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II SÉRIE —NÚMERO 43

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o recurso de admissibilidade apre-sentado pelo Agrupamento de Intervenção Democrática ao projecto de lei n.B 142/V (Lei Orgânica da Assembleia da República).

1—No dia 12 de Janeiro de 1988, foi submetido à apreciação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, um recurso de admissão interposto pelo Agrupamento Parlamentar da Intervenção Democrática, nos termos do artigo 134.8 do Regimento. Aquele agrupamento parlamentar tinha oportunamente recorrido para o Plenário da admissibilidade do projecto de lei n.B 142/V, com base na violação da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente no que diz respeito ao artigo 18.B, n.B 3.

A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu pela conveniência da elaboração de um parecer fundamentado sobre a matéria, tendo nomeado um relator para o efeito.

2 — O relator entendeu por bem, apesar de o Regimento da Assembleia o não exigir, ouvir o agrupamento parlamentar recorrente a fim de se inteirar dos fundamentos da alegada violação da Constituição da República.

O representante da Intervenção Democrática na Comissão explicitou como fundamentos daquela violação a exclusão dos agrupamentos parlamentares dos órgãos previstos no projecto de lei n.° 142/V (Lei Orgânica da Assembleia dá República). Neste entendimento, seriam violados os requisitos das leis restritivas em sede de direitos, liberdades e garantias, especialmente no que concerne ao artigo I8.fl, n.B 3.

3 — Mas será assim? É o que tentaremos analisar seguidamente.

O Prof. Jorge Miranda, in Estudos sobre a Constituição, I vol., p. 66, escreve que a Constituição de 1976 não possui nenhuma cláusula geral sobre o exercício de direitos, quer de todos os direitos, quer de alguma categoria em particular. No entanto, o artigo 16.°, n.B 2, da Constituição da República Portuguesa manda interpretar os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Sustenta-se com êxito a aplicabilidade nesta sede do artigo 29." daquela Convenção, que estipula nos seus números:

2 — No exercício destes direitos e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exlusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática.

3 — Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente aos fins c aos princípios das Nações Unidas.

Levantam-se dificuldades na doutrina acerca da conca-tenação do artigo 29.* da Declaração Universal e do artigo 18.B, n.B 2, da Constituição da República Portuguesa. O Prof. Jorge Miranda defende que o artigo 29.° contempla condições gerais que incidem sobre todos os direitos e que têm a ver com o seu exercício e o artigo 18.9, n.° 2, diz respeito somente aos direitos, liberdades e garantias e têm a ver com o seu conteúdo.

Concluiremos deste modo que o artigo 18.9 apenas se aplica aos direitos, liberdades e garantias, c não a todos os direitos constitucionalmente consagrados. Admite-se a existência de leis restritivas aos direitos, liberdades e garantias e o artigo 18.9, n.<* 2 e 3, prevê quais os seus requisitos. Eles consistem na necessidade da lei restritiva se revestir de carácter geral e abstracto, na não existência de efeitos retroactivos, na impossibilidade de diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais e na limitação ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses protegidos. Como refere Vieira de Andrade, in Direitos Fundamentais na Constituição de 1976. nos casos previstos no artigo 18.9, n.08 2 e 3, a limitação resulta de uma intervenção normativa dos poderes públicos e afasta-se dos limites iminentes ou da colisão de direitos.

4 — Seguidamente, teremos de indagar se a existência de um agrupamento parlamentar integra o elenco dos direitos, liberdades e garantias, uma vez que já concluímos que o artigo 18.° só se aplica àqueles direitos.

O artigo 51.9 consagra a existência de associações e de partidos políticos. Segundo Vital Moreira e Gomes Cano-tilho, in Constituição Portuguesa Anotada, a posição constitucional dos partidos políticos é não apenas de mera licitude, mas de verdadeira funcionalização constitucional. A Constituição da República Portuguesa dá grande destaque aos partidos políticos por oposição às associações políticas.

Estas, segundo Vital Moreira e Gomes Canotilho, prosseguem só alguns dos objectivos dos partidos políticos, não beneficiam do estatuto dos partidos e não gozam de vários direitos, como de entre outros o de apresentação de candidaturas.

Sabemos que o Agrupamento Parlamentar da Intervenção Democrática não tem por base a existência de qualquer partido político. A natureza jurídica da Intervenção Democrática consiste na existência de uma associação política.

Poderemos concluir que, ao configurarmos a ID como associação política por força do artigo 51.9 da Constituição da República Portuguesa, somos favoráveis à aplicação do regime exclusivo dos direitos, liberdades e garantias, nomeadamente o do artigo 18.9 da Constituição da República Portuguesa.

5 — Resta-nos a análise da alegada violação do artigo 18." da Constituição da República Portuguesa pelo projecto de lei n.B 142/V.

Já se enunciaram no n.9 3 os requisitos para a existência de leis restritivas.

Teremos de os analisar detalhadamente e para isso buscamos auxílio na classificação do Prof. Gomes Canotilho:

a) Requisito de lei formal (artigo 18.°, n.9 2). — Os direitos, liberdades c garantias só podem ser restringidos por lei. No caso sub judice. trata-se de um projecto de lei que, com a sua aprovação, promulgação e publicação, será convertido em lei. Não se verifica portanto a violação deste requisito.

b) Requisito de generalidade e abstracção de lei restritiva (artigo 18.B, n.B 3). — Estabelece o artigo 18.9, n.B 3, que as leis restritivas devem possuir um carácter geral e abstracto. O projecto de lei n.fi 142/V dirige-se a um número indeterminado de casos e de pessoas pelo que se verifica igualmente o cumprimento deste requisito.

c) Exigência de autorização de restrição expressa na Constituição (artigo 18.°, n.9 2). — Considera-se que a Constituição individualizou expressamente os direitos sujeitos a reserva de lei restritiva para