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II SÉRIE — NÚMERO 23

PROJECTO DE LEI DE REVISÃO CONSTITUCIONAL N.° 3/V

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

1. Se a primeira revisão da Constituição de 1976 encerrou o período de transição pós-revolucionário para a institucionalização do regime democrático e a consagração de um genuíno Estado de direito, cabe à próxima revisão a tarefa de aprofundar a vertente económica e de afinar as vertentes política e social da democracia aberta, pluralista e europeia que somos e cada vez mais tendemos a ser.

Nisso se empenha o Grupo Parlamentar do Partido Socialista neste seu projecto.

Não se trata — longe disso — de substituir uma Constituição por outra. À parte alguns saudosistas contados que continuam descontentes com as liberdades conquistadas, os Portugueses continuam a identificar--se com o essencial da Constituição que nos rege. Não assim com algum acessório que sobrou da primeira revisão e que no decurso dos últimos cinco anos foi ficando mais inadequado e mais distante da sua motivação inicial.

Ainda assim, sem ruptura do seu núcleo estruturante. Após a revisão de 1982, a Constituição da República ficou apta a, sem retoque, ser a matriz de um país da Comunidade Europeia. Vem-no sendo sem abalos críticos.

Extensa e programática desde o berço, além de ideologicamente dirigida mais do que usam sê-lo as leis fundamentais das democracias pluralistas, nasceu fadada a ver posta em causa a desejável rigidez das Constituições. Daí a profundidade do primeiro retoque e de algum modo a relativa extensão previsional do segundo.

Ver-se-á que graus de consensualidade se atingem. Desde já, e ao nível da elaboração do seu próprio projecto, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista assume patríoticamente as suas responsabilidades, apresentando as propostas que tem por necessárias e suficientes numa perspectiva de Estado e de eminente defesa do interesse geral.

Sem estratégias preconcebidas.

2. Pouco há a mudar no enunciado dos «Direitos fundamentais». O texto em vigor já os acolhe com formulações que nada têm a aprender com as declarações universais de direitos.

Ainda assim, ensaiam-se aperfeiçoamentos reforça-tivos que confirmam a nossa lei fundamental como a Constituição de um País que viveu tempo de mais sem esses direitos para ter agora deles uma concepção avara.

A nova dimensão do acesso ao direito e aos tribunais; novos direitos reconhecidos aos estrangeiros e apátridas; cautelas reforçadas no condicionamento da suspensão do exercício de direitos; a valorização do Provedor de Justiça; uma nova concepção do papel dos meios de comunicação social; o realce conferido à protecção dos consumidores; novas e indeclináveis exigências no domínio da segurança social; o reforço dos direitos da juventude e da terceira idade; uma nova concepção do direito ao desporto, são exemplos, entre outros, das orientações que se perfilham.

Onde quer que se detectem expressões ideologicamente dirigidas — ainda quando seja o ideário do Partido Socialista a direcção apontada — fazem-se propostas neutralizantes. Com uma cautela; sem consagração

das ideologias contrárias. Sendo certo que não há Constituições ideologicamente puras, podem e devem as Constituições ser ideologicamente neutras.

A Constituição económica liberta-se, no presente projecto, de prejuízos de sentido colectivista. Não ou não tanto porque deles derivem constrangimentos desculpa-bilizantes de não importa que governo. Mas porque, nas economias mistas, com predominância dos mecanismos de mercado, como é e tende cada vez mais a ser a nossa, não devem as Constituições ir além da exigência de que a liberdade de iniciativa e uma salutar concorrência se movam no respeito pelo interesse comum, no quadro da coexistência de três sectores de propriedade dos meios de produção e da subordinação do poder económico ao poder político democrático.

O desbloqueamento da privatização, em certos termos, das nacionalizações posteriores ao 25 de Abril; a sujeição da faculdade de nacionalizar — instrumento de que nenhum Estado prescinde — a critérios de interesse público e ao dever de indemnizar; a clarificação dos sectores de propriedade dos meios de produção, libertando a sua definição de prejuízos conceituais datados a definição dos objectivos da política agrícola sem vinculação constitucional a modelos determinados de reforma agrária, ainda que com a manutenção de alguns dos seus mais comuns instrumentos; a constitu-cionalização da prática da concertação social e a institucionalização do Conselho Económico e Social como seu mais alto instrumento, são as propostas mais relevantes.

Quanto à organização do poder político deve assinaiar-se um importante reforço da democracia participativa, uma procura de mais estabilidade e algumas aberturas à institucionalização de uma salutar alternância política .

A democracia participativa recebe o contributo do referendo deliberativo, ainda que com defesas de fácil justificação, bem como o alargamento do direito de petição e de acção popular. As petições dirigidas à Assembleia da República, com um grau de representatividade a definir por lei, ganham o direito a ser discutidas em plenário. Os consumidores, o património cultural e o ambiente vêem assegurada a sua defesa através de novas e mais vincadas formas de exercício da acção popular.

A introdução da moção construtiva é factor de estabilidade e de alternância, esta propiciada também por leis de consenso reforçado.

O equilíbrio e a separação dos poderes dos órgãos de soberania caracterizadores de um regime semipresi-dencialista são cuidadosamente salvaguardados.

A Assembleia da República e os serviços do Presidente da República passam, com toda a lógica, a dispor de autonomia organizativa, administrativa e financeira.

Reforçam-se, com equilíbrio, os instrumentos de fiscalização política do Governo pelo Parlamento.

Quanto aos tribunais, autonomiza-se dos demais o Tribunal Constitucional e constitucionalizam-se, como obrigatórios, os tribunais administrativos e fiscais.

Aprofumda-se, dentro de limites consensualizáveis, a autonomia regional.

Ultrapassam-se os equívocos de uma década relativos à criação e instituição de regiões administrativas, designadamente obrigando à aprovação, dentro de um ano, da lei da sua criação abstracta.