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3 DE DEZEMBRO DE 1990

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existência. Logo, não pode ser esvaziado, iransferindo a sua propriedade e a sua gestão, isto é, o que os define, para as juntas de freguesia. Ficou, implícita, esta outra consideração: o que, por principio, deve desenvolverse — a propriedade social — não pode constitucionalmente restringirse.

Tudo de acordo com a alógica mais elementar, pese a • tradição polémica das sensibilidades de escola.

4 — Entretanto, ocorreu a segunda revisão constitucional, que operou no texto em que se fundou o acórdão as seguintes alterações, em resumo de sentido:

Em vez de se garantir a existência, garante-se agora a coexistencia de três sectores de propriedade dos meios de produção;

Desaparece a referencia à propriedade social e ao seu desenvolvimento;

Os meios de produção comunitários, possuídos e geridos por comunidades locais, deixam de integrar o sector público e passam a integrar o sector cooperativo e social;

Continua a ser princípio de organização económico-social a protecção (já não o desenvolvimento) deste sector.

Tudo isto que significado relevante tem no âmbito das soluções contidas nos dispositivos em causa?

Nenhum que possa justificar a conclusão da sua constitucionalidade superveniente. Quando muito, pode pretender-se que sofreu alguma redução o «favor» de que gozava a propriedade social —em que se integrava o subsector dos bens comunitários — traduzida na substituição da garantia do seu desenvolvimento pela garantia da sua protecção.

Mas, embora tenha desaparecido a expressão «bens e unidades dc produção pertencentes a comunidades», para apenas se continuarem a referir os meios dc produção comunitários possuídos c geridos por comunidades locais, nem por isso é lícito julgar-se afastada a conclusão dc que c elemento identificador dos meios dc produção comunitários a atribuição da propriedade desses bens às próprias comunidades locais: quer consideradas universalmente, enquanto lais — ainda que sem personalidade jurídica—, quer como soma de compartes titulares de um direito comum c indivisível. Na primeira destas versões, reiomam-se as «angústias» técnico-jurídicas cm tomo da questão dc saber quem era o «proprietário», titular da «propriedade social». Não assim na segunda.

Em abono da conclusão supra, o facto dc no n.9 1 do artigo 82.9 da Constituição se falar em «três sectores de propriedade», um dos quais seria agora o «cooperativo e social» em que os meios de produção comunitária se integram. Conclusão que, acrescente-se, de algum modo põe em causa a fuga do novo projecto a clarificar de uma vez por todas a velha questão da titularidade dominial dos baldios. Seria pena que se não aproveitasse o impulso constitucional para, a esse respeito, decretar a paz entre os doutores.

Posto isto, cumpre deduzir que continuam a ser invocáveis contra as soluções em causa do decreto n.° 132/V os vícios dc inconstitucionalidade declarados nos acórdãos do Tribunal Constitucional, para que de novo se não caia nelas.

5 — É, porém, lícita a abordagem de um novo caminho para, se for caso disso, recuperar, sem incorrer cm nova inconstitucionalidade, a solução, perfilhada com «nuances» em todos os projectos de alteração da lei de

baldios contribuintes do decreto vetado, ou seja, a de dar cobertura legal à transferência de facto de poderes de gestão dos baldios que a prática quase sem excepção consagrou, das comunidades locais para as juntas de freguesia em cuja área os baldios se localizem.

Neste domínio, com efeito, a vida antecipou-se à lei. E em reconhecimento de que órgãos eleitos pelos condóminos na prática se revelaram menos eficazes gestores do que as novas juntas de freguesia legitimadas pelo voto popular, transferiu para estas os poderes de administração daqueles. O fim da gestão paralela ensaiada após a restituição dos baldios ãs comunidades vem tendo expressão crescente e tem colhido generalizado consenso. Não obstante, remanescem excepções que nao podem deixar de ser tomadas em conta.

Tudo isto para dizer que, sendo constitucionalmente possível, deve procurar-se uma cobertura legal para a situação criada, que, aliás, se não tem por de fácil recuo.

Um caminho possível, que teria o mérito, entre outros, de se traduzir numa opção dos condóminos, sendo pois casuista, seria o de virar do avesso o disposto no artigo 2° do decreto vetado.

Assim: a administração dos baldios continuaria a competir às respectivas comunidades locais, e não às respectivas juntas de freguesia; e em vez de serem estas a poder delegar a sua gestão numa comissão eleita — como no decreto vetado— dos seus utentes, ou em organizações que o costume tiver fixado, seriam agora as comunidades locais, representadas por qualquer dos seus órgãos, a delegar nas juntas de freguesia, na totalidade ou em parte, os respectivos poderes de gestão.

É isto constitucional? Tem-se por certo que sim. Por um lado. o n.9 2 do artigo 114.9 da Constituição só veda a delegação dos poderes dos órgãos de soberania, de região autónoma ou de poder local, noutros órgãos, não a delegação nas juntas de freguesia de poderes originariamente detidos por outros órgãos. E, se é certo que a competência c o funcionamento dos órgãos de soberania são os definidos na Constituição, o mesmo não acontece relativamente aos órgãos do poder local.

Acresce que, mesmo em relação.às competências das juntas de freguesia, a Constituição permite a sua delegação cm organizações dc moradores.

Por último: é próprio do instituto da delegação de poderes, a retenção na fonte da matriz dos poderes delegados, pelo que à fonte podem retornar a iodo o tempo, pela via da livre revogação do mandato implícito no acto de delegar.

E é sabido que o mandatário exerce os poderes delegados em nome e em representação do mandante, tudo se passando como se fosse a própria entidade delegante a exercê-los.

A par da representação política que justifica a sua existência, a junta de freguesia exerceria assim uma forma de representação jurídica de titulares de direitos que cm parte se confundem com os politicamente por cia representados. Nada, pois, de conflituante ou de abnorme.

Quanto aos actos de disposição esses, devem sem reserva permanecer não só na titularidade, mas na disponibilidade dos compartes, e ser exercidos através dos respectivos órgãos representativos.

E claro que também nada impede que aqueles órgãos afectem às juntas de freguesia, no todo ou cm parte, as receitas da exploração dos baldios. Nem que o façam por ácto genérico, c não ano a ano ou caso a caso. Mas têm de ser eles a deliberar em qualquer dos casos.