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II SÉRIE — NÚMERO 23

PPROJECTO DE LEI DE REVISÃO CONSTITUCIONAL N.° 9/V

Preâmbulo

1. O projecto de lei de revisão constitucional que o PRD apresenta orienta-se por algumas linhas fundamentais que lhe dão coerência.

A primeira resulta de que o PRD não é um partido que ostensiva ou veladamente conteste a Constituição. Teria legitimidade que outros não possuem para fazê--!o, pois não existia quando esta foi aprovada. Mas não o faz: acata-a como lei fundamental em vigor e reconhece-a como síntese — imperfeita em muitos pontos sem dúvida, porventura desequilibrada nalguns, mas compilação do essencial — daquilo que o 25 de Abril legou. E o PRD jamais repudiou, e não repudia hoje, esse legado. Tão-pouco invoca ou aceita que se invoque a Constituição como desculpa para insuficiências de acção parlamentar ou governativa.

Daqui decorre que, se o PRD propõe alterações significativas, procura fazê-lo no quadro daquilo que é próprio de uma revisão constitucional.

E fá-lo ainda, tendo em conta que criar de origem é uma coisa, alterar outra: vários preceitos da Constituição não os teria o PRD introduzido, outros não os haveria redigido como se encontram. Mas modificar o que está traz consigo um significado que frequentemente é excessivo e que, quando se ultrapasse o indispensável, não ajuda à estabilização a que todo o texto constitucional deve aspirar.

Acresce que o acatamento da legalidade constitucional implica a necessidade de respeitar, ao menos no processo presente, os limites materiais de revisão constitucional que se encontram consignados. Poderá discutir-se politicamente a decisão de os haver introduzido com a latitude que apresentam. Nenhuma responsabilidade tem nisso o PRD. Mas cumpre-os. No quadro das normas que regem o exercício do poder de revisão constitucional e o delimitam se procurou, pois, o PRD manter. Julga, aliás, que foi até ao limite que essas normas permitem.

2. Segunda linha de orientação, que se reflecte sobretudo naquilo a que é hábito chamar a «parte material» da Constituição traduziu-se nisto: descomprometer, no possível, a linguagem constitucional e reduzir o sentido dirigente da Constituição, desligando-a de opções específicas de futuro, atenuar certas regras, eliminar alguns desequilíbrios; mas manter, e manter com rigor, garantias — que não são só de cidadãos, são ainda de estratos sociais e da própria colectividade, bem como de princípios fundamentais.

A este critério obedece, designadamente, toda a formulação dada ao título 11 da parte II (Estruturas da propriedade dos meios de produção e sectores de actividade) e as regras que se propõem no sector agrário (designação que se teria preferido para epígrafe do título iv dessa parte n e que apenas não se propôs para não tocar num compromisso difícil alcançado em 1982).

Aqui, neste último título, a preocupação fundamental foi a de estabilizar a propriedade e a posse útil da terra. Ali foi a de consignar garantias para os vários sectores de propriedade, sendo certo que o que consta

do título li da parte li é completado peio que se encontra do capítulo ni do título ai da parte i (Direitos e deveres económicos).

No que toca à tão controversa questão das chamadas «desnacionalizações» ou «privatizações», a posição do PRD é simples e clara: entende que a maioria tem legitimidade para fazer variar a extensão do sector público, mas que a possibilidade de variação encontra e deve encontrar limites.

Tais limites são antes de mais os que, para além de impostos pelo artigo 290.°, mesmo interpretado com elasticidade, são reclamados pelo princípio, que ninguém ousará publicamenie contestar, da subordinação do poder económico ao poder político democrático.

A independência do poder democrático requer que o Estado não fique desarmado nos sectores estratégicos da economia — e as armas de legislação e da polícia não chegam.

É ao Estado e às pessoas colectivas públicas, por outro iado, que cabe prestar serviços públicos. Finalmente, nenhuma lógica de concorrência permite justificar que para o sector privado sejam transferidas empresas públicas que actuam, de direito ou de facto, em situação de monopólio ou exclusivo ou de domínio do mercado.

Não quer tudo isto dizer que se tenha obsessão da economia pública — carecida, aliás, de reformas profundas no modo do seu funcionamento. Mas tem-se a noção do equilíbrio e a dos perigos para a independência do poder democrático que resultaria de uma concentração exorbitante do poder económico em Portugal, em mãos nacionais ou estrangeiras, e para a qual existem, de resto, circunstâncias propícias.

Estas são as razões da redacção proposta para o artigo 84.°, que substituiria, na sua função, o actual artigo 83.° (irreversibilidade das nacionalizações). Ponto muito delicado que ficava em aberto era o da definição dos sectores estratégicos da economia, nos quais é vedado ou (alteração significativa relativamente àquilo que hoje consta do artigo 85.°, n.° 3) limitado o acesso de empresas privadas. Devolver pura e simplesmente para a lei esvaziaria de eficácia a norma constitucional. Definir constitucionalmente os sectores estratégicos criaria porventura demasiada rigidez. Optou-se pela solução de remeter para a lei aprovada por maioria de dois terços, mas que pode a qualquer momento ser alterada — coir. a reserva, que aqui se faz, da disponibilidade para substituir essa remissão por uma definição constitucional de sectores necessariamente estratégicos.

De qualquer modo, uma vez determinados esses sectores, é à maioria, com as únicas restrições resultantes da necessidade de respeito da Constituição e da lei e dos poderes do Presidente da República, que cabe decidir o que deve ou não deve ser transferido de sector.

3. Pelo que diz respeito à organização do poder político, as propostas que se formulam traduzem o que sempre foi defendido pelo PRD: atenuação da parti-darização da vida política portuguesa (daí, designadamente, a necessidade de permitir candidaturas apresentadas por grupos de cidadãos) e restabelecimento do equilíbrio de poderes entre o Presidente da República e Governo, comprometido pela revisão de 1982. Acrescentaram-se o reforço dos meios de fiscalização parlamentar e diversas soluções que se têm por aperfeiçoamentos, algumas colhidas de sugestões públicas