dizer que há uma parte que continua a ser suportada pelos cofres — isso é, aliás, inevitável.

Até agora, ele era totalmente suportado pelos cofres, salvo uma pequena verba. No entanto, agora passa a haver um esforço de envolvimento do Estado, num sentido amplo, nesta matéria. Isto porque como é evidente, ainda não se conseguiu chegar ao ponto de transferir para o Orçamento de Estado tudo aquilo que está a cargo dos cofres. O ideal seria mesmo que se transferissem os próprios cofres. No entanto, tal como o Sr. Deputado Almeida Santos referiu na 1." Comissão, isso é, de momento, completamente impensável, pois envolveria uma incomportável alteração... Aliás, devo dizer que temos uma lei orgânica que está pronta — não a poderei facultar porque ainda não foi aprovada em Conselho de Ministros — e que começará a encarar seriamente e a resolver esse ponto.

Finalmente, quanto ao Serviço Tutelar de Menores ...

O Sr. José Magalhães (PCP): — E a reinserção social, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Justiça: — Quanto à reinserção social, devo dizer que aquilo que não estiver a cargo do Orçamento do Estado ficará a cargo dos cofres.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Portanto, estão garantidos os 56 000 contos necessários para perfazer os 350 000 contos, não é verdade?

Pausa.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Deputado, acabo de saber de fonte mais segura e idónea que sim — isto com toda a pureza e com todo um descomprometimento «comprometedor».

Finalmente, quanto à incidência do imposto profissional quanto aos magistrado judiciais e aos do Ministério Público, eu não sei responder. Ao que creio, o Ministério das Finanças, que está aqui muito brilhantemente representado, poderá talvez esclarecer o Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): — Sr. Presidente, gostaria de lhe perguntar se só os ministros é que têm direito a almoçar.

Risos.

O Sr. Presidente: — Certamente que não, certamente que não.

No entanto, havia colocado previamente a questão aos diversos grupos parlamentares, no sentido de continuarmos com o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Justiça. Assim, neste momento, poria a questão de saber até que horas poderemos ir. Isto porque se não houver um consenso entre os grupos parlamentares teremos de, possivelmente, ver uma outra continuação da discussão. Portanto, gostaria de ouvir todos os grupos parlamentares sobre essa questão, começando pelo PSD.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Sr. Presidente, penso que a intervenção do Sr. Ministro se prolongou um pouco mais do que aquilo que estaria previsto no horário dele relativamente ao almoço que tinha.

Portanto, penso que esta reunião deve ser interrompida aqui, continuando da parte da tarde. Isto até porque durante todo o tempo decorrido até este momento estivemos, no fundo, a repetir questões que já foram levantadas em sede de comissão. Assim, se há algum sentido útil no nosso trabalho, é o de descer à especialidade e discutir na especialidade — é esta a fase de discussão do orçamento.

Sendo assim, isto é, como até aqui já tivemos uma discussão na generalidade, aquando da preparação da discussão do orçamento, penso que deveríamos interromper a reunião, continuar de tarde e, então sim, seguirmos o método de discutir na especialidade.

O Sr. Presidente: — Gostaria agora de conhecer a posição do CDS em relação a esta questão.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): — Sr. Presidente, em primeiro lugar não sei em que medida o proposto se conforma com a calendarização da própria Comissão, pois creio que estava prevista a audição de outros Srs. Membros do Governo — e talvez fosse esta a primeira informação que a mesa nos devesse dar.

É que, se realmente temos disponibilidade apenas até às 15 horas, então, nessa altura, não vale a pena interromper para voltarmos de tarde, pois então não temos tempo para isso.

Agora, se, de facto, de acordo com essa calendarização que estava prevista anteriormente, isso é compatível com a possibilidade de interrompermos e de recomeçarmos após o almoço, por mim achava preferível.

No entanto, creio que tudo isto passa, exactamente, por saber qual é, em primeiro lugar, o tal timing previsto pela Comissão e, em segundo lugar, a disponibilidade do Sr. Secretário de Estado e dos Srs. Directores--Gerais para poderem estar presentes.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o que lhe posso dizer é que, em relação ao programa da Comissão de Economia, Finanças e Plano, temos para esta tarde o debate sobre o orçamento do Ministério da Saúde, o qual está previsto iniciar-se às 15 horas.

A questão — e por isso é que estou colocar o problema aos diversos grupos parlamentares — é que podemos considerar que haverá eventualmente as hipo-

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teses de a discussão sobre o orçamento do Ministério da Saúde se prolongar para não mais do que as 18 horas, de a realizar das 18 às 20 horas ou — uma outra hipótese possível — de fazermos um prolongamento desta reunião para a noite, embora julgue que talvez não seja necessário.

Portanto, era neste sentido que gostaria de colocar a questão aos vários grupos parlamentares, porque estes, ao pronunciarem-se por uma das hipóteses, terão, como é evidente, de ter em consideração outras condicionantes — se a hipótese for, por exemplo, a de a reunião se prolongar para depois das 18 horas, devem ter isso em consideração para o debate sobre o orçamento do Ministério da Saúde.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): — Afinal, Sr. Presidente, tinha razão em pôr a questão preliminar. É que, pela nossa parte e nessa perspectiva, preferiríamos continuar agora.

O Sr. Presidente: — Gostaria agora de ouvir o Grupo Parlamentar do PRD.

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Sr. Presidente, nós não vemos qualquer inconveniente no prolongamento da reunião, desde que isso não vá contra os interesses do Sr. Secretário de Estado e dos Srs. Directores--Gerais. Assim, pela nossa parte, penso que talvez fosse mais oportuno continuarmos e não interrompermos.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para se pronunciar sobre esta questão, o Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Sr. Presidente, vejo aqui na calendarização da Comissão que realmente está marcada para as 15 horas a discussão sobre o orçamento do Ministério da Saúde. No entanto, vejo também que o início da discussão relativa ao Ministério da Justiça estava marcada para as 11 horas, sendo que só a começámos cerca das 12 horas e 20 minutos — portanto, com uma hora e um quarto de atraso. Assim, se não quisermos «ratar» essa hora e um quarto do nosso tempo, então também podemos empurrar um pouco o debate do Ministério da Saúde para mais uma hora e um quarto.

De qualquer forma, pode ser até que às 15 horas tenhamos já todo este assunto arrumado e, tal como o PRD, estamos na disposição de continuar a reunião até que este assunto esteja esgotado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Presidente, o PCP entende que devemos continuar até final.

O Sr. Presidente: — Parece ser o PSD a única voz discordante neste momento.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Dá-me licença que use da palavra, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Sr. Presidente, o PSD é a única voz discordante, mantém essa discordância e até aceita a sugestão que o Sr. Presidente

levantou, isto é, a de seguir este trabalho a partir das 18 horas. Isto porque, na verdade, a reunião começou atrasada, não por culpa do Ministério da Justiça, que esteve presente, nem por nossa, que também cá estávamos. Assim, lamento muito, mas as pessoas têm os seus compromissos, devendo, por isso mesmo, respeitar-se a calendarização e as horas para estas reuniões.

É isso que o PSD tem a dizer.

O Sr. Presidente: — Certamente, Sr. Deputado, embora julgue que não valerá a pena entrarmos agora em questões de culpa ou de não culpa, porque senão teríamos de fazer o cômputo de quem é que não estava cá às 9 horas e 30 minutos — e talvez seja melhor não o fazer —, que era a hora marcada para o início da discussão sobre os Encargos Gerais da Nação.

No entanto, embora a posição maioritária dos grupos parlamentares aqui presentes tenha ido no sentido de se continuar a reunião, se não houver objecção poderíamos colocar a hipótese de interromper a reunião neste momento. Porém, isto teria de ser considerado na perspectiva de os grupos parlamentares racionalizarem o seu tempo em termos de discussão sobre o orçamento da saúde, de modo que, cerca das 18 horas, pudéssemos ter terminado essa mesma discussão — seria, portanto, das 15 às 18 horas (três horas, talvez), se houver por parte de todos os grupos parlamentares o comprometimento de estarem presentes às 15 horas. Isto porque se começarmos novamente com uma hora de atraso teremos o mesmo problema.

De qualquer modo, falei agora com o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Justiça e parece-me que da parte do Governo não haverá objecção ao prolongamento desta sessão a partir das 18 horas.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Justiça (Garcia Marques): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Justiça: —

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela minha parte não há qualquer problema quer em continuar a reunião agora, quer em retomá-la às 18 horas. Não sei, no entanto, se o Sr. Ministro tem qualquer impedimento relativamente à possibilidade da continuação da reunião a partir das 18 horas.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, se a continuação às 18 horas nos facultar, por acréscimo, a presença do Sr. Ministro da Justiça, creio que seria excelente. Se não, tudo seguirá como estava previsto e como seria agora.

No entanto, creio que nessa hipótese, se contássemos com a presença do Sr. Ministro, então teríamos talvez ganho alguma coisa a nível de responsabilidade política do debate, sem subestimar, naturalmente, a composição actual da representação do Governo, e, portanto, creio que poderíamos aderir a essa solução, embora não seja boa — como é evidente, teríamos

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preferido a outra que estava ensejada. Mas manifestamos o nosso acordo nesses termos, fazendo-se um esforço e um apelo à presença, se possível, do próprio Ministro da Justiça, o que será mais justificável do que, por exemplo, a galeria completa dos Srs. Directores--Gerais, cuja intervenção no debate nem é regimental-mente possível.

O Sr. Presidente: — Sobre a presença do Sr. Ministro da Justiça, faremos a respectiva solicitação ao Sr. Secretário de Estado Adjunto.

Assim, se não houver qualquer objecção, recomeçaríamos o debate do Orçamento do Ministério da Justiça às 18 horas, agradecendo que, ao mesmo tempo, todos os grupos parlamentares fizessem o esforço necessário para que iniciemos a discussão do orçamento da Saúde às 15 horas prefixas.

Está, pois, interrompida a reunião.

Eram 13 horas e 30 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice--Presidente Ivo Pinho.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos reiniciar os nossos trabalhos.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, a Sr.8 Ministra da Saúde informa--me que, tendo já feito uma intervenção de introdução a respeito do orçamento do seu Ministério aquando do debate na generalidade, pensa não ser necessário fazer aqui uma introdução. No entanto, se algum dos Srs. Deputados considerar que, apesar de tudo, é útil ouvir essa introdução inicial, a Sr.8 Ministra da Saúde está, evidentemente, disposta a fazê-la. Se se entender que não há utilidade nisso, então entraremos, desde já, nas perguntas que houver a formular por parte de cada um dos grupos parlamentares.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Dá-me licença que interpele a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Faça favor.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, penso que talvez fosse útil que a Sr.8 Ministra se pudesse debruçar mais especificamente sobre os pontos que constam do relatório da Comissão de Saúde.

O Sr. Presidente: — Se essa é uma declaração de intenções, posso dizer que a Sr.8 Ministra se colocou, desde logo, à disposição para fazer essa introdução se algum Sr. Deputado considerasse que tal era útil.

Nesses termos, concedo a palavra à Sr.8 Ministra da Saúde para, se quiser, se referir a alguns dos aspectos que constam do relatório da Comissão de Saúde que a Sr.8 Ministra entenda carecerem ainda de algum esclarecimento adicional.

Tem V. Ex.8 a palavra, Sr.a Ministra.

A Sr.8 Ministra da Saúde (Leonor Beleza): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Confesso que não estava preparada para intervir nos termos em que o Sr. Deputado Ferro Rodrigues referiu, isto é, comentando o parecer da Comissão de Saúde mas, de qualquer modo, terei muito gosto em fazê-lo.

Seguindo, então, o referido parecer, diz-se na página 2 que a contribuição do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Saúde representa um acréscimo, em termos nominais, de 10,2% relativamente ao que acontece em 1986.

Já tive ocasião de referir que não é possível limitarmo-nos a fazer este comentário, na medida em que a transferência prevista na proposta de lei do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Saúde ainda não está completa visto que a ela acrescerá aquilo que servirá para fazer a actualização dos vencimentos do pessoal. Significa isto que não é possível fazer a comparação apenas entre a transferência que consta da proposta de lei e aquilo que foi transferido no ano passado, na medida em que haverá que acrescer a essa verba de 164 800 contos a quantia necessária para fazer face ao aumento dos vencimentos dos funcionários públicos. Portanto, a nossa previsão é a de que haja um acréscimo de 16% na transferência do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Saúde em relação ao ano passado. Aliás, esta questão da não inclusão das verbas para actualização de remunerações consta do n.° 1 deste parecer.

Quanto ao que se refere no n.° 2, isto é, que há uma verba de 4 milhões de contos para fazer face a novas admissões e à revisão de carreiras, devo dizer que tal não é inteiramente exacto, pois, como os Srs. Deputados sabem, conforme consta do documento que apresentei na comissão sobre a repartição de verbas do Serviço Nacional de Saúde, a verba prevista para novas admissões e revisão de carreiras é de 2 673 000 contos e não os tais 4 milhões que constam do parecer da Comissão de Saúde.

No que se refere ao n.° 3, devo dizer que, de facto, o acréscimo, em termos nominais, para os serviços convencionados é de 7 % e também é correcto o que se diz no n.° 4, isto é, que o acréscimo para medicamentos é de 1,2%.

Relativamente à verba para «consumos», como também tive ocasião de referir no Plenário, apenas está aqui mencionada a verba que aparece destacada no projecto de orçamento do Serviço Nacional de Saúde sob essa rubrica específica. Contudo, já tive também ocasião de dizer aos Srs. Deputados que há uma outra rubrica que consta do documento que entreguei e que está, genericamente, enunciada como «Novas admissões, novas actividades e revisão de carreiras». Assim, se se somar as quantias que figuram sob essa rubrica e aquelas que estão atribuídas aos hospitais directamente em «consumos» verifica-se que há um aumento de mais de 30%. Ora, a verdade é que a generalidade das verbas incluídas nessa rubrica e atribuídas aos hospitais serão, de facto, verbas para gastar em «consumos», termo amplo que utilizamos no orçamento do Serviço Nacional de Saúde.

É exacta a referência que aqui está no sentido de cerca de 1 milhão de contos da verba destinada às misericórdias se destina ao pagamento de equipamentos que se encontravam em instalações das misericórdias e que, como sabem, passaram a fazer parte do Serviço Nacional de Saúde.

Quanto ao n.° 7, onde se diz que as receitas próprias do Serviço Nacional de Saúde resultantes do pagamento de cuidados médicos prestados no âmbito cos subsistemas de saúde e da actividade das companhias seguradoras registam um acréscimo de cerca de 5 milhões de contos, como também tive ocasião de

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referir, as receitas próprias do Serviço Nacional de Saúde não estão destacadas entre aquilo que resulta de pagamentos dos subsistemas ou de pagamentos a efectuar por entidades responsáveis por serviços prestados a beneficiários, por exemplo, de companhias de seguros e aquilo que resulta de taxas moderadoras. A nossa avaliação, como já disse, é a de que o que resulte de taxas moderadoras é menos de 5% da verba inscrita como receitas do Serviço Nacional de Saúde.

A referência que é feita ao défice é aquilo que consta do documento que entreguei.

No que se refere à apreciação que é feita, suponho que ela se refere sobretudo, como se diz na p. 3, a dois elementos: à verba para pagamento de medicamentos e à verba para consumos nos hospitais.

Relativamente aos consumos nos hospitais, já tive oportunidade de dizer que não é exacto que estejamos a prever neste momento gastar apenas cerca de mais 109b em consumos nos hospitais do que aquilo que terá sido gasto em 1986, segundo as estimativas que neste momento fazemos e que os Srs. Deputados já conhecem.

Relativamente à verba para medicamentos, também já tive ocasião de dizer que essa previsão assenta, de facto, numa gestão extremamente rigorosa dos recursos que temos, como, aliás, é referido no relatório da comissão, e sobretudo nos efeitos que esperamos venham a ter, particularmente durante o ano de 1987 na medida em que só então é que esses efeitos serão plenos, as medidas que tomámos em relação ao redimensionamento das embalagens. Isso conjugado com o controle do aumento dos preços e com o controle, que, naturalmente, está na nossa mão, da introdução de novos medicamentos no mercado.

Disse já no Plenário e tenho muito gosto em repetir aqui que é possível que venhamos a introduzir novas medidas no sentido de uma maior selectividade naquilo que é reembolsado pelo Serviço Nacional de Saúde, porque é possível que hoje haja gastos injustificados resultantes da forma como as coisas estão a funcionar, o que, do nosso ponto de vista, necessita de algumas correcções.

Quanto à previsão sobre a angariação de receitas, o parecer da Comissão é pessimista no que diz respeito à possibilidade de o Serviço Nacional de Saúde vir a recolher tudo aquilo que está previsto como receitas, mas devo dizer que não é essa a posição do Governo. Lembro apenas que o sistema actual para o reembolso pelos subsistemas está em vigor apenas desde o mês de Julho, pelo que, para a previsão, nos baseámos naquilo que está neste momento a acontecer durante o 2.° semestre.

Assim, em 1986, prevemos uma modificação muito significativa na cobrança de receitas do Serviço Nacional de Saúde durante o 2.° semestre relativamente ao que aconteceu no 1.°, na medida em que a legislação respectiva apenas entrou em vigor em Julho deste ano. Naturalmente que essa eficácia terá pleno sentido em 1987 e, por outro lado, como os Srs. Deputados sabem, introduzimos, em termos de uma gestão mais cuidadosa dos nossos recursos, uma regra nova, de acordo com a qual os serviços de saúde irão reter uma parte muito substancial das receitas que são capazes de cobrar, o que naturalmente é um incentivo importante a que cobrem receitas o mais eficazmente possível.

Como certamente sabem, para trás, o Serviço Nacional de Saúde limitava-se a descontar no financiamento que mensalmente põe à disposição dos vários serviços de saúde as receitas desses serviços. A partir do ano

que vem uma parte substancial dessas receitas será retida pelos serviços de saúde, que poderão utilizá-la segundo os seus critérios, embora, naturalmente, de acordo com regras gerais que emitimos mas, em todo o caso, com uma margem de liberdade importante por parte dos serviços, o que constitui um incentivo importante para que cobrem as receitas a que têm direito.

Em relação aos comentários feitos sobre o plano de investimentos, também já tive ocasião de dizer que a nossa previsão aponta para que praticamente tudo o que foi atribuído em termos de PIDDAC de saúde durante o ano de 1986 venha, de facto, a ser gasto, utilizando nós a margem de manobra que o Orçamento do Estado confere ao Governo nesta matéria.

Houve, com efeito, algum atraso na maneira como as obras e os pagamentos foram sendo feitos mas nesta altura consideramos que estamos em condições de recuperar quase totalmente o atraso que existiu para trás e que, repito, utilizando a margem de manobra que o Orçamento do Estado para 1986 confere ao Governo, poderemos executar praticamente tudo aquilo que, em termos de despesa, foi previsto no PIDDAC de 1986.

Quanto à referência sobre o montante global do investimento, lembro apenas que há uma parte importante de investimento em saúde que está prevista nos planos integrados de desenvolvimento regional (PIDRs), que, em rigor, deveria acrescentar àquilo que está atribuído no PIDDAC do Ministério, na medida em que isso significa, em todo o caso, um acréscimo importante nos recursos que vão ser gastos em investimentos no sector da saúde durante o ano de 1987 e que está formalmente destacado, embora, como é óbvio, substancialmente concorra para o mesmo fim.

Relativamente aos comentários finais que são feitos no relatório, é evidente que o Governo está de acordo quanto à necessidade de rentabilizar os grandes investimentos que foram feitos. Aqui referem-se especificamente o Hospital de Santarém, mas, quer nesses, quer em todos os outros novos hospitais, bem como nos antigos, o Governo entende que há que rentabilizar devidamente os investimentos que foram feitos. Naturalmente com os limites que necessariamente existem e que significam que não poderemos nunca gastar tudo aquilo que queiramos, o Governo considera que os investimentos feitos são convenientemente rentabilizados com as propostas de PIDDAC que fez.

São estes os comentários que me suscita o relatório da Comissão de Saúde.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, depois desta breve explicitação crítica do conteúdo do relatório da Comissão de Saúde, penso que seria útil entrarmos agora numa primeira ronda de perguntas e respostas.

Peço apenas a cada um dos Srs. Deputados que vão colocar questões o cuidado de distinguir entre questões que respeitam ao orçamento de funcionamento e questões que respeitam ao PIDDAC.

Iria dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado, que pretende aditar algo àquilo que foi dito pela Sr.9 Ministra.

Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, quero apenas referir-me a um ponto específico que diz respeito a um investimento — o Centro de Saúde de Sever do Vouga — que, por lapso, não foi incluído inicialmente

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nas propostas do PIDDAC da saúde. Antes de ser entregue o PIDDAC, não na Assembleia, mas ao próprio Governo, foi feito com 24 horas de atraso, mas, por ra2ões burocráticas que dizem respeito à introdução no computador, não pôde figurar no mapa vn que saiu e de que os Srs. Deputados dispõem.

Sendo assim, e uma vez que não há qualquer alteração a nenhum dos valores inscritos no PIDDAC, a minha proposta é a de que ele seja incluido com uma verba de 500 contos para 1987 e essa mesma verba seja retirada do Centro de Saúde de Ponte de Sor, que está em construção.

É claro que depois isto se projecta nos anos futuros. Não tenho aqui a projecção nos anos futuros, mas esses são elementos que posso fornecer, por exemplo amanhã, se isso me for permitido e for aceite esta proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Seguindo, então, a metodologia que o Sr. Presidente indicou, começaria por fazer algumas observações respeitantes ao orçamento de funcionamento, e centrar-me-ia fundamentalmente na verba global atribuída a título de transferências para o Serviço Nacional de Saúde.

Diria, em primeiro lugar, que não houve uma crítica ao parecer da Comissão, mas sim algumas observações feitas ao parecer, muitas delas, suponho, até em concordância com o mesmo parecer.

Uma das observações que têm sido feitas é a que respeita a verbas de consumos no âmbito dos hospitais. A Sr.a Ministra tem respondido a esta objecção

— registo que já não é a primeira vez, pois já na comissão especializada deu essa resposta — dizendo que a verba não é rigorosamente a que consta deste desdobramento que nos foi facultado no âmbito da Comissão e está anexo ao parecer da mesma Comissão, mas que é uma verba superior, na medida em que

— suponho ser este o pensamento de V. Ex.a, pelo que me corrigirá se não for assim — metade das receitas próprias é directamente consumida, sem ter um circuito mais complicado, nas próprias unidades geradoras dessas receitas.

Gostaria que isto me fosse explicado do ponto de vista orçamental e da conta — e está cá, principalmente, o Sr. Secretário de Estado, que vai ser com certeza um grande auxílio. É que nas contas (e não na conta geral do Estado) que V. Ex." aqui nos deu, respeitantes ao desdobramento desta verba, o que acontece é que as receitas próprias nos aparecem deduzidas ao montante global da despesa para dar o volume do financiamento necessário ao Serviço Nacional de Saúde.

Portanto, para além do valor de uma simples consignação que isso possa ter, não percebo como é que realmente se pode alcançar que a verba de consumos vai resultar aumentada por este facto. Suponho que não vai resultar aumentada, Sr." Ministra. Esta é uma dúvida que persiste no meu pensamento e no do meu partido, que gostaria que V. Ex." esclarecesse.

Ainda no que respeita a esta matéria do orçamento do Serviço Nacional de Saúde, a Comissão fez observações relativamente à verba de medicamentos, às comparticipações respeitantes a medicamentos a pagar às farmácias.

Sabemos qual é o raciocínio da Sr." Ministra nesta matéria, que assenta numa equação na qual desempenha elemento importante a possível realização de uma poupança de 20% com o novo sistema de racionaliz£-ção de embalagens dos medicamentos.

Conhecemos as queixas enormes que tem despertado esse sistema de racionalização, o que porventura poderia ser natural numa primeira fase de implementação. Um jornal do último fim de semana dedica mesmo uma ampla reportagem a esta matéria, na qual se aponta, suponho, no sentido de erro na listagem das embalagens racionalizadas. Aí se dá nota de que há da parte do Ministério a intenção de rever esse regime de racionalização. E suponho que também li na imprensa, ao longo destas últimas duas semanas, outras informações neste sentido, ou seja, no de que o Ministério tenciona alterar este sistema.

Alterar, Sr.8 Ministra, vai dar como resultado poupar mesmo os 20%, menos do que os 20% ou ainda mais do que os 20%?

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Gastar mais 20%!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Esta é uma questão, relacionada com esta matéria, que também lhe coloco.

De momento, as minhas observações quanto ao orçamento de funcionamento são estas.

No que respeita ao PIDDAC, suponho que não tivemos oportunidade de obter um esclarecimento cabaí na Comissão sobre as linhas de política que orientam a distribuição das verbas do PIDDAC da saúde deste ano.

Podemos realmente surpreender alguma linha dessa política, que tentámos dar no relatório e que seria no sentido de se promover uma concentração de meios nos dois grandes centros de Lisboa e Porto, onde se fariam sentir mais as necessidades. No entanto, mesmo assim, a observação do PIDDAC não permite tirar esta conclusão completamente, porque verificamos que, naquilo que será a área metropolitana do Porto, o conjunto de meios previstos no PIDDAC é ainda claramente diminuto. E não se vê que faça face a nenhuma obra de grande monta que permita alterar as estruturas de atendimento em matéria de serviços hospitalares nesta região.

Verificamos também que há diminuição da verba atribuída no PIDDAC, tal como nos foi distribuído, ao novo Hospital da Universidade de Coimbra. Isso, porventura, iria nessa linha de beneficiação dos dois grandes centros.

Por outro lado — e aqui falo um pouco com a influência da informação que me é dada da minha região —, V. Ex." falou dos PIDRs. Voltaria ao PIDR do Alto Minho, não para fazer a observação que fiz na última reunião da Comissão, mas para dizer o seguinte: no Alto Minho tem-se conhecimento da proposta da Comissão do Planeamento Regional do Norte. Não sei se a sigla é CCCR — estou a fazer alguma confusão —, mas V. Ex.8 perdoar-me-á e preencherá com certeza esta lacuna. Por aí se surpreende que havia vários centros de saúde propostos pela CCCR, que, suponho, foram todos eliminados, menos um.

Ora, isto também nos permite surpreender uma certa orientação: favorecimento porventura das instalações hospitalares, em detrimento da medicina ambulatória, dos cuidados de base ou primários, em termos de PIDDAC, e favorecimento dos grandes centros, em detri-

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lacuna que eu queria preencher: veio demonstrar que, ao contrário do que o Sr. Deputado Silva Marques disse no Plenário, nem só os médicos fazem perguntas. Isto é: não obstante o serviço de saúde que temos, ainda há utentes que sobrevivem e são capazes de fazer perguntas.

Risos.

Dito isto, a questão que lhe colocaria tem a ver com a verba orçamentada para medicamentos.

Disse a Sr." Ministra, em resposta à eventual exiguidade da verba contemplada no Orçamento para 1987, que há três razões que explicam essa verba e justificam que não haja receios quanto a essa eventual exiguidade: o rigor na gestão, o redimensionamento dos medicamentos e uma maior selectividade na comparticipação.

Relativamente ao rigor orçamental, gostaria que fosse possível que nos puséssemos de acordo quanto àquilo que se entende por uma gestão rigorosa do Orçamento. Pelos dados de que dispomos, aquilo que realmente se passou ao ano passado foi que, em relação à verba prevista para os medicamentos, gastaram mais 7 milhões de contos, que foram em parte cobertos, em recurso a orçamentos suplementares, por verbas desviadas de outras rubricas, nomeadamente a verba de pessoal, onde eventualmente se gastaram cerca de 5 milhões de contos.

A questão está em saber se esse desvio de verbas se fez porque não se fez aquilo que se deveria ter feito ou porque eventualmente tinham sido sobreavaliadas à partida — isto é, terá havido uma boa gestão, mas uma má provisão, embora as duas coisas andem a par. Sendo assim e sendo este, no fundo, o entendimento de uma boa gestão, ou seja, o da capacidade de transferir de rubricas deficitárias quantias existentes em rubricas excedentárias, em que rubricas pensa a Sr.8 Ministra que poderá neste momento e no ano de 1987 desviar as verbas de que irá carecer seguramente para preencher a comparticipação dos medicamentos?

No desvio de que verbas e em que rubricas se traduzirá essa gestão rigorosa, rubricas essas que, pelos vistos, estão à partida supostamente sobreavaliadas?

O Sr. Deputado Nogueira de Brito já colocou a questão do redimensionamento dos medicamentos. De facto, Sr.8 Ministra, as indicações de que dispomos são as de que, em lugar de corresponder a uma redução no custo e nas despesas, o redimensionamento corresponde a um aumento. Os números que vão vindo a público mostram que em certos casos —e não sabemos onde é que isto vai parar — o redimensionamento traduz-se, na prática, em aumentos que podem ir desde 80% até cinco vezes mais o preço actual dos medicamentos. Ou seja, aparentemente e a pretexto do redimensionamento das embalagens, os produtores propõem e efectivam aumentos de preço que rondam essas ordens de grandeza.

Como é que, nesta perspectiva, o redimensionamento pode provocar qualquer economia nas comparticipações?

O que é que a Sr.8 Ministra entendeu por maior selectividade? Será uma redução nas comparticipações dos medicamentos? Será uma redução dos medicamentos comparticipados? Quais são os critérios a que irá obedecer essa maior selectividade nas comparticipações, que se traduzirá em reduções significativas no montante das comparticipações nos medicamentos?

mento dos que o não sejam, designadamente os hospitais distritais, e mesmo em prejuízo da possibilidade de se extrair o máximo rendimento de grandes investimentos recentemente feitos.

Pediria à Sr.8 Ministra que nos desse nesta matéria aquilo que realmente é a orientação da política que preside à distribuição das verbas do PIDDAC.

Finalmente, quero fazer-Ihe uma observação e uma pergunta que são de conjunto.

V. Ex." tem feito referência ao conjunto de medidas de natureza fiscal que integram o artigo 49.° da proposta de orçamento e tem estabelecido uma ligação entre essas medidas e o orçamento do seu Ministério.

Pergunto, Sr.8 Ministra, se V. Ex.a entende o orçamento do seu Ministério como um orçamento que seria deficiente em termos clássicos e que só tendo em conta esse tipo de medidas é que pode vir a revelar-se suficiente, ou seja, se espera que esse tipo de medidas venham a ter influência na procura de cuidados de saúde por parte da população já neste ano de 1987.

Eram estas as questões que o CDS tinha a colocar para já.

O Sr. Presidente: — Perguntaria agora se algum dos Srs. Deputados do PSD deseja formular alguma questão à Sr.a Ministra da Saúde.

Pausa.

Não havendo inscrições por parte do PSD, faria a mesma pergunda ao PRD.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila.

O Sr. Victor Ávila (PRD): — Sr.a Ministra da Saúde, quero colocar-lhe a seguinte questão: na Comissão de Economia, Finanças e Plano, aquando das audiências que tivemos com os vários ministérios no âmbito da discussão do Orçamento do Estado, a Sr.8 Ministra referiu que, das verbas de receitas próprias dos hospitais, 50% seriam retidas nessas instituições — como, aliás, foi referido há pouco. Indicou também que parte das aplicações previstas para essas retenções seria para verbas destinadas a obras de manutenção nos edifícios hospitalares e a aquisição de algum equipamento.

A questão que quero colocar-lhe é a de saber se, do ponto de vista técnico e orçamental, não seria mais correcto que essas verbas fossem orçamentadas no PIDDAC e não inscritas em despesas de funcionamento corrente dos hospitais centrais.

Uma outra questão que gostaria de lhe colocar diz respeito ao PIDDAC e, concretamente, às verbas previstas para o Hospital Distrital de Évora, em relação ao qual o PIDDAC prevê uma verba com o montante de 11 000 contos. Perguntar-lhe-ia se, atendendo à situação em que neste momento se encontram as medicinas, a qual, segundo especialistas, está perfeitamente degradada e disfuncional, considera que esta verba é suficiente para um funcionamento eficaz destes serviços no Hospital Distrital de Évora.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): — Sr.8 Ministra da Saúde, começaria por dizer que o Sr. Deputado Nogueira de Brito fez algumas das perguntas que gostaria de colocar e, inclusivamente, preencheu uma

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Sr." Ministra, as nossas considerações sobre os medicamentos estão feitas e estão expressas as nossas preocupações quanto às verbas orçamentadas.

Aproveito a aportunidade para voltar a abordar o PIDDAC e comentar a informação que acaba de nos ser dada pelo Sr. Secretário de Estado sobre os centros de saúde do distrito de Aveiro.

Disse o Sr. Secretário de Estado que o Centro de Saúde de Sever do Vouga ia ser dotado de uma verba de 500 contos.

Começo por criticar o que se passou em relação à distribuição de verbas no PIDDAC para o distrito de Aveiro, que, a meu ver, foi bastante penalizado.

Com efeito, temos informação de que foram propostas verbas para o Centro de Saúde de São João da Madeira, para a reinstalação do posto, e de que a proposta não foi aceite. Para Santa Maria da Feira, também as propostas para reequipamento das instalações de Nogueira da Regedoura e Paços de Brandão não foram aceites. Para a ampliação do Posto de Albergaria-a-Velha, foi proposta uma verba e 5000 contos, que também não foi aceite.

O distrito de Aveiro foi, portanto, bastante penalizado.

Já foi dito na Assembleia da República pelo responsável pela Administração Regional de Saúde de Aveiro, aqui presente, que o distrito tem enormes carências em matéria de centros de saúde.

Verifica-se, agora, que a maior parte das propostas feitas pela Administração Regional do Sul foi pura e simplesmente ignorada.

Em relação a Sever do Vouga, registo com agrado a menção de que vai ser orçamentada uma verba. Em todo o caso, quero dizer que essa verba é perfeitamente insignificante e inexpressiva visto que, naturalmente, se deve destinar ao projecto e a informação de que disponho é a de que, no Ministério da Saúde, o projecto está pronto ou praticamente elaborado e pronto.

Gostaríamos de ver um verba já orçamentada para aquisição e preparação do terreno e, possivelmente, até para a adjudicação das obras antes do final do ano.

A Sr." Ministra não deve ter conhecimento do facto, pelo que a devo informar de que este Centro de Saúde de Sever do Vouga já figurou em PIDDACs de anos anteriores e foi retirado. Portanto, desde há muitos anos que há promessas quanto ao centro de saúde e o actual Centro, que tem precárias condições de funcionamento, foi visitado por altos funcionários do Ministério da Saúde, tendo todos concluido pela prioridade deste Centro e, em todo o caso, ele tem vindo a ser ignorado.

Trata-se, de facto, de um dos concelhos mais pequenos do distrito He Aveiro, mas dos mais carenciados nesta matéria, pelo que propomos que esta verba seja substancialmente aumentada.

O Sr. Presidente: — Uma vez que há mais senhores deputados do PS que desejam formular pedidos de esclarecimento à Sr." Ministra, concedo agora a palavra ao Sr. Deputado Santana Maia.

O Sr. Santana Maia (PS):—Sr." Ministra, Sr. Secretário de Estado: Em relação à análise global do Orçamento, não vou colocar qualquer outra per-

gunta, uma vez que elas estão contidas no relatório da Comissão, bem como nas perguntas que já foram feitas em Plenário, como ainda e sobretudo nas perguntas já aqui colocadas pelo presidente da Comissão de Saúde, Segurança Social e Família, Sr. Deputado Nogueira de Brito.

Uma das nossas preocupações que, aliás, foi salientada aqui pelo meu colega de bancada deputado Lopes Cardoso, refere-se aos medicamentos.

Passemos sobre essa questão e detenhamo-nos sobre o PIDDAC e sobre o aspecto relativo ao ensino da enfermagem.

Começando por este último ponto, temos vindo a assistir, durante estes últimos anos, a que o numeras clausus das escolas de enfermagem seja rigidamente imposto e completamente conseguido. Quer dizer, não tem havido fugas ao numerus clausus imposto pelas escolas de enfermagem. Será isto um benefício?

Será, porventura, uma medida de rigor, mas, dadas as enormes carências de enfermagem, dada a impossibilidade de muitas unidades de saúde e novos hospitais funcionarem devido às carências de enfermagem, não seria caso de o Ministério impor às próprias escolas de enfermgem o alargamento do numerus clausus?

Sei que, em grande parte, o problema do numerus clausus das escolas de enfermagem se prende com o pagamento aos docentes. De facto, este pagamento não seduz e não atrai os docentes, pelo que é extremamente difícil às escolas de enfermagem conseguir pessoal docente capaz. De qualquer forma, uma vez que estamos a debater o orçamento, e isto poderá ter implicações oraçamentais, não seria de dotar o sector de ensino, nomeadamente as escolas de enfermagem, com uma maior verba no sentido de, em menos anos, podermos dotar o País do número de enfermeiros de que necessita, sem os quais o sistema de saúde não irá funcionar certamente?

Em relação ao PIDDAC e no fim das visitas que a Comissão de Saúde, Segurança Social e Família efectuou, quero aqui trazer mais uma vez o problema do Novo Hospital da Universidade de Coimbra, para o qual, em 1986, se previu uma verba de 1 534 000 contos para 1987, enquanto no PIDDAC proposto a esta Assembleia consta uma verba de apenas 200 000 contos.

Se a isto acrescentarmos que no PIDDAC de 1986 foram retirados ao Novo Hospital da Universidade de Coimbra 300 000 contos, vemos já a impossibilidade de muitos dos serviços funcionarem.

Sr.a Ministra, Sr. Secretário de Estado: O que me preocupa fundamentalmente é que o Hospital da Universidade de Coimbra já abriu, embora tardiamente, pelo que pergunto durante quanto tempo vamos ter duas unidades hospitalares a funcionar, com todos os encargos que daí advirão.

Não vamos agora discutir a dimensão, a estrutura, o dimensionamento do Novo Hospital da Universidade de Coimbra, com o qual, de resto e publicamente, nunca concordei em absoluto. Contudo, a obra está feita, há que o pôr a funcionar e não podemos permitir que durante longos meses ou possivelmente mais de um ano duas unidades hospitalares continuem a funcionar.

Assim, o serviço de medicina nuclear, que tinha pedido uma verba de 150 000 contos, não tem qualquer verba para poder funcionar.

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O serviço de anatomia patológica, que tem pedida uma verba de 170 000 contos, não tem qualquer verba que o possa pôr a funcionar e, portanto, terá de continuar a servir-se do laboratório de anatomia patológica da Faculdade de Medicina.

Isto para não falar já em dotações para outros serviços como o de oftalmologia, o de otorrino, serviços de instalações e equipamento que não estão dotados minimamente com alguma ferramenta e que pediram uma verba de 60 000 contos; para não falar de outros serviços como é o caso de dermatologia, informática e, eventualmente, com meios mais sofisticados, como sejam a angiografia digital, a alitotrícia. Mas enfim, isso serão problemas mais discutíveis e de opção entre os grandes centros como sejam os de Lisboa, Porto e Coimbra.

Em relação a Santarém, e depois da visita que fizemos ao Novo Hospital de Santarém, foi-nos dado um relatório pelo presidente da respectiva comissão instaladora que, com a necessidade de pôr o Hospital de 500 camas a funcionar totalmente — quando neste momento funciona apenas com 250 camas e com alguns serviços não completamente equipados — justifica um pedido para que a verba de 26 000 contos inscrita no PIDDAC possa ser alterada para 90 000 contos.

Finalmente, em relação a centros de saúde, uma vez que o meu lugar de deputado está mais directamente ligado ao distrito de Coimbra, felicito-me por ver verbas inscritas para novos centros de saúde deste distrito, nomeadamente o Centro Norton de Matos, que era uma carência sentida desde há muito anos.

Quero também fazer a proposta de que para o Centro de Saúde de Soure seja inscrita uma verba que, embora pequena, possibilite que esse Centro seja uma realidade dentro de curto prazo, uma vez que a Câmara já ofereceu o terreno há alguns anos, trata-se de um processo que se vem arrastando com uma morosidade demasiada, pelo que aqui deixo esta nota de atenção e uma proposta para que em 1987 seja inscrita uma pequena verba para início do processo de construção do Centro de Saúde de Soure.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.

O Sr. Miranda Caiba (PS): — Quero colocar uma questão muito simples e que tem a ver com a referência que a Sr." Ministra fez relativamente aos planos integrados de desenvolvimento regional.

Estou ligado a um círculo eleitoral que também tem um desses plano e que é o PIDR Norte-Alentejano. Nesse projecto apresentado junto das autarquias locais há um conjunto de considerações feitas em relação à área de saúde.

Uma delas é um projecto de reestruturação e instalação do Hospital Distrital de Elvas, que é um projecto de integração em centro de saúde.

Consegui reparar que, de facto, as propostas apresentadas são, de uma maneira geral, contempladas, só que, em relação ao Hospital Distrital de Elvas, não há uma única verba consignada.

Em princípio, naquilo que foi apresentado junto da Comissão de Coordenação Regional do Alentejo estavam previstos 50 000 contos, não havendo, portanto, nenhuma verba num projecto global de 200 000 contos, como ali está referido.

Por outro lado e na sequência dos dados fornecidos pelo Sr. Secretário de Estado, tomei agora conhecimento de que uma verba proposta no PIDDAC para o Centro de Saúde de Ponte de Sor deixou de o ser para ser afecta a um outro centro de saúde.

Gostaria de ser esclarecido se assim é, porque o Centro de Saúde de Ponte de Sor é considerado como um centro de saúde novo e acharia espantoso que tivesse havido um lapso para alterar a afectação desta verba.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PRD): — Sr.3 Ministra da Saúde: no passado sábado deputados reuniram-se no Governo Civil da Guarda com autarcas desse distrito e o Sr. Director do Hospital Distrital da Guarda pôs-nos ao corrente do facto de V. Ex.8 tencionar reclassificar aquele Hospital.

Ficámos atónitos com a exposição que o Sr. Director nos fez e posso transmitir a V. Ex.8 que deputados e autarcas do distrito da Guarda se vão pôr em pé-de--guerra se, de facto, V. Ex.8 levar a cabo essa reclassificação.

Não podemos tolerar que o Hospital Distrital da Guarda possa vir a perder determinadas especialidades que há dezenas de anos lá são praticadas. Trata-se de uma região do interior, como na minha última intervenção tive oportunidade de referir, onde se continua a morrer por falta de médico.

Se V. Ex." levar a cabo essa reclassificação, digo que arranjará, efectivamente, um pé-de-guerra no distrito da Guarda.

Mais, pela primeira vez, acima dos interesses partidários, vi o interesse regional. Com efeito, todos os deputados e todos os autarcas comungam da mesma aspiração, que é a de não permitir que tal seja levado a cabo.

Neste contexto, gostaria que a Sr." Ministra me esclarecesse sobre se, de facto, essa reclassificação vai ou não ser levada a cabo.

O Sr. Presidente: — Para a Sr.8 Ministra, com certeza que este é só mais um pé-de-guerra, não é verdade? Já há outrosl

Risos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr." Ministra, embora não tenha interesse nenhum e seja só para comparar números, começaria por dizer que quando se fala numa percentagem de 10,2%, mesmo que a Sr.4 Ministra quisesse fazer a comparação, esta só se poderia fazer em relação à percentagem relativa ao ano passado, porque este foi o único ano em que a dotação provisional estava incluída no orçamento do Ministério, enquanto nos outros anos não era assim. De maneira que, a não ser com a do ano passado, não se podia comparar esta percentagem com a da dotação provisional dos outros anos porque nessa altura vinha sempre de fora. Assim, quando falamos da percentagem da dotação provisional, referimo-nos à dos anos anteriores ao ano passado. Quando muito, se a Sr.8 Ministra quiser fazer esse relacionamento, então a verba deste ano ainda foi muito inferior em percentagem à do ano passado.

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Quanto ao problema das novas admissões, a Sr.a Ministra continua a dizer que são apenas 2,6 milhões de contos mas esquece-se de acrescentar que há mais 1,2 milhões que estão inscritos nas outras duas rubricas, como a Sr.a Ministra nos explicou na Comissão. Em relação aos novos distritos e novos serviços, a verba com o pessoal tem mais 1,2 milhões de contos, o que, somado aos 2,6 milhões, dá a verba que a Comissão apresentou como sendo a da Sr.4 Ministra. Mas, se não for assim, faça o favor de nos dizer. Por conseguinte, estas observações eram só em relação aos reparos que a Sr." Ministra fez quanto ao relatório da Comissão.

Quanto ao orçamento propriamente dito, tal como a Sr.8 Ministra também afirma, queríamos começar por dizer que o mal dos nossos hospitais, principalmente dos serviços de urgência, é o mau funcionamento das unidades de cuidados primários. Ora, o que ainda não vemos incluído no orçamento para este ano é uma verba que permita que essas unidades de cuidados primários funcionem bem. Todos os dias se ouvem reclamações das populações dizendo que não têm médico. No sábado tive oportunidade de correr todas as freguesias do concelho de Portel e vi que, no máximo, há consultas três vezes por semana, quando já houve todos os dias, e a maior parte das freguesias só têm consultas duas vezes por semana. Assim, as populações têm de se deslocar muitos quilómetros até ao Centro de Saúde para conseguirem arranjar uma consulta médica, se houver vagas; caso contrário, têm de recorrer ao médico particular. De maneira que acho que é por aqui que se deviam atacar os problemas da saúde, pondo a funcionar as unidades de cuidados primários. A Sr.8 Ministra afirma o mesmo; portanto, queria saber onde estão previstas as verbas para esse bom funcionamento.

Também gostava que a Sr.8 Ministra nos desse uma lista das despesas realizadas, por meses, nos hospitais centrais e distritais, em relação ao ano passado, bem como a previsão daquelas para este ano.

Igualmente gostaria que nos fossem fornecidos os mesmos elementos no que diz respeito às assembleias regionais de saúde, visto que têm uma verba global, já para não mencionar as verbas para os centros de saúde, o que deve ser extremamente difícil. Estes elementos ser-nos-iam úteis.

Em relação ao problema das taxas moderadoras, a Sr.8 Ministra continua a dizer que pensa cobrar 5% das receitas próprias. Também gostaria de saber quais as verbas cobradas este ano, discriminadas por meios complementares de diagnóstico, por consultas, por serviços de urgência.

Quanto aos medicamentos, problema que já foi abordado por todos, a intervenção da Sr.8 Ministra sugere--me umas perguntas. A Sr.* Ministra tenciona alterar a comparticipação a pagar pelos utentes? Será essa uma fonte de financiamento? Será por isso que se prevê este aumento no preço dos medicamentos? Os utentes vão pagar mais pelos medicamentos e as comparticipações vão diminuir?

Em relação ao pessoal, gostaria de perguntar à Sr.8 Ministra que revisões de carreiras é que este governo tenciona fazer em 1987. Vai ou não implementar a politica de dedicação exclusiva? Se sim, com que verbas? E, já agora, gostava de saber quais os mapas de concursos previstos para o ano que vem e quais os especialistas que vão ser colocados nos hospitais distritais e quando.

Em relação ao PIDDAC, Sr.8 Ministra, todos choram e quem não chora fica mal...

Risos.

Mas, queria ainda referir-me à política que a Sr.a Ministra diz que vai implementar este ano e que respeita ao predomínio das grandes áreas metropolitanas, que serão as dotadas com maiores verbas. Mas essas verbas é que não encontramos no PIDDAC. Se, no caso de Lisboa, há uma verba importante para o Hospital do Restelo — nem se trata de saber se o seu funcionamento tem muitos inconvenientes, embora, pessoalmente, ache que são maiores as vantagens — para os novos hospitais, o oriental e o ocidental, que a Sr.8 Ministra continua a dizer que são para construir, a verba é diminuta, nomeadamente a de 37 200 contos para o ocidental.

Referindo-me ao novo Hospital de Loures-Sintra...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde (Baptista Pereira): — Sr. Deputado, Loures--Sintra, não: Amadora-Sintra!

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Amadora-Sintra, peço perdão!

Portanto, referindo-me a esse novo hospital, sei que já houve contactos entre o Ministério e as autarquias locais e que há verbas previstas. Tenho aqui um documento que diz que para a aquisição de terrenos eram necessários mais ou menos 100 000 contos e 200 000 contos para o projecto. Pergunta-se se os novos hospitais continuarão só a ser um plano — e a longo prazo! — como se vê pelas verbas inscritas no PIDDAC, pois não sei para que vão servir 37 200 contos, ou se haverá, realmente, uma dotação maior para a construção destes dois hospitais da área metropolitana de Lisboa.

E, por agora, ficar-me-ia por aqui.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Apenas porei duas ou três questões e, uma delas, digamos que era mais no sentido de fazer um registo, na medida em que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não se encontrava presente na altura em que a Sr.8 Ministra a referiu.

Julgo que valerá a pena clarificarmos o problema da não inclusão das verbas destinadas ao aumento das remunerações do pessoal no orçamento do Serviço Nacional de Saúde. A Sr. Ministra já tinha referido este aspecto em comissão, só que julgo que há uma certa divergência em relação a afirmações do Sr. Secretário de Estado, igualmente na Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Por conseguinte, gostaríamos que ficasse clarificada a questão de não estarem previstas nenhumas verbas para o aumento das remunerações do pessoal no orçamento do Serviço Nacional de Saúde. Isto é, a verba que aqui nos surge deverá ser acrescida de mais 11,5%, números redondos, que estarão na dotação previsonal.

A segunda questão é relacionada com o problema das receitas próprias. Não se trata da questão, que já foi levantada pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, de saber se estão aqui todas as receitas próprias ou se não está a que será constituída pelas receitas dos hospitais e que também gostaria de ver clarificada.

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Concretamente, gostaria de saber se nestas receitas próprias, que aumentam cerca de 5 milhões e meio ou 6 milhões de contos, está incluído o pagamento da ADSE.

A terceira questão é sobre o PIDDAC para 1986 a executar, eventualmente, em 1987. Concretamente, é sobre a tal verba, já referida em comissão, de que haverá cerca de um milhão e quinhentos e tal mil contos que não foi gasto e que o Governo pretende vir a gastar em 1987, sendo um milhão e duzentos e tal mil contos para o Hospital de Coimbra, etc. Pelo que está escrito em alguns relatónos de varias comissões, esse «pedido» — chamemos-lhe assim — que o Governo faz no articulado do orçamento pode não ter receptividade por parte da Assembleia da República. Se, com argumentos varios, assim se verificar, apenas gostaria de chamar a atenção para os riscos que se correm se o Governo não alterar a sua posição, designadamente a da inscrição dessas verbas no Orçamento para 1987. É que se pode correr o risco de o Hospital de Coimbra não vir a ter verba para 1987 por exclusiva responsabilidade do Governo, na medida em que a Assembleia da República não quer cortar a verba, mas, se é para ser gasta em 1987, a Assembleia quer é que aquela fique inscrita no Orçamento para esse ano. Trata-se de um problema que me parecer que deveria ser tido em consideração.

Neste momento, são estas as questões que se me oferecem.

O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra à Sr." Ministra, gostaria de saber se há algum Sr. Deputado que ainda tenha alguma questão para pôr.

Pausa.

Faça favor, Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, agradeço a oportunidade porque queria referir-me a esta questão do artigo 12.° —se não estou em erro quanto à numeração.

É que, na realidade, há duas questões diferentes. A questão que foi posta pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira relaciona-se com a aprovação ou não pela Assembleia do artigo 12.°, porventura em sede de despesas, porque esse artigo se inscreve na votação da Comissão.

Mas, há uma outra questão. É que, na Comissão de Saúde, Segurança Social e Família, surpreendemos por parte do Governo a intenção — que, neste momento, não aprecio em termos substanciais— de reafectar a verba sobrante do PIDDAC de 1986 em termos de a redistribuir. Aliás, como aparece também sugerido na intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira, suponho até que se tratava de concentrar verbas sobrantes numa única iniciativa que seria, precisamente, o Hospital de Coimbra.

Ora bem, para além de porventura não vir a ser aprovado o n.° 2 do artigo 12.°, levanta-se uma outra questão para cujo esclarecimento deveríamos aproveitar a presença aqui do Sr. Secretário de Estado do Orçamento. E que suponho que a redacção que foi proposta à Assembleia não consente essa interpretação. Isto é, não consente a reafectação dessas verbas. Consente; apenas, que as verbas sejam aplicadas no mesmo projecto para que tinham sido inscritas. Ora, o Ministério da Saúde não tem essa ideia. E, realmente, de acordo com o que nos foi dito, o Ministério da Saúde,

da verba de 1 500 000 contos que tinham sobrado, preparava-se para reafectar 1 200 000 contos ao Novo Hospital da Universidade de Coimbra. Se esta interpretação não valer, esse 1 200 000 contos não pode ser reafectado a este Hospital. Essa verba tem de continuar a ser gasta nos vários projectos em que estava inscrita no PIDDAC do ano passado.

Portanto, aproveitava para pôr a questão neste momento à Sr." Ministra, ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento e ao Sr. Secretário de Estado da Saúde, que, aliás, foi quem nos deu a informação.

O Sr. Presidente: — Há mais algum Sr. Deputado que queira pôr alguma questão antes de a Mesa dar a palavra à Sr.a Ministra e também ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que poderá intervir sempre que entender?

Pausa.

Sr.8 Ministra, tem a palavra e boa sorte! São tantas, não é?

Risos.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ranl Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, era apenas para pôr duas questões muito simples, relacionadas com o distrito de Viseu.

Gostava de perguntar à Sr.a Ministra quais são as intenções do Governo no que toca ao novo hospital regional de Viseu que tem sido sistematicamente prometido e sobre o qual constatamos que, no PIDDAC, estão inscritas verbas, ao que suponho apenas para remodelação ou melhoria das suas instalações, mas que, de forma alguma, correspondem ao objectivo anteriormente enunciado de se vir a construir um novo hospital regional.

Por outro lado, no que toca ao Hospital Distrital de Lamego, constatamos que no PIDDAC não existem verbas de qualquer significado nem sequer para obras de ampliação.

De forma que, relativamente a estes dois casos que a Sr." Ministra tão bem conhece e que constituem uma preocupação grande de todo o distrito, gostava de saber as intenções da Sr." Ministra sobre este assunto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Marques.

O Sr. António Marques (PRD): — A Sr.a Ministra conhece perfeitamente a situação da saúde no distrito de Leiria: os problemas inerentes à construção de um novo hospital em Leiria, os inerentes à actualização do velho hospital ou, pelo menos, quanto à dotação de algumas verbas para que este possa funcionar minimamente.

Uma outra grande questão de saúde no distrito de Leiria diz respeito às Caldas da Rainha e ao seu Hospital Distrital. Por motivos que não conhecemos totalmente, este ano não estão previstas quaisquer verbas para este Hospital Distrital. Entretanto, é do conhecimento da Sr.a Ministra que as condições de funcionamento deste e a região que serve nos diriam que talvez

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fossem necessárias bastantes verbas para se poder actualizar o referido Hospital que, já neste momento, necessitava de duplicar a sua capacidade. Mas, ainda assim, a administração do Hospital, no ano passado, iniciou pequenas obras no serviço de urgência, que é completamente caótico. No ano passado, este serviço, que tem uma pequena sala, gastou cerca de 5000 contos numa primeira fase de obras para poder ser dotado de um mínimo de condições de funcionamento. Pois bem, este ano não há qualquer dotação prevista para que, pelo menos, se possa acabar esta pequena obra. Depois de contactada, a administração do Hospital disse-nos que 5000 contos seriam suficientes para esse efeito. Com cerca de 4000 contos para aquisição de equipamento poder-se-ia dotar o Hospital das Caldas da Rainha com um serviço de urgências capaz e não nos esqueçamos que este serve uma grande região.

Outro sistema que está completamente bloqueado naquele Hospital Distrital é o bloco operatório. Possui apenas duas salas, razoavelmente apetrechadas, mas necessita de, pelo menos, mais duas.

Existe um projecto que já está um pouco desactualizado sob o ponto de vista orçamental, mas creio que uma verba da ordem dos 50 000 contos resolveria o problema e esta verba não teria de ser despendida só no ano de 1987. Por exemplo, uma dotação de 20 000 contos para o início daquela obra era mais que razoável e poderia já vir a dotar as Caldas da Rainha de um bloco operatório capaz.

Enfim, não seriam verbas muito grandes, que tivessem reflexos muito importantes neste Orçamento, mas viriam com certeza a dotar aquela unidade hospitalar, que é — repito — verdadeiramente importante para toda aquela região, das condições mínimas para o seu funcionamento.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr, Deputado Valdemar Alves.

O Sr. Valdemar Alves (PSD): — Sr. Presidente, pedi a palavra só para fazer um breve comentário às verbas que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu referiu em relação a Aveiro.

É evidente que não foi contemplada a totalidade das verbas que foram pedidas pela Administração-Geral de Saúde, o que não quer dizer que não tenhamos carências. Todavia, há um pormenor que não queria deixar de colocar aqui.

De facto, apesar de não termos para Aveiro as verbas que foram solicitadas, também é verdade que neste PIDDAC para 1987 aparecem consignadas obras para três novos centros de saúde — Vagos, Sever do Vouga e Ovar —, o que quer dizer que, embora não satisfazendo todos os pedidos, vê-se pela primeira vez a consignação de verbas para o início das obras de três novos centros de saúde concelhios, o que já é, em certa medida, significativo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Vieira.

O Sr. Rui Vieira (PS): — Sr." Ministra da Saúde, queria colocar-lhe o problema de um caso de especial necessidade. Refiro-me ao Hospital de Alcobaça, que está num estado de degradação tal que põe em particular risco a vida dos doentes acamados no caso de acontecer um sinistro, por exemplo um incêndio.

Desía situação dá-nos conta um relatório recentemente efectuado pela Associação Portuguesa de Seguros que refere que, a ocorrer um incêndio naquele Hospital, 80% dos acamados morreriam nesse sinistro. De resto, o Gabinete de Instalações e Equipamentos de Saúde, através de um técnico qualificado, corrobora desta opinião.

O pedido de obras foi devidamente efectuado e V. Ex.a não fez para isso qualquer dotação no PIDDAC para 1987, pelo que gostaria de perguntar à Sr.8 Ministra se não considera que para esta situação, que foi devidamente caracterizada e da qual foi dado conhecimento, devido à sua especificidade, não seria de fazer a dotação pedida em devido tempo pelos responsáveis pela gestão do Hospital de Alcobaça.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Sr. Presidente, dá--me licença que dê uns breves esclarecimentos ao Sr. Deputado Valdemar Alves relativamente à questão de Aveiro que ele colocou?

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, sem querer de maneira nenhuma — e chamo a atenção para isso — fomentar ou criar um precedente, porque não gostaria que isso acontecesse, vou deixar o Sr. Deputado Ferraz de Abreu retorquir à observação feita pslo Sr. Deputado Valdemar Alves, uma vez que efectivamente ele não colocou nenhuma questão à Sr.8 Ministra.

Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abrea.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Esta intervenção deve-se ao facto de ter ficado com receio de que a Sr.Q Ministra se deixe influenciar pelas palavras que acabam de ser preferidas pelo Sr. Deputado Valdemar Alves, porquanto se ele se contenta com pouco em relação ao nosso distrito, eu não.

Assim, mantenho tudo o que referi: as carências são enormes e estão longe de ser atendidas neste PIDDAC. De resto, iremos apresentar propostas nesse sentido.

O Sr. Presidente: — Seguindo a metodologia que se lhe afigurar mais correcta para responder a todas estas questões, tem a palavra a Sr.8 Ministra da Saúde.

A Sr.a Ministra da Saúde (Leonor Beleza): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

O primeiro comentário que gostaria de fazer é o de que naturalmente as verbas atribuídas à saúde, e em particular as que constam do PIDDAC, não correspondem àquilo que o Governo gostaria de apresentar. De facto, o Governo gostaria de dispor de muito mais dinheiro porque o equipamento de saúde e em particular o parque hospitalar do País está em muitos casos em muito más condições.

Aliás, é também por isso que entendemos que deveríamos fazer aquele esforço que referi da retenção pelos hospitais de parte das receitas. Isso é feito também com a intenção de que isso lhes permita fazer algumas obras de pequena conservação, embora não esteja, naturalmente, a referir-me aos grandes investimentos, que, obviamente, não poderiam ser feitos com essas verbas.

De facto, o parque hospitalar do País está em más condições, embora seja preciso não exagerar porque há alguns novos hospitais muito bons, sobretudo fora das grandes áreas metropolitanas, como sabem.

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O que acontece é que é, obviamente, impossível não só resolver estes problemas todos uma vez, como ainda por cima é preciso que tenhamos sempre em consideração que é necessário alcançar um razoável equilíbrio entre as várias regiões do País e que, se em certas zonas o investimento feito nos últimos anos é muito vultoso, isso implica necessariamente que em outras unidades de saúde poderemos ter de fazer alguns sacrifícios.

E posso referir-me, por exemplo, à zona centro do País, que é de longe das três zonas a que tem um melhor parque hospitalar, nomeadamente em termos de número de camas por habitante. Isso significa que, numa adequada repartição dos poucos recursos que possuímos, tem de se acorrer sobretudo às zonas norte e sul, onde, de facto, esse ratio camas/habitante é notavelmente pior do que é na zona centro. Este é apenas um comentário geral.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Oradora: — Em todo o caso, como também já referi, embora as verbas não cheguem, como foi largamente criticado o défice proposto para o Orçamento do Estado pelo Governo, naturalmente que era impossível acorrer a tudo aquilo que de facto são necessidades dos serviços de saúde, o que não vamos ser nós a contestar, até porque a história já é velha e não foi nada que tivesse acontecido durante este último ano.

Por outro lado também, permitam-me que lhes diga, Srs. Deputados, que se em vez de terem ido apenas a meia dúzia de hospitais, ou nem isso, tivessem ido a todos os hospitais do País, teriam visto certamente muitas outras coisas que é preciso fazer.

O Governo não tem nenhuma pretensão de resolver de vez a má situação de muitos hospitais e equipamento hospitalar com o PIDDAC da saúde para 1987. O que tem é de, naturalmente, responder pelas prioridades que foram estabelecidas e pela maneira como emprega os recursos que existem. Uma outra questão é a de saber se esses recursos seriam na totalidade aqueles que desejaríamos. Em todo o caso, em relação ao PIDDAC e a todas as questões que foram formuladas, o Sr. Secretário de Estado dará explicações mais detalhadas, concretamente em relação aos casos focados.

Quanto às observações feitas pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, mais especificamente quanto à verba de «Consumos», aquilo que consta do projecto de orçamento do Serviço Nacional de Saúde que entreguei, como possivelmente terão reparado, não significa em todos os casos a retenção de exactamente 50% pelos serviços de saúde das verbas obtidas através da cobrança de receitas próprias.

Aliás, falei em 50% como um número de referência, mas nem em todos os casos iremos proceder exactamente da mesma maneira. Por exemplo, as unidades de saúde de psiquiatria vão, em princípio, reter mais de 50%, porque como a situação delas também é pior entedemos que devíamos tratá-las de certa maneira com preferência neste ponto.

Agora o que naturalmente acontece é que a verba de receitas próprias está deduzida de certa maneira na transferência global do Serviço Nacional de Saúde, que, em princípio, transferirá 160 800 000 contos e a isso acrescerão, como financiamento do Serviço Nacional de Saúde, 11 558 000 contos de financiamento através de receitas próprias.

Mas em relação ao que será posto à sua disposição, cada grupo de hospitais — referidos no documento que entreguei — disporá não só das verbas que aparecem sob a rubrica «Consumos» atribuída a cada um dos grupos de hospitais, mas também das verbas que aparecem sob a rubrica «Novas admissões, novas actividades, revisão de carreiras». Basicamente aquilo que está atribuído a cada grupo de hospitais resultará da retenção de cerca de metade das receitas próprias desse hospital, o que acresce àquilo que está consignado em «Consumos», que, como referi, destinar-se-á sobretudo a reparações ...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr.a Ministra, dá--me licença que a interrompa?

A Sr." Ministra da Saúde: — Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr.a Ministra, quanto a isso tenho uma dúvida. Fiz umas contas e embora confesse a minha deficiência nessa matéria, somos aqui três parcelas de despesas e depois deduzo--Ihes a receita própria e obtenho uma verba que é igual ao financiamento necessário, sabendo desde já — e isso é um assunto que depois vamos discutir com o Sr. Secretário de Estado do Orçamento — que esta dívida passa para 1988. Portanto a dívida é que é a soma.

Agora, somo a coluna 3, a 4 e as novas admissões, deduzo-lhe a receita própria globalmente e obtenho a coluna 7. Portanto, não compreendo o que isso significa de acrescento em termos de despesas a não ser uma simples consignação de receita. Metade desta receita está directamente consignada ao estabelecimento, mas ela deduz-se de facto das verbas de consumo, não se adiciona. Porque se se adicionasse às verbas de consumo, esta conta que fiz não estava correcta.

A Sr.a Ministra da Saúde: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, o que está sob financiamento necessário é apenas a transferência do Orçamento do Estado.

Vendo o caso dos hospitais centrais, aquilo que eles vão gastar é a verba que está atribuída na coluna 3 «Despesas com pessoal», mais a que está consignada na 4 «Consumos», mais a que podemos encontrar numa coluna que não está numerada, entre a 4 e a 5.

Esses hospitais vão cobrar a verba que está na coluna 5 e cerba de metade do que está nessa coluna e que figura como «Novas admissões, novas actividades, revisão de carreiras», vai ser gasto pelos hospitais.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr.a Ministra, acredito que essa verba vá ser gasta pelos hospitias, simplesmente vai ser gasta por conta da dotação global que a Sr.a Ministra lhes deu nestas três colunas.

Não é nada a somar, é por conta disso, porque depois aparece deduzido para se obter a coluna 7.

Quer dizer essa verba contribuiu para formar essa despesa...

A Sr.a Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, contribuiu para formar a despesa do que está naquela coluna não numerada.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr.8 Ministra, contribui para formar a despesa da coluna que V. Ex." quiser. Simplesmente acontece que contribui por conta

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da soma das três colunas, não além da soma das três colunas. Essa verba constitui receita que, adicionável ao que vem do Estado, à transferência do seu Orçamento, vai fazer face a essa despesa em conjunto.

A Sr." Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, isso é exacto. Aquilo que aparece na tal coluna que não é numerada configura esse tal «por conta» que o Sr. Deputado está a referir.

De facto, não é além daquilo que está nas três colunas, é substancialmente aquilo que está na terceira coluna e isto foi o que eu sempre disse.

Referi este ponto a propósito de um comentário que aparece no relatório da comissão parlamentar, onde se refere que o aumento do consumo dos hospitais centrais e distritais será apenas de cerca de 9% em relação àquilo que calculámos que será em 1986. E foi a esse propósito que disse que não podíamos atermo-nos apenas àquilo que consta da coluna 4 para verificar quais vão ser os consumos dos hospitais, porque aquilo que consta da coluna 5 e que substancialmente significa retenção de parte das receitas reverterá substancialmente para aumento dos consumos dos hospitais.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr.* Ministra, se me dá licença, depois de acabar de a ouvir falar, estava a concluir outra coisa completamente diferente.

É que realmente V. Ex.4 incluiu aqui uma nova coluna...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, será útil concluir essa «outra coisa» ou vamo-nos embrenhar em mais colunas.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, tenho a impressão de que estas questões têm alguma utilidade, na medida em que o Governo encontrou esta resposta, assim como a do PIDDAC sobre a retenção — parece-me que com honestidade — e acho que com honestidade a devemos discutir até final para saber o que tem de real, pois pode haver aqui alguma ilusão, ilusão essa de que, suponho, o Governo comunga, porque surpreende a grande honestidade com que estas coisas estão a ser ditas.

Portanto, acho que vale a pena prosseguir.

A Sr.8 Ministra, este ano, acrescentou uma nova coluna, que não é numerada — e verifico, agora, que a retenção se destina às novas admissões... e como não é numerada seria isso que eu somava. Simplesmente, relacionava as novas admissões com «Pessoal» e não com «Consumos» — só se dantes esta matéria era «Consumos» e não «Pessoal», mas tenho a impressão que não... E essa é que, numa conta grosseira, equivale a metade das receitas próprias. Nessa perspectiva está bem, mas, como a Sr.* Ministra as explicitou todas, já não estava bem outra vez...

Risos.

A Sr." Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, o que tentámos foi destacar aquilo que correspondia a novas actividades do Serviço Nacional de Saúde. Repare que o nome que está nessa coluna não numerada é «Novas admissões e revisões de carreiras».

Bom, «Novas admissões e revisões de carreiras» tem sobretudo a ver com aquilo que está sob o ponto 6 e o resto serão substancialmente novas actividades dos serviços de saúde. É disso que se trata.

Naturalmente que, em alguma medida, isso pode significar pagamento a pessoal. É óbvio que sim, mas o que tentámos foi destacar. Aliás, simultaneamente vamos pedir aos serviços de saúde que administrem essas novas verbas tentando não as utilizar exclusivamente na manutenção daquilo que está, mas fazendo alguma coisa de novo. É essa a intenção do destacamento desta nova coluna e não a intenção de tentar causar dificuldades de entendimento.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Posso interrompê--la de novo Sr.a Ministra?

A Sr.8 Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Então, Sr.8 Ministra, leia o nosso relatório de outra maneira, que suponho ser, também, inteiramente correcta.

Como pode verificar, no nosso relatório louva-se a inclusão dessa coluna «Novas admissões». Simplesmente, nunca as imputámos a «Consumos» e a Sr.8 Ministra diz: «não leiam os consumos tal como aí estão, adicionem-lhe a coluna não numerada». No fundo, vai ser obtida através da retenção de metade das receitas próprias geradas pelas respectivas unidades. Muito bem!

Destacávamos a vantagem de se preverem autonomamente novas admissões e lamentávamos o pouco crescimento dos consumos. Agora, temos uma explicação para esse facto que, realmente, descaracteriza um pouco a nossa observação num sentido e, digamos assim, caracteriza-a no outro.

A Sr.8 Ministra da Saúde: — Já agora, a propósito dos consumos hospitalares — e porque muitas vezes se tem a ideia de que os consumos hospitalares se referem a bens cujos preços evoluem de uma maneira completamente diferente daqueles que servem para a fixação da taxa de inflação —, gostaria de, a título de informação e porque pode ter algum interesse para os Srs. Deputados, deixar aqui registado que no Ministério da Saúde procedemos semestralmente à aquisição por grosso, através da Secretaria-Geral do Ministério, de uma série de bens para consumo hospitalar. E quero dizer aqui aquilo que se passou nesta matéria durante este ano, porque pode ter algum interesse para a avaliação de como as coisas funcionam.

No 1.° semestre de 1986, houve aquisições no valor aproximado de 3 milhões de contos — não é, nem de perto nem de longe, tudo aquilo que os hospitais consomem, refiro-o para que possam ter uma ideia da percentagem em termos de consumo hospitalar —, enquanto o aumento de preços médio, no mesmo período, em relação ao 2.° semestre de 1985 foi de 3%. No 2.° semestre deste ano, em aquisições que também se aproximaram dos 3 milhões de contos, o aumento de preços foi de 0,8% em relação ao 1.° semestre. Estes são bens de consumo hospitalar. Referi o valor global das aquisições que estão em causa e, portanto, podem compará-los com o valor global das aquisições dos hospitais. O que em todo o caso é significativo é que os aumentos de preços, quer de uma vez quer da outra, tenham sido, somadas até, notavelmente inferiores à taxa de inflação deste ano.

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O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Posso interrompê-la, Sr.8 Ministra?

A Sr.8 Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr.8 Ministra, só há uma constatação a fazer: é que o deflacionador utilizado pelo Governo para o consumo público é de 12,4% e registo que o aumento de preços aqui se situa a níveis muito inferiores, o que é curioso.

Portanto, o CDS tinha razão: temos um Orçamento «despesista», afinal de contas!...

A Sr.8 Ministra da Saúde: — Isto era apenas em relação a uma zona dos consumos.

Disse aos Srs. Deputados, no outro dia, em Plenário, que os mecanismos de que dispomos para controlar as despesas do Serviço Nacional de Saúde estão em muitos domínios ainda muito abaixo daquilo que seria razoável. Nessa intervenção também referi, durante alguns momentos, as alterações que em termos quer de gestão do sistema quer de prestação de contas estamos a introduzir e que são absolutamente indispensáveis para que saibamos exactamente onde é que os recursos de que dispomos — sempre poucos — são gastos.

Em relação aos medicamentos, Sr. Deputado Nogueira de Brito, ninguém no Ministério da Saúde tem responsabilidade naquela reportagem a que se referiu e que foi publicada num jornal. Não foi nenhum de nós que disse o que é que ia acontecer.

Neste domínio, não há, neste momento, intenção de rever as coisas como estão, pois queremos ter primeiro que tudo a certeza absoluta de qual foi a eficácia da medida que foi tomada. É óbvio que se, num ponto ou noutro, se vier a verificar que é necessário introduzir correcções, elas serão introduzidas. Nomeadamente, é possível que isso aconteça em relação a certos medicamentos concretos que não são facilmente tratáveis na sistemática utilizada.

De qualquer maneira, não foi nenhum de nós que disse que isso iria ser revisto, nem sequer temos neste momento qualquer intenção firme de o fazer.

Em relação ao PIDDAC, o meu Secretário de Estado Adjunto vai responder mais detalhadamente em relação as considerações que foram feitas. Quero, no entanto, fazer uma referência sobre a concentração de meios nos hospitais centrais ou nos outros.

Os hospitais centrais, excepto no que respeita ao Hospital de Coimbra, foram relativamente abandonados nos últimos anos, por isso também entendemos que é preciso fazer um esforço especial nos hospitais centrais, o que não tem a ver com qualquer ideia de afastar a noção de que é nos hospitais distritais que hoje temos de investir em termos de melhorar o seu funcionamento. A própria viabilização dos hospitais centrais tem muito a ver com a intenção de não lhes «despejar» aquilo que os hospitais distritais poderiam tratar.

Mas em termos de situação da rede hospitalar, avaliamos hoje como pior a situação de muitos dos hospitais centrais do que a da generalidade dos hospitais distritais.

Em relação ao artigo 49.° da proposta de lei do Orçamento do Estado, relativo aos desagravamentos fiscais que propusemos para os chamados seguros de saúde, não há, de momento, qualquer ligação entre isto

e aquilo que foi proposto ao nível das despesas do orçamento do Serviço Nacional de Saúde. Entendemos que há que fazer a experiência e ver quais são os respectivos resultados.

Já tive ocasião de explicar por que é que o Governo propôs esta alteração e o respectivo significado. Julgamos que, a algum prazo, ela se deverá traduzir em modificações nas despesas do Serviço Nacional de Saúde, mas queremos ter primeiro alguma certeza em relação àquilo que virá a acontecer.

O Sr. Deputado Vítor Ávila perguntou-me se não seria mais correcto incluir no PIDDAC as verbas com equipamento dos hospitais ou com obras de manutenção. Ora bem, é, por vezes, um pouco difícil distinguir entre uma coisa e a outra. Naturalmente que me estou a referir a obras de conservação, que são obras de administração ordinária, para utilizar um termo jurídico — aliás, sou jurista, como talvez saibam.

A administração ordinária engloba obras de pura conservação dos imóveis e a nossa noção é a de que, em relação a um número importante de hospitais, essa é, de facto, uma necessidade.

Por outro lado, em relação a pequeno equipamento, ele pode também corresponder a uma aquisição de administração ordinária.

Não há nenhuma necessidade formal de incluir essas verbas no PIDDAC. Já agora, permita-me que lhe diga que há uma prática muito antiga no Serviço Nacional de Saúde. Não nasceu agora que parte das verbas atribuídas para funcionamento normal dos serviços sejam despendidas, sobretudo, em pequeno equipamento. Isso já vem de há muito tempo, não é nada de novo.

O que pretendemos é apenas dar aos hospitais um incentivo no sentido de poderem reter parte daquilo que cobram para cobrarem melhor e poderem, também, gastar mais alguma coisa. Parece-me que não haverá aqui nenhuma modificação substancial de comportamento em relação àquilo que já, habitualmente, é pago por verbas de funcionamento.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): — Permite-me que interrompa a Sr.8 Ministra, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado. No entanto, agradeço-lhe que seja rápido, porque se todos os Srs. Deputados a quem a Sr.8 Ministra da Saúde responde lhe colocarem novas questões, não saímos hoje daqui.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): — Não é propriamente para colocar uma nova questão, Sr. Presidente. É apenas para, no âmbito da resposta que me foi dada, tentar clarificar o sentido da minha intervenção. Ou seja: não ponho em causa que são necessárias obras de manutenção e conservação, tal como também não ponho em causa que isso se tenha passado anteriormente.

A questão que coloco é a de que, lá porque se tenha passado anteriormente, isso não quer dizer que se continue a passar no futuro ou que se deva passar no futuro.

Do meu ponto de vista, se se tratar de obras de conservação plurianual, devem ser inscritas no PIDDAC e não em gastos ordinários de conservação corrente.

Assim, também os equipamentos, independentemente do seu montante, desde que tenham uma vida útil superior a um ano, deveriam ser considerados num plano de investimentos, como seria o PIDDAC.

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Isto não é só uma questão contabilística; é um problema de as verbas retidas pelos hospitais serem afectadas a utilizações específicas. E se fica tudo no âmbito de um fundo de maneio, qualquer dia poderá ser adquirido equipamento sem qualquer controle por parte da Assembleia da República, que deveria controlar as despesas de capital.

Era esta a questão e com ela não estou a pôr em causa nem a justiça da utilização, nem o facto de já anteriormente se ter passado assim.

A Sr." Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, de qualquer maneira, não entendi que o problema era o da justiça da aquisição, pois é óbvio que isso não estaria em causa. O que estaria em causa seria o processo formal, digamos, pelo qual se procede.

Ó Sr. Deputado, é inevitável que, nos estabelecimentos de saúde e, em particular, nos grandes estabelecimentos, seja necessário, muitas vezes, acorrer a obras de conservação e de aquisição que não podem, pura e simplesmente, ser previstas em PIDDAC. Infelizmente, muitas vezes surge a necessidade de substituir equipamento, que se estragou pura e simplesmente, ou de se proceder a obras elementares de conservação dos imóveis.

Não se trata, pois, de obras de conservação plurianuais ou de investimentos plurianuais, não se trata de nada disso. Entre a substituição da lâmpada e a compra de um equipamento extremamente sofisticado — de angiografia digital ou de um TAC ou do que seja — há uma infinidade de pequenas aquisições a que sistematicamente os serviços de saúde devem poder ter recurso e que, naturalmente, saem pelo orçamento de funcionamento, independentemente de nalguns casos poder haver algum «resvalar» entre uma coisa e outra. Há uma ampla zona em que é perfeitamente legitimo que esse tipo de despesas se faça pelo orçamento de funcionamento e, naturalmente, é em relação a essas que pensamos que convém dar aos hospitais alguma margem para que, através da sua boa cobrança, possam melhorar de alguma maneira o funcionamento dos respectivos serviços.

As outras questões levantadas em relação ao PIDDAC serão respondidas pelo meu Secretário de Estado Adjunto.

Quanto a medicamentos —e com isto respondo à questão posta pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso—, quero dizer que, como sabe, aquilo que a Assembleia vota é a transferência global do Orçamento do Estado para o orçamento do Serviço Nacional de Saúde e não tem sido prática que a Assembleia vote especificamente as várias rubricas do orçamento do Serviço Nacional de Saúde. Ou seja: é votada uma transferência global e o Governo tem tido liberdade para, dentro dessa transferência, administrar da maneira que melhor puder e souber as verbas que lhe são atribuídas.

Neste sentido, não é possível nem rigoroso falar, minimamente, em desvios. O que naturalmente acontece — e eu vim, apenas, praticando aquilo que, segundo julgo saber, era prática anterior— é que o Governo apresenta uma justificação de como tenciona gastar aquilo que será a transferência do Orçamento do Estado para o orçamento do Serviço Nacional de Saúde.

Na realidade, em 1986 houve sobreavaliação das despesas com pessoal, mas, além disso, houve também uma política cuidadosa no sentido de certos gastos com pessoal serem reduzidos àquilo que era, de facto, necessário.

Houve, por exemplo, um aspecto em relação ao qual fizemos um esforço muito particular, que tem a ver com o trabalho extraordinário — aliás, isso já tinha sido iniciado pelo meu antecessor, que estabeleceu restrições à utilização do trabalho extraordinário nas unidades de saúde, nomeadamente nos hospitais. Tenho vindo a prosseguir e a incentivar essa política no sentido de haver a melhor gestão possível dos recursos que o próprio hospital tem dentro. Há, por vezes, um recurso injustificado, quer a trabalhadores de fora do hospital, nomeadamente das administrações regionais de saúde, para resolverem problemas de dentro do hospital, quer, por vezes também, aos trabalhadores do próprio hospital.

Aqui é obviamente uma medida de boa gestão utilizai o melhor possível os recursos de que, neste momento, o Serviço Nacional de Saúde já dispõe.

Em alguma parte por medidas de contenção, mas também porque tinha havido sobreavaliação das necessidades em termos de pessoal, foi possível que nesta matéria se tivesse gasto substancialmente menos do que aquilo que estava previsto.

Em relação aos medicamentos, também já tive ocasião de dizer que o Governo tinha à sua disposição mecanismos que faziam gastar menos, mesmo menos, em medicamentos.

Vários Srs. Deputados me perguntaram se o Governo tenciona ou não descer o nível de comparticipações.

O que aconteceu foi que, simultaneamente, tinha havido sobreavaliação da modificação, em termos de comparticipações, que tinha sido realizada com efeitos a partir de Outubro de 1985. Como os Srs. Deputados certamente sabem, em 1 de Outubro de 1985 entraram em vigor alterações no nível das comparticipações que tinham sido sobreavaliadas e que se traduziram num aumento brutal da despesa em 1986, isto até por indução nos consumos. O Governo entendeu que não devia modificar o nível das comparticipações, uma vez que tinha verbas no orçamento do Serviço Nacional de Saúde que podia afectar ao consumo de medicamentos.

Na verdade, o que se passou foi que se gastou mais numa rubrica do que aquilo que tínhamos pensado e menos noutra. Portanto, não houve nenhuma espécie de desvios.

Quanto aos resultados que o Sr. Deputado imputou ao redimensionamento das embalagens...

O Sr. Lopes Cardoso (PS): — Dá-me licença que a interrompa, Sr.* Ministra?

A Sr.° Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): — Sr.8 Ministra, não se trata aqui, nem eu referi isso com qualquer sentido pejurativo, de ter havido ou deixar de haver desvios. De facto, houve uma transferência de verba — e, repito, não há aqui nenhum conteúdo pejurativo nem nenhuma acusação ao Governo no sentido de que não devia ou podia ter feito a transferência — que resultou do facto de haver, como disse a Sr.8 Ministra, uma sobrevalorização das despesas com pessoal e uma sobrevalorização das despesas com medicamentos, permitindo assim um equilíbrio global.

Em relação ao actual Orçamento, a Sr.8 Ministra invocou a garantia de que as previsões relativas às des-

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pesas em medicamentos estavam cobertas pela «gestão rigorosa», pelo redimensionamento das embalagens de medicamentos e pelas comparticipações.

Voltando a essa «gestão rigorosa», pergunto-lhe se este ano, em que não haverá, pressuponho, sobreavaliação de despesas de pessoal — aprendeu-se alguma coisa...—, não haverá sobreavaliação de despesas em medicamentos. Para além deste aspecto particular, a gestão será tão «rigorosa» quanto o foi no último ano? Como é que este ano é possível dispensar, da forma como se dispensa, essa cobertura que resultou da transferência?

Em relação a este primeiro ponto, que seria uma das respostas a uma insuficiência de provisão, pela minha parte não fiquei esclarecido. E quanto às outras questões fico a aguardar as respostas da Sr.0 Ministra.

A Sr.a Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, em relação ao comentário que fez, dizendo que se aprendeu «alguma coisa», dir-lhe-ei que se aprendeu alguma coisa em tudo e não não só na gestão das verbas de pessoal. Naturalmente que essa «alguma coisa» que se aprendeu há-de poder resultar em melhor gestão, senão seria, de facto, difícil gerir as verbas do Serviço Nacional de Saúde.

Sr. Deputado, repare que estamos a falar da gestão de um orçamento que em 1986 foi de cerca de 160 milhões de contos! É não podemos perder a noção da globalidade da verba com que estamos a mexer nem podemos sobreavaliar excessivamente que se gastou mais num sítio ou num outro. A verba global com que estamos a mexer, concretamente no que respeita à transferência do OE, em relação à qual a Assembleia da República entendeu que deveriam ser transferidos 150 milhões de contos em 1986, é uma verba de uma importância que torna, de certa forma, menos grave que não seja rigorosamente cumprido o projecto que tinha sido apresentado. Projecto esse que, repito, era apenas um ensaio para o Governo demonstrar que considerava suficiente e adequada a verba que pedia, mas que depois não era restritivo, possibilitando a movimentação de verbas.

Quando falamos em «gestão rigorosa» do Orçamento, naturalmente referiamo-nos à adequação entre as despesas que temos de fazer e os meios de que dispomos e além disso também nos referimos à possibli-dade de transferir verbas de umas rubricas para outras, uma vez que isso é legalmente possível quando, perante a evolução das coisas, for razoável.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): — Sr.a Ministra, se me permite, gostava de lhe dizer que não estou a fazer nenhuma crítica ao Governo em relação às transferências que eventualmente tenham feito, além de que este não seria o momento oportuno para o fazer.

O que para mim continua por esclarecer é o seguinte: como é que uma gestão mais rigorosa do que a do passado, apesar de tudo quanto aprendemos, permite tranquilamente pensar que um acréscimo nominal de cerca de 1 % para os medicamentos permite cobrir as despesas relativas aos medicamentos no ano de 1987?

A Sr." Ministre da Saúde: — Sr. Deputado Lopes Cardoso, do ponto de vista do Governo isso será suficiente porque, tal como já disse, é possível que venhamos a introduzir outras medidas.

De qualquer forma, antes do fim de Janeiro de 1987, é impossível ter uma previsão correcta dos efeitos do redimensionamento das embalagens.

O Sr. Deputado referiu-se a determinadas alterações nos preços. Ora, se eventualmente essas alterações se estivessem a verificar, elas eram perfeitamente ilegais, uma vez que o despacho que determinou que se procedesse ao redimensionamento das embalagens determinou também restrições na modificação dos preços. Talvez seja necessário em sede de inspecção verificar se alguma coisa irregular se está a passar, mas é completamente impossível que esses efeitos, em termos de subida de preços, se tenham vindo a verificar.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Sr.8 Ministra, isso significa que os números que vêm nesta notícia estão todos errados e que nada disto é verdade?!

A Sr." Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, confesso que não fui eu que fiz a notícia. No entanto, devo dizer-lhe que estamos a verificar se realmente existem irregularidades em curso e, se existirem, resolver-se-á esse problema em sede de inspecção.

O despacho que determinou o redimensionamento das embalagens naturalmente que teve o cuidado de dizer em que termos é que a subida de preços se podia verificar, porque senão poderíamos perder tudo aquilo que eventualmente tivéssemos obtido de outra maneira.

Em princípio, não vai haver descida ao nível das comparticipações, pois não há nenhuma intenção de se proceder dessa maneira.

Quando falei em selectividade, referia-me àquilo que é comparticipado ou não. Enfim, são assuntos que estamos a estudar, e dentro de pouco tempo, ver-se-á o que é efectivamente necessário fazer. Porém, o Governo admite que haja uma lista excessivamente ampla de medicamentos que vão ser comparticipados.

O Sr. Deputado Ferraz de Abreu colocou questões acerca do PIDDAC, às quais o Sr. Secretário de Estado depois responderá.

O Sr. Deputado Santana Maia, num âmbito que de facto é perfeitamente curial, colocou questões que têm a ver com o ensino de enfermagem e respectiva situação. Devo dizer-lhe que, do nosso ponto de vista, o sistema que tem vindo a ser aplicado e que, aliás, ainda o foi este ano, do numerus clausus, não resulta, pelo que é necessário modificá-lo. Obviamente que o problema também tem a ver com o Estatuto dos Docentes, no entanto, apercebemo-nos de que o numerus clausus tem imposto restrições excessivas.

De qualquer forma o facto de o numerus clausus ser observado não é tão grande e, felizmente, noutras zonas ele tem sido «furado». Naturalmente, seria bom que ele fosse cumprido, mas coloca-se o problema de saber se ele é ou não adequado.

Relativamente ao Hospital da Guarda, devo dizer--lhe que ainda ninguém o classificou. Pelo menos eu ainda não o fiz e receio que não haja alguém com competência para o fazer. Portanto, o Hospital da Guarda não está classificado no âmbito da nova classificação que o Governo adoptou, ou seja, a classificação de hospitais por níveis, classificação essa que está inserida na carta hospitalar.

Até este momento só saiu a qualificação, se assim se quiser chamar, de uma série de hospitais de nível 1. Os hospitais de nível superior ainda não foram qualificados.

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Portanto, volto a dizer, não há nenhuma qualificação para o Hospital da Guarda e só quando a houver é que podemos colocar o problema da reclassificação.

O Sr. Santana Maia (PS): — Sr.a Ministra, dá-me licença que a interrompa?

A Sr." Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Santana Maia (PS): — Sr." Ministra, eu baseei a minha exposição numa outra dirigida a V. Ex.a pela gerência do Hospital da Guarda, em 19 de Novembro de 1986, em que manifestava esse receio.

Pergunto-lhe: poderá V. Ex.B garantir-me, neste momento, que não irá reclassificar o Hospital Distrital da Guarda?

A Sr.a Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, de momento, tudo o que posso garantir é que o vou classificar e depois logo se verá. O problema da reclassificação não se coloca, pois ele ainda não está classificado!

O Sr. Santana Maia (PS): — Sr.a Ministra, o que lhe pergunto é se não vai reclassificar o Hospital Distrital da Guarda.

A Sr.a Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, repito, vou classificá-lo. Ele ainda não está classificado!

O Sr. Santana Maia (PS): — Mas irá mantê-lo dentro do nivel 3, nível 2, nível 1...?

A Sr. Ministra da Saúde: — Não está em nível nenhum Sr. Deputado. Não foi colocado em nível nenhum e enquanto não o for não é possível reclassificá-lo!

Sr. Deputado, já agora gostava de lhe dizer que a carta hospitalar não tem nada a ver concretamente com o Hospital Distrital da Guarda, que, como lhe disse, não está classificado, mas tem a ver com muitos problemas que naturalmente vamos ter com a questão das classificações das unidades hospitalares.

A carta hospitalar visa justamente tentar alguma disciplina no âmbito do planeamento dos hospitais, no âmbito daquilo que é o nível de cuidados que cada hospital presta. Temos tido excessivos exemplos de situações em que as obras são feitas ao sabor de várias pressões e influências e depois temos de pôr determinadas unidades de saúde a funcionar, quando era muito mais adequado e razoável que, em vez daquela concreta unidade de saúde, tivesse sido colocada uma outra. Toda a gente sabe que isso acontece — aliás, não é minha a expressão «elefantes brancos» em relação a hospitais...

Sr. Deputado Santana Maia, é evidente que tentar colocar alguma espécie de disciplina na forma como as unidades de saúde estão a funcionar vai, em muitos casos, encontrar dificuldades por parte de muita gente, por parte das populações ou de quem quer que seja, porque naturalmente as pessoas desejariam sempre que o hospital que têm mais perto de casa fosse do nível mais elevado possível. É evidente que esse tipo de dificuldade vai existir. É justamente com consciência disso e de que, apesar das dificuldades, é preciso pôr ordem num sector onde infelizmente, a esse nível, tem havido

pouca que — e estamos sempre aqui a «chorar» porque o hospital x é demasiado grande, o hospital y foi sobredimensionado, etc. — estamos a elaborar a caria hospitalar (que está quase pronta) e a tentar classificar as unidades de saúde e aquilo que é razoável existir em cada zona. Isto tendo em atenção os recursos que neste momento temos e aquilo que é razoável aspirar no nosso país, no estádio de desenvolvimento em que nos encontramos e com as possibilidades que neste momento temos.

Por isso, Sr. Deputado, permita-me que lhe diga — e repito que isto não tem nada a ver com o Hospital Distrital da Guarda, pois em relação a este não faz sentido falar em reclassificação, uma vez que não houve classificação — vai haver casos em que surgirá algum descontentamento em relação à classificação que for feita e às valências que reconhecemos que cada hospital deve ter.

Mas, paciência, ou há alguma ordem num sector onde ela tem sido muito difícil de estabelecer, ou então vamos continuar a «chorar», porque há unidades que foram sobredimensionadas e que custam excessivamente a pôr a funcionar em termos de uma adequada repartição de recursos.

O Sr. Santana Maia (PS): — Sr.a Ministra, permite--me que a interrompa novamente?

A Sr." Ministra da Saúde: — Faça favor.

O Sr. Santana Maia (PS): — De facto, compreendo essa ordem, essa metodologia levada a cabo por V. Ex.a, mas peço-lhe encarecidamente que não beneficie outras regiões em detrimento de uma região do interior, uma região do Terceiro Mundo, uma região carenciada do País e que é a região da Guarda, uma região fronteiriça.

É preocupação da gerência do Hospital Distrital da Guarda que não só a valência de pneumologia —que, há mais de 100 anos, é praticada naquele Hospital—, como outras venham a desaparecer do Hospital Distrital da Guarda.

Aproveito a oportunidade para transmitir a V. Ex.a que se realizou, no sábado, uma reunião entre cinco deputados eleitos pelo distrito da Guarda, pertencentes ao CDS, PSD e PS, e autarcas do distrito. Estes últimos pediram-nos que transmitíssemos a V. Ex.a a preocupação que têm no sentido de que esse Hospital não perca as valências, atendendo a que se trata de um hospital de fronteira. Isto porque nessa zona há um elevado grau de sinistralidade e porque as vias rápidas Aveiro/Vilar Formoso e Bragança/Castelo Branco irão intensificar ainda mais o fluxo rodoviário, pelo que haverá um maior grau de sinistralidade.

Pedíamos, pois, a V. Ex.a que, de facto, se mantenham as valências actuais no Hospital Distrital da Guarda.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Santana Maia, creio que a preocupação ficou transmitida. Agora, seria preferível que avançássemos um pouco, pois, tendo este assunto a sua importância, não é todavia um assunto que possa ser discutido no âmbito desta reunião.

De modo que a Sr.a Ministra da Saúde ficou certamente com essa preocupação, e eu agradecia que pudéssemos seguir em frente, pois há ainda muitas questões para responder.

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O Sr. Santana Maia (PS): — Sr. Presidente, agradeço as suas palavras, mas não podia deixar, nesta oportunidade que tenho de colocar este problema candente à Sr.8 Ministra da Saúde, de manifestar esta legítima aspiração.

O Sr. Presidente: — Fez muito bem, Sr. Deputado. Faça favor de continuar, Sr.8 Ministra.

A Sr.8 Ministra da Saúde: — O Sr. Deputado Vidigal Amaro teceu algumas considerações em relação à comparação entre a verba para o Serviço Nacional de Saúde em 1986 e 1987. De facto, em 1986, pela primeira vez, ao que creio, a verba estava incluída no Serviço Nacional de Saúde.

O que quis apenas dizer era que as verbas não eram rigorosamente comparáveis, porque havia um elemento que faltava em relação a 1987.

Quanto às considerações que teceu sobre os cuidados primários, é óbvio que essas preocupações são as minhas — como, aliás, já tive ocasião de referir — em grande parte dos cuidados primários, pois viabilizam o funcionamento dos cuidados hospitalares. E nesta zona temos, sobretudo, estado a investir na formação do pessoal, com a consciência de que muito daquilo que tem a ver com o bom funcionamento dos cuidados primários tem também a ver com o prestígio que o pessoal de saúde que lá está colocado possa alcançar junto das populações que serve.

Por outro lado, e no que respeita a eventuais faltas de médicos, o Sr. Deputado sabe, talvez melhor do que eu, das dificuldades da colocação de médicos na periferia. Vão agora abrir de novo concursos para clínica geral, em que espero que seja possível colmatar seriamente as dificuldades de algumas zonas do interior em relação à colocação de médicos de clínica geral.

No entanto, deixe-me que lhe diga também, Sr. Deputado, que é nossa convicção ser preciso repensar o sistema de trabalho dos médicos de clínica geral, regulamentado hoje pelo Decreto-Lei n.° 310/82, na medida em que ele não favorece excessivamente uma adequada utilização do trabalho desses médicos.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Eu não falei dos médicos, não disse que não havia médicos; eles estão lá!

A Sr.8 Ministra da Saúde: — Aí está. Pronto, é isso.

Sobre as taxas moderadoras, Sr. Deputado, nós não temos, neste momento — como sabe, a respectiva cobrança começou apenas, nos termos novos, em 15 de Julho de 1986 —, dados suficientes sobre a parte que as taxas moderadoras têm nas receitas próprias do Serviço Nacional de Saúde — suponho que já tinha referido isso.

De facto, como disse várias vezes, o nível de avaliação das contas dos vários serviços do Serviço Nacional de Saúde não nos permite, neste momento e com suficiente precisão, saber exactamente qual é o respectivo impacte nestes últimos meses, que, aliás, são os meses mais recentes. Portanto, aquilo que referi á apenas uma estimativa que fazemos, embora não possamos ainda, infelizmente, compará-la com números que tenhamos.

No que diz respeito a comparticipações, não tencionamos alterá-las — já o disse.

Quanto à revisão de carreiras e modificações desse tipo, ainda é cedo para que possa fornecer pormenores sobre essa questão.

Relativamente aos concursos paramédicos, foram, como certamente sabe, abertos recentemente, nas três zonas do País — norte, centro e sul —, uma série de concursos para assistentes hospitalares. Tais concursos estão, neste momento, todos em curso, e suponho que foi praticamente aberto tudo aquilo que havia para abrir. Com efeito, admito que haja ainda alguma coisa que deva ser feita, mas, substancialmente, estão neste momento em curso concursos para colocação de assistentes hospitalares nos quadros dos hospitais de todo o País.

Em relação à dedicação exclusiva, isso tem a ver com a modificação das carreiras e é um assunto que estamos ainda a estudar, Sr. Deputado.

A noção que temos é que há certas coisas que não podemos fazer de repente. Aliás, presumo que quando pôs o problema da dedicação exclusiva colocou sobretudo a questão em relação aos médicos, pois será em relação a eles que o problema é, porventura, mais importante.

Há uma coisa que já agora lhe refiro: temos sido extremamente receptivos em relação à possibilidade de acumulação dentro do Serviço Nacional de Saúde. O Sr. Deputado pôs a questão num âmbito mais vasto, mas dentro do Serviço Nacional Saúde ou entre o Serviço Nacional de Saúde e outros exercícios profissionais, em relação aos quais a intervenção do Ministério da Saúde seja legalmente necessária, a prática do Ministério tem sido extremamente restritiva. Com efeito, só são autorizadas as acumulações quando, na prática, é manifestamente viável que os cargos sejam acumulados, o que anteriormente não aconteceu sempre.

Por outro lado, é necessária a demonstração, por parte dos serviços em causa, de que é mesmo necessário aos serviços que essa acumulação exista. E naturalmente que está por detrás disto a consciência de que, perante a possibilidade de que haja, dentro de algum tempo, médicos desempregados, não tem nenhuma justificação que se permitam as acumulações para além daquilo que é razoável.

Em relação à dedicação exclusiva, a noção que temos é que só é possível avançar decididamente numa coisa desse tipo sobretudo em relação ao futuro. Isto porque, dada a prática posterior — o actual panorama existente nos serviços de saúde e a situação pessoal dos médicos que estão no Serviço Nacional de Saúde —, é extremamente difícil pensar que podemos, a curtíssimo prazo, avançar numa política muito ambiciosa em termos de obrigatoriedade — ou algo parecido — de dedicação exclusiva. Contudo, é possível fazer isso no futuro; é possível, sobretudo, fazer isso para aqueles que estão a começar, e estamos a encarar essa possibilidade.

Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira relativamente à ADSE, naturalmente que está cá a ADSE, pois é, de certa maneira e quando pensamos em subsistemas, o subsistema por excelência — não é o único, mas é sobretudo nesse que estamos a pensar.

E é tudo, Sr. Presidente. Se permitir agora que o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Saúde responda às outras questões, ele fá-lo-á.

O Sr. Presidente: — Certamente, Sr.8 Ministra. Tem então a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Saúde.

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da

Said® (Baptista Pereira): — Sr. Deputado Nogueira de Brito, agradeço-lhe a oportunidade de me ter feito uma pergunta a que sou especialmente sensível, no sentido de saber se o PIDDAC é uma lista de empreendimentos — estes ou outros quaisquer — ou se obedece a um critério (ou pelo menos tende para isso).

Devo dizer-lhe que sim, que obedece a um critério. Tal critério pode ser discutível, mas só gostaria de lhe dizer, muito rapidamente, pois não disponho de tempo suficiente para aprofundar, que houve realmente uma orientação neste PIDDAC, pois ele exprime uma determinada preocupação do Governo em relação a determinadas áreas que identificámos — e não falo só em áreas do ponto de vista territorial, mas também em áreas de intervenção.

Posso dizer-lhe que tivemos a preocupação de promover o reforço de alguns grupos vulneráveis, nomeadamente no âmbito da saúde mental e dos cuidados materno-infantis. Tivemos uma preocupação de melhorar a rede de serviços e de, fundamentalmente, corrigir ou tentar corrigir, ainda que o horizonte temporal de um ano seja curto, algumas assimetrias importantes que se verificam em Portugal — e quando me refiro a essas assimetrias estou a referir-me, com várias vezes foi já aqui salientado, as áreas metropolitanas.

Com efeito, as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto são áreas que correspondem a metade da população portuguesa e que têm sido extraordinariamente esquecidas nos últimos 30 anos. Neste sentido — e também já disse isto várias vezes —, recordo-lhe que os últimos investimentos importantes nas duas áreas metropolitanas se realizaram nos anos S0 e que isso foi, portanto, determinante em relação ao Governo, para que tomasse, este ano, determinadas medidas respeitantes à distribuição das verbas que lhe eram permitidas.

Um outro aspecto ainda diz respeito à humanização dos serviços, o qual foi outro aspecto que nos interessou especialmente.

É evidente que poderíamos citar outras áreas em que procurámos que o PIDDAC exprimisse esses nossos anseios, que se basearam, como lhe disse, numa identificação de problemas. Talvez não o tenhamos conseguido inteiramente, mas essa preocupação existiu.

Se, concretamente, se verificar que, em relação à área metropolitana de Lisboa, ela representa 47 % do investimento do PIDDAC, ou seja, 4 474 000 contos, verá que isso se exprime aqui no PIDDAC.

Em relação à área metropolitana do Porto, que tem, na sua globalidade, em cuidados de saúde primários e hospitais, cerca de 1 083 000 contos, tal corresponde a 11,4 % do investimento.

Quero dizer ao Sr. Deputado que é preciso não esquecer um pormenor importante: é que no ano que vem, em 1988 — portanto, em relação a 1987 —, poderá verificar que os investimentos, nomeadamente nas áreas hospitalar e de cuidados de saúde primários, aumentarão substancialmente. Isto porque este ano lançámos determinados projectos, e, no primeiro ano do seu lançamento, não temos capacidade para gastar mais dinheiro. Se assim não fosse, obviamente que teríamos atribuído mais verbas à área metropolitana do Porto.

Em relação a uma diminuição da verba atribuída aos Hospitais da Universidade de Coimbra... Foi outra pergunta que me fez, não é verdade?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, realmente surpreendia, na redução da verba para o novo hospital, essa linha política de preferência pelas áreas metropolitanas. Agora, é verdade que a verba do hospital, que estava prevista no PIDDAC do ano passado, desapareceu praticamente este ano.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, conforme tive oportunidade de expor, quando abordámos este assunto na Comissão Parlamentar, o problema de Coimbra foi o seguinte: quando nós — penso que no bom sentido — verificámos que haveria verbas sobrantes, que não podíamos nem conseguíamos gastar este ano em relação ao que estava previsto, do PIDDAC de 1986, pretendemos ser realistas. Assim, fizemos este raciocínio simples: bom, se não conseguimos gastar estas verbas — e devo dizer-lhe que, ao nível da Direcção-Geral das Construções Hospitalares, nunca tinha havido, que seja do nosso conhecimento, esta preocupação de ir buscar todos os dinheiros que, pelas razões mais diversas, não podem ser gastos no ano a que estão atribuídos, e podermos canalizá-los (pensamos que no cumprimento e no respeito da lei) para outros empreendimentos —, utilizámos a possibilidade que unhamos de, perante uma realidade que se nos deparava — haver dinheiro que não gastaríamos em 1986 —, poder financiar concursos que podiam ser abertos imediatamente.

Há aqui um ponto que gostaria também de fazer ressaltar: todas as verbas canalizadas para Coimbra dizem respeito a concursos de equipamento, que podem ser imediatamente lançados porque estão prontos para isso — e isso é importante. Não se trata, portanto, de deferir para 1987 verbas que ficam cativas no hospital, mas de concursos que o hospital pode imediatamente lançar.

Então, poderíamos libertar verbas em 1987 e ir financiar outros projectos, fazendo assim uma melhor gestão e podendo ainda mobilizar recursos para outros empreendimentos que, de outro modo, ficariam prejudicados.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da

Saúôs: — Faça favor, Sr. Deputado.

Q Sr. Noguera de Brito (CDS): — Bem, Sr. Secretário de Estado, então, contando nós aqui com a presença do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, podemos deixar este assunto definitivamente esclarecido.

O que acontece é que há uma reafectação de verbas em 1986 — isso é possível, é correcto e nós sabemos disso. Portanto, serão concursos que serão lançados e adjudicados ainda este ano, havendo, quanto muito, um período complementar em 1987, não é verdade?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Exacto, Sr. Deputado, é isso mesmo.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, já agora dá-me licença que o interrompa também?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, as verbas serão despendidas quando? O concurso será feito agora, mas quando é que as verbas serão despendidas — em 1986 ou em 1987?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, o nosso interesse é que elas sejam despendidas em 1986, pois, desse modo, pagaremos a pronto e escusamos de pagar juros de mora e outros encargos que resultarão do não pagamento a pronto. Portanto, o que interessa é, realmente, lançar os concursos este ano para serem pagos este ano.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, então, se é para serem lançados e pagos este ano, não há necessidade do tal artigo, pois está autorizado a fazer essa despesa pelo orçamento de 1986. Quanto muito, pode pedir autorização para fazer a transferência de um projecto para o outro.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado do Orçamento, quer fazer o favor de esclarecer este ponto?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Bem, eu compreendo a questão, e o Sr. Deputado Octávio Teixeira tem razão naquilo que está a dizer. Simplesmente, o artigo 12.° não serve bem para isso. O artigo 12.° serve fundamentalmente para determinados projectos, nos quais os respectivos empreiteiros se atrasaram.

Como o Sr. Deputado sabe, de acordo com a lei, para serem pagas por conta das verbas deste ano, as despesas têm de ser autorizadas até ao fim do mês de Novembro e a folha tem de ser processada até 30 de Dezembro, para que, depois, possam ser pagas, ainda em termos de tesouraria, até ao dia 14 de Fevereiro.

O que se passa é que há duas perspectivas, facto que tem provocado, nos últimos anos, uma certa indisciplina.

Com efeito, para utilizar ainda as verbas de 1986, antecipa-se muitas vezes o pagamento aos empreiteiros, mesmo antes de as obras se encontrarem na fase que confere o direito do seu pagamento total.

A ideia foi a de dar um pouco mais de transparência ao pagamento a esses empreiteiros. Portanto, eles não vêem as verbas processadas até ao final deste ano, mas sabem que têm de concluir as obras num prazo que, mesmo que seja totalmente impossível até ao fim do ano, possa ir até Março, a fim de que haja uma ligação directa e verdadeira entre a adjudicação da obra e o momento em que ela é paga, isto é, em que o empreiteiro tem direito a receber o crédito.

De outro modo, o que acontece é que o empreiteiro tem de aguardar que o orçamento entre em vigor e que o PIDDAC tenha de ser visado — é um processo que demora ainda algumas semanas, senão meses —, sendo que só depois é que vai onerar verbas de 1987 já comprometidas para outros projectos. Ou seja, se o projecto é de 1986, a hipótese é prolongar o exercício de 1986 no caso dessas obras para que elas sejam pagas ainda por verbas de 1986. Não se trata de transferir as verbas de 1986 para 1987.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Faça favor.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas este tema é um tema horizontal, na medida em que o esclarecimento deste artigo 12.° é muito importante.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, não há dúvida nenhuma de que compreendo a sua horizontalidade e acho que a questão é importante, mas também a nossa horizontalidade vai acabar por volta das 18 horas, que é a hora a que chega o Sr. Ministro da Justiça. De qualquer modo, como disse, considero que é uma questão importante.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Em relação a mim, como pessoa, agradar-me-ia mais que V. Ex.a gabasse a verbalidade. Na horizontalidade não estou muito interessado.

Risos.

O Sr. Presidente: — Oh, Sr. Deputado, também não o critiquei!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Quanto ao mais, Sr. Secretário de Estado, o que lhe queria perguntar vem na Unha das questões que o Sr. Deputado Octávio Teixeira lhe colocou.

É que, quanto a mim, esse n.° 2 é um pouco confuso, pelo que lhe pergunto o seguinte: ele consente pagamentos apenas até 31 de Março, isto é, prolonga o período complementar? E, em matéria de adjudicações, o que é que exige? Que as adjudicações sejam feitas até 31 de Dezembro?

Penso que é importante clarificar isto, porque o que está lá escrito permite concluir que as adjudicações se poderão fazer ainda em 1987.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Exactamente!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr. Deputado, aquilo que os serviços me explicaram

— e isto prende-se mais com obras no âmbito do Ministério do Plano e da Administração do Território, embora pense que também inclua obras da área da saúde — foi que, a acrescer ao orçamento, as verbas do PIDDAC são nominativas, isto é, destinam-se a projectos que têm credores nominativos. Ora, o que acontece é que o projecto é lançado, é adjudicado e é pago por fases, de acordo com o contrato; depois, há uma parte do contrato cujo pagamento, por atraso dos empreiteiros ou do arranque do concurso, etc, não pode ser autorizado até 31 de Dezembro. A obra não está em condições e, porque isto é feito através de autos de medição — suponho que é assim que se diz, mas peço-lhes que me perdoem a minha falta de conhecimentos técnicos no sector das obras públicas —, sucede que chega-se a 31 de Dezembro, a obra atrasou-se, passa para Janeiro e põe-se a questão de saber como é que se vai pagar ao empreiteiro. Isto porque a partir de 1 de Janeiro de 1987 entra o PIDDAC, os projectos e as obras de 1987.

Ora, o que se tem passado nos anos anteriores, e que herdámos, como aconteceu com outros governos

— enfim, tem sido uma bola de neve —, é que começa--se por pagar, no PIDDAC do ano x, os projectos e as obras que estavam em curso nos anos x-\, x-2, etc. O expediente que tem sido seguido pela Administração

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em anos anteriores é o de considerar que a obra está mais adiantada do que na realidade está para que o empreiteiro possa ser pago ainda no ano do exercício a que se refere a obra.

Neste caso, o que fazemos é dar aos empreiteiros a chance de, em vez de acabarem a obra até 31 de Dezembro, a qual já foi lançada em 1986 e está em fase de conclusão, poderem acabá-la até ao final de Março.

Esta é filosofia que tem sido seguida; não há aqui nenhum trunfo na manga. É que, senão o que acontecia era que, em 1987, ou pura e simplesmente não se pagava ao empreiteiro — e ele tem direito a receber, com mais ou menos juros de mora, com mais ou menos multas, desde que prossiga a obra e a conclua —, ficando ele à espera que em 1988 se inscrevesse uma verba para pagar a sua obra de 1986, ou se prejudicava as obras de 1987.

Este problema decorre do facto de o nosso orçamento ser um orçamento de gerência e não de exercício e esta é uma forma de lhe dar uma certa componente de exercício para um período muito limitado, a fim de resolver o problema. É que, como disse, o PID-DAC é um processo burocratizado que tem a sua filosofia mas que, exactamente por ter essa filosofia, acresce ao processo de controle do orçamento em termos de contabilidade pública.

Mas, enfim, a Assembleia decidirá. É que, se fosse como no orçamento deste ano, que será aprovado em tempo oportuno, teríamos tempo de ver qual era a solução que a Assembleia dava a este problema.

Só queria deixar claro que não há aqui nenhuma passagem, nem nenhum protelamento; bem pelo contrário, trata-se de puxar para o ano a que respeitam as despesas desse mesmo ano.

Não sei se consegui ser bem explícito.

O Sr. Presidente: — Pediram a palavra, para fazer pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados Nogueira de Brito e Octávio Teixeira.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, o que fica claro nesta matéria é que, a partir deste momento e até ao fim do mês de Dezembro, a administração do Hospital de Coimbra ou a entidade que neste momento o gere tem de adjudicar aquisições de equipamento no valor de 1 200 000 contos para as poder pagar até ao dia 31 de Março. Se isso não acontecer, não poderão adjudicá-las em 1987, porquanto as verbas do PIDDAC de 1986 destinadas àquele Hospital foram esgotadas e agora vão ser reafectadas verbas dentro do PIDDAC — o que sabemos ser possível — mas terão de ser adjudicadas no novo Hospital de Coimbra até ao fim de Dezembro para que possam ser pagas de acordo com esse sistema, sendo certo que poderão vir a sê-lo até 31 de Março. Isto se for aprovado o n.° 2 do artigo 12.°, é claro. Também é preciso ter cuidado com isso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, vou ser muito breve até porque, certamente, teremos de voltar a este problema em sede, mais global, da discussão do Ministério das Finanças.

Julgo que, mesmo com a explicação que o Sr. Secretário de Estado deu, há cssos, como por exemplo, o de uma obra que estava previsto executar em 1986 mas que o não foi por atrasos vários, em que aquilo que se pretende fazer é criar um prazo adicional para que a obra seja completada e paga.

Se pegarmos no PIDDAC deste ano e o compararmos com o do ano passado, verificamos que o problema nos surge numa imensidade de outras situações, em que há o chamado arrastamento de investimentos, que se não são executados num ano, são-no no outro.

Mas, do meu ponto de vista, há uma questão em que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não tem razão. É que isso não implicaria que a despesa que estava inicialmente orçamentada deixasse de ser feita em 1987. Agora, se a execução material é feita em 1987, então o pagamento deve ser feito nesse mesmo anos. Digamos que se sobrou dinheiro em 1986, ele pode ser transferido, em termos de dotação, para 1987, inscrevendo-o no respectivo orçamento. Julgo que isto seria mais correcto, até porque o Sr. Secretário ce Estado sabe que o problema também tem implicações com a programação monetária, e nós vamos fazer pagamentos em 1987 com base, em termos globais, no recurso ao crédito, interno ou externo —mas, para facilitar, consideremos que é ao interno—, que não está previsto na programação monetária. Esse pagamento vai ser feito em 1987, vai ser afecto à programação de 1987 e, no entanto, aparentemente, formalmente, em termos orçamentais, está incluído na programação monetária de 1986.

Isso parece-me extremamente complicado, embora também compreenda a questão que o Sr. Secretário de Estado levantou, e que é a de —embora julgue que isso não seja necessário— não repetir exemplos anteriores, em que se empolava em determinado ano a execução financeira fazendo pagamentos adiantados para, depois, a execução material só se vir a concretizar passados três ou quatro meses, já no ano seguinte.

Julgo que era possível clarificar tudo isto sem entrar numa outra «inclarificação», digamos assim, que resulta da proposta apresentada pelo Governo.

Em todo o caso, certamente que voltaremos a esta discussão quando tratarmos do orçamento do Ministério das Finanças.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, uma vez que, sem dúvida nenhuma, este assunto ainda irá ser debatido noutra sede, quando recebermos a equipa do Ministério das Finanças, vou conceder de novo a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde para terminar as respostas aos pedidos de esclarecimento que lhe havim sido feitos.

Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Relativamente a uma questão que o Sr. Deputado Nogueira de Brito me colocou sobre o PIDR do Alto Minho, gostaria de dizer que, evidentemente, como a Sr." Ministra já aqui referiu, não podemos realizar em 1987 tudo aquilo que gostaríamos, razão pela qual no PIDR do Alto Minho só foi considerado um centro de saúde.

Ao Sr. Deputado Victor Ávila, que me questionou sobre o PIDDAC do hospital de Évora, hospital que se debate com problemas no serviço de medicina interna e ao qual foram atribuídos 11 000 contos, gostaria de

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dizer que o Hospital de Évora tem uma ocupação média extremamente baixa, talvez por estar ligeiramente sobredimensionado em relação às necessidades. Isto porque, como sabe, os distritos de Évora, Portalegre e Beja são distritos de saldo fisiológico negativo, pelo que têm tido uma diminuição relativa da população nos últimos anos. Portanto, na medida em que há outras áreas onde se faz sentir uma muito maior pressão de doentes do que no Hospital de Évora, tivemos, naturalmente, de fazer o rateio das verbas. É exclusivamente essa a razão e não há mais nenhuma.

O Sr. Victor Ávila (PRD): — Permite-me uma interrupção, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Faça favor.

O Sr. Victor Ávila (PRD): — Sr. Secretário de Estado, esse tipo de argumentação poderia ter a sua lógica se articulada com a dotação de 60 000 contos que é feita no PIDDAC do Hospital do Patrocínio.

Portanto, o que queria era que o Sr. Secretário de Estado enquadrasse essa sua argumentação em alternativa com a dotação que é feita para o Hospital do Patrocínio de Évora.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — No que diz respeito ao Hospital do Patrocínio, como o Sr. Deputado sabe, a dotação do PIDDAC de 1986 para esse Hospital foi feita pela Assembleia da República.

Devo dizer-lhe, todavia, que é um investimento importante e que não pode ser visto em contraponto com as próprias camas agudas do Hospital de Évora. Isto porque é um hospital não de agudos mas fundamentalmente virado para o rastreio da doença oncológica, quer dizer, é um hospital de retaguarda, o que é importante num distrito que tem uma população extremamente envelhecida e que, portanto, tem doentes de evolução prolongada que podem deixar de estar nas camas quentes, digamos assim, que são muito mais caras e onde não beneficiam, e estar antes num estabelecimento deste tipo. Por isso, é correcto, em termos de investimento, privilegiar, de certo modo, um hospital, que não é um hospital de agudos, numa zona do País que tem problemas de cuidados de evolução prolongada para doentes idosos (psicogeriátricos e outros). Portanto, do meu ponto de vista, essa posição é ajustada, e julgo que o Sr. Deputado concorda comigo.

Respondendo agora ao Sr. Deputado Ferraz de Abreu e se me permite fazer uma sugestão, dir-lhe-ei que seria óptimo para Lisboa e para o Porto que V. Ex.a fosse deputado por esses círculos, porque, com certeza, defenderia esses distritos com a mesma veemência com que defendo o distrito de Aveiro, da região centro.

Apesar das suas obervações de miserabilismo em redação ao PIDDAC de Aveiro, gostaria de dizer-lhe que, no que respeita aos cuidados de saúde primários, I Aveiro tem uma verba relativamente importante no I contexto global do País —são cerca de 4%, ou seja, I aproximadamente 40 000 contos—, o que tem algum significado. Se for ver o que se passa quanto à área hospitalar, verificará que os Centros Hospitalares de i Aveiro Norte e de Aveiro Sul têm mais de 170 000 con-

tos, o que, somado às verbas para outros estabelecimentos de saúde que se encontram nesse distrito e tendo em conta os investimentos vultosos que tem conhecido (e bem) o Hospital de Aveiro nos últimos anos — e também não é indiferente ser uma região onde tem havido bastante investimento... Oh Sr. Deputado, não quero dizer que ela não tenha carências, mas apenas que não foi tratada desfavorecidamente em relação aos meios de que dispomos face a outras regiões do País!

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Posso interrompê--lo, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secrtário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Faça favor.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Sr. Secretário de Estado, só lhe quero dizer que sou deputado pelo País e não apenas pelo distrito de Aveiro e, nesse sentido, defendo a saúde de uma maneira global e nacional. Se não fiz mais considerações sobre o orçamento da saúde de uma maneira global é porque elas já tinham sido feitas e não quis estar a massacrar ninguém com repetições.

Em todo o caso, não deixei de mostrar as minhas apreensões em relação a certas verbas, nomeadamente em relação ao orçamento em si, na medida em que considero insuficiente a parte que ele ocupa no Orçamento do Estado.

Como deputado do País lamento essa insuficiência.

Não deixei também de mostrar apreensão em relação a outras verbas, como, por exemplo, a verba para os medicamentos, porque não navego nas águas optimistas da Sr.a Ministra. De resto, veremos isso para o ano, se Deus quiser e se todos cá estivermos.

Em relação ao meu distrito, devo dizer-lhe que de facto ele foi contemplado, mas que não o foi propro-cionalmente às terríveis carências que ele tem. De resto, teríamos que pôr em causa a justiça do orçamento ou das propostas da Administração Regional de Saúde de Aveiro, porque apresentou de facto uma série de obras a fazer no distrito que foram pura e simplesmente ignoradas neste Orçamento. Foi isso que pus em relevo.

Levantei também o problema de Sever do Vouga porque considero que é uma situação de grande carência que se vem arrastando há muitos anos. Aquela povoação viu já várias vezes inscritas verbas no Orçamento, que depois foram retidadas, já lá foi toda a gente e escolheram terrenos, etc, mas continuam ignorados.

Deixe-me que lhe diga que a verba que V. Ex.3 propõe —500 contos— não é nada. É só por dizer que está contemplada no Orçamento, mas não vai traduzir--se em nada lá na terra. O projecto está elaborado e não custa dinheiro — foram só os técnicos do Ministério da Saúde que o fizeram— mas 500 contos não dá sequer para deitar um árvore abaixo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Deputado Ferraz de Abreu, muito rapidamente, em relação a Sever do Vouga, quero dizer--lhe que a expropriação do terreno pode, deve e vai ser incrementada em 1987, mas vai ser paga em 1988.

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Isto porque, sendo os processos de expropriação de terrenos morosos, não iríamos imobilizar uma verba excessiva para depois não a gastarmos e termos os problemas que temos.

O Sr. Ferrraz de Abreu (PS): — Pode ser necessário expropriar.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da

Saúde: — Mas, pelo menos, é a informação que tenho.

E, como verá nos anos seguintes, é um projecto que tem expressão plurianual.

Quero dizer-lhe que foi realmente o actual Ministério que colocou e inscreveu no PIDDAC Sever do Vouga. Houve um lapso, que foi, como já disse, da minha responsabilidade —digo-o claramente—, e só por uma razão burocrática, por não ter podido entrar no computador a tempo, é que não foi possível inscrever antes. E por isso é que viemos aqui expô-lo.

É claro que, em relação à exiguidade das verbas do PIDDAC, elas são sempre exíguas, dadas as carências enormes que existem na saúde. Mas este é um lugar comum que não vou aqui focar. Reconheço, enfim, que o PIDDAC é reduzido e que poderia ser melhor. Com certeza que sim, pois as carências são muitos grandes, mas penso que foi realmente o possível. E vamos ver se o conseguiremos executar pelo menos tão bem quanto este ano.

Relativamente à questão do Hospital de Coimbra, colocada pelo Sr. Deputado Santana Maia, é evidente que o Hospital já deveria e poderia ter sido aberto há bastante tempo. Conhece, tão bem como eu, as enormes dificuldades que há em abrir um estabelecimento daquela natureza, sobredimensionado e que nunca se faria hoje em dia. Todavia, esse facto não é nem da nossa culpa nem da dos anteriores governos, mas sim de um microclima muito particular, que não vamos aqui discutir e que o Sr. Deputado sabe, tão bem como eu, o que é que representa.

Já explicámos aqui qual é o problema: há uma aparente diminuição da dotação para 1987, pelas razões que já foram aqui referidas.

Quero também dizer, ainda em relação a este Hospital, que, evidentemente, o facto de o Hospital não ter, por exemplo, medicina nuclear — que foi uma das coisas de que falou — não significa que o Hospital não possa abrir e funcionar perfeitamente. Não sejamos demasiadamente ambiciosos, pois não podemos fazer tudo de repente.

Aquele Hospital usou uma metodologia de planea-mento-financiamento que é bastante discutível e de que ninguém é responsável neste momento — nós, pelo menos, não somos com certeza —, e a verdade é que, em vez de ter feito o financiamento por patamares sucessivos do mesmo nível, fez um financiamento sectorial, do tipo «agora financiamos e vamos dotar este serviço muito bem, depois vamos ao outro, e assim sucessivamente». Isto deu um desequilíbrio ao Hospital que é extremamente difícil de vencer. E foi daí que vieram as dificuldades que o governos anteriores tiveram para o abrir, as quais conseguimos superar agora, na medida do que nos foi possível.

Em relação ao Hospital de Santarém, estou de acordo que uma verba de 90 000 contos seria melhor que a de 26 000 contos. Mas esta foi a possível.

O Sr. Santana Maia (PS): — Mas não é a necessária!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Foi a possível, Sr. Deputado. Penso que nenhuma destas verbas é a necessária nem nunca o poderá ser. Estas verbas são as possíveis.

Em relação aos centros de saúde, lembro que, apesar de tudo, foi feito um esforço importante este amo relativamente aos centros de saúde da região centro. Gostaria de chamar a atenção para isto. Quem vir o PIDDAC com uma chave de leitura que não decorra imediatamente da apreciação das fichas do mapa vn terá esta ideia. Poderia dar-lhe aqui números, mas penso que o adiantado da hora impede que prolonguemos este problema. Poderei, contudo, fornecer-lhe pessoalmente essa indicação.

Quanto ao que o Sr. Deputado Miranda Calha disse acerca do PIDR do Norte Alentejano, o Hospital de Elvas não está contemplado, dada a exiguidade que sempre existe...

Mas reparo agora que o Sr. Deputado Miranda Calha não se encontra presente...

O Sr. Santana Maia (PS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Santana Maia (PS): — Sr. Secretário de Estado, apenas quero dizer que o Sr. Deputado Miranda Calha me pediu para informar a Sr." Ministra e o Sr. Secretário de Estado de que, por motivo de afazeres inadiáveis, teria de ausentar-se, mas que, de qualquer maneira, eu tomaria nota dos esclarecimentos que prestassem.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Certo, Sr. Deputado, não há problema nenhum.

Nós usámos o seguinte critério: nos sítios onde havia PIDR há investimento, e fomos extremamente restritivos em relação ao PIDDAC. Apesar de tudo, a zona do Alentejo tem uma verba significativa, sendo o PIDDAC para 1987 nessa zona de 369 000 contos, o que, apesar de tudo, é significativo. Penso que não poderiam ser previstos todos os empreendimentos.

Não quereria falar do Hospital da Guarda e da reclassificação. Apenas quero fazer — e tenho pena que o Sr. Deputado Miranda Calha não esteja presente — o seguinte reparo: mal vai o País se pensa que o facto de os hospitais serem classificados por níveis é um factor de despromoção. Não se trata de dizer que as especialidades que ficam nos hospitais de acordo com os níveis são especialidades de segunda, mas sim de dizer que ficam as especialidades que são necessárias e suficientes, e não mais. Não podemos estar a multiplicar especialidades que depois, em cada uma das partes em que se encontram, têm uma subutilização, o que significa subdesenvolvimento de tecnologia. Isso tem de ser assumido.

O Sr. Deputado Vidigal Amaro falou dos cuidados de saúde primários e disse que, segundo lhe parece, haveria um certo desequilíbrio no PIDDAC em relação aos cuidados de saúde primários. Quero dizer-lhe que eu próprio, quando elaborei o PIDDAC, tive o cuidado de tentar equilibrar o investimento na área dos cuidados de saúde primários e nas restantes áreas.

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Em primeiro lugar, dir-ihe-ia — e julgo que concordará comigo — que os cuidados de saúde primários são uma área de saúde que vive muito mais da organização que do investimento. Está de acordo, Sr. Deputado?

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Não foi nesse sentido que fiz a pergunta.

O Sr. Secretario de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Não era ao PIDDAC que se referia?

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Não, Sr. Secretário de Estado, era ao funcionamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Então peço-lhe desculpa, Sr. Deputado, porque interpretei mal as suas palavras.

Já agora, digo-lhe que o valor global dos investimentos dados aos cuidados de saúde primários neste PIDDAC é de 2 400 000 contos, o que representa 23,6% de todo o investimento, sendo o maior dos últimos cinco anos. Privilegiámos, pois, os cuidados de saúde primários na medida do que nos foi possível.

Finalmente, tocou num assunto a que sou especialmente sensível, que é o das áreas metropolitanas, nomeadamente a de Lisboa.

Sr. Deputado, devo dizer-lhe que o Governo vai fazer para o ano investimentos substanciais na área metropolitana de Lisboa, nomeadamente no Restelo e em Almada. Esqueceu-se do hospital de Almada, que vai arrancar em grande força no ano que vem, como verá pela dotação que lhe foi atribuída.

Em relação ao hospital do eixo Amadora-Sintra, quero dizer-lhe que a dotação que este ano lhe foi atribuída se destina exclusivamente a fazer o projecto e a pagar a primeira parte deste. Como sabe, um projecto demora pelo menos um ano a fazer. Se o conseguirmos fazer num ano, isso será o recorde dos recordes da Direcção-Geral das Construções Hospitalares. E, sendo certo que um projecto não se paga todo de uma vez, dotámos com aquilo que é previsível em relação aos custos do projecto.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — O que — 37 000 contos — é muito pouco.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Não é, Sr. Deputado, porque é só a primeira entrada para o projecto. Depois, há a avaliação e o pagamento, que é diferido ao longo dos anos, porque não é só num ano ou dois que é pago. Como sabe, a dinâmica de um projecto é essa, mesmo em termos de arquitectura e de pagar à equipa projectista. Portanto, rateámos o dinheiro que tínhamos.

Mas — pode crer — sou altamente insuspeito nessa matéria, porque há seis anos que ando a defender os hospitais da área metropolitana de Lisboa. De forma que ou seria a última pessoa que não os acarinharia. Pode ter a certeza disso e também de que fomos nós que os colocámos em termos substanciais com projecções para os anos futuros, que é uma coisa que não tinha sido feita.

O Sr. VidtfgaE Araapo (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Secretário de Estado, continuo a dizer que o problema desta equipa ministerial é o verbo e a verba.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministre éz Saúde: — Sr. Deputado, não compreendi a diferença que há entre um e outro, porque penso que são unis-sexo.

Risos.

Penso que respondi as perguntas que o Sr. Deputado Vidigal Amaro colocou em relação ao PIDDAC.

Em relação à questão de Viseu e Lamego, quero dizer, quanto ao Hospital de Viseu, que são feitos importantes investimentos no hospital antigo e que há um projecto elaborado para a construção de um hospital novo, de resto sobredimensionado e situado na zona centro, relativamente próximo de Coimbra.

Dir-me-ão, evidentemente, que os diferentes distritos da zona centro não podem ser penalizados pelo tal elefante branco do Hospital de Coimbra, mas o que é facto é que nenhum governo pode ignorar que estão ali 14 700 000 contos de investimento. Por isso, não é justo, em termos de região, e tendo em conta que a região centro tem 2 300 000 habitantes, a região norte 3 400 000 e a região sul 4 300 000, que continuemos a privilegiar a região centro em detrimento das outras regiões, com excepção de uma franja da região centro muito próxima da região sul — de resto, é extremamente controverso, porque há uma parte dessa zona que drena para o sul, nomeadamente para a área metropolitana — que é a zona sul do distrito de Leiria, na qual priorizámos o Hospital de Leiria. Aliás, ele foi priorizado até pelo governo anterior, e nós continuámos e seguimos essa política, apesar de se tratar da região Centro.

Agora, Leiria tem um determinado posicionamento em relação ao País e Viseu tem outro posicionamento. Então, fazemos investimentos no hospital antigo, porque, naturalmente, o Hospital de Viseu não é uma prioridade nacional.

De resto, posso dizer quais são as prioridades nacionais, que sei de cor. Vindo de norte para sul, são as seguintes as zonas prioritárias: Guimarães, Matosinhos, Leiria, Amadora-Sintra, Almada, Restelo e Tcrres Vedras.

Julgo, pois, que respondi à pergunta colocada peio Sr. Deputado António Marques sobre o novo hospital de Leiria. Leiria é uma prioridade — isso não está em causa — e, assim, o hospital está a avançar com toda a força.

Quanto ao Hospital das Caldas da Rainha, trata-se de um problema muito complexo.

O Hospital das Caldas da Rainha é um hospital sub-dimensionado em relação às necessidades. O que acontece — e isto são heranças que também temos de assumir — é que, a escassos 20 km das Caldas da Rainha, foi feita uma unidade de saúde que se chama Hospital de Nível 1 de Peniche e que, no fundo, era uni centro de saúde que foi hiperatrofiado.

Chamo aqui a especial atenção para a tentação que há por parte dos cuidados de saúde primários de assumirem a sua orfandade em relação aos hospitais e quererem centros de saúde com internamento sempre e em qualquer circunstância, que depois são empolados e acabam por ser hospitais subdimensionados ou centros de saúde ingovernáveis. O problema do estabelecimento

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de saúde que se encontra em Peniche é um exemplo dessa natureza: não é um centro de saúde nem um hospital, mas foi um investimento importantíssimo.

Há que gerir os recursos das Caldas da Rainha, custe o que custar, pesem, embora, todos os regionalismos exacerbados que se vivem naquela zona, que conheço especialmente, porque sou de lá e sei bem como isso é. Caldas da Rainha e Peniche estão condenadas a viver em complementaridade e têm de perceber que não é possível evitar isso, sob pena de esbanjarmos algumas largas centenas de milhar de contos que estão ali investidos em Peniche. O problema das Caldas da Rainha tem de ser analisado com extremo cuidado e ponderação, e temos de ver se pedagogicamente conseguimos actuar nessa área.

Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Rui Vieira quanto ao Hospital de Alcobaça, o problema de Alcobaça é também um problema complicado, mas por outra razão.

Estamos a estudar uma alternativa para a solução do problema dos cuidados hospitalares e de saúde primários na zona de Alcobaça, porque — e isto é só para adiantar um pouco em relação não à solução do problema, mas ao equacionamento desse mesmo problema — aquele triângulo ao sul de Leiria que se estende até Torres Vedras é um terreno extremamente difícil. E não estou a falar de Leiria — Leiria é outra coisa —, mas sim da região ao sul de Leiria. Al existem estabelecimentos hospitalares, mas que foram feitos numa óptica muito diferente daquela que hoje seguimos em relação aos hospitais distritais e são unidades subdimensionadas. Por isso, há que ver com muito cuidado como é que se podem gerir recursos tão dispersos como aqueles que existem naquela área, alguns de boa qualidade.

É nesse contexto que se tem de encarar o Hospital de Alcobaça e todos os recursos hospitalares e de saúde em Alcobaça.

O Sr. Presidente: — Se o Sr. Deputado Nogueira de Brito pede a palavra para formular mais alguma questão ao Sr. Secretário de Estado, então, começar-se-á uma nova roda de perguntas, precisamente pelo CDS.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, com efeito, desejo formular mais uma questão ao Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, quando há pouco tentava surpreender um critério na concatenação das verbas do PIDDAC falei no PIDR do Alto Minho um pouco com o sentido de concluir que aí tinha havido contracção das verbas dedicadas aos cuidados primários de saúde.

Há pouco o Sr. Secretário de Estado falou na distribuição do PIDDAC para a área metropolitana de Lisboa e referiu uma verba de 47,4% ou 44,7% e uma outra de 11,4% para a área metropolitana do Porto.

Suponho que V. Ex." mistura aí hospitais e cuidados primários de saúde. Foi feita alguma agregação nesse sentido? É evidente que o Sr. Secretário de Estado me poderá devolver a bola, e pode fazê-lo porque temos elementos para trabalhar. Repito a pergunta: tem alguma agregação feita, no sentido de juntar os cuidados primários de saúde e os hospitais em relação ao PIDDAC?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Tenho sim, Sr. Deputado. E fiz essa agregação porque, eu próprio, para fazer o PIDDAC, tive de seguir essa metodologia para me orientar. Assim sendo, tenho várias chaves para poder ler o PIDDAC de acordo com diversos critérios e isto para não criar assimetrias e desigualdades.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Se o Sr. Secretário de Estado dispõe delas, poderá dar-nos a distribuição das verbas do PIDDAC para os cuidados primários de saúde e para os hospitais?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, posso dizer--lhe que, em termos globais, para os centros de saúde e sem os PIDR tenho várias chaves, pelo que lhe vou dizer duas delas.

Para os centros de saúde, é afectado 13% do valor global; para os serviços de saúde mental, 4,9%, o que significa que duplicámos o investimento em relação ao ano de 1986 e triplicámos em relação ao de 1985, pelo que estamos a ser coerentes com as nossas medidas de política; para as áreas metropolitanas, 15,79%, áreas essas que englobam o Hospital do Restelo, e 200 000 contos por desagregar, para poder suprir as necessidades do Porto que nos pareceu necessário reforçar, sobretudo na respectiva área dos cuidados primários de saúde; para os hospitais centrais, 31%; para os hospitais distritais, 30%, e o restante destina-se aos serviços centrais, centros de administrações regionais de saúde, etc.

Portanto, sem os PIDR, o total de cuidados primários de saúde representa 18,55%, o total dos cuidados hospitalares representa 77% e o restante representa 4,5% do total.

Não sei se estou a ser maçador com estas verbas ou se isto interessa ao Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Interessa, sim, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Portanto, para a área metropolitana de Lisboa é afectado 47% do investimento; para a área metropolitana do Porto, 11 %; para a região do Norte, 18%; para a região Centro, 14%; para a região Sul, 3 % — mais adiante explicarei este valor, e o restante representa 4% do total.

Quanto ao valor da região Sul, ele é aparentemente ridículo mas é preciso não esquecer que temos de lhe adicionar a verba dos PIDR, que para esta região é de cerca de 1 milhão de contos, mais concretamente, 988 000 contos.

Isto é uma visão macro do PIDDAC.

Em relação aos projectos prioritários posso dizer que eles são: Guimarães, Vila Real, Bragança, Matosinhos, Torres Vedras, Restelo Ocidental e Almada.

Sem querer alongar a minha exposição quero referir alguns aspectos que o Sr. Deputado Nogueira de Brito me permitiu agora fazer, através da pergunta que formulou.

Em relação a determinados distritos desprotegidos—e aqui permito-me fazer uma pequena crítica ao Sr. Deputado Ferraz de Abreu ...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — O Sr. Secretário de Estado Adjunto podia enviar esses dados para a Comissão!

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Não tenho aqui a desagregação. Peço desculpa, mas não a trouxe pois está separada destes valores mas posso fornecê-la ao Sr. Deputado se, porventura, estiver interessado nisso.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado Adjunto, era precisamente isso o que eu ia sugerir.

Se realmente vai- fazer a entrega de algum dos elementos que referiu e de outros ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, poderá, então, enviá-lo à Comissão.

De resto, permita-se-me um comentário: uma vez que esses dados não são confidenciais, como é óbvio e como se demonstrou aqui, teria sido extraordinariamente importante que esses dados pudessem ter sido enviados na altura em que foi enviado o mapa vil, pois ter-nos-ia facilitado imenso a compreensão das tais linhas de politica de que, há pouco, falava o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Bom, estes são documentos de trabalhos que elaborámos e que julgo não ser costume entregar no Parlamento.

Não sei se isso não foi feito noutros anos, mas nós fizemo-lo e como os entendemos como documentos de trabalho foi por isso que os não enviámos para a Assembleia e não com alguma intenção de os sonegar à Assembleia.

De resto, quando fomos à Comissão Parlamentar discutir este assunto eu próprio levei estes documentos, mas pareceu-me pretensioso estar a enviar para a Assembleia algo que não tinha sido solicitado e que nem sequer era costume enviar, pelo que o seu envio poderia ter uma outra leitura. No entanto, é claro que esses documentos estarão à disposição dos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado Adjunto.

Pergunto ao PSD se deseja ainda colocar alguma questão.

Pausa.

Uma vez que não é esse o caso, faço a mesma pergunta ao PRD.

Pausa.

Pelos vistos, também não é esse o caso pelo que passo a pergunta ao PS.

Pausa.

Uma vez que o PS também não deseja colocar qualquer outra questão, concedo a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sempre pensei que havia duas «voltas» de perguntas, pelo que da primeira vez deixei algumas questões.

A primeira coisa que quero dizer à Sr.a Ministra da Saúde é a de que os deputados não visitaram apenas meia dúzia de hospitais ou ainda menos. Quanto muito, a Comissão de Saúde, Segurança Social e Família fez isso. No entanto, os deputados — e falo por mim — visitaram muito mais hospitais durante um ano.

Em relação ao PIDDAC e ao seu não cumprimento, o ano passado estava inscrita uma verba para o Centro de Saúde de Estremoz e este ano não a vejo. Apesar de se tratar de um projecto plurianual, não vejo inscrita no PIDDAC qualquer verba nesse sentido.

O Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Está sim, Sr. Deputado. Há uma verba inscrita nesse sentido.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Pode ser que o erro tenha sido meu, mas procurei e não a encontrei. Se está contemplada em que sítio é que está inscrita?

Com efeito, quando fala de Évora e de todos os centros de saúde não fala certamente no de Estremoz.

Outra questão que quero colocar, e essa vem no seguimento da intervenção do Sr. Secretário de Estado Adjunto, é a de saber que critérios levaram a tirar 500 contos do Centro de Saúde de Ponte de Sor e a afectá--los a outro centro de saúde do norte, que não sei qual é. E porque é que foi o Centro de Saúde de Ponte de Sor que ficou sem essa verba e não qualquer outro?

Um outro problema que se coloca é o do Centro de Saúde da Amadora — Edifício B, que foi comprado à autarquia já em 1981 por uma verba que ronda os 114 000 contos, o que, em termos reais, se traduz numa dívida do Estado à autarquia no valor de 230 000 contos. Quando é que essa verba vai ser paga? Quando é que o Estado começa a pagar à autarquia a verba que lhe é devida?

Quero apenas fazer um comentário em relação ao Hospital Distrital de Évora.

Se este Hospital está sobredimensionado, se tem número de camas a mais, como é que o Sr. Secretário de Estado Adjunto justifica que do outro lado da rua se vá fazer um outro hospital? Este é um problema de sobredimensionamento.

O Sr. Secretário de Estado diz que esse outro hospital é para «camas de retaguarda», mas, então, é porque faltam camas no Hospital Distrital.

Diz que a ocupação do Hospital é muito baixa, mas isso deve-se às condições, que são inqualificáveis, dos serviços de medicina, que o Sr. Secretário de Estado conhece, e que não são aproveitadas porque não têm médicos. Com efeito, há muitas especialidades que não estão em funcionamento porque não têm médicos colocados lá.

De facto, não consigo perceber como é que havendo um hospital que tem camas a mais, do outro lado da rua se vão construir mais camas.

Um último comentário relativo ao problema dos cuidados primários de saúde é o de que quando referi a diferença de verbas entre os cuidados primários e os cuidados diferenciados, queria referir-me ao problema do funcionamento, pois há muito pouco dinheiro para tal.

Em relação ao PIDDAC, os números fornecidos pelo Sr. Secretario de Estado Adjunto querem dizer que os cuidados primários estão ainda muito mal financiados no PIDDAC.

Mas percebo a razão de ser disto, pois apesar de todas as carências já há muitos centros de saúde por todo o lado. Mas se me perguntarem se as carências em equipamento se fazem sentir mais em relação aos cuidados primários ou aos cuidados diferenciados, então aí concordo com o Sr. Secretário de Estado em que se deve privilegiar o equipamento dos cuidados diferenciados.

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No entanto, no que respeita ao funcionamento e era a isso a que eu me referia, cada vez que os centros de saúde funcionam como estão a funcionar, pior para os serviços centrais.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Deputado Vidigal Amaro, para Estremoz, está prevista no PIDDAC uma verba de 12 800 contos. Poderia ter sido um lapso meu, tal como aconteceu relativamente a Sever do Vouga, mas neste caso não foi.

Em relação ao problema de Sever do Vouga/Ponte de Sor, digo-lhe que Sever do Vouga não figurou no PIDDAC porque o respectivo projecto estava a ser elaborado na Direcção-Geral das Construções Hospitalares e como no PIDDAC têm de figurar rubricas que correspondam a algo, aquele teria de estar omisso.

No entanto, o projecto havia continuado porque o ano passado já o actual Governo o tinha mandado continuar e eu sabia isso. Portanto, o que se passou foi que não me apercebi que esse projecto não estava inscrito no PIDDAC.

Como queremos arrancar com o Centro de Saúde de Sever do Vouga para o ano que vem, se ele não figurasse no PIDDAC, uma vez que é um projecto plurianual, em 1987 não poderia ser lançado porque em 1988 não haveria dinheiro para isso.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Secretário de Estado Adjunto, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Secretário de Estado Adjunto, a minha pergunta é a seguinte: que critérios é que levaram a tirar 500 contos ao Centro de Saúde de Ponte de Sor e não a outro qualquer?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, a razão foi a de que me informei na Direcção-Geral das Construções Hospitalares em relação ao projecto e me terem dito que não fazia qualquer diferença retirar esse montante, no que respeita ao desenvolvimento do PIDDAC. Com efeito, trata-se de uma pequena importância que, por um lado, me permite colocar o Centro de Saúde de Sever do Vouga no PIDDAC e projectá-lo para os anos seguintes e, por outro lado, não prejudica o Centro de Saúde de Ponte de Sor. Foi, portanto, uma questão desta natureza e não de qualquer outra que conduziu a este critério. Penso não ser errado proceder-se desta maneira.

Em relação ao Centro de Saúde da Amadora, não compreendi a pergunta que fez, uma vez que não disponho de informação sobre este assunto.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Se me permite que o interrompa, esclarecê-lo-ei no sentido de o informar que neste momento o Estado deve à autarquia da Amadora 230 000 contos, resultante da compra efectuada em 1981, do chamado «Edifício B» por uma verba de 76,9 milhões de contos que, depois, foi actualizada para 114 000 contos. E esta verba nunca foi paga. Foi comprado em 1981 por 114 000 contos, pelo que, em

termos actuais, o Estado já deve 230 000 contos e a autarquia pergunta quando é que lhe é pago este dinheiro de que o Estado é devedor.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, não lhe sei responder a isso porque não tinha conhecimento de nada.

Em relação ao Hospital de Évora, desculpe, mas não posso deixar de lhe responder. Sr. Deputado, o Hospital do Patrocínio não é um hospital de agudos. Infelizmente, Évora, bem assim como Portalegre e Beja são distritos com um saldo fisiológico negativo onde existe a maior percentagem do País de pessoas com mais de 65 anos, salvo erro só igualado pelo distrito da Guarda. Quer dizer, é uma zona onde temos que privilegiar os cuidados adequados à população que, como sabe, não são tanto os cuidados agudos como são, com certeza, os cuidados de evolução prolongada. Tendo em conta que, por razões provavelmente ligadas à alimentação, mas que não se conhecem bem, se trata de uma zona que tem uma alta incidência da doença oncológica em determinados órgãos, este é um local onde interessa ter um centro de rastreio de cancro. Naturalmente, que este centro não serve só o distrito de Évora, pois os estabelecimentos de saúde ultrapassam os limites distritais ou autárquicos onde se encontram implantados. Portanto, num sítio onde os principais problemas de saúde das populações resultam do seu envelhecimento, é lógico que se criem estruturas que, simultaneamente, não vão sobrecarregar camas de agudos, mas que vão, sim, estar colocadas nos locais adequados. O Sr. Deputado dir-me-á que não há problema nenhum porque se afirmo que há uma ocupação baixa do hospital de agudos, então devemos utilizar essas camas a cem por cento. É que, como sabe, essas camas são mais caras quando ocupadas. Portanto, este problema tem que ver com uma determinada filosofia.

Por outro lado, esses doentes idosos com cuidados de evolução prolongada — como sabemos pela nossa experiência de médicos — vão inundar os serviços de medicina interna e vão perturbar o seu funcionamento. Portanto, parece-me uma medida acertada e, de resto, defendo a solução que aqui foi estabelecida no ano passado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Secretário de Estado, em relação a esse assunto, a verdade é completamente diferente. É que havia um programa, com protocolo assinado e tudo, aceite, aliás, por todos os governos anteriores a este, segundo o qual a estrutura física do Hospital do Patrocínio pertencia ao Hospital Distrital de Évora, era, portanto, um prolongamento. Isto foi assim até que este Governo, através da Sr." Ministra, resolveu dar o Hospital do Patrocínio à Misericórdia.

E quando, no ano passado, na discussão do Orçamento para 1986, a Assembleia deu a verba, esta era para o Hospital Distrital. Este ano, o Governo está é a dar dinheiro a uma entidade chamada Misericórdia para construir esse hospital. Porque tanto esse hospital como essas verbas não vão pertencer ao serviço de saúde pública, vão é ser postos ao dispor do serviço particular, a cargo da Misericórdia. É preciso que fique bem claro que o hospital vai ser pago e sustentado com verbas do Estado. Conforme o compromisso tomado com a assinatura do protocolo, a obra será acabada e o hospital equipado totalmente com verbas do Orçamento do Estado.

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A Sr.8 Ministra da Saúde: — Sr. Deputado, o Governo não tem nada contra os serviços de saúde privados e talvez fosse bom que isso ficasse aqui bem claro. O Governo não considera de maneira alguma negativo que seja uma Misericórdia a administrar um estabelecimento de saúde, em vez de ser o Estado a fazê-lo directamente. De qualquer maneira, é bom que se aclare que o que o Estado fez não foi dar nenhum estabelecimento a uma Misericórdia. O que o Governo fez foi confiar-lhe a gestão de um estabelecimento de saúde. Como já foi aqui sublinhado, um estabelecimento de saúde não se destina ao tratamento de agudos, que o Governo entende que não faria sentido aumentar num dos distritos do Alentejo e, sobretudo, num caso em que o nível de ocupação médio do hospital é de 60%, o que constitui o nível de ocupação mais baixo de todos os hospitais do Alentejo. Em contraposição, faz todo o sentido aumentar os equipamentos destinados a receber os doentes em situação estabilizada, nomeadamente as pessoas da terceira idade. Como sabe, de facto, estas pessoas ocupam as camas de medicina interna do Hospital de Évora para além do que é razoável. A própria viabilização deste Hospital passa, nalguma medida, pela libertação de camas de agudos por pessoas que estarão muito melhor num estabelecimento adequado ao tratamento de doentes estabilizados, que não precisam de um certo nível de sofisticação de cuidados médicos. Isto é mais barato e mais razoável a todos os níveis.

De facto, o que o Governo fez foi pegar naquele estabelecimento, que, como todos sabem, está há muitos anos sem ser concluído, e entregá-lo a uma entidade que julgamos que o gerirá da melhor forma. E, de qualquer maneira, é importante notar que este não vai ser um «hospital da rua». O Governo entendeu que, neste momento, não havia motivo para se aumentar o número de camas de agudos do Hospital de Évora porque, até no contexto de outros distritos do Alentejo, não tinha sentido fazê-lo, atendendo à situação da própria saúde nesse distrito.

Agora, Sr. Deputado, o Governo não considera negativo que seja uma entidade privada a administrar este Hospital. O Governo considera que a Misericórdia de Évora, que administrou o Hospital durante SOO anos, vai ser perfeitamente capaz de terminar a construção e de gerir o Hospital no interesse das populações.

Não se trata aqui de satisfazer a Misericórdia ou quem quer que seja. Trata-se é de prestar os melhores serviços possíveis às populações e o Governo entende que era a melhor solução para o fazer.

O Sr. Presidente: — Em nome da Comissão de Economia, Finanças e Plano e da Comissão Parlamentar de Saúde, cumpre-me agradecer a presença e os esclarecimentos dados pela Sr.8 Ministra da Saúde e pelo seu Secretario de Estado Adjunto e, também, a presença do Sr. Director-Geral da Saúde e da Sr.8 Direc-tora-Geral da Contabilidade Pública.

Os esclarecimentos dados foram preciosos e, quanto à saúde, ficámos bem informados.

Srs. Deputados, dou por terminada esta reunião. Dentro de momentos, daremos início à reunião sobre a justiça.

Pausa.

O Sr. Presidente (Octávio Teixeira): — Vamos reiniciar a reunião sobre o orçamento do Ministério da Justiça que tinha ficado suspensa desde manhã.

Como, na altura, ficaram algumas questões por responder, o Sr. Secretário de Estado Adjunto propõe-se começar por fazer uma pequena intervenção inicial, no sentido de clarificar algumas questões, o que me parece correcto. De seguida, todas as bancadas terão oportunidade de pôr as questões consideradas necessárias.

Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Garcia Marques): — Srs. Deputados, de facto, na reunião da manhã, foram postas algumas questões que talvez justifiquem uma referência suplementar.

Começaria por dizer que, relativamente aos problemas de administração da justiça, não se pode esquecer que nessa matéria, por alturas do 25 de Abril, já a situação era de crise. Esta traduzia-se por vários indicadores e sintomas como, por exemplo e uma insuficiência de magistrados e de funcionários de justiça, a existência de comarcas desprovidas de magistrados durante largos períodos de tempo, um estatuto profissional das magistraturas muito desfavorável, carreiras desprovidas de estímulos e de aliciantes, tendência para uma cada vez maior desertificação de quadros e carências de planificação global da respectiva gestão, uma degradação das instalações e do equipamento num número muito elevado de tribunais. Este eram sintomas que, de facto, já existiam à data do 25 de Abril e, sem prejuízo do esforço que foi feito, houve determinadas manifestações dessa situação de carência que se acentuaram por virtude de fenómenos igualmente bastante conhecidos que ocorreram no período revolucionário. A convulsão social e a escalada de reivindicações, uma recessão económica e uma situação de crise generalizada, o regresso ao País de quase 1 milhão de repatriados das ex-províncias ultramarinas, a génese de novos factores de conflitualidade e de instabilidade do Direito, agitações de teor anarco-populista animadas por forças não democráticas, riscos concretos da instituição de fórmulas de justiça popular aqui e ali, constituem alguns dos aspectos de que resultou uma situação que se traduziu numa degradação do parque judiciário, no que diz respeito a instalações. Houve, também, necessidade de se fazer um esforço ingente de recuperação de quadros, de formação de magistrados e certas situações, aqui referidas pelo Sr. Ministro, encontram justificação como consequência deste quadro, que é real. Isto é, em 25 de Abril de 1974 temos uma situação degradada no campo da administração da justiça, designadamente ao nível do funcionamento dos tribunais, e temos a ocorrência de circunstâncias que determinaram o agravamento dessa situação no pós-25 de Abril.

De facto, em termos de evolução do movimento estatístico dos tribunais, se acompanharmos a análise do gráfico representativo dessa evolução do período ocorrido a partir de 1970, poderemos sublinhar as tendências dominantes que passo a enunciar. Houve um período de sensível estabilidade entre 1970 e 1974, houve uma subida em flecha do movimento processual entre 1974 e 1979 e, a partir daí, continuou a ocorrer o aumento do serviço dos tribunais mas em termos mais moderados.

Tudo isto se prende não só com o problema do funcionamento dos tribunais e com a prestação da administração da justiça mas também com outras situações, como, por exemplo, as que se verificam nos serviços

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de combate à droga e, também, no âmbito da política criminal em geral, designadamente nos domínios da delinquência juvenil e da reinserção social dos delinquentes.

Lembro-me que foi aqui dito que o período que se seguiu ao 25 de Abril, designadamente o da gestão socialista no âmbito da administração da justiça, quando o Sr. Deputado Almeida Santos era o tutelar desta pasta, foi um período caracterizado pela febre. Só que a febre é uma manifestação de doença e esta não é compatível com o funcionamento equilibrado e saudável dos organismos afectados.

De facto, se é verdade que foi realizado um trabalho quantitativamente significativo do ponto de vista legislativo, não podemos esquecer que foram realizadas determinadas actividades que estão longe de poderem ser qualificadas como bem sucedidas no campo das consequências. Todos se lembram disto e não se pode dizer que a herança recebida da gestão desenvolvida nessa época tenha sido apetecível. Por exemplo, todos terão presente a ocorrência da evasão da prisão de Alcoentre, verificada imediatamente após o referido período. E por certo se lembram de algumas reformas efectuadas no âmbito dos organismos de combate à droga que determinaram muitas disfunções, muitas redundâncias, muitas situações de sobreposição de competências e que geraram crises que, só recentemente, vieram a ser debeladas, à vista de um grande esforço bastante significativo.

Reportando-me, mais concretamente, ao problema da luta contra a droga e ao esforço que está a ser desenvolvido nesse domínio, tenho à disposição dos Srs. Deputados que o desejarem uma pequena separata em que se enuncia um programa de actividades que visam desenvolver com maior eficácia esse tipo de combate. É verdade que esta constitui uma matéria prioritária. No entanto, em matéria de verbas neste domínio, não podemos esquecer que, relativamente ao Orçamento de 1986, se verifica este ano um aumento da ordem dos 32% e que também houve a atribuição de cerca de 60 000 contos de verbas do PIDDAC ao Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga, sendo verdade que se tratava de um organismo que não era contemplado pelo PIDDAC de 1986.

Para além disto, como muito bem salientou o Sr. Ministro, todo este domínio da luta contra a droga é um domínio interdisciplinar em que há necessidade de se envolver não só a actividade de diversos organismos públicos como também há a necessidade de se apoiarem iniciativas desenvolvidas por instituições privadas que têm atrás de si uma obra de bem-fazer e que já tenham demonstrado resultados visíveis quanto a esse combate. Muito sumariamente, no que diz respeito ao tráfico da droga, diria que os resultados que a Polícia Judiciária tem vindo a demonstrar são significativos de uma eficácia acrescida no combate à droga. Por outro lado, há determinadas medidas em estudo que, por certo, serão anunciadas em tempo oportuno e que dizem respeito a esta área.

No que diz respeito a determinadas acções que exigem uma actividade interdisciplinar, designadamente no que se refere ao controle das fronteiras e ao das encomendas postais, estão a ser desenvolvidas, em articulação com outros departamentos do Estado, certas iniciativas que poderão conduzir a alguns resultados úteis.

No âmbito da prevenção primária, também há contactos estabelecidos com os departamentos próprios do Ministério da Educação e bem assim no que se refere à utilização de meios de comunicação social, designadamente da rádio e da televisão como mediadoras das acções de prevenção, sensibilização e esclarecimento.

Também estão a ser realizados estudos epidemiológicos e procurar-se-á — e isso está em fase adiantada de estudo — cobrir o território com uma rede de serviços de profilaxia e apoio ao toxicómano.

É verdade que, não obstante o esforço que está a ser desenvolvido e que será continuado, não poderá fazer-se uma cobertura integral das necessidades, muito longe disso. Como foi referido, a percentagem das necessidades que serão cobertas pela actuação dos serviços do Estado nesta área será uma percentagem que ficará sempre aquém dos 50%.

De qualquer modo, como todos sabemos — e eu já o disse —, trata-se de uma matéria, de uma problemática, que responsabiliza toda a sociedade e em relação à qual, nessa medida, toda a sociedade se deve empenhar.

Por outro lado, está em reelaboração, numa fase bastante adiantada, o diploma do Gabinete de Planeamento e de Coordenação de Combate à Droga. Está a proceder-se à sua reestruturação através da colaboração de especialistas e será criada uma comissão interministerial e pluridisciplinar de pendor não repressivo, consagrando-se a representação activa e a permanente auscultação das forças comunitárias empenhadas nesta causa, com destaque para as associações de jovens e de pais.

Estamos também empenhados num outro conjunto de acções, designadamente envolvendo departamentos do Ministério da Saúde e do Ministério da Educação e Cultura que são importantes nesta área.

Poder-se-á dizer que, do ponto de vista ideal, os meios financeiros previstos deveriam ser superiores. Com certeza que sim. Simplesmente, temos que reconhecer a necessidade de distribuir as disponibilidades existentes em função dos serviços e iremos procurar fazer com os meios existentes a melhor gestão possível de maneira a acorrer às necessidades mais importantes que já enunciei.

No âmbito dos serviços tutelares de menores — porque na área da reinserção social o Sr. Ministro da Justiça já respondeu esta manhã em termos que, penso, foram absolutamente esclarecedores — e no que se refere à Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores é exacto que houve este ano, e isso pode ser confirmado pela simples observação das verbas do Orçamento, um aumento muito significativo dos meios financeiros postos à disposição dessa Direcção-Geral: o aumento é da ordem dos 60% em relação ao Orçamento deste ano.

Relativamente ao PIDDAC, pode-se dizer que houve reduções significativas relativamente às previsões feitas e às verbas inicialmente inscritas, só que tratou-se de um problema de ratear as disponibilidades existentes. Quanto a este problema, é preciso não esquecer que também aí há uma realidade francamente mais favorável em relação a 1986, que é de todos conhecida e que foi sobejamente retratada no relatório da comissão especializada, que consiste na disfunção que impediu a utilização integral das verbas do PID-DAC/86 por parte dos departamentos do Ministério da Justiça.

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Nesta área, como também foi assinalado pelo Sr. Deputado José Magalhães, é de facto indispensável a articulação de actividades e o desenvolvimento de actuações conjugadas entre o Ministério da Justiça e outros departamentos. É evidente que assim é, e isso está a ser feito há muito tempo.

Há protocolos celebrados entre a Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores e departamentos do Ministério do Trabalho e Segurança Social, assim como também há protocolos assinados entre a Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores e departamentos do Ministério da Educação e Cultura.

Recentemente e através de iniciativas importantes foram realizadas acções, que vão ser continuadas, em conjugação com a Secretaria de Estado da Juventude, quer ao nível de visitas de estudo, indativas de tipo desportivo e visitas ao Arsenal do Alfeite, que, por exemplo, é algo que vai ocorrer em breve.

Foi também possível, através da boa vontade do Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, obter uma biblioteca para cada um dos estabelecimentos de menores existentes — que são catorze.

Enfim, trata-se de todo um conjunto de iniciativas que estão em curso, mas que não queria estar a enunciar quando se situam ao nível do simples projecto. Tudo o que estou a dizer refere-se a algo que está concretizado e quando anuncio a visita ao Arsenal do Alfeite ou iniciativas de natureza desportiva estou a referir-me a coisas já feitas ou a realizar até ao fim do ano.

Procurou-se também dinamizar os contactos com determinadas ordens religiosas que têm uma longa experiência e tradição de bem fazer neste domínio, e, sem prejuízo de reconhecer as carências que existem e que são bastantes, temos também de verificar que, por exemplo, o número de menores aguardando colocação decresceu de um modo muito significativo nos últimos seis meses.

Estão a ser feitos esforços no sentido de aprontar os estabelecimentos que estão em regime de subutilização ou utilizar alguns cujas estruturas físicas estão montadas mas que não estão a ser utilizadas, mas é evidente que isso implica o desbloqueamento de outro tipo de dificuldades, designadamene do ponto de vista da admissão do pessoal. No campo financeiro podemos congratular-nos com a circunstância de, embora não da forma ideal, termos obtido no entanto sensíveis acréscimos nesta área relativamente ao que se passou em 1986.

O Sr. Presidente: — Se os Srs. Deputados estiverem de acordo, poderíamos iniciar a segunda ronda de questões e, como tem sido hábito, começaríamos pelo Grupo Parlamentar do CDS.

Tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): — Depois de esta manhã ter ouvido o Sr. Ministro da Justiça dizer que realmente tinha dinheiro suficiente para todas as carências do seu Ministério —uma afirmação que é raro ouvir aos governantes e que sendo sincera não deixa apesar de tudo de mostrar a linearidade que o Sr. Ministro da Justiça se comporta na gestão da sua pasta — suscitam-se-me alguns problemas de tipo diferente daqueles que é normal pôr nestas circunstâncias.

Normalmente, nestes casos, os deputados, sobretudo da oposição, o que querem é que em determinados

sectores, ou para este ou para aquele ramo de actividade ou de serviço do respectivo ministério, se dêem mais verbas.

Dizia eu que comecei a ter uma preocupação contrária ao habitual, mas agora a questão que se me coloca é a de saber se não haverá ajustamento de serviços dotados com verbas a mais, no sentido de que, por exemplo, o Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga tem um aumento da sua dotação de cerca de 50%, o que poderia merecer aplauso dado que estamos inteiramente de acordo com tudo quanto foi dito aqui sobre a necessidade de combater a droga, quer no aspecto do seu consumo, quer no aspecto do seu tráfego. Tudo quanto se disse e a radiografia que se fez daquilo que é o País neste momento em matéria de consumo de droga é obviamente alguma coisa que nos preocupa e que entendemos que merece uma resposta eficaz e rápida, sobretudo capaz de conduzir que deixemos de ser rapidamente aquilo que porventura estamos a ser neste momento, que é um paraíso da droga.

Da mesma forma, aplaudo também todo esse espírito de fazer um apelo a instituições de solidariedade social que podem, de facto, nesse domínio e obviamente com todo o nosso agrado, prestar um serviço altamente prestimoso e inestimável e, porventura, até insubstituível.

Mas quanto a isso interrogo-me sobre se haverá realmente capacidade de execução para o Orçamento que está previsto para este ano, isto é, se na verdade o Ministério, para além de dinheiro, dispõe também de capacidades humanas que permitam vir a executar cabalmente o Orçamento nesse domínio.

Uma outra questão que se nos suscitou foi esta: fiquei a saber esta manhã, por uma afirmação feita pelo Sr. Secretário de Estado das Finanças, que o Secretariado da Reforma Administrativa só actuava nos diferentes ministérios a pedido destes; isto é, quando um determinado ministério achava que era preciso porventura planear melhor a sua eficácia administrativa fazia um pedido ao Secretariado da Reforma Administrativa e o Secretariado ia ver o que é que podia fazer.

A pergunta concreta que eu fazia é se do Ministério da Justiça já houve, ao menos em relação a alguns sectores, a preocupação de pedir ao Secretariado da Reforma Administrativa que visse se não havia maneira de rentabilizar melhor os esforços que o Estado está a fazer em pagamentos de vencimentos aos funcionários públicos.

Por fim, não queria terminar com duas preocupações relacionadas com a existência ou não de verbas.

Um pouco contraditoriamente em relação à afirmação feita pelo Sr. Ministro, gostaria de lhe colocar uma questão muito concreta — que até ocorreu no meu distrito em termos de, porventura, criar uma imagem desagradável para a administração da justiça— referente à existência de verbas para pagar as deslocações dos magistrados.

Sei que o problema se suscitou —e o Sr. Ministro teve a gentileza de na altura nos explicar— exactamente porque essas deslocações estavam a ser pagas pelos cofres e depois passaram a ser pagos pelo Orçamento do Estado. A verdade é que nos números que vejo — tanto quanto sou capaz de ver, porque tenho muita dificuldade em manusear estes números muito grandes — parece-me que a verba orçamentada para deslocação de magistrados aumenta em pequeníssima medida em relação ao ano anterior, o que me leva a

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interrogar-me sobre se não irá acontecer o mesmo que aconteceu o ano passado, e que foi extremamente desagradável.

Para terminar, colocava o problema da sobreocupa-cão dos tribunais. Todos sabemos que, para além de casos verdadeiramente pontuais e calamitosos, a generalidade dos tribunais apresenta um panorama de sobreocupacão, desde as testemunhas que se têm que arrastar pelos corredores junto às salas de audiência até à ausência de salas para os advogados, que já hoje poucos tribunais terão. Uma boa solução para este problema porventura poderia passar pela transferência dos serviços dos notariados e dos conservatórios para outros edifícios.

Gostaria de saber se concretamente estão previstas quaisquer medidas no sentido de melhorar o panorama, que de um modo geral os nossos tribunais hoje apresentam.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, a pergunta que vou colocar tem a ver com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais.

Tivemos ocasião de visitar as cadeias e deparámos com uma situação razoável em muitas delas, embora houvesse outros casos, como o de Monsanto, que não tive oportunidade de visitar mas que foi referenciado como o mais gritante.

No Orçamento estão previstos algumas verbas, designadamente na rubrica «31 — Aquisição de serviços — Outras despesas» e na rubrica «28 — Encargos de instalações». Pergunto se a Direcção-Geral, e designadamente o Ministério da Justiça, vai fazer face a despesas de conservação dos actuais edifícios — já não estou a falar dos novos edifícios prisionais — a partir desta verba da rubrica 31 ou se também vai utilizar a rubrica «28 — Despesas de instalação», porque noto que designadamente para o estabelecimento de Monsanto há aqui uma verba de 18 239 contos e outra de 3000 contos na «Aquisição de serviços — Outras despesas».

Gostaria de obter o esclarecimento relativamente a estas «Outras despesas» constantes da rubrica 31, bem como de saber se efectivamente nas despesas de instalação também está prevista alguma despesa para a conservação dos edifícios.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Licínio Moreira.

O Sr. Licínio Moreira (PSD): — Sr. Ministro da Justiça: no relatório da 1.a Comissão vem logo nas primeiras páginas um quadro da estatística dos processos entrados e findos desde 1973 até 1985 e nota-se que o saldo dos pendentes vem aumentando de ano para ano, o que prova, pelo menos estatisticamente, que o Ministério não consegue, apesar do esforço feito nesse sentido, dotar a justiça de um número suficiente de magistrados, para que possam trabalhar nos processos que todos os anos aparecem, cada vez em maior número, de acordo com o que essas estatísticas nos dizem — embora se verifique que ultimamente a curva é menos acentuada do que nos anos de 1980 a 1984.

Pergunto ao Sr. Ministro se é através do aumento do número de magistrados que o Ministério da Justiça pretende fazer com que os processos entrados sejam em

número mais ou menos correspondente àquele que os magistrados podem findar durante um ano ou se tem outras ideias ou iniciativas no sentido de a actividade dos magistrados nos processos ser simplificada, de forma a que se não perca tanto tempo com eles.

Uma outra pergunta diz respeito ao notariado. Portugal é o único país da CEE que tem o notariado como actividade dependente do Ministério da Justiça, já que nos restantes países —ao que julgo saber — se trata de uma profissão liberal.

Pretendo saber se o Ministério está aberto a um enorme anseio da Associação dos Notários Portugueses no sentido de, a pouco e pouco, se voltar ao estilo antigo do notariado como profissão liberal.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Carvalho.

O Sr. Costa Carvalho (PRD): — Sr. Ministro, na sequência da intervenção do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Sr. Ministro de há pouco, em que se referiu ao planeamento e coordenação do combate à droga, partindo do princípio de que a verba talvez não seja a necessária, mas admitindo que isso envolve acima de tudo recursos humanos, pois não haverá grandes despesas em material, parece-me que continua a haver uma carência de técnicos. O próprio relatório diz que das 304 unidades do quadro de pessoal só 147 estão preenchidas e creio que, dessas, uma parte substancial, cerca de um terço, por tarefeiros, o que obriga a especiais cuidados quanto ao recrutamento de pessoal especializado.

No que respeita aos Serviços Tutelares de Menores o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Sr. Ministro referiu uma série de acções que vão ser desenvolvidas, nomeadamente disse que o número de menores a aguardar internamento nos estabelecimentos especializados decresceu nos últimos seis meses.

Se possível, gostaria de saber como pensa o Ministério actuar num caso concreto: o Barredo. São públicas as condições desumanas, humilhantes mesmo, em que os menores vivem aí e, pessoalmente, sei também das dificuldades que o Tribunal de Menores do Porto tem para actuar no Barredo.

Como pensa o Ministério actuar nessa zona tão degradada, onde se vive em condições tais que a opinião pública se sente chocada com o que se passa por lá, e, para mais, com as dificuldades que há no desalojar de crianças isoladas meses e meses, metidas em tegúrios autênticos, explorados, as mais das vezes, por proxenetas e prostitutas?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretario de Estado: Gostaria de colocar a W. Ex.M alguns problemas que, pela importância de que se revestem, têm de ser aflorados neste momento.

O primeiro refere-se à Polícia Judiciária. Pela leitura de todos os elementos fornecidos sobre o Orçamento e o PIDDAC, sabemos que para o ano de 1987 não se prevê que haja uma dotação para desenvolver as Inspecções da Polícia Judiciária de Chaves e de Faro.

Sabido que se trata de dois pontos importantes da ficalização da PJ, um numa fronteira importante do Norte do País e o outro numa zona importantíssima

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de crime, como é sabido, e acontecendo até que, em Faro, a obra já adjudicada — como se diz no relatório que apresentámos na 1.a Comissão— foi interrompida, não se sabendo exactamente porquê. Porque foram paradas as obras, Sr. Ministro?

Outro problema que se prende, ainda, com a PJ é o da instalação de novas delegações ou subdelegações, que parecem importantíssimas, como, por exemplo, em pontos chave de desenvolvimento do crime, como Viseu, Évora, Leiria e Santarém, sendo certo que o Sr. Director da Polícia Judiciária teve ocasião de informar a 1.a Comissão de que, em Viseu, se impunha como necessidade e com urgência a criação de uma delegação ou, pelo menos, de uma subdelegação.

Parece que o orçamento deveria prever a instalação destas delegações ou subdelegações em pontos chave como os que referi, porque são pontos importantes em que a PJ pode combater o crime, que ali se refugia, por tratar-se de uma zona neutra onde só a GNR e a PSP poderão, porventura, actuar, e mal!...

Já não falo, por exemplo, na ampliação das instalações da PJ em Setúbal, o que se impunha, uma vez que também é um ponto muito importante do desenvolvimento do crime.

Outro ponto que me parece ser de referir diz respeito ao Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga. O Orçamento prevê o investimento de uma verba de 240 328 contos destinada àquele Gabinete.

Em primeiro lugar, quero referir que as verbas orçamentadas representam um corte de cerca de 60% em relação às verbas propostas pelo próprio Gabinete. Mas a verdade é que há rubricas importantes que foram reduzidas, como, por exemplo, as que se referem à conservação e aquisição de instalações, pois sabe-se que os serviços se queixam de falta de espaço e que as instalações existentes estão em parte degradadas.

Os serviços também se queixam de que querem adquirir os mais diversos serviços e as verbas não chegam, como, por exemplo, o lançamento de publicações periódicas ou não sobre o combate à droga, de alerta para os problemas da droga, posters, autocolantes, campanhas de prevenção na rádio, na televisão e na imprensa, produção de materiais de vídeo para apoio do trabalho de prevenção, etc.

Por outro lado, também podemos verificar que a verba atribuída este ano a este Gabinete — se bem que já tenha alguma importância comparada com a do ano anterior— são duas centenas e meia de contos, não deixa de estar, em todo o caso, completamente desfa-zada em relação ao que se passa, por exemplo, em Espanha.

A Espanha atribuiu ao combate à droga qualquer coisa como S milhões de contos e em França a verba chega aos 8 milhões.

Parece-me que, mesmo em termos comparativos, a verba de duas centenas e meia de contos é muito pequena para o combate que temos de travar — até porque, como se sabe, Portugal é, neste momento, um ponto de passagem e até de consumo de droga importante, que temos de limitar de qualquer maneira. Parece-me, portanto, que se impunha um reforço das verbas para este Gabinete.

Mas há ainda um outro ponto relativo ao Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga. Como foi reconhecido na 1.a Comissão pelo Sr. Director daquele Gabinete, este tem no seu quadro de pes-

soal 304 unidades, das quais nem metade estão preenchidas — só o estão 147. Ora, se a droga é, como todos sabemos, um flagelo que tem de ser combatido arduamente, não se compreende muito bem por que é que estas vagas não são preenchidas, pois seriam necessárias para um combate mais eficaz.

Um outro ponto que quero referir diz respeito ao parque judiciário português e em relação a dois casos concretos do distrito que represento nesta Assembleia. Refiro-me a Viseu e a Tabuaço.

Em Viseu há dois tribunais que estão completamente desactualizados: o Tribunal de Trabalho e o Tribunal Judicial. O primeiro não tem qualquer categoria para funcionar como tal, é uma casa mal arranjada, com dois pisos de altura, gabinetes exiguíssimos, uma sala de audiências que é um quartinho pequeno. Não tem categoria nem dignidade para funcionar como tribunal.

Por outro lado, o Tribunal Judicial, embora funcione num edifício pequeno construído para esse fim — dos primeiros a serem construídos neste país—, já não tem capacidade para aguentar os serviços que se acumulam, as secções que aumentaram, os processos que aí acorreram.

Em Viseu há a ideia — talvez colhida no Ministério da Justiça, dada por algum ministro que por lá tenha passado [...]— de que o problema se resolveria com a transferência do Tribunal do Trabalho para o edifício do Tribunal Judicial e com a construção de um novo edifício para o Tribunal Judicial para acorrer às necessidades da comarca.

Não há qualquer elemento no PIDDAC que permita prever que o Ministério esteja interessado nesta ideia. Pelo contrário, existe uma verba de 5000 contos destinada ao Tribunal Judicial de Viseu, mas, com uma verba destas, só é possível a sua remodelação.

Não seria de pensar em dar soluções a esta questão diversa daquela que o orçamento parece estar a dar?

No distrito de Viseu existe o Tribunal de Tabuaço, que já figurou no orçamento anterior com dotações para os anos de 1987 (que era de 1900 contos) a 1989 (que era de 20 000 contos), verba igual à do ano anterior. O Tribunal de Tabuaço desapareceu pura e simplesmente das verbas apresentadas. Porquê?

Pergunto se, sendo uma necessidade imperiosa, como é, satisfazer as populações da comarca de Tabuaço com a instalação de um tribunal condigno, não será de pensar em instalar lá um tribunal e, se esta verba, que no total até seria pequena — no todo, cerca de 42 000 contos —, não poderia ser repensada para acorrer às necessidades de uma terra pequena, mas com tanta necessidade de justiça como uma terra grande.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Creio que este ano o debate sobre o orçamento da justiça teve duas novidades que gostaria de assinalar.

Em primeiro lugar, houve um certo aprofundamento dos instrumentos de análise do orçamento por parte da Assembleia da República, que para o efeito solicitou e obteve diversos elementos de informação — o que foi positivo. Em segundo lugar, a justiça foi tema no próprio debate na generalidade, o que ainda não tinha acontecido, sendo de lamentar que o Governo não tenha podido intervir nessa fase do debate, o que fez agora — e também é tempo possível.

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No entanto, creio que não pode deixar de sublinhar--se o tom com que o fez e o conteúdo dos argumentos que aqui expendeu, que não podem deixar de merecer algum reparo. Isto é: se houve tom que imperasse no debate na generalidade foi o da preocupação, preocupação essa pela degradação das diversas peças do sistema — o relatório da própria 1." Comissão, aprovado por unanimidade, sublinha as componentes dessa degradação —, que não é um fenómeno original português, mas tem as nossas causas próprias.

O relatório procura fazê-lo no tom mais desapaixonado que possível foi, isto é, sem entrar em quesüias ou querelas sobre a história recente da justiça portuguesa e sobre as responsabilidades partidárias nos últimos anos, uma vez que o PSD tem tido o recorde de titularidade da pasta nessa esfera e a passagem do outro partido citado foi episódica.

Em todo o caso, o Governo não trouxe agora o mesmo tom à análise das causas da degradação do sistema.

Creio que há um ponto que talvez tenha sido possível firmar e isso já terá valido a pena. Esse ponto é o pranto sobre as finanças da justiça. Isto é, tem sido típico por parte de diversos ministros da Justiça —e o Sr. Ministro em funções não estará isento dessa pecha— o grande, grande pranto sobre a penúria de recursos lá fora e grande, grande satisfação pelo carácter dos recursos cá dentro. E entre este lá fora e cá dentro anda o coração ministerial: lá fora propaganda no sentido de que estamos mais dinâmicos do que nunca, cá dentro, Srs. Deputados, as verbas são suficientes. Há alguma jactância para efeitos internos que é negativa.

Creio que se há alguma contradição — isto, devolvendo uma observação que há pouco foi formulada por parte da minha bancada—, ela existe por parte do Governo. Foi por isso que canalizámos para o relatório da 1." Comissão aquele quadrozinho sobre os recursos públicos afectados à justiça, que é inédito e, se calhar, até incompleto, mas que, enfim, é uma primeira tentativa que os diversos tipos de recursos canalizados para a justiça dão com carácter agregado, sem os quais ela teria entrado em colapso há muito mais tempo.

Porém, não é possível — e aqui creio que o Sr. Ministro da Justiça não tem razão — que, no exterior, o Sr. Ministro se queixe da maior penúria, como se verificou, por exemplo, num despacho que publicou no Diário da República, n.° 142, de 24 de Junho de 1986, em que referia o caso português como um caso que ultrapassa as barreiras do imaginável e do consen-tível, e que venha aqui, na Assembleia da República, gabar-se dos maiores aumentos de sempre, dizendo que são satisfatórios.

É evidente que eu deveria ter entendido isto com «um grão de sal», como dizendo «são satisfatórios face à penúria». Porém, a verdade é que eles nos são apresentados como colossais e até se chega a dizer que o Orçamento tem um PIDDAC de 3,5 milhões de contos, o que é uma coisa sensacional, quando, infelizmente, sabemos que não é assim. Esses 3,5 milhões de contos são para colmatar o enormíssimo «buraco» que é o PIDDAC/86, a situação de degradação terrível em que se encontra o parque judiciário e a situação de não PIDDAC que caracterizou a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, para mal de todos nós, especialmente dos presos, e outros aspectos negativos e rombudos da execução orçamental de 1986, que é francamente desas-

trosa. Ora, isto prova-se a todas as luzes e nem sofre contestação: basta ver os elementos que nos foram fornecidos pelo próprio Ministério e o retrato da situação que nos foi traçado pelos directores-gerais.

Portanto, creio que se há um discurso um pouco duplo — triste lá fora e contente cá dentro —, esse é o do Governo. Registámos a afirmação de que as verbas destinadas à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e à Polícia Judiciária em matéria de manutenção e funcionamento são suficientes. Portanto, Sr. Ministro, é uma questão de esperar! Nós também vamos esperar atentamente e logo veremos quando é que vem pedido o primeiro reforço.

O terceiro aspecto que o discurso governamental omite é a questão do planeamento de reformas que, em nossa opinião, tem bagueado e tem sido francamente lamentável. Creio que, por vezes, a resposta do Ministro da Justiça quanto a essa matéria é a tradução do discurso do Sr. Ministro Charles Hernu, em França, só que tradutore traditore sem aquilo que são cautelas do respectivo discurso, isto é, não culpabilizar a magistratura, não culpabilizar o parlamento respectivo e confessar francamente a falta de dinheiro.

A minha última observação geral é a de que temos assistido a uma demarche que é particularmente grave em termos políticos e que é a tentativa de transferência de responsabilidades. O despacho que citei de 24 de Junho de 1986 é um exemplo particularmente fri-sante nesta matéria quando, por um lado, procura enjeitar as responsabilidades que o Ministério da Justiça tem no que diz respeito ao bom funcionamento da máquina judiciária, quando assenta todo ele numa análise de recessão dos meios financeiros que o Ministério da Justiça tem e, por outro lado, não salvaguarda sequer o esforço que os magistrados portugueses têm feito para combater o caos do sistema, devolvendo críticas em três áreas: a comunicação social, que, ao que parece, seria completamente incapaz de perceber os problemas do Ministro da Justiça; a opinião pública, que, com razão, se queixa, mas, ao que parece, o Sr. Ministro da Justiça entende que não é, e, finalmente, a Assembleia da República, que é a terceira vítima ou o terceiro responsável da situação criada no discurso do Sr. Ministro.

A Assembleia aparece como acusada de ter mecanismos de aprovação que não são dotados de assinalável celeridade, o que é uma queixa concreta perfeitamente infundamentada quando aplicada, por exemplo, à revisão da organização judiciária.

A Assembleia da República não reviu a organização judiciária porque o Governo não apresentou, em tempo, os estudos preparatórios e a proposta de lei respectiva. Esta é a resposta e a explicação cabal pura e simples. No entanto, o Diário da República ostenta um despacho em que se diz precisamente o contrário e em que se insinua que os culpados do grande atraso da reforma da organização judiciária somos nós, os deputados da Assembleia da República. Ora, creio que este discurso deixa de lado as causas reais da crise do sistema! A Assembleia da República não pode suprir a falta de dinâmica de formas legislativas nem esta forma de legiferar, que não acautela, por exemplo, a entrada em vigor do Código de Processo Penal. O máximo que podíamos fazer era aquilo que foi feito na lei de autorização legislativa que aqui foi aprovada em Julho deste ano. Mas não se pode fazer, pois está nas mãos do Governo, que, por alguma razão, é responsável.

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Quanto à questão do planeamento, gostava de assinalar que as GOPs para 1986 não foram cumpridas a título nenhum. Tanto quanto parece, este ano estão livres de cumprirem quaisquer GOPs, mas se analisarmos aquilo que vem publicado no Diário da República n.° 99, de 30 de Abril de 1986, veremos que das medidas de politica para 1986 contam-se pelos dedos as que foram cumpridas. Tivemos, sem dúvida, o Código das Sociedades, mas veremos o que é que isso dá e se, pura e simplesmente, não será necessário suspendê-lo, dada a forma caótica e improvisada como foi vista a sua entrada em vigor. Não temos Código de Registo Comercial, não temos alterações ao Código de Processo Civil — talvez as tenhamos em 1987, como há pouco afirmou o Sr. Ministro; aquisição, construção e reparação de tribunais foi o que se soube face à falência do PIDDAC; intensificação, adaptação e apetrechamento dos estabelecimentos prisionais nem sombras, coisa nenhuma, nem PIDDAC; desenvolvimento de acções de planeamento para a revisão do ordenamento judiciário prosseguiram algumas do âmbito do Ministério, mas os resultados visíveis e a criança ainda não conhecemos. A reformulação orgânica dos registos e notariado e o estatuto dos conservadores e notários do registo notariado, coisa nenhuma, marca passo. Quanto às acções de extensão territorial da Polícia Judiciária, o Sr. Deputado Armando Lopes sumarizou em que é que se encontram. A situação das instituições encarregadas de protecção e controle da droga passou para 1987.

Portanto, este é o estado de todas as medidas de política de 1986 constantes das GOPs. Ora, creio que isto dá bem a imagem da situação do Ministério em termos de gestão.

Em relação às questões de registo e notariado, Sr. Ministro, devo dizer que não pudemos discutir isso no trabalho preparatório, pois não foi possível ter cá o Sr. Director-Geral do Registo e Notariado. Em todo o caso, alertam-me para as seguintes situações, que creio que valeria a pena debater: além de não ter sido reformulada a orgânica dos registos e notariado e o estatuto dos conservadores, notários do registo de notariado, terá sido perfeitamente inconclusiva a reunião que se realizou no dia IS de Julho de 1986 com o sindicato respectivo e que visava abordar estas coisas. Em todo o caso, terá sido prometido às entidades sindicais que seria elaborada e publicada em Outubro uma portaria de actualização da participação dos conservadores e notários. Ora, não me apercebi que isso tenha sucedido e creio que o Governo está em mora em relação a uma promessa que fez e que, ao que parece, consiste, no mínimo dos mínimos, para minimizar a perda do poder de compra dos respectivos trabalhadores.

Em relação à situação de gestão do registo e notariado, marca passo a questão da orçamentação de 711 serviços do registo e notariado que, como sabem, entregam trocos. Este aspecto foi um ponto do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, mas, em todo o caso, não sei o que é que o Ministério pensa sobre esta matéria e creio que seria útil termos essa sugestão, até para efeitos da elaboração de uma eventual disposição na especialidade.

Finalmente, gostava de saber como é que o Governo avalia a aplicação do Decreto-Lei n.° 145/85, de 8 de Maio, que instituiu os inspectores-orientadores e que está a originar alguns protestos por se assemelhar demasiado a uma espécie de situação de tutela dos respecti-

vos funcionários. Como é que o Sr. Ministro encara isso, que resultados é que teve? Considera ou não que o diploma provou?

Por outro lado, gostava de saber como é que encara uma maior descentralização no quadro da orçamentação que sugeri e uma maior liberdade de gestão por forma a que os serviços não estejam dependentes da direcção-geral para comprarem coisas tão pequenas como uma bobinas, umas fitas de máquinas, umas máquinas xerocópias e coisas desse tipo que hoje dependem de inumeráveis peias burocráticas, tal como é sabido. Por exemplo, o ano passado aconteceu que na Direcção-Geral dos Registos e do Notariado a verba se acabou e a certa altura deixou de haver fitas para máquinas. Em relação aos registos e notariado, eram estas as questões que pretendia colocar.

Em relação às questões da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, o debate que travámos preliminarmente foi bastante profícuo. Assim, gostava apenas de perguntar, directa e imediatamente, ao Sr. Ministro o seguinte: a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias pronunciou-se unanimemente pelo encerramento da prisão de Monsanto no 1." trimestre de 1987. Este é um voto pio? Como é que o Governo encara esta situação e quais são as medidas que considera necessárias do ponto de vista dos pressupostos que a Assembleia da República deveria preencher para garantir esse desiderato comum?

A segunda questão que gostaria de colocar em relação a esta subquestão prende-se com a situação sanitária das prisões. No debate na generalidade colocámos com bastante preocupação certas interrogações sobre as medidas de emergência que o Governo não toma. Ora, gostaria de saber se essa atitude se vai manter mesmo depois de alguns casos particularmente espectaculares de sida na Penitenciária de Lisboa e em que termos é que esta questão é perspectivada, agora que ela assume aspectos dramáticos.

Em relação à questão da Polícia Judiciária, o Sr. Deputado Armando Lopes já colocou as questões que considerava fulcrais.

Em relação à droga, creio que o debate preliminar foi bastante informativo sobre dois factos. Primeiro, não há dinheiro para o raio X que o Governo propagandeia por toda a parte. Isto é, lendo-se atentamente os discursos do St. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, verifica-se que há o anúncio público de medidas, mas olhando-se o Orçamento verifica-se que não há substrato financeiro para as medidas anunciadas. Não encontrei no Ministério das Finanças um tostão para os aparelhos de raio X que é necessário instalar nas fronteiras, também não temos conhecimento de serem garantidas verbas para o controle e detecção de droga na correspondência que a certa altura foi aventada como elemento fulcral.

Em relação à situação do Gabinete de Planeamento de Coordenação do Combate à Droga, foi dito pelo Sr. Deputado Armando Lopes aquilo que é fulcral. O Orçamento é indigente, é um orçamento de David, e o Golias droga vence naturalmente este David. Só me choca particularmente que seja possível ouvir da parte do responsável do sector esta coisa simples: não será possível, senão em 1990 — já o disse esta manhã, mas creio que vale a pena repetir —, ver preenchida a criação de um núcleo de dez centros de recuperação que só preencherão as necessidades de 30 % a 40 % dos destinatários. Isto sucede no momento em que o Par-

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lamento Europeu elaborou um extenso relatório, aconselhando aos Estados membros a adopção de um conjunto de medidas que em Portugal não terão nenhuma possibilidade de serem vazadas no momento em que os organismos de combate à droga reconhecem que há uma intensificação do tráfico de determinadas espécies com a possibilidade de aparecimento entre nós do próprio crack e outras drogas modernas, com penetração em organismos juvenis. Anuncia-se que esta a marcar passo um protocolo esquálido entre a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e o Ministério da Educação, um protocolo mais do que tímido; em relação à reinserção é o que se sabe; em relação à articulação com os outros departamentos também tudo marca passo. Assim, pergunto se não haverá alguma maneira desta questão ser levada a sério em termos orçamentais.

Em relação ao acesso ao direito, devo dizer, Sr. Ministro, que creio que vão ser gastos os 12 500 contos que pela primeira vez inscrevemos este ano no Orçamento do Estado. Digamos que este Governo não tem o mérito de, pela primeira vez, ter inscrito montantes para esse efeito; esse mérito terá sido, porventura, da Assembleia da República. Em todo o caso, não nos foi dada informação sobre a maneira como vai ser usada essa verba. Será a inauguração do edifício na próxima semana ou amanhã? Será com esse fim que vão ser gastos os 12 500 contos que inscrevemos? Que acções serão desenvolvidas em termos de patrocínio remunerado em processo penal em 1986?

Quanto às verbas de 1987 só nos resta fazer votos que sejam aplicadas e, porventura, menos tarde do que aconteceu em 1986 em relação ao programa de emergência para tribunais e prisões.

Olhando as verbas do PIDDAC em relação ao parque judiciário e ao sistema prisional, verifica-se que são verbas mínimas ou, como dizia alguém — creio que o Sr. Director-Geral ou o próprio Subsecretário de Estado —, são verbas para um orçamento de socorro: não dá para fazer um palácio da justiça nem um ou metade! Em todo o caso, o que pergunto é se, face à situação do parque, não é absolutamente indispensável pensar num programa de emergência para a construção ou para as reparações que são absolutamente indispensáveis, sob pena de nos acontecer amanhã o episódio de São João novo outra vez. Quer dizer, na situação em que certos tribunais estão, com arquivos nos sítios mais disparatados, nas casas de banho, nas salas dos advogados, com papel por todo o lado, antiquíssimo, em condições absolutamente degradantes, qualquer azar, uma faísca, um grupo de patifórios que se coligue para efeitos de destruir um processo, etc, pode provocar um incêndio e destruição. Nessa altura o Ministro irá, «de bombeiro», mandará o secretário--geral ver onde é que houve o incêndio, despachar uns tantos milhares de contos para tapar o buraco e arranjar um armazém que permita desbloquear a situação. Este problema aconteceu no Porto e ainda não se encontra resolvido. Pergunto: não será melhor prever isso? Não será melhor, por exemplo, fazer um programa de emergência, tendo em conta a reafectação de cartas verbas que estão previstas, por exemplo, para a Polícia Judiciária, que também delas carece para a nova directoria? Não acha que o estado de incipiênáa dos projectos de remodelação não justifica, aparentemente, alguns dos montantes que lá estão inscritos? Não seria útil e necessário reafectar essas verbas para se fazer um verdadeiro programa de emergência que

permitisse, por exemplo, desbloquear a situação do Tribunal da Boa-Hora, dos tribunais do Porto e outros

— não quero ser injusto em relação à degradação do parque judiciário — e que permitisse também desbloquear a resolução de certas carências dos tribunais das regiões autónomas, problemas para o qual chamo especial atenção?

Neste campo, creio que o PSD tem uma particular responsabilidade. Não podemos ser indiferentes ao facto de recentemente um presidente de um governo regional reclamar publicamente a regionalização da justiça, com o argumento de que a justiça é má e de que os edifícios respectivos são pardieiros e não têm dignidade face aos edifícios regionais. As declarações são do Dr. Alberto João Jardim, mas, no caso dos Açores, conhecemos algumas reclamações desse teor.

Creio que a situação existente em alguns tribunais das regiões autónomas põe em causa a soberania, mas também dá azo a reclamações infundadas de regularização da justiça que, pura e simplesmente, são inconstitucionais e descabidas, mas são preocupantes quando têm como base objectiva disfunções graves do sistema.

Pergunto ao Governo, que também é do PSD, que posição adopta perante isso e se é encarado algum projecto de emergência nessa área.

O semanário Expresso do passado sábado veio colocar a questão de que a Comissão de Luta contra o Contrabando de Gado e Carne está a provocar um pequeno conflito no seio do Governo, em que o Ministro da Agricultura, Álvaro Barreto, é favorável à sua extinção.

Assim, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro da Justiça se o Gabinete do Combate ao Contrabando de Gado e Carne, que está a provocar o referido conflito

— de que eu não tinha conhecimento, mas ficámos a saber —, vai ser extinto ou se vai manter.

Eram essas as perguntas que lhe queria colocar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Ministro da Justiça, Sr. Secretário de Estado Adjunto, Srs. Di-rectores-Gerais: Parodiando ira título de um conhecido e grande escritor do nosso tempo, diria que o Sr. Dr. Garcia Marques fez, perante nós, a incrível e triste história da justiça em Portugal, mas esqueceu-se de falar no seu orçamento desalmado.

De facto, não posso também partilhar, de forma alguma, o discurso oficial em relação às verbas consignadas para o Ministério da Justiça, uma vez que as carências detectadas e as dificuldades de desenvolvimento de certos programas são de tal monta que nos devem suscitar, por um lado, preocupação, por outro lado, medidas tempestivas e adequadas e, finalmente, um grande realismo na interpretação dos dados e no esconjurar dos perigos mais eminentes. E, pelo menos na nossa óptica, um debate orçamental é tudo menos um estrito confronto de verbas, em estilo mais ou menos tecnocratez, uma vez que se impõe a consideração dos problemas que motivam cada uma das rubricas, cada uma das verbas que por aí aparecem.

Aquando do debate na generalidade sobre as propostas de lei das grandes opções do Plano e do Orçamento, tivemos oportunidade de sinalizar alguns dos nós de bloqueamento do sistema em algumas das precariedades mais profundas, e o meu camarada José Magalhães

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acaba também, agora, de recuperar algumas das questões centrais, as quais não foram dadas respostas capazes.

No entanto, gostaria de, ainda assim, abordar umas quantas outras questões no pouco tempo de que dispomos, começando pelo problema do sistema prisional.

Há uma resposta do Ministério que urge, que é a que tem a ver com a capitação. Os 220$ vão manter--se, naturalmente, ou pouco irão subir. Assim, a questão é a de saber em que percentagem irão subir, no quadro das prescrições e das consignações conhecidas.

Os reclusos diminuíram um pouco por obra e graça da amnistia que esta Câmara aprovou e não sei se irão continuar a diminuir com a legislação adjectiva penal e outra, periférica, que ainda está por publicar.

Porém, independentemente dessa constatação, penso que é prudente e justo que um ministério não fique à espera do esvaziamento artificial das cadeias para resolver problemas que têm outra natureza. E esses problemas situam-se, de facto, na área, aqui acentuada, da mais extrema degradação dos estabelecimentos prisionais existentes no País.

Aliás, permita-me, Sr. Ministro, que não aceite, de forma nenhuma, que invoque situações comparadas, em Espanha ou na França, porque é de Portugal que curamos. E enquanto houver uma cadeia que funcione em extremos de alta desumanidade, como as cadeias de Monsanto — e é apenas uma situação de ponta —, do Funchal e outras, que pudemos conhecer de alma amargurada, não deixarei de dizer que isto não está bem e o Sr. Ministro terá de ouvir-me a mim, à minha bancada e a muitos outros deputados até ao fim, por piores que sejam as cadeias da França do Ministro Chailandon, da Espanha ou donde quer que paire.

Com efeito, esta é uma questão central. E tanto é uma questão central que, por isso mesmo, entendemos que as verbas inscritas — os 120 000 contos para o novo estabelecimento prisional de Lisboa, os 120 000 contos para o de Faro e os 131 000 contos para o do Funchal — não são, de forma alguma, bastantes sequer para atacar, numa 1. * fase, a situação de carências com que nos deparamos.

O Sr. Ministro diz que as verbas chegam e diz que isto está bem. Enfim, a responsabilidade é sua, e não deixarei de, pela minha parte, assumir aquela que me compete.

No entanto, a situação prisional não tem apenas que ver com este lado do problema; tem a ver com muitos outros.

Um, por exemplo, é o do quadro em que se movimentam hoje os guardas prisionais.

Gostaria de perguntar ao Sr. Ministro da Justiça se problemas que vêm sendo sinalizados de há muito estão em vias de ter solução ou não — e, como verá, a pergunta tem óbvia implicação orçamental.

Por exemplo: o direito à utilização gratuita dos transportes colectivos pelos guardas prisionais e o subsídio de habitação foram para a frente? A prática discriminatória em relação a emolumentos, uma vez que só os guardas prisionais os não recebem, foi extinta? O subsídio de risco, que ainda por cima põe a questão, altamente caricata, de, sendo os guardas prisionais aqueles que estão em contacto com perigos maiores, serem exactamente os únicos que não recebem subsídio de risco, havendo «mangas-de-alpaca» que estão a recebê--lo, alguma volta foi dada neste problema, Sr. Ministro da Justiça? As questões, tantas vezes e tão legiti-

mamente colocadas, do horário de trabalho, com guardas a fazerem 70 e mais horas quotidianamente, não são um problema que tenha também expressão orçamental, designadamente pela admissão de novos quadros, por um lado, e pela reestruturação...

Estou a ver as pessoas a sorrirem, devo ter dito alguma coisa...

Vozes do PSD: — 70 horas diárias, Sr. Deputado?!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Eu disse 70 horas diárias? Então são semanais, Srs. Deputados.

Bem, esta equipa da justiça a tais esforços nos obriga que até é possível cometer lapsos desta natureza.

Risos.

Aqui está, pois, tempestivamente corrigido.

Portanto, como ia dizendo, trata-se de questões para as quais gostaria de conhecer a resposta do Ministério, porque elas implicam, também da nossa parte, uma reponderação das nossas próprias propostas a curto prazo.

Relativamente ao parque judiciário, queria colocar apenas uma questão — uma vez que as outras foram já colocadas pela minha bancada e também pelo Sr. Deputado Armando Lopes ainda há momentos —, que tem a ver com o Tribunal de Braga.

O Sr. Ministro da Justiça deslocou-se àquela cidade do norte, aí teve amplos e, ao que espero, fecundos contactos com os autarcas e suponho que também com algumas representações de advogados e outros utentes e actuantes da justiça. De qualquer forma, um problema subsiste: teremos ou não teremos tribunal?

Bem, os dados de que disponho, e que são irretor-quíveis, são estes: o projecto — dizia-me o Sr. Dr. Garcia Marques numa reunião havida, há dias, na Sala do Conselho de Ministros — estava desactualizado, impunha-se reconvertê-lo e reformulá-lo com vista ao início das obras e a Câmara Municipal de Braga assumiu o compromisso de proceder, rapidamente, em tempo absolutamente recorde, à reestruturação do projecto. Perante isto, o Governo admitiria a possibilidade da consignação de verbas, este ano, para o arranque da obra em apreço?

Há mais um dado importante: é que a Câmara Municipal de Braga propõe-se adiantar as primeiras verbas relacionadas com o lançamento da obra, desde que o Governo a indemnize depois.

Também era agora só o que faltava serem as autarquias a emprestar dinheiro ao Ministério, que depois lhes pagaria, não sabemos se bem, se tarde, se mal e com que juros.

Bem, como é que vamos fazer?

Gostaria de ter uma resposta cabal, uma vez que já tive oportunidade de acentuar noutra sede que esta história do Tribunal de Braga é hoje, de facto, uma das mais antigas no trânsito dos PIDDACs, ou, pelo menos, das intenções de PIDDAC do Ministério da Justiça, e é já um motivo de chacota que, espero, não chegue ao Parque Mayer, pois seria a extrema degradação de tudo aquilo que aqui seriamente debatemos.

O planeamento e a coordenação do combate à droga mereceu, há pouco, algumas considerações por parte da equipa governamental, que me parecem também não dar respostas à questão central de saber se os quanti-

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tativos estabelecidos, relativamente baixos (da ordem dos 240 000 contos), vão bastar para o muito, mas mesmo muito, que urge, num pais que se está a transformar num porto de tráfego de droga.

Aqui, sem maldade, apetece-me lembrar as GOPs, que querem, de facto, que Portugal seja um país-porto. E aqui está uma das coisas em que Portugal será porto: porto de tráfego de droga e de outras porcarias quejandas.

Enfim, em vez da reidentificação de Portugal com o seu grande paradigma histórico e com as grandes linhas do desenvolvimento e do progresso, que se impõem, sobretudo, depois do 25 de Abril, teríamos, por exemplo, Portugal-porto do tráfego de droga.

Para combater isto — e não quero escamotear que alguns esforços têm sido realizados pelas pessoas responsáveis — seria necessário que se procedesse a uma muito maior consignação de meios.

Quanto ao Instituto de Reinserção Social, se 1987 vai ser o ano do enterramento, que merecerá gáudio de todas as partes, da velha legislação penal adjectiva, naturalmente que isto implicará alguma modificação profunda no âmbito das acções do Instituto de Reinserção Social, o que também implicará o aumento das verbas.

O Sr. Ministro disse hoje de manhã — ficou registado em acta e congratulo-me com o facto — que os 56 315 contos, ou qualquer coisa muito perto disto, era o mínimo dos mínimos que o Sr. Director-Geral do Instituto de Reinserção Social aqui havia enunciado, estariam garantidos e, portanto, abstenho-me de outros comentários.

Quanto ao combate à criminalidade, gostaria de lembrar que, hoje de manhã, o Sr. Ministro teve oportunidade de acentuar que era esta uma área em que importaria, sobretudo, um calor de alma.

Conheço o seu pendor metafórico e até o estimo, mas aqui, efectivamente, tratar-se-ia de um calor de alma «ledo e cego, que a fortuna não deixa durar muito».

Bem sei que quando Camões falou na fortuna não pensava exactamente nesta, tão vil, prosaica e metálica, a que me refiro, mas o que é facto é que, com tão poucas verbas, Sr. Ministro, o combate à criminalidade não vai longe. Aliás, diria que ou ele tem cinco pernas e todas elas desequilibradas, ou tem duas e é manco, ou qualquer coisa de grave se passa, porque, pela leitura que todos fizemos e pelos dados de que dispomos, importaria era aumentar, séria e profundamente, as áreas de intervenção.

Noutro aspecto, o combate à criminalidade económica é menos do que escasso. Com efeito, a existência, por exemplo, de um gabinete de perícias financeiras e contabilísticas a funcionar adequadamente, é hoje um imperativo.

O combate à corrupção é também menos do que escasso.

Portanto, creio que vale a pena que todos, de uma forma consciente, neste debate do orçamento, tenhamos a noção da necessidade de repensar as opções feitas, em termos orçamentais, pelo Ministério e de recon-signar algumas dotações menos correctamente avançadas.

E já não me referiria sequer às questões de preenchimento de vagas e outras, que ficarão para uma outra fase, se houver disponibilidade para ela.

Gostaria de colocar apenas mais duas ou três questões finais, antes de dar a palavra à minha camarada Odete Santos, que, suponho, tem também alguns problemas a levantar.

Em primeiro lugar, e quanto à Lei Orgânica da Polícia Judiciária, gostaria de colocar uma pergunta simples e seca: é para vir à Assembleia da República para ser apreciada ou apenas para ser produzida no seio acolhedor e materno (ou paterno) do Governo e por aí se ficar?

A segunda questão, com a qual termino esta primeira ronda de observações, tem a ver ainda com o Código de Processo Penal e com a sua entrada em vigor.

A entrada em vigor do Código de Processo Penal pressupõe, efectivamente, toda uma renovação de filosofia e também um conjunto de medidas, normativas e de outra ordem, que substanciem as mudanças a operar.

Já aqui foram referidos problemas com a formação de magistrados e o recrutamento de magistrados judiciais, e a verdade é que ficam de pé as questões que coloquei ao Sr. Director-Geral da Polícia Judiciária — que aqui se não se encontra neste momento, mas seguramente que o Sr. Ministro saberá responder —, que são estas: como vamos de extensão territorial da Polícia Judiciária? As vagas que dizem vir a ser totalmente preenchidas até 1990 serão vagas determinadas de forma realista ou em 1990 estaremos a dizer que são precisas mais não sei quantas por infravalorização dos cálculos?

Trata-se de questões importantes, uma vez que ou o Código de Processo Penal entra em vigor, com tudo aquilo que é indispensável para que se opere, de facto, uma mudança significativa, ou então será o apocalipse, em vez do paraíso com que sonharam e com que todos nós, de alguma maneira, sonhamos, contribuímos ou pensámos contribuir.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Odete Santos.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Em primeiro lugar, quero colocar uma questão muito concreta relativa ao parque judiciário e ao distrito de Setúbal.

Trata-se de uma omissão que me admirou bastante em relação ao Tribunal Judicial do Seixal. De facto, embora a autarquia tenha conseguido melhorar as condições em que trabalham os magistrados e os funcionários no tribunal existente, isso espanta-me. É que aquando da última visita que fiz ao Tribunal do Seixal, tanto os juízes como a Câmara estavam esperançados em que esse projecto arrancasse em breve. Aliás, a Câmara já cedeu o terreno e prontificou-se, inclusivamente, proceder à execução do projecto.

Por estas razões se pergunta por que é que o Tribunal Judicial do Seixal, que apesar da melhoria introduzida, funciona em péssimas condições — há, inclusivamente, funcionários a trabalhar numa sala sem qualquer janela, etc. —, não avança? Pergunta-se: porquê esta omissão?

Em segundo lugar, outra coisa que me espanta muito é que, em relação ao Tribunal Judicial de Setúbal, na parte relativa ao PIDDAC, vem inscrita uma verba de 340 contos para a construção do referido Tribunal. Eu sei que este é um projecto plurianual, mas retenho que no segundo ano a verba orçamentada indicada também é apenas de 500 contos, pelo que pergunto se há, de

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facto, vontade de iniciar a construção do Palácio da Justiça de Setúbal. É que 340 contos não dá, efectivamente, para nada.

Isto espanta-me, tanto mais quando este ano, por volta de Abril/Maio, se efectuou uma visita do representante do Ministério a Setúbal, que contactou com os magistrados e com a Câmara, tendo tal visita sido noticiada nos jornais com grandes parangonas no sentido de que «agora é que ia ser, agora é que o Palácio da Justiça de Setúbal ia ser uma realidade». Mas, afinal, este orçamento diz-nos que tal não vai acontecer, apesar de se tratar de um tribunal que, como disse, funciona em péssimas condições, tendo até há poucos dias caído um bocado de tecto de uma secção, onde as testemunhas estão no corredor, podendo conversar com as testemunhas que vão saindo da sala de audiências, que lhes dizem o que lhes perguntaram para que aquelas possam arrumar as respostas, e onde há um arquivo com processos que estão praticamente a apodrecer.

Ora, nestas condições, este Tribunal não corresponde, de forma nenhuma, às necessidades actuais do distrito e muito menos poderá conseguir fazê-lo quando e se o Código do Processo Penal entrar em vigor. Isto porque o Tribunal de Instrução Criminal, onde podem vir a realizar-se debates em audiência, funciona num átrio com uma barulheira infernal proveniente do público que ali se encontra à espera.

Por isso, faço esta interrogação: há vontade de construir o Palácio da Justiça de Setúbal? A mim parece--me que não!

A segunda questão diz respeito a um problema que já foi ventilado aqui em relação às estatísticas da justiça. Quero começar por dizer — e vou apenas abordar o aspecto de justiça laboral — que, em minha opinião, não há motivos para se estar descansado, pois o orçamento não responde às exigências no aspecto de justiça laboral.

Há pouco o Sr. Secretário de Estado inventariou os males — e disse que isso era uma «manifestação da doença» — que deram origem, no período revolucionário, a um recurso muito frequente aos tribunais de trabalho. Pois eu diria ao Sr. Secretário de Estado que neste momento há males muito maiores que já não são sequer uma manifestação de doença, mas mesmo de uma morte clínica. É que podem ostentar-se estas estatísticas, que também não são muito famosas, mas mesmo assim isso consegue-se à custa de muitos males, e graves, que afastam as pessoas dos tribunais de trabalho: é à custa da não aplicação de leis, à custa da precarização do emprego e da proliferação dos contratos a prazo. Isso é que faz diminuir o número de processos nos tribunais do trabalho.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Muito bem!

A Oradora: — E este é, de facto, um mal, porque penso que o que todos queremos é que as leis sejam aplicadas.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Sr. Presidente, quero fazer um ponto de ordem à Mesa, se tal for possível.

O Sr. Presidente: — Faça favor.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — É para pedir à Mesa que me informe se foram estabelecidos tempo de intervenção para os Srs. Deputados. É que, de contrário,

ficaremos aqui interminavelmente ... Posso até pegar no orçamento, começar a ler todas as rubricas e nunca mais avançamos.

O Sr. Presidente: — Bom, Sr. Deputado ...

A Sr.8 Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, assinalo que fui interrompida quando estava no uso da palavra ...

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que aguarde apenas uns momentos, Sr.8 Deputada, para que possa dar o esclarecimento solicitado.

Sr. Deputado Vieira Mesquita, na verdade, não há tempos pré-estabelecidos e, aliás, não tem sido hábito da Comissão de Economia, Finanças e Plano fazê-lo. Por conseguinte, os Srs. Deputados intervêm naquilo que consideram ser importante, em termos de analise, na especialidade, do Orçamento.

Tenha a bondade de continuar a sua intervenção, Sr.8 Deputada Odete Santos.

A Sr.8 Odete Santos (PCP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Voltando a pegar no aspecto das estatísticas — e, em bora tenham tentado cortar o fio do discurso e à meada, não o conseguiram —, quero dizer que as estatísticas de 198S que nos trazem, no que diz respeito à justiça laboral, têm coisas muito graves em termos de duração das execuções de trabalho. Repare que 27% dos processos demoram mais de cinco anos e também há uma grande percentagem de processos (35%) que são arquivados por falta de bens, o que é uma consequência do tempo que os processos demoram a ser concluídos. Igualmente em relação às transgressões de trabalho há uma grande percentagem de processos (29%) que duram mais de cinco anos. E a Inspecção-Geral do Trabalho não levanta todos os autos que deveria levantar!... Esta questão não tem a ver directamente com a discussão do Orçamento na especialidade, mas refiro-a porque se prende com este aspecto da justiça laboral.

Por outro lado, quero chamar a atenção do Sr. Ministro da Justiça para o seguinte: uma das facetas mais graves da justiça laboral é a questão dos acidentes de trabalho. Ora, eu sei que em relação ao distrito de Setúbal o número de acidentes de trabalho aumentou significativamente neste ano de 1986 e julgo que no resto do Pais o panorama não será diferente, porque as causas desse aumento são a precarização do emprego, o não cumprimento das normas de higiene e de segurança e o facto de não haver actuação da Inspecção-Geral do Trabalho, quer dizer, as causas são as mesmas em todo o País.

Perante estas estatísticas relativas a 1985, que já não são muito boas porque vemos aqui acções referentes a acidentes de trabalho que duram mais de cinco anos e mesmo as que duram entre um e dois anos, e que são 21 %, colocam situações delicadíssimas (há pessoas que foram dadas como curadas por companhias de seguros, mas que, afinal, não o estavam e que, enquanto o processo decorreu, não receberam nada), pergunto ao Sr. Ministro da Justiça se, tendo-se agravado o panorama dos acidentes de trabalho no ano de 1986, pensa que, na verdade, o orçamento do seu Ministério dá resposta à necessidade de acelerar os processos relativos a acidentes de trabalho.

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Em minha opinião, esta é uma das graves questões que se colocam. Penso que deve haver um melhor apetrechamento dos tribunais de trabalho e dos funcionários. Isso não acontece e aquilo que existe não responde as necessidades.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (Mário Raposo): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além do prazer que tenho sempre em vir a esta Assembleia, desta vez eu diria que —para utilizar uma linguagem metafórica que o Sr. Deputado José Manuel Mendes referiu— quase fiz uma viagem a um tempo de que, ai de mim, já estou um tanto distanciado, que é o tempo dos tribunais. Eu e o Sr. Secretário de Estado fomos, por assim dizer, réus de um julgamento equitativo, amável, cooperativo, mas a verdade é que também fomos bombardeados com uma série de perguntas que são sempre fáceis de fazer e que são relativamente fáceis de responder se o respondente não quiser responder com inteira autenticidade, como me preocupo sempre e, pelo menos, tento fazer.

Esta é, pois, a posição mais fácil de criticar. Considero que é, de qualquer forma, uma postura necessária, pois é para isso que aqui estamos, é essa a nossa responsabilidade política, que é, sobretudo, a responsabilidade de aperfeiçoar um instrumento fundamental para a vida do País como é o Orçamento.

Esta é uma tarefa da Assembleia, pelo que é justo que ela, até um certo ponto, ao ter um responsável do Governo à mão, o transforme no tal réu, vá lá, amigo ou, talvez melhor, afectivamente réu, que é como, de certa maneira, me estou aqui a sentir. E até sou réu não pelos males que eventualmente possam dimanar do Ministério da Justiça, mas até pelos males que, porventura, possam dimanar do Ministério do Trabalho. Segundo o que a Sr." Deputada Odete Santos disse eu até seria réu por comparticipação criminosa, porque, na verdade...

A Sr.4 Odete Santos (PCP): — Sr. Ministro, os tribunais de trabalho não são dependentes do Ministério do Trabalho!

O Sr. Ministro do Justiça: — Foram exactamente integrados no Ministério da Justiça em 1980, ano em que, ao contrário do que no debate na generalidade foi dito, se fizeram coisas que foram convuladas aqui nos debates na generalidade para outros anos, como o início do funcionamento do Centro de Estudos Judiciários, que se verificou em 1980. O diploma que o criou é de Setembro ou Outubro de 1979 e o Centro entrou em funcionamento em 1980, assim como o Gabinete de Direito Europeu e outras actividades de carácter comunitário.

Ainda em relação ao problema laboral —e para não perdermos tempo, ou melhor (porque nós com isto ganhamos tempo), para encurtar pelo menos o tempo psicológico que gastamos com esta questão—, devo dizer que o Código de Processo de Trabalho está a ser revisto. Eu, em conjunto com o Sr. Ministro do Trabalho —porque na realidade, volens nolens, o Código de Processo de Trabalho tem de ser articulado com o Ministério do Trabalho—, estamos a trabalhar nesse

sentido e suponho que ele já terá contactado o Sr. Juiz Dr. Rodrigues da Silva exactamente para proceder à referida reformulação.

Dizia eu que é realmente fácil arrolar uma série de deficiências, de lacunas, de impreparações. Por isso, há pouco, referindo-me ao Sr. Deputado José Magalhães, eu dizia que havia uma contraditoriedade nas respostas aos quesitos. Ora, se ali havia uma contraditoriedade nas respostas, aqui há uma certa contraditoriedade nas perguntas ao confrontarmos o que disseram os Srs. Deputados, que, além de deputados, são juristas. E digo isto sem qualquer carácter de piropo ou de cumprimento, mas apenas no sentido de que, sendo juristas qualificados, sabem perfeitamente o que perguntam. Julgo que dou assim a imagem, ou o tom, do que há de ambíguo não nas vossas perguntas nem nas vossas posturas, mas nesta própria temática. Por exemplo, o Sr. Deputado Andrade Pereira estava preocupado com o eventual excesso de dotação de verbas para o problema da droga...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Era ironia!

O Sr. Ministro da Justiça: — Isto para se ver que há realmente uma certa indefinição.

Agora, para não perdermos mais tempo com este comentário introdutório, que, de qualquer forma, julgo ser necessário, gostaria de salientar que nós, em Portugal, estamos talvez, colectiva e insensivelmente, a prestar um mau serviço, ou pelo menos não inteiramente bom, à causa da justiça —isto para usar uma expressão um bocado pomposa—, na medida em que estamos sempre a dizer que a justiça funciona mal, que está tudo a funcionar pessimamente. £ é por isso que chamo à colação o tal argumento comparatístico porque, quer se queira quer não, quando, salvo erro, o Sr. Deputado José Manuel Mendes refere que não pode haver uma prisão a funcionar como a prisão de Monsanto, eu devo dizer que isso é válido em toda a parte do mundo, incluindo em Portugal. Quer dizer, não há aí nenhuma razão comparatística que explique essa situação, como não há nenhuma razão comparatística que explique a maneira como desde há 40 anos está a funcionar o Tribunal do Funchal.

Não vamos, pois, afunilar a tarefa de remediar os males da justiça neste país para o ano de 1987; vamos, sim, tentar fazer em 1987 aquilo que é possível. Daí a eventual incongruência que o Sr. Deputado José Magalhães assinalou no meu discurso ao falar num discurso intramuros ou num discurso extramuros, o que seria um discurso para parlamentar ver ou um discurso para o público em geral ver.

Ora, devo dizer que o discurso é exactamente o mesmo. Não me recordo exactamente do que terei dito no despacho sobre o acesso ao direito, mas lembro-me do sentido daquilo que disse e que, curiosamente, me referi a um projecto de lei do Partido Comunista Português. Tenho sempre a preocupação —não sou melhor nem pior que os outros, embora haja pessoas que têm mais preocupações do que outras, e eu sou uma delias— em dizer aquilo que está bem quando está bem.

A verdade é que há um projecto de lei sobre acesso ao direito, da iniciativa do Partido Comunista Português, que, dentro de uma perspectiva não coincidente inteiramente com a minha, embora tenha pontos de contacto, considero notável. E assim mesmo o disse, salvo erro, nesse despacho.

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Isto serve para significar que o meu discurso tenta pelo menos ser coerente, com a natural precariedade e inconstância natural dos homens. É que, mesmo quando os homens pretendem ser constantes, por vezes as circuntâncias, não por eles determinadas, mas que actuam em relação a eles, fazem-nos mudar de opinião.

Não me lembro de ter assumido uma posição de jactância em relação aos meios financeiros do Ministério da Justiça. Se pretendêssemos acudir a todos os males da justiça neste país, teríamos de ter um Orçamento de 100 milhões e contos e, então, teria de pedir à Assembleia da República que me desse 100 milhões de contos. Dessa forma garantiria que no ano de 1987, contratando especialistas daqui ou dacolá para fazerem em prazo recorde todas as obras necessárias no parque judiciário e no domínio da droga e contratando técnicos estrangeiros para os serviços da droga, se conseguiriam resolver todos os problemas da justiça.

O que importa saber é o que é que podemos fazer com os meios que o País neste momento, nesta circunstância e nesta conjuntura histórica tem disponíveis. Ora, nesta medida permito-me dizer que o meu discurso, aqui e lá fora, é exactamente sempre o mesmo. As circunstâncias é que são diferentes: aqui, tenho de reportar-me ao possível, lá fora, posso por vezes remeter-me para o ideal.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Ah!

O Sr. Ministro da Justiça: — É perfeitamente natural. Esta é a linguagem metafórica, mas é a linguagem que certamente foi propagada pela leitura dos excelentes escritos dos Sr. Deputado José Manuel Mendes.

Acho natural que se diga que um homem tem de acreditar em alguma coisa e em que os outros possam funcionar descarnadamente, tecnocraticamente ou com o calor da alma. Acho que isto é respeitável e — todos temos de convir — necessário.

O Sr. José Mamüe5 Memdes (PCP): — É o calor da verba!

O Sr. Ministro ás Jttsliça: — É o calor da verba, mas o calor da verba poder ser potenciado pelo calor da alma. Isto é indiscutível. Não exageremos, mas nós estamos a tentar não exagerar ao nível do Governo.

Respondendo concretamente, para não alongar demasiado esta intervenção, às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Andrade Pereira, diria que na realidade o Secretariado da Reforma Administrativa está a cooperar nalgumas acções com o Ministério da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado já teve uma reunião com o Sr. Ministro Adjunto exactamente sobre problemas de horários das conservatórias. Curiosamente, ainda esta tarde falei com ele, e já tentei falar com o Sr. Director-Geral dos Registos e Notariado, mas ele tinha vindo exactamente para esta Assembleia.

Concretamente, não compreendo que uma certidão de nascimento só tenha um prazo de validade de três meses, quando a pessoa só nasce uma vez. Este é um exemplo, mas há uma série de coisas que temos de limar. Aliás, está acordada com o Sr. Ministro Adjunto uma reunião, a realizar na próxima quarta-feira, exactamente para debater alguns destes assuntos.

Portanto, não é o Secretariado da Reforma Administrativa que é solicitado, pois há uma cooperação ou interacção de esforços, até porque tudo o que diga res-

peito à modernização do sistema judiciário e da justiça em geral tem necessariamente o contributo de uma reforma administrativa. É isso que estamos a tentar, e é isso que talvez não tenha sido suficientemente reconhecido pela Assembleia — evidentemente não se está aqui para dirigir elogios ao Governo — e até ao nível da opinião pública.

Devo dizer que, como o Sr. Deputado José Magalhães disse, reconheço que o Ministério da Justiça talvez tenha pecado sempre por uma falta de sentido de promoção — no bom sentido — não dele, Ministério, mas daquilo que se faz de positivo e como paradigmático, de que é exemplo o diploma sobre as cláusulas contratuais gerais, que continua a ser completamente desconhecido de toda a gente. É essa uma das vertentes do tal acesso ao direito, que rapidamente irei focar adiante.

O Sr. Deputado Andrade Pereira referiu também um exemplo que, com o muito apreço que sabe que tenho por si, é paradigmático de uma certa relutância em aceitar realidades em relação a situações novas. E não digo que esta relutância parte dos Srs. Deputados em gerai, porque ela até parte dos magistrados — e com isto não estou a endossar culpas nem a enjeitar responsabilidades.

Antigamente, até à entrada em vigor da Lei n.° 21/85, as suas despesas de deslocação eram suportadas pelo Gabinete de Gestão Financeira, pelos chamados «cofres», e não havia qualquer problema no processamento dessas verbas. Esta responsabilidade transitou para o Orçamento do Estado, ou seja, para a contabilidade pública, e esta teve de exigir aqueles requisitos que se exigem a qualquer servidor do Estado.

Neste aspecto, evidentemente que um ministro é um servidor do Estado, tal como um magistrado também o é. Por isso, quando faço alguma deslocação, tenho de preencher aqueles boletins de deslocação.

Aliás, está aqui presente o Sr. Director da 4.a Repartição da Contabilidade Pública, que pode confirmar que nunca houve falta de verba no Orçamento do Estado. Suponho, aliás, que tive ocasião de dar ao Sr. Deputado Andrade Pereira uma fotocópia do meu despacho onde isto mesmo se revela.

O que havia era dificuldade na tramitação desse processamento das verbas para deslocações, porque os senhores magistrados preenchiam mal os boletins e indicavam mal os itinerários. Remetiam para a relação

— que, no caso, era a Relação de Coimbra —, esta tinha aquilo retido durante alguns meses e, depois, era remetido para a 4.a Repartição, que, a meu pedido e com o sentido de cooperação que sempre revela, devolvia à Relação de Coimbra. Ao cabo e ao resto, o Ministério da Justiça estava rigorosamente fora deste circuito — isto sem enjeitar responsabilidades.

A 4.a Repartição fez o possível. O que havia era uma falta de habituação a um sistema mais rigoroso do que existia anteriormente. Pelo menos naquela altura

— hoje certamente que a coisa já seria mais complicada — havia uma certa facilitação formal, não estando em causa sequer nenhum problema material.

Devo dizer que nisso os senhores magistrados da Guarda exorbitavam e tiveram discussões menos consentâneas com aquela dignidade e postura que é naturiamente exigível a um senhor magistrado — pelo menos na minha perspectiva —, que, aliás, reiteraram ulteriormente.

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O problema da sobreocupação dos tribunais será um problema comum a vários dos Srs. Deputados, ao qual me referia rapidamente.

O Sr. Deputado Vieira Mesquita referiu as despesas com a instalação dos novos estabelecimentos prisionais.

Estão realmente no PIDDAC as verbas de 35 000 contos, para melhoria dos estabelecimentos prisionais, e de 380 000 contos, para construção e adaptação para instalar edifícios e estabelecimentos prisionais. Está discriminada no PIDDAC essa verba.

Está, pois, dada a resposta à interrogação do Sr. Deputado Vieira Mesquita. O Sr. Deputado Licínio Moreira colocou o problema do aumento dos processos pendentes.

Permito-me dizer ao Sr. Deputado Licínio Moreira que não há aumento de processos pendentes. Se por processo pendente entendermos um processo em curso, necessariamente que haverá mais gente, mais pessoas, mais cidadãos a recorrerem à justiça.

O que interessa é saber qual é a capacidade de resposta dos tribunais, de forma a que não haja processos em atraso.

Ora, a verdade é que, mesmo de acordo com as estatísticas do Gabinete de Estudos e Planeamento, que atenderam apenas, quanto a processos resolvidos, aos processos entrados e terminados em 1985, as estatísticas de Direcção-Geral dos Serviços Judiciários apontam para um número de 1 300 000 processos resolvidos em 1985.

Na realidade, o que me dói e choca é que possamos ir um pouco atrás de uma certa deformação — que, em matéria de comunicação social, acho perfeitamente natural, não sendo sequer mal intencionada —, porque não se tem a noção do que é um processo pendente. Como o Sr. Deputado sabe, melhor do que eu, um processo pendente é um processo que está em curso. Se não houvesse processos pendentes neste país, não havia tribunais, tudo estava resolvido.

O que interessa, portanto, é confrontar o número de processos pendentes com o número de processos findos. E o número de processos findos (não só os que entraram em 1985, como também os que tinha transitado de anos anteriores) foi de aproximadamente 1 300 000. Isto avalizado pela Direcção-Geral dos Serviços Judiciários, da qual, aliás, é director-geral um magistrado judicial.

Quanto ao bloqueamento, considero, pois, que não há uma situação de pré-catástrofe ou pré-ruptura que determine quaisquer medidas de urgência. A medida que temos de assumir é a entrada em vigor, com as necessárias cautelas e as necessárias infra-estruturas, do código de Processo Penal e do Código de Processo Civil, que é, a meu ver, igualmente preocupante, porque embora o calendário aponte para fins de Dezembro, não sei até que ponto é que esse calendário será cumprido. Não posso fazer mais nada, a não ser que faça eu o Código. Mas não sei fazer códigos, e só posso fazer leis com três ou quatro artigos.

Risos.

Não posso fazer mais nada. Confesso a minha incapacidade.

Quanto à questão do aumento de magistrados, diria que não é necessário, de maneira nenhuma, o aumento de magistrados. O que é necessário é que se simplifiquem os processos de funcionamento dos tribunais e se faça aquilo que se diz na lei orgânica, que já está

pronta e assumida — não só pronta, mas também assumida, porque já está pronta há dois ou três meses e será apresentada na Assembleia logo que aprovada em conselho, como tive ocasião de dizer esta manhã. Está previsto realmente que muitas das tarefas, neste momento imputadas aos magistrados, transitarão para os secretários judiciais.

Não acredito na contingentação de processos, porque ela significa sempre que haveria um número de processos em relação aos quais seria denegada justiça. Se um magistrado judicial apenas tem obrigação de julgar 325 processos por ano, se ele tiver 348 processos ficam 23 em que ele denega justiça. Isto porque o retardamento propositado ao autorizar da justiça será uma denegação de justiça.

Do que estou sinceramente convencido é de que, com as medidas que estão a ser tomadas e, sobretudo, com a reforma processual em curso e a reforma judiciária, haverá realmente uma grande simplificação, que já se notou este ano com aquele simples diploma intercalar sobre o Código de Processo Civil.

Devo dizer — e esta é, aliás, a opinião da Associação Sindical dos Magistrados Judiciais Portugueses, que logo o disse — que houve realmente um encurtamento de prazos e de duração de processos pendentes.

Quanto ao notariado, há uma tradição em Portugal. Pertencemos ao grupo do notariado latino, ou seja, à União do Notariado Latino, mas, como sabe, há uma tradição, que vem já de há muito tempo, do notariado de função pública.

Hoje, em Portugal, o notário é simultaneamente tributário da disciplina ou estatuto da função pública e tem também uns laivos de profissão liberal.

Devo dizer que não tenho ideias definitivas, embora em 1980 tenha feito um estudo preparatório sobre esta matéria e considere que terá de haver um estudo prévio muito sério sobre a mesma. Com efeito, não se muda o estatuto de uma profissão tão responsável e responsabilizante como esta, que, no fundo, defende da boa-fé da contratação e de um conjunto de coisas da hierarquia, sob pena de destatização nesta profissão que, a curto prazo, poderia representar um trauma que é conveniente acautelar.

O Sr. Deputado falou nos inspectores orientadores, sobre os quais certamente o Sr. Secretário de Estado, depois, quererá dizer alguma coisa, mas devo dizer-lhe que se está a procurar assegurar ao máximo a liberdade e disponibilidade de espírito dos notários, que o são. Aliás, a preocupação que agora há em pôr termo àquelas peias burocráticas e ao excesso de intervencionismo no chamado Registo Nacional de Pessoas Colectivas tem, exactamente, por fim impedir uma apreciação prévia de determinados problemas que, depois, serão sujeitos aos próprios notários, como é o caso do objecto da sociedade, aliás, em total sintonia com a actua] estrutura do Registo Nacional de Pessoas Colectivas.

O Sr. Deputado Costa Carvalho colocou um problema dos quadros do Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga, que também já foi aqui enfrentado. É evidente que há aí tarefeiros porque não estava descongelada a admissão de pessoal. Por seu lado, a admissão requer que o pessoal tenha uma certa preparação prévia pois são áreas de muito melindre, pela sua especificidade, pelo que têm ée ter um período transitório de preparação. Daí a existência destes tarefeiros.

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Entretanto, sobre este assunto, como também sobre o do Barredo, o Sr. Secretário de Estado, hoje mais vinculado ao problema da droga, poderá responder.

Quanto ao problema que o Sr. Deputado Armando Lopes referiu, devo dizer que no Programa do III Governo Constitucional já se falava na urgente e total cobertura territorial pela Polícia Judiciária.

Reconheço ser necessário e urgente o aumento dessa cobertura territorial. Ultimamente, conseguiu-se terminar a Inspecção de Aveiro que, como sabem os Srs. Deputados que a possam conhecer, é um dos melhores serviços de polícia judicial da Europa, e tenho medo de que se considere como tropo aquilo que o não é. E isso foi dito pela Interpol que, há dias, esteve em Portugal numa reunião, mas, uma vez que já se foi embora, agora já se pode divulgar.

Devo dizer que para mim é altamente preocupante a não existência de uma inspecção em Viseu, Leiria, Évora, que a de Chaves ainda não seja uma inspecção e que no Algarve ultimamente apenas tenha sido criada a de Portimão.

Quanto à inspecção de Aveiro, devo dizer que o decreto regulamentar já está feito, o que é um primeiro passo que, embora não resolvendo nada, é necessário. E digo isto tendo em conta o caso da Inspecção de Aveiro, criada em 1980, nessa altura a criação de inspecções fazia-se por portaria, e que só agora entrou em funcionamento.

Quanto à Inspecção de Leiria, ainda há pouco tive ocasião de dizer ao Sr. Deputado Licínio Moreira que ela é uma necessidade absoluta.

O Ministério da Justiça tem de envidar todos os esforços necessários para inventar qualquer solução para o problema de Leiria, e isto a curto prazo. O problema de Leiria é particularmente grave, porque é uma zona com uma preocupante intensidade de criminalidade e que, portanto, carece de ser resolvida.

Por que é que não está inscrita uma verba no PID-DAC? Primeiro, porque há sempre dispositivos de mobilidade dentro do PIDDAC, pelo menos por aquilo que me tem sido dito, pois o Ministério da Justiça é um pouco naif em matéria de PIDDAC e não está muito habituado a mover-se dentro desses campos. No entanto, também já sei o suficiente para perceber isso.

Por outro lado e de qualquer forma, há sempre maneira de haver fundos próprios do Ministério da Justiça para acorrer a uma situação de emergência.

Fundamentalmente, e isso é o mais difícil de tudo, não há uma verba inscrita no PIDDAC porque até agora não houve um edifício em Leiria que, segundo o relatório que solicitei que fosse elaborado pela Polícia Judiciária, tivesse condições para que lá fosse instalada a Polícia Judiciária.

O mesmo se passa em Viseu, embora aqui necessariamente mais dilatado e diferidamente porque só agora vai ser criada no papel.

Reconheço, entretanto, que aposto a 100% na cobertura territorial pela Polícia Judiciária, à medida que as coisas se possam ir fazendo.

Quanto à droga, estamos precisamente no problema entre o ideal e o possível. É evidente que em Espanha se afectaram 5000 milhões de pesetas para este problema, isto é, 5 milhões de contos, o que corresponderia a metade da verba afecta ao Ministério da Justiça só para a droga. Ficava tudo drogado.

Risos.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Sr. Ministro, desculpe interrompê-lo, mas eu falei em 5 milhões de contos aplicados em Espanha.

O Sr. Ministro da Justiça: — Exacto, são 5 milhões de contos aplicados em Espanha, mas para nós, com muito respeito e afectividade que sabe que tenho por si, só nos interessam os argumentos comparativos quando são favoráveis as nossas próprias teses, porque não se diz que em França há o triplo da população prisional e outras coisas que agora já me abstenho de referir.

Portanto, em Espanha são afectadas 5000 milhões de pesetas e em Portugal, com relativos escassos meios, temos conseguido fazer face àquilo que é possível, quer a nível da Polícia Judiciária, quer a nível de prevenção e combate à droga, através do gabinete respectivo.

Quanto ao parque judiciário e às perguntas concretas que o Sr. Deputado formulou ao Governo, devo dizer que, quanto ao Tribunal de Trabalho de Viseu, há contactos em curso com a respectiva Câmara Municipal sobre a doação de um terreno.

Discute-se agora a localização, tendo em vista uma solução global.

Entretanto, como há reparações urgentes a fazer no actual edifício, há 5000 contos inscritos no PIDDAC de 1987.

Curiosamente, o Sr. Secretário-Geral vai ter amanhã uma reunião com o Sr. Governador Civil de Viseu e, ainda esta semana, uma outra com o presidente do Tribunal da Relação de Coimbra.

Quanto ao Tribunal de Tabuaço, diz o Sr. Secretario--Geral que foi excluído do PIDDAC por questões técnicas face à iluminação das segunda e terceira prioridades, mas o Gabinete de Gestão Financeira mantém-se e a sua vocação é a de, dentro das possibilidades, e para meados do próximo ano, acorrer a este tipo de situações.

Foi este tipo de preocupação que, aliás, foi aqui revelada pelo Sr. Deputado Almeida Santos, conhecedor como é dos problemas do Ministério da Justiça. Na verdade, os cofres têm sempre esta vocação de suprimento, de acudimento, porque é difícil planear totalmente a actividade do Ministério da Justiça para o próximo ano. Aqui não há planificação que resulte, a não ser que actuemos com uma rigidez tão grande que...

O Sr. Armando Lopes (PS): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Sr. Ministro, não percebi bem a resposta que V. Ex.a deu a respeito dos tribunais de Viseu. A solução que está a ser pensada é, portanto, a de se construir um tribunal judicial novo em Viseu?

O Sr. Ministro da Justiça: — São os três tribunais no mesmo edifício, Sr. Deputado!

O Sr. Armando Lopes (PS): — Um edifício com os três tribunais?

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O Sr. Ministro da Justiça: — Exacto, Sr. Deputado, através de um terreno cuja doação seria feita pela Câmara.

Isto é o que me é dado saber, mas não posso garantir que isso se venha a concretizar, como é óbvio.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Portanto, trata-se de um edifício com o Tribunal do Trabalho, o Tribunal Judicial e o Tribunal das Contribuições e Impostos?

O Sr. Ministro da Justiça: — Tribunal do Trabalho, Tribunal Judicial e Tribunal de Instrução Criminal.

Quanto ao Sr. Deputado José Magalhães, realmente o Governo não interveio no debate na generalidade e foi pena.

Já que o Governo é amavelmente acusado de tantas malfeitorias — boas malfeitorias —, também farei aqui um ligeiro reparo (também o posso fazer uma vez que estamos a trabalhar em cooperação) ao sistema de funcionamento deste debate. Não digo que alguém em concreto tenha culpa disto, pois deve ser uma culpa colectiva e difusa.

Na verdade, e a menos que aqui estivesse todo o dia, eu não poderia saber que Srs. Deputados iriam intervir no debate relativo ao Ministério da Justiça, o que, aliás, nem é hábito. Não é uma certa sensação de enco-lumidade mas sim de não ser feita qualquer intervenção sobre o assunto.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, não pudemos contar com a presença do Sr. Ministro da Jus-tiza mas tivemos o prazer de ver que as nossas intervenções, tanto a minha como a do Sr. Deputado Almeida Santos, eram escutadas atentamente pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

Depois, não tivemos oportunidade de o ouvir rebater os argumentos que produzimos, mas essa é outra questão.

O Sr. Ministro da Justiça: — Devo dizer que li grande parte das intervenções. A do Sr. Deputado Almeida Santos li-a na íntegra, mas da sua confesso que só tenho uns apontamentos.

Cada um dos Srs. Deputados limitou-se a transmitir a sua posição, naturalmente, e a desempenhar o seu papel. Agora, devo dizer que o Sr. Deputado Almeida Santos referiu alguns pontos que, apesar da grande amizade que tenho por ele — é claro que em Comissão se pode falar em «amizade» mas no Plenário apenas se pode dizer «estima»—...

Risos.

... devo dizer, não são muito correctos, o que demonstra um certo esquecimento por parte das pessoas que falam sempre com rectidão e verdade. A verdade é que o Centro de Estudos Judiciários começou a funcionar em 1980, quando ninguém acreditava que assim acontecesse e quando as leis de organização judiciária tinham causado um profundo traumatismo nas duas magistraturas.

No entanto, devo dizer que sou partidário das leis de organização judiciária de 1977. Do que não sou partidário — e isso não é imputável a alguém em concreto, mas à sucessão de governos que então ocorreu — é que às leis de Organização Judiciária não se tenha seguido imediatamente a criação do Centro de Estudos Judiciários. Foi o período mais negro da falta completa de juízes, chegando a haver um défice de 300 juízes no País. A verdade é que, hoje, ninguém se recorda disso.

Para testar melhor esta minha afirmação, há dias perguntei ao Sr. Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura se, neste momento, faltava algum juiz, ao que me respondeu que, neste momento, não falta qualquer juiz.

É evidente que, com as necessidades que vão surgir da aplicação do Código de Processo Penal, poderão vir a ser necessários mais juízes, mas estes serão sempre juízes auxiliares criados por via de dotação do Gabinete de Gestão Financeira.

Quanto aos meios de acesso ao direito e quanto aos fins que demos a estes meios, tentámos daí o melhor fim e que foi o de, finalmente, concretizar uma política de acesso ao direito.

Devo dizer que, mesmo que fosse por meios próprios do Ministério da Justiça, encetaríamos, necessariamente, essa política.

Assim, espero que, para o próximo ano, a proposta de orçamento do PIDDAC seja aprovada, porque nos facilitará esta tarefa.

Muito rapidamente, vou dizer o que se fez até agora.

Como, aliás, tive ocasião de dizer de manhã, até agora preparou-se o esquema de actuação que em matéria de direito à informação se vai ter.

Retirando esse tipo de informação qualquer ideia de marketing político, de promoção política ou partidária, ou promoção do próprio Governo —que, aliás, terá sido um dos graves erros cometidos até agora —, o que vai haver é uma promoção de leis, que é necessário que sejam conhecidas. Reporto-me novamente às cláusulas contratuais gerais, ao estabelecimento individual de responsabilidade limitada e outras coisas assim.

O Gabinete de Consulta Jurídica, que já está instalado, não custou um tostão, isto é, custou apenas o preço do mobiliário, pois o andar já estava arrendado ao Ministério da Justiça, tendo sido apenas afectado a esse fim. Aliás, trata-se de um 9.° andar de um prédio na Avenida de Infante Santo, creio que no n.° 52. O 8.° andar do prédio vai igualmente ser afectado ao Ministério e, portanto, das verbas de que pudemos dispor apenas se gastou uma fatia mínima da ordem de 1600 contos para pagar a instalação e o mobiliário porque o andar estava vazio. Eis-me, portanto, com toda a abertura, a dizer o que se tem passado.

Entretanto, tem funcionado uma comissão que procurei que fosse pluridisciplinar e qualificada, que é presidida por um advogado, antigo bastonário da Ordem, de que fazem parte um procurador-geral-adjunto, que é o Dr. Lourenço Martins, um advogado que foi director da revista da Ordem dos Advogados quando eu próprio era bastonário, que é o Dr. Jorge Santos, que tem ideias concretas e próprias sobre esta matéria. Desta comissão fazem ainda parte o Sr. Secretário--Geral do Ministério, o qual, antes disso, já pertencia à comissão e, em suma, pessoas ligadas a esta área. Trata-se, portanto, de uma comissão onde, para além de se estar a preparar o conjunto de actuações em matéria do direito à informação, também já se pre-

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parou —em colaboração comigo próprio— o protocolo que irá ser celebrado com a Ordem, entretanto, também a preparar-se a lei sobre a actual assistência judiciária e sobre o patrocínio oficioso. Concretamente, tenho muito gosto em referir, em primeira mão, qual o tipo de protocolo que vai ser assinado amanhã entre o Ministério e a Ordem dos Advogados.

Trimestralmente, o Ministério da Justiça transferirá uma verba para a Ordem dos Advogados. Com esta verba, a Ordem remunerará os advogados e os estagiários de acordo com uma tabela prefixada e de acordo com um número máximo de horas de prestação de serviços, de forma a que se torne uma munificência para alguns advogados estagiários em detrimento de outros. Em suma, tentar-se-á, simultaneamente, ir ao encontro da necessidade de preparar um ambiente de trabalho e de afectação a uma profissão que tem que ser iniciada com um carácter de exclusividade e não considerada como uma profissão secundária em relação a outras. Porque até agora, se não fossem filhos de uma pessoa muito rica ou de um advogado ou se nao estivessem sob a protecção de uma forma qualquer de mecenato forense, os jovens advogados tinham que lançar mão de outras profissões. Portanto, a assinatura deste protocolo vai não só permitir que se acuda a estas situações mas também permitirá que o cidadão carente de consulta jurídica possa ir a esse gabinete nem que seja só para compor os seus litígios com uma fórmula e um ritual o mais informais possível. Na medida em que se assinará amanhã o protocolo com a Ordem, esse gabinete será instalado, embora não comece necessariamente a funcionar no mesmo dia. Duvido que, durante este ano, se possa despender a dotação que havia, mas a verdade é que se tem feito o possível, e, numa matéria tão sensível, não se pode incorrer em precipitações e, sobretudo, não se pode gastar dinheiro só para se dizer que se executou totalmene o que estava previsto. O dinheiro tem-se gasto com a tal preocupação de economia que tem que haver, necessariamente.

Quanto às GOPs para 1986 —pelos vistos foi um «golpe baixo» por parte do Ministério da Justiça, na medida em que não atingiu a dimensão preconizada —, devo dizer, Sr. Deputado, que foram concretizadas todas as tarefas pertencentes ao rol por si enunciado.

No que diz respeito ao Código das Sociedades Comerciais, o Sr. Deputado põe sempre o problema da vacatio da entrada em rigor e de desfasamento. Mas, devo dizer que este não é um código que tenha tido a perfeição formal e o acabamento ideais. Detesto um código com gralhas e este tem-nas, quer de redacção, quer de impressão. Se tem. sido criticado por alguém é sobretudo por aqueles que abusavam dos privilégios da maioria, portanto espanta-me muito que o Sr. Deputado José Magalhães venha acusar o Governo de ter publicado um código que protege francamente as minorias e aqueles que carecem de protecção, que obriga as sociedades a distribuírem dividendos. É que parece que as grandes críticas que têm sido dirigidas contra o Código são as que estão a motivar a acusação que o Sr. Deputado José Magalhães está a fazer...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, para que não persista nenhum equívoco sobre esta questão, permite-me que clarifique um aspecto?

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, só assinalei um aspecto que está evidente para toda a gente que não queira fechar os olhos. Isto é, a forma como se efectivou a entrada em vigor do Código está a conduzir a problemas que já originaram que um partido com sede nesta Casa propusesse o respectivo adiamento. E vai ser exigida a consideração muito cuidadosa de quais as medidas que podemos adoptar para evitar que o tecido económico seja perturbado por essa entrada em vigor, sem prejuízo da posição do meu partido sobre a protecção das minorias, o qual, como bem adivinhará, não é certamente hostil a esse objectivo, mas bem pelo contrário!

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Deputado, quanto à entrada em vigor do Código devo dizer que foi a que sempre esteve estabelecida, e não estava de forma alguma condicionada pela entrada em vigor do Código de Registo Comercial. Aliás, até estou a sair fora do âmbito do orçamento pois isto não tem nada a ver...

O Sr. José Magalhães (PCP): — É política!

O Sr. Ministro da Justiça: — A verdade é que, somente com a sua entrada em vigor, o Código de Registo Comercial não poderá implementar em Portugal todo o sistema moderno de registo comercial. Porque tal só se verificará quando entrar em vigor a Lei Orgânica do Registo do Comércio que cria um registo de comércio que absorverá o famigerado Registo de Pessoas Colectivas, que não é tão mau como o pintam, que pode ser utilizado e que tem um know-how em matéria de estatística e de informática que, certamente, será fundamental para a continuação da sua actividade nessa área. Aproveito para prestar homenagem ao director-geral dos Registos e do Notariado que o é também do Registo de Pessoas Colectivas até pela forma aberta com que tem actuado nesta matéria, e faço-o dado que existe entre nós o melhor sentido de cooperação.

Quanto às alterações de consecução do Plano, não sei que outras GOPs é que não terão sido cumpridas...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Todas as outras, Sr. Ministro da Justiça.

Desde as que estão na p. 1024 (420) do Diário da República...

O Sr. Ministro da Justiça: — Já agora, muito rapidamente, diga quais são.

O Sr. José Magalhães (PCP): — O Código do Processo Penal já não é para este ano, pelo menos com autorização legislativa.

O Sr. Ministro da Justiça: — Ó Sr. Deputado, isso é um autêntico verbalismo...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Ó Sr. Ministro, o que estava aqui anunciado era a publicação...

O Sr. Ministro da Justiça: — Todos sabemos que o Código do Processo Penal está completo e que ainda não entrou em vigor apenas por razões de calendário, que estão à vista de toda a gente.

O Sr. Deputado pegou num exemplo que destrói completamente a sua conclusão.

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O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, continuo enublado por o Sr. Ministro destruir o exemplo dado. Devo dizer que neste caso não é assim porque o Governo chegou a anunciar a entrada em vigor do Código de Processo Penal para o dia 1 de Outunro de 1986 e, como V. Ex.a sabe melhor do que eu, isso não aconteça nem podia acontecer materialmente.

O Sr. Ministro da Justiça: — A questão da verdade dos factos é uma questão que tem de ser respeitada.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Foi assim que o Governo encarou a reforma do processo penal na altura em que foram elaboradas as GOPs.

Em Abril de 1986 o Governo anunciava a entrada em vigor do Código de Processo Penal para 1 de Outubro de 1986 — aqui não há volta a dar-lhe; é um facto histórico! E o Governo foi obrigado a rectificar este seu juízo e chegou à conclusão de que, em 1986, não era possível esta entrada em vigor. Neste momento, concede-a para Junho de 1987. Excelente, Sr. Ministro, vamos ouvir e vamos...

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, é uma rectificação importante que ficava no Código de Processo Penal e, até quase que por imploração do Sr. Presidente e certamente de alguns Srs. Deputados, diria apenas o seguinte.

Se quando foram preparadas as GOPs se anunciava, eventualmente, a entrada em vigor do Código de Processo Penal no dia 1 de Outubro de 1986, não se sabia o tempo que demoraria o debate daquelas na Assembleia.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Não foi um debate.

O Sr. Ministro da Justiça: — Debate esse que, aliás, foi frutuoso e, não tenho vergonha nenhuma de dizer, foi enriquecedor para o Código. E não tenho nenhuma vergonha nem nenhum complexo político-partidario de dizer aqui que, realmente, a cooperação da Assembleia foi muito útil.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Excelente!

O Sr. Ministro da Justiça: — E até a cooperação do Sr. Deputado José Magalhães.

Ora, eu dava um doce ao Sr. Deputado — um doce à sua escolha e da região do País que quiser! — ...

Risos.

... se, alguma vez, ao referir-me ao Ministro da Justiça, dissesse: «Olha, o Ministro da Justiça deu-me razão e fez alguma coisa de bom neste país!» Nunca dirá isto. Eu agora pelo menos caí em dizer isto!

Risos.

Não me quero alongar mais. Já me referi ao acesso ao direito, falarei agora quanto ao encerramento da cadeia de Monsanto no 1." trimestre de 1987, e quedar--me-ia por aqui, mas talvez me refira ainda ao Tribunal de Braga.

Quanto ao encerramento da cadeia de Monsanto no 1.° trimestre de 1987, é evidente que quem queira isto faz um voto pio pois se não há possibilidade de pôr os presos que lá estão noutro sítio, não há possibilidade de os matarmos nem de os lançarmos ao Tejo;

necessariamente que não se pode encerrar Monsanto durante o 1.° trimestre de 1987. A única hipótese que há é a de se concretizar a solicitação que já foi feita à Assembleia no sentido da possibilidade de ocupação do reduto-sul do forte de Caxias, que permitirá que para aí seja feita uma transferência de parte dos reclusos que estão em Monsanto. Enquanto tal não acontecer, podemos é melhorar as instalações da cadeia. Mas para a encerrar só se for através de um remédio boche — como diriam os franceses no sentido de referirem um remédio à alemã — ou através de um remédio à maneira de Challandon que era o de se decretar uma amnistia que punha cá fora 5 mil presos ou quantum satis para se resolver o problema.

Sr. Deputado, salvo o devido respeito — e este é um problema muito sério —, não posso de maneira nenhuma pensar em encerrar um estabelecimento prisional quando não tenho outro que seja sucedâneo dele. Devo dizer que, neste momento, na Direcção-Geral dos Serviços Prisionais está-se a trabalhar intensamente no sentido de se prepararem os projectos e os programas dos novos estabelecimentos prisionais. Só que toda a gente sabe que tal não surge de um momento para o outro e que não é no 1.° trimestre de 1987 que se poderá resolver o assunto.

Que as condições são péssimas, são! Que eu as deploro, deploro! Que deploro que se tenha deixado chegar a cadeia de Monsanto a esta situação, deploro. Devo dizer, Sr. Deputado, que como poderá ver no Boletim do Ministério da Justiça — salvo erro no n.° 280 — há um despacho meu em que se aponta o caso de Monsanto como sendo um caso de sobrelotação e que deveria haver um melhor aproveitamento das instalações. E o Sr. Deputado vê que neste medio tem-pore, realmente, não se fez nada em relação à situação de Monsanto. Agora, fazemos o que é possível. Na verdade, por muito respeito que tenha pela Assembleia, por muito sincero apreço que tenha pelos Srs. Deputados, que, além de deputados, são juristas qualificados, devo dizer que já pertenci à Subcomissão Parlamentar de Análise da Situação Prisional e sei perfeitamente que, já nessa altura, havia tribunais a funcionarem em piores condições que o de Monsanto, designadamente o Tribunal de Paços de Ferreira — ainda há dias lá estive e vi que está a funcionar muitíssimo melhor do que em 1982, Sr. Deputado. Portanto, vamos equilibrar um pouco esta discussão. É evidente que tal não justifica que haja um tribunal a funcionar nas condições em que está o de Monsanto. Só que milagres ninguém faz, nós faremos o que for possível e poremos a nossa imaginação a funcionar o melhor possível.

Já agora farei uma incursão no domínio do registo e notariado. Em 18 de Julho, tive uma reunião com o sindicato em que se aventou a hipótese de uma actualização periódica da comparticipação emolumentar, que resulta do Regulamento dos Registos e Notariado, que data de 1980. Na redacção originária previa-se uma canalização anual, mas como poderá ver na actual redacção houve o cuidado de se utilizar a expressão «periodicamente». Aliás, quero frisar que tive ocasião de o referir à direcção do sindicato.

No Ministério da Justiça sabe-se que sou contra a criação de encargos que não sejam indispensáveis, sem haver a necessária cautela financeira.

Prometi que iria fazer o possível para que tal fosse assim e, entretanto, remeti o problema para um estudo técnico que iria ser feito. Com um simples gesto de

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caneta ou por um mero acto de voluntarismo pessoal ou de caprichismo político não posso deixar de dizer que atribuo um aumento de comparticipações emolumentares aos senhores conservadores e aos senhores notários.

Aliás, para conservadores e notários teria de se estudar qual era o aumento. Há uma série de dados prévios que terão de ser analisados sob a orientação do Sr. Secretário de Estado que tem a seu cargo este pelouro, e depois, como é óbvio, terá de ser tomada uma decisão a nível do Ministério.

Uma das causas da degradação financeira dos cofres, que lentamente está a ser recuperada, foi a criação excessiva de participações emolumentares, que sobrecarregaram as despesas com o pessoal e que conduziram a situações de grande dificuldade.

Quanto ao Tribunal de Braga, tive o prazer de ir a Braga, aproveitando uma deslocação que fiz para inaugurar dois tribunais — afinal de contas, neste país ainda se inauguram tribunais — que foram acabados nos últimos dois anos — como será agora o caso de Valpaços, de Oliveira de Frades e de Estarreja —, onde tive muito gosto em ver um terreno, acompanhado do meu querido amigo José Ferreira Salgado, que é o vice--presidente da Associação Jurídica de Braga, do Sr. Governador Civil e do Sr. Presidente da Câmara.

Devo dizer que esse terreno não é aquele que inicialmente se pensava que fosse, é um terreno melhor.

Nós teremos toda a disponibilidade para iniciar as acções necessárias à resolução do problema de Braga. O actual Tribunal de Braga não está no estado em que o tinha encontrado da última vez que lá advoguei, mas eu também já não estou no mesmo estado...

Risos.

Quer dizer, há usura..., e enquanto as coisas físicas podem ser recuperadas as outras já não podem.

É verdade que o actual Tribunal de Braga está envelhecido mas não está em situação caótica. Curiosamente, o "Sr. Secretário-Geral teve uma reunião com o Sr. Presidente da Câmara de Braga na passada sexta--feira. Está assente o terreno, mas não há verba inscrita no PIDDAC/87. Pode, no entanto, arrancar-se com o projecto.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Dá-me licença, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Justiça: — Com certeza.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Pode arrancar--se com o projecto com base em que verba?

O Sr. Ministro da Justiça: — Para já, o projecto não faz parte da verba do PIDDAC, é sim uma despesa de funcionamento. E um projecto demora uns meses.

Por outro lado, ainda agora o Sr. Deputado teve ocasião de dizer que se aventava a hipótese de a própria Câmara de Braga fazer um avancement no sentido de despoletar esta situação.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Esperemos que não use juros extremamente elevados porque seria o fim do Ministério.

O Sr. Ministro da Justiça: — Espero que não. De qualquer forma, devo dizer que o terreno é magnífico...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Eu conheço-o.

O Sr. Ministro da Justiça: — ... e eu estou o mais aberto possível a esta ideia, até porque, embora não devamos insistir muito na ideia de palácios da justiça de grande espectro, a justiça administrada em edifícios com relevo — como é o caso do Tribunal de Penafiel e do Tribunal de Paredes, que são dois tribunais a que ainda se pode chamar velhos palácios da justiça na exacta acepção de palais francês — confere maior dignidade à justiça, e, no fundo, não é tão mais caro que injustifique a opção por esse tipo de construção.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Ministro, V. Ex.a dá-me licença?

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Não queria estar a interromper o seu raciocínio...

O Sr. Ministro da Justiça: — Não interrompe nada Sr. Deputado; até já tinha terminado a minha intervenção...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Esperava que não, Sr. Ministro, porque coloquei-lhe imensas questões, às quais não respondeu...

O Sr. Ministro da Justiça: — Mas respondo, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Não importa, Sr. Ministro.

Colocava-lhe agora uma questão central, ainda relacionada com a questão dos tribunais, referente ao plano de emergência para fazer face à situação com que nos deparamos que excede muito largamente os mais de 700 000 contos que o PIDDAC inscreve e que correspondem a nada.

Sr. Ministro: Temos programa de emergência, sim ou não? Para quando? Em que termos? O Tribunal da Boa-Hora vai continuar com está?

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Deputado, um plano de emergência dá sempre ideia de uma emergência constitucional, de um estado de sítio ou de excepção e a realidade é que não estamos numa situação suficientemente excepcional — aquilo que em direito constitucional se chama a excepção constitucional.

Eu não minimizo a gravidade do problema, encaro-o com a gravidade e o melindre que ele tem e a verdade é que devo dizer que se vai afectar em 1987 aquilo que já se devia ter afectado há vários anos...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Ah, 733 000 contos!

O Sr. Ministro da Justiça: —..., isso é indiscutível.

Agora não é necessário um plano de emergência, porque desde que tenhamos capacidade de executar tudo isto — e vamos tê-la — conseguimos acudir com normalidade às situações mais gritantes do nosso parque judiciário, porque aquelas que se elencam são dez, quinze ou vinte e, Srs. Deputados, há muitos tribunais que felizmente ainda funcionam em boas condições e que têm sido reparados sucessivamente e em relação aos quais não é necessário fazer uma grande intervenção.

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É evidente que se pergunta se esta verba é óptima, não há solidariedade governamental que me leve a dizer que esta verba é óptima. Agora, é a verba possível e, sobretudo, é uma verba que representa um grande avanço em relação a tudo o que existia antes, porque antes não existia nada, até porque havia sempre a crença mirífica nos cofres. Os cofres davam para tudo, quando já há uma série de anos que não dão para nada. E o mal foi realmente este!

Agora, acredito que não é necessário realizar dramaticamente um plano de emergência, até porque a própria ideia de emergência em relação à justiça tira-lhe a sua natural tranquilidade. Entendo que não temos o direito de dizer que devemos entrar...

O Sr. Deputado entenda-me nos seus precisos termos. Não é o Sr. Deputado que o está a dizer..., mas é uma atitude de reacção.

Atenção, não estou a dizer que seja o Sr. Deputado que o diz. Por amor de Deus, era o que mais faltava!

Risos.

O Sr. Deputado bem sabe a que me refiro. Não se pode dizer que este país está a cair aos bocados e que temos de fazer um plano de emergência. A verdade é que o parque judiciário português tem funcionado mal, deve funcionar melhor e devemos investir todos os esforços nesse sentido. Temos de criar estruturas para que ele funcione melhor e este Orçamento para 1987, não sendo óptimo, é, no entanto, a primeira perspectiva de uma superação do actual estado de coisas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito breve, limitar-me--ei em abordar duas questões prévias e depois responderei a três questões colocadas relativas à área da Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores, ao Gabinete de Planeamento e Coordenação de Controle à Droga e à Direcção-Geral dos Registos e Notariado.

Quanto às questões prévias penso que somos sempre confrontados perante uma situação dilemática. Por um lado, criticam-se lacunas de actuação; por exemplo, no âmbito da extensão territorial da Polícia Judiciária assinalou-se a necessidade de instalar novos departamentos o que ninguém contesta — é de facto assim.

Simplesmente, para isso há necessidade de organizar os meios, designadamente meios de pessoal, de os preparar e de os ter preparados para que os novos departamentos funcionem com operacionalidade.

Por outro lado, criticam-se determinados projectos, medidas e programas de actuação como, por exemplo, no âmbito do problema da droga o facto de se fazer referência à necessidade de implementar medidas de controle e detecção através de aparelhos de raios x.

Quanto ao problema respeitante à concretização e implementação das novas soluções que resultarão do Código de Processo Penal e da nova Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, critica-se a circunstância de não haver meios e de não ter havido o cuidado prévio de os acautelar de modo a dar a execução a essas medidas.

Estamos, de facto, perante uma situação que é natural e normal mas que não deixa de ser uma situação dilemática.

E, realmente voltando, por exemplo, ao problema da criação de novos departamentos da Polícia Judiciária, todos sabem que um departamento não nasce por acaso; há necessidade não só de preparar fisicamente as condições para que ele seja instalado, mas há, mais do que isso, a necessidade de fazer o recrutamento e a formação de pessoal necessário para que o departamento funcione de um modo capaz, e tudo isto implica um planeamento que não se organiza e se executa de um dia para outro.

Foi por estas razões que tive o cuidado de assinalar que as circunstâncias difíceis, as carências e os constrangimentos que afectam a actividade da justiça — não só a actividade da justiça, mas todos os domínios da actividade de um qualquer governo são necessariamente afectados por dificuldades do tipo financeiro — pois esta situação tem causas que nós não podemos esquecer e desafio quem quer que seja a dizer-me que não é exacta a afirmação que fiz a propósito dos sinais de crise que a justiça vivia aquando do 25 de Abril ou que não foram verdadeiros os factores de agravamento dessa crise resultantes do pós-25 de Abril.

E quando se afirma que há situações de palácios de justiça que estão por instalar, uma situação que já se prolonga há 40 anos, pergunto: e que dizer dos outros que já se arrastavam há mais de 40 anos e já foram instalados?

O caso de Penafiel é um exemplo concreto, ao lado do qual podia citar muitos outros palácios de justiça ou tribunais recentemente instalados: Ferreira do Zêzere, Tribunais de Trabalho e de Instrução Criminal de Sintra, Tribunais de Trabalho de Santo Tirso, Vila Franca de Xira, Vila Nova de Gaia e Loures; Palácios da Justiça de Benavente, Figueiró dos Vinhos, Lourinhã, Grândola, Cinfães, Lousã, Caminha, Paredes, Oliveira de Frades, Estarreja e tantos outros.

Como os Srs. Deputados sabem, há todo um conjunto de acções e empreendimentos que estão em curso nas suas diversificadas fases. E um empreendimento não começa com a adjudicação da obra, mas sim no momento da obtenção do terreno e da adjudicação do projecto, tendo este, também, diversas fases: programa prévio, projecto base, anteprojecto e projecto de execução. Ou seja, há dificuldades a vencer que levam o seu tempo.

Há ainda um outro aspecto, que me atreveria a referir nesta intervenção prévia, que acho extremamente importante e que ainda não foi aqui focado. Refiro--me ao esforço que o Ministério da Justiça tem vindo a fazer desde há longos anos e que se tem acentuado ultimamente, no domínio da criação de condições de modernização, não só do aparelho judicial, mas também de todo um conjunto de áreas que dependem do Ministério da Justiça.

Estou a referir-me especificamente, para não o fazer em relação a outros domínios, à informática. Todos conhecemos a utilização da informática pelo Ministério da Justiça em áreas como a identificação civil e os registos automóvel, criminal e das pessoas colectivas, no âmbito da investigação criminal e da gestão de reclusos e na gestão administrativa e financeira.

No ano em curso desenvolveu-se a primeira aplicação no âmbito da gestão judiciária num tribunal piloto e arrancou-se com um primeiro projecto de tratamento automático da documentação jurídica, ou seja, de informática jurídica em sentido estrito, ao nível do tratamento dos pareceres do Conselho Consultivo da

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Procuradoria-Geral da República, ao qual se sucederá, muito naturalmente, o tratamento automático da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo.

Tendo terminado a abordagem das questões prévias que me pareciam importantes referir, reportar-me-ia a algumas questões que o Sr. Ministro fez o favor de me endossar.

Em relação à Direcção-Geral do Serviço Tutelar de Menores, concretamente quanto ao problema que afecta o funcionamento dos serviços e dos estabelecimentos na área do Porto, há realmente uma primeira prioridade que é necessário atribuir — o que se vai fazer — à instalação e operacionalidade de actuação do Centro de Observação e Acção Social do Porto. É de facto uma carência que importa colmatar e para isso temos condições financeiras no PIDDAC que nos permitem arrancar com a realização dessas obras e com o recrutamento do pessoal necessário — que é uma das grandes lacunas que afecta não só a Direcção-Geral do Serviço Tutelar de Menores mas também o Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga.

De facto, só menos de 50% dos lugares do quadro é que estão providos e é verdade que tem havido necessidade de recorrer a tarefeiros, mas, conjuntamente com as condições financeiras que já referi e que não vou repetir, que sem serem as ideais são, de qualquer modo, substancialmente melhores do que aquelas que existem no ano em curso, o problema vai ser resolvido, segundo espero, através da compreensão do Governo para propostas de resolução de descongelamento. Vamos, com certeza, fazer um esforço no sentido de prover vagas e, portanto, ter uma maior capacidade de actuação.

Vamos também, com recurso a esses funcionários a admitir, fazer os esforços possiveis no sentido de pôr a funcionar os lares de semi-internato que existem fisicamente mas que não estão operacionais, tanto do Porto como de Lisboa.

Também vamos dinamizar — como há pouco referi — a colaboração com entidades privadas e públicas que nos possam ajudar a travar este combate.

Muitas das referências que fiz em relação à Direccão--Geral dos Serviços Tutelares de Menores são aplicáveis igualmente ao problema e aos serviços de combate à droga. Também aí, o Sr. Ministro terá oportunidade de, brevemente, apresentar em Conselho de Ministros uma proposta de resolução visando o descongelamento de alguns lugares.

Todos conhecem as dificuldades existentes para o provimento de determinados lugares na função pública, que resultam da respectiva legislação, que é necessário contornar. Aliás, estamos a fazer o esforço possível para as ultrapassar.

Já agora e de passagem em relação à alusão feita de inexistência de subsidio de risco para os guardas prisionais, quero dizer que ele não existe por uma razão muito simples: é que os guardas prisionais têm um estatuto remuneratório especial. Este estatuto não prevê, nem pode prever, o subsídio de risco, porque é um estatuto remuneratório equiparado ao da Polícia de Segurança Pública.

Quanto aos problemas da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado e à questão da remodelação, da reorganização dos serviços, quero dizer que aquela direcção-geral é como uma locomotiva parada há 40 anos. Assim, há que testar as alterações legislativas antes de as pôr a funcionar, antes de as publicar.

De qualquer modo, posso anunciar que se encontra para aprovação a nova lei orgânica do registo de comércio, que constituirá um ensaio de profunda alteração das estruturas e das carreiras.

Aliás, o Código das Sociedades Comerciais, o Código do Registo Comercial e a Lei Orgânica do Registo de Comércio constituem como que um bloco normativo, cujas interdependências, articulações e interconexões são evidentes. De facto, é um ponto de partida extremamente importante para a reorganização profunda dos registos e notariado.

Em relação à alteração do estatuto financeiro, à orçamentação das conservatórias, isso está dependente da Lei Orgânica dos Cofres e o Sr. Ministro já falou, já explicou e já disse que está em preparação essa nova lei orgânica.

No que se refere à inspecção e orientação, quero dizer que o ensaio até agora efectuado, apenas no âmbito das conservatórias de registo predial, tem tido o aplauso geral dos conservadores, particularmente dos mais jovens, que se sentem extremamente apoiados na sua formação profissional. Tem havido reacções de hostilidade pontuais — é verdade que sim —, mas, porventura, essas reacções negativas vêm de unidades que se mostram menos assíduas, que têm ou mantêm os serviços com atraso ou com menor qualidade.

Finalmente, em relação ao problema das despesas, quero referir que já não é correcto agora, como o seria anteriormente, dizer-se que as conservatórias estão dependentes da Direcção-Geral dos Registos e Notariado para as pequenas despesas e nem sequer há falta de bens essenciais como fitas de máquina de escrever — a não ser por negligência do próprio conservador que as não tenha mandado adquirir —, pois as despesas até 250 contos mensais podem ser autorizadas pelos próprios conservadores, observadas, evidentemente, as formalidades legais.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, gostaria de responder a uma questão que me foi posta e a que, na minha intervenção, não cheguei a dar resposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou alongar-me muito, mas, há pouco, não tive ocasião de responder a uma pergunta que me foi posta — salvo erro, pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes — sobre os guardas prisionais.

O Sr. Deputado que colocou a questão queria saber como estava o subsídio de compensação para renda de casa dos guardas prisionais — o subsídio de habitação. Devo dizer que sobre isso já foi publicado um decreto--lei que está em aplicação. Portanto, remeto-o para o Diário da República. Como a residência dos guardas prisionais...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Justiça: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Não é essa a questão, Sr. Ministro. Já estava remetido anteriormente para o Diário da República, que li e conheço — tenho comigo o texto que até posso mostrar...

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A questão é saber se isso basta para dar satisfação a reivindicações, que se nos afiguram justas, dos guardas prisionais — o caso de Pinheiro da Cruz é perfeitamente ilustrativo.

Por outro lado e aproveitando o facto de estar «com a bola no pé», não sei onde é que está a cláusula que impede os guardas prisionais de receberem subsidio de risco, como dizia o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Sr. Ministro. Impedimento legal existirá e gostaria de saber qual é, uma vez que, de outra ordem não se vê — e mesmo que legal houvesse...

O Sr. Ministro da Justiça: — Sem prejuízo da resposta que o Sr. Secretário de Estado depois vier a dar, completo o meu pensamento.

Devo dizer o seguinte quanto aos guardas prisionais: o seu estatuto foi equiparado — como todos os Srs. Deputados sabem — ao do pessoal da Polícia de Segurança Pública, em 1980 e, curiosamente, através de um diploma que é, de certa forma, emblemático de uma actuação que deveria ter sido sempe adoptada. Lá diz-se expressamente que «os encargos daquela equiparação serão dimanados do Orçamento Geral do Estado» — como então se dizia.

Não se imputou este aumento de encargos anuais, que, na altura, se cifrava em 8000 contos/ano, aos cofres, mas sim ao Orçamento do Estado. Este era o primeiro ponto.

Segundo ponto: os guardas prisionais e todo o pessoal de vigilância dos estabelecimentos prisionais tiveram subsídio de compensação como resultado não de uma reivindicação mas de uma preocupação por mim sentida. Achei que deveria existir e esse subsídio foi atribuído sem qualquer necessidade de reivindicação prévia.

Esse subsídio veio minorar, sobretudo, a injustiça relativa existente entre aqueles que tinham residência do Estado, que viviam no próprio estabelecimento prisional, e os que não tinham residência fornecida pelo Estado.

Terceiro ponto relativo aos horários de trabalho que, em alguns casos — não em todos e não de forma tão dramática como a que aqui foi referida —, é uma situação que tem de ser corrigida: neste momento, segundo o que me disse o Sindicato dos Guardas Prisionais numa reunião realizado por minha iniciativa para saber como vão estas coisas, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais está a preparar um levantamento das situações para serem remuneradas as horas extraordinárias nos termos gerais da função pública.

Os subsídios de transporte são vexata quaestio, que estou a tentar resolver e que me preocupa bastante. Muito sumariamente vou dizer o que se passa.

Os guardas prisionais, nos termos do seu estatuto, têm residência obrigatória no estabelecimento prisional e, por outro lado, estão em serviço permanente, não podendo, sequer, nas folgas, recusar-se a prestar serviço. No entanto, e apesar da sua equiparação à Polícia de Segurança Pública e de estarem em situação de serviço permanente, o diploma de 1984 não é suficientemente explícito quanto ao subsídio de transporte, o chamado «passe».

Não se podendo, evidentemente, atribuir um subsídio de transporte que não fosse previamente permitido por lei pediu-se um parecer à Procuradoria-Geral da República, que se pronunciou em sentido negativo. Portanto, não tínhamos lei.

Tinha de criar-se uma lei e nesse sentido preparou--se um projecto de decreto-lei, devidamente justificado. Surgiu, entretanto, uma orientação geral do Governo no sentido de contemplar todas as situações de utilização gratuita de transportes públicos explorados quer por empresas privadas quer por públicas, para evitar uma situação expropriativa. Quer dizer: o Estado pode munificentemente atribuir a 1000 categorias profissionais passes ou transporte gratuito à custa de empresas com economia própria. É dentro desse quadro que tive ocasião de expor aos guardas prisionais, evidenciando o meu interesse pelo assunto e tendo para tal a inteira cooperação do Sr. Ministro dos Transportes, que espero que este problema do transporte se resolva.

É necessário que assim seja até porque gera uma situação de tensão, já que quando vão fardados não são incomodados e quando não — o que por vezes se justifica pela necessidade de não andarem a evidenciar-se como guardas prisionais, pois, qualquer elemento de uma força de segurança ou similar tem, por vezes, necessidade de não patentear a sua condição — são-no.

Ora, por este conjunto de circunstâncias o problema dos guardas prisionais será resolvido a curto prazo. Que todos os demais problemas que noutras áreas possam existir fossem resolvidos com tanta facilidade e presuntiva brevidade!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos ter em qualquer altura de terminar o debate sobre o orçamento do Ministério da Justiça, mas às 21 horas teremos forçosamente de encerrar esta sessão.

Como faltam ainda 5 minutos para as 21 horas, julgo que poderíamos aproveitar esses cinco minutos para os Srs. Deputados, que o desejarem, fazerem um comentário final sobre o debate.

O Sr. Viera Mesquita (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Sr. Presidente, dado o pouco tempo de que dispomos, se vamos concluir a sessão com comentários finais sobre o debate do orçamento do Ministério da Justiça, nem às 22 horas estará terminada. Por aquilo que já se passou, pelo muito de que se falou e se debateu e por termos chegado a uma hora não regimental julgo que seria de interromper a reunião, se ela houver de continuar.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a ideia é a de que a sessão termine mesmo às 21 horas, pelo que peço aos Srs. Deputados dos grupos parlamentares que pretendam fazer comentários finais sobre esta matéria o favor de serem rápidos.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, pedi a palavra e, já agora, uso-a para dizer que, realmente,

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mesmo o Sr. Deputado Vieira Mesquita terá ficado com a sensação de que era preciso continuar a discutir os problemas. Talvez não a esta hora, talvez não nestas circunstâncias constransgentes. Devo dizer que também não tenho o minimo gosto em estar a discutir a esta hora e nestas circunstâncias os problemas da justiça, sobretudo quando há dossiers tão graves a analisar — veja-se que temos as prisões abarrotando de presos e os tribunais a apodrecer. E isto são realidades gravíssimas! ...

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Posso interrompê--lo, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PCP): — Faça favor, Sr. Deputado. Está a ver como é importante falar nisto?

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Sr. Deputado José Magalhães, relativamente àquilo que acabou de dizer sobre as prisões, não é essa a minha convicção.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Não é essa a sua convicção? Então, está mal informado!

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Se me permitir que continue a interrompê-lo, não é essa a minha convicção. Estive nas prisões e pude verificar que, efectivamente, assim não era — se há o caso de Monsanto, esse é um caso isolado.

E aquilo que ouvi ao Sr. Ministro da Justiça e ao seu Secretário de Estado Adjunto satisfez-me relativamente aos projectos e à acção que o Ministério da Justiça tem desenvolvido no sentido positivo de resolver problemas que se acumularam anteriormente.

O passo significativo que foi —e é— dado com o Orçamento de 1987 é muito importante. Assim venham a ser dados novos passos em futuros orçamentos, como os que se dão no presente!

O Sr. José Magdfcães (PCP): — Parece-me que é esta uma situação gravíssima! Andei ao lado do Sr. Deputado Vieira Mesquita nas prisões de Custóias, de Paços de Ferreira e por aí adiante. Em Custóias vi jovenzinhos presos em condições absolutamente lamentáveis. Em Paços de Ferreira «idem idem, aspas aspas».

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Lamentáveis também não!

O Sr. José MagaEnses (PCP): — A situação do sistema preocupa toda a gente e julgava que também preocupava o Sr. Deputado Vieira Mesquita afinal parece que não, deve ser da hora.

O Sr. Vieira MesnjuÈía (PSD): — E preocupa. Mas não posso usar o adjectivo lamentáveis. Isso não.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Em todo o caso, são lamentáveis. Profundamente, a todos os títulos e invocando todos os princípios, incluindo a Constituição, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e um sentimento comum de humanidade.

Não quero dramatizar além daquilo que seja necessário, mas, por exemplo, a verba para manutenção e

funcionamento da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais não vai chegar. O Sr. Ministro diz que sim. Assume responsabilidade política. Por nós, a partir do momento em que diz que a verba vai chegar, não podemos propor um tostão.

Provavelmente, estaremos aqui e logo veremos, no 3.° trimestre —ou coisa assim— de 1987, se o Governo ainda o for nessa altura, qual é a situação da Direcção--Geral dos Serviços Prisionais.

Não vou fazer mais «profecias negras» deste tipo, porque seria demasiado fácil — embora, seja o mais provável e infelizmente demasiado certeiro.

Gostava também de dizer que a questão do debate sobre os problemas da justiça talvez se possa fazer, sem a pressão constrangente do Orçamento, em melhores condições, porque é uma situação demasiado grave para que nos possamos submeter ao arrolamento negativo feito pelas oposições e ao arrolamento positivo feito pelos governos. Isto é: o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, por exemplo, face às observações de que havia situações gravíssimas nos tribunais «arrancou» com as conclusões sobre os avanços informáticos e a administração de equipamentos, e adiantou dois ou três tribunais. Bom, se agarrasse nos projectos reportados e na lista que está aqui à frente, vinha Aveiro, Cantanhede, Coimbra, Covilhã, Funchal, Boa-Hora e por aí adiante... começava a ler e não acabaria, pois são dezanove ou vinte. E os projectos arrastados continuam por aí adiante: Albufeira, Coruche, Espinho, Horta e por aí adiante...

Isto não pode ser! A situação é demasiado grave para que certos equívocos e certos tropos comuns nos discursos «bem-falantes» resistam à análise das finanças.

Creio que o grande trunfo do debate deste ano é que as finanças «vieram ao de cima» e provaram que os 3 milhões não são excessivos, mas sim escassos, não vão dar, pelo que a situação no sector é muito grave e exige outra política e outro orçamento.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): — Sr. Presidente, quero aproveitar esta oportunidade para fazer um comentário à sessão de hoje.

Penso que é muito importante a discussão das várias políticas dos vários ministérios, mas parece-me que o objectivo da reunião em que estamos a participar é a análise do Orçamento do Estado, pelo que conviria que, em futuras reuniões, nos circunscrevêssemos mais ao objecto da reunião a fim de evitar este tipo de tratamento.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.

De qualquer modo, julgo que as questões levantadas por cada um dos Srs. Deputados foi com vista à questão orçamental.

Terminamos aqui a nossa reunião.

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Agradeço ao Sr. Ministro da Justiça, ao Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça e aos directores-gerais do Ministério da Justiça aqui presentes o terem-nos acompanhado nesta «corrida de meio--fundo» pelos meandros das necessidades orçamentais do Ministério.

Agradeço igualmente à Sr.8 Directora-Geral da Contabilidade Pública e demais elementos daquela Direcção-Geral que nos acompanharam na primeira fase da «maratona».

Eram 21 horas e 8 minutos.

Estiveram presentes os seguintes Srs. Deputados:

A Comissão: Presidente, Rui Manuel P. Chancerelle de Machete (PSD) — Vice-Presidente, Ivo Jorge de

Almeida dos S. Pinho (PRD) — Secretário, Octávio Augusto Teixeira (PCP) — Secretário, Abel Gomes de Almeida (CDS) — Belarmino Henriques Correia (PSD) — Fernando Manuel Cardoso Ferreira (PSD) — Alberto Monteiro de Araújo (PSD) — Fernando Próspero Luís (PSD) — Alípio Pereira Dias (PSD) — Fernando Correia Afonso (PSD) — Guido Orlando de Freitas Rodrigues (PSD) — Helena de Melo Torres Marques (PS) — João Cardona Gomes Cravinho (PS) — Eduardo Luís Barreto Ferro RodriguesÇPS) — José da Silva Lopes (PRD) — José Carlos Pereira Liiaia (PRD) — Vítor Manuel Ávila da Silva (PRD) — José Manuel Mendes (PCP) — José Luís Nogueira de Brito (CDS) — João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).

PREÇO DESTE NÚMERO: 258$00

Depósito legal n.0 8319/85

Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E, P.

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