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II SÉRIE-A — NÚMERO 12

6 — Quer se diga expressamente quer não que a propriedade dos terrenos baldios pertencem às comunidades, ou em comunhão aos compartes, a Constituição já diz o bastante — aliás em confirmação de uma arreigada convicção de base consuetudinária — para se não poder ingorar a existência, o significado e a força desse vínculo dominial.

Daí que não seja nem pacífico nem porventura constitucional impor a formalização de uma nova instituição de baldios que têm séculos de existência consensual, ou mesmo a consagração de uma intervenção do Conselho de Ministros que não revista, quando muito, natureza meramente ratificativa.

O caso é este: se o a baldio é dos compartes; se esse sector de propriedade tem os compartes por proprietários (ainda que em regime de comunhão indivisa), esse direito encontra garantia constitucional no artigo 62.e da Constituição, pelo que dele não pode dispor o Estado, através do Conselho de Ministros, a menos que lance mão do instituto da expropriação por utilidade pública.

Não basta assim a proposta dos condóminos. Faz-se mister a sua decisão.

7 — Munidos destas clarificações preliminares, desbravadoras dos caminhos a percorrer e das opções a perfilhar, impõe-se uma breve reflexão sobre as soluções configuradas no projecto em apreço ou indevidamente deixadas fora dele.

Não se trata, por agora, de um exaustivo exame na especialidade, embora, a espaços, possa a reflexão incidir sobre segmentos de um tal exame. E assim:

7.1 —A optar-se pela consagração expressa da titularidade dominial —que se aconselha—, ela deveria ter lugar no artigo 1* ou autonomamente num artigo l.B-A.

Bastaria que no n.° 1 do artigo 1." se dissesse: «[...] terrenos pertencentes às comunidades locais e por elas possuídos, geridos e aproveitados como logradouro comum, nos termos [...]».

7.2 — É aliás discutível a redução do conceito de baldios aos terrenos. E os fomos comunitários? E os moinhos comunitários? E as eiras comunitárias? Melhor se falaria em «terrenos e outros bens».

7.3 — No n.° 2 do artigo 1.° a expressão «uma ou várias áreas descontínuas» deixa de fora a hipótese (porventura a mais frequente) de uma só área contínua.

7.4 — De novo, no artigo 2.°, se pensa apenas nos terrenos. E, mesmo quanto a estes, deveria o conceito de logradouro comum ser apenas exemplificativo. Bastaria faze-lo preceder de um «nomeadamente».

7.5 — Definir «comunidade local» apenas como um «conjunto de pessoas maiores que desenvolvem [...]», etc, pode gerar, entre outras perplexidades, a de saber se os menores são excluídos do uso do baldio (o que em regra não acontece) ou se se exige a efectividade individual desse uso para se adquirir a qualidade de comparte. Além de que o conceito de comunidade engloba uma afectio que se não contém na simples ideia de um «conjunto».

Seria mais prudente não tentar definir comunidade t reduzir a ambição a definir comparte, talvez a partir do conceito de residência num determinado espaço.

7.6 — Receia-sc que a exigência de inscrição no

recenseamento de compartes como condição do exercício dos direitos de comparte (n.s 3 do artigo 3.°) abrangendo o direito de uso do baldio possa ser fértil em interpretações divisionistas.

Não se há-de esquecer que fenecem cedo as leis que desconhecem ou tentam espartilhar o fluir espontâneo de inveterados usos.

7.7 — No n.° 2 do artigo 4.° volta a restringir-se aos terrenos o conceito de baldio.

Deve, aliás, qualificar-se de «ilícita» a apropriação que se declara nula. E de «nulidade» se tratando, precisa ela de ser «declarada»?

7.8 — No artigo 5.*. não parece que a simples gestão esgote os poderes dos órgãos ali referidos. Nomeadamente a assembleia de compartes tem poderes de representação e disposição. E tem a assembleia poderes de gestão?

Melhor seria deixar a difiniçâo das competências para os dispositivos próprios e dizer aqui apenas quais são os órgãos.

7.9 — Na alínea f) do n.Q 1 do artigo 8.° a expressão «terrenos do baldio» retoma a exclusividade dos terrenos como objecto dos baldios. Crê-se preferível a expressão «terrenos baldios».

E porquê alienação só a compartes? Se um não comparte quiser fixar-se na povoação onde moram os compartes e só tiver lugar para edificar em terreno baldio que confronte com a povoação?

7.10 — «Os critérios de alienação de frutos e produtos» [alínea 0 do n.e 1 do artigo 8.fl] não se incluem nos poderes normais de administração? Será prudente não forçar a reunião frequente, e a propósito de tudo, da assembleia dos compartes. Talvez deva deixar-se este poder ao conselho directivo.

7.11 —O recurso aos tribunais limita-se ao «exercício dos interesses comunitários»? [Alínea m) do n.e 1 do artigo 8.«].

7.12 — São justificadas dúvidas sobre a constitucionalidade da colocação da validade de algumas deliberações da assembleia de compartes na dependência da sua aprovação pelo governador civil. Pois como? Precisar de tal validação a eleição dos próprios órgãos? A regulamentação do uso e fruição, do baldio que, pela Constituição pertence à própria comunidade'} Limitar o direito de a comunidade dispor do que lhe pertence?

Aceila-se um definição de tutela inspectiva genérica. Não uma limitação de direitos que a Constituição garante.

7.13 — No n.B 2 do artigo 13.° deve esclarecer-se que o terceiro mandato que fica proibido é o sucessivo.

7.14 — Considera-se mesmo exequível a existência de um representante do governador civil junto dos órgãos de cada baldio? E para efeitos de simples tutela inspectiva não será demais?

Crê-se que o artigo 15.° assume uma feição excessivamente policiesca. Temos mesmo de sujeitar as comunidades a tal sorte de capitis diminutio e de humilhação?

7.15 — No artigo 16.° voltam os terrenos a constituir o objecto únicp dos baldios.

E se não se entende — como decorre da expressão «terrenos que são» — que a figura da instituição em baldios (sic) só se aplica a baldios que se instituam ex novo, são legítimas sérias dúvidas sobre a constitucionalidade deste dispositivo.

Pois como? Instituir burocraticamente, «hic et nunc», o que séculos de consueludinariedade já consagraram?

Recorre-se, aliás, a conceitos e pressupostos perigosos, como o de indispensabilidade ao logradouro comum em certo momento. Quem ajuíza em nome ou cm substituição de quem é dono? O Conselho de Ministros — diz-se adiante. Pode então dizer não? Sem expropriar? Não o consente o artigo 62.e da Constituição!