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II SÉRIE-A - NÚMERO 44
reduzidas ao mínimo, mas sem que deixe de se reconhecer que os crimes mais graves de tráfico de droga devem merecer equiparação ao tratamento previsto nesse diploma para a criminalidade violenta ou altamente organizada e para o terrorismo.
Sem embargo mesmo de aqui ou acolá se dar por urna certa repetição cujo fundamento se achará na pretensão de colocar nas mãos do aplicador da lei (e do público em geral) um texto de conjunto, que dê cobertura o mais completa possível a uma realidade criminológica que se reflecte em várias vertentes.
4 — Embora partindo do figurino do Decrelo-Lei n.° 430/83, de 13 de Dezembro —recorde-se, preparado com a colaboração de técnicos das Nações Unidas —, opta--se por fazer uma revisão global, a projectar também, ainda que de modo reduzido, no diploma regulamentar.
As modificações ocorridas no processo penal, a revisão do Código Penal que se aproxima, as alterações organizativas que tiveram lugar nos últimos anos, somadas às adaptações decorrentes do direito internacional pactício quer no campo das normas quer dos princípios, surgiram como razões bastantes para empreender uma revisão global dos diplomas. Ademais, esse caminho sempre seria o indicado face ao volume das alterações, pelo pragmatismo de textos assim dotados de maior coerência e de mais fácil manejo.
5 — Posto que o objectivo primeiro da revisão seja o de efectuar as adaptações do direito nacional indispensáveis a tornar eficaz no âmbito interno a aludida Convenção das Nações Unidas de 1988, não se excluía a possibilidade de ponderar outras alterações consideradas importantes, desde que não demandassem estudos muito profundos e necessariamente lentos.
A organização das tabelas anexas ao diploma principal foi um dos pontos objecto de preocupação.
Não ofereceria dificuldade aditar às tabelas existentes as duas listas respeitantes aos precursores, nos termos da Convenção de 1988, aproveitando a oportunidade para integrar as substâncias que, entretanto, haviam sido incluídas por portarias editadas nos termos das Convenções de 1961 e 1971.
No entanto, afigurou-se, em dado momento, que se poderia dar mais um passo no sentido de uma certa gradação de perigosidade das substâncias, reordenando-as em novas tabelas e daí extraindo efeitos no tocante às sanções.
Já hoje, como se sabe, as substâncias constantes da tabela ív anexa ao Decreto-Lei n.u 430/83 são alvo de tratamento diferenciado relativamente as restantes, designadamente no capítulo da punição do tráfico, do incitamento ao seu consumo e do próprio consumo.
Na verdade, começa por não ser pacífico que a organização das tabelas lai como se apresentam nos anexos as Convenções da Nações Unidas de 1961 e 1971, esteja assente numa coerente linha gradativa de perigosidade das diversas substâncias, o que já se reconhecera de algum modo, no Decreto-Lei n.° 430/83, ao deslocar a tabela tv da Convenção sobre Estupefacientes para lugar mais adequado aos seus efeitos nefastos. É pertinente notar que em modelo recente de proposta de regulamentação, a seguir eventualmente pelos legisladores nacionais, as Nações Unidas adoptam aquela posição, ao mesmo tempo que reduzem as tabelas de quatro para três, distinguindo entre drogas de alto risco e drogas de (simples) risco, aditando, evidentemente, uma tabela para os precursores.
As soluções de direito comparado denunciam igualmente um clima de certa mudança, porventura em sintonia com
as aquisições mais recentes da investigação científica sobre os efeitos das substâncias incluídas nas tabelas.
A Inglaterra antes da inclusão dos precursores, seguia uma classificação tripartida, colocando a cannabis, a par das anfetaminas, dos barbitúricos e da metaqualona (classe B), depois dos opiáceos — heroína morfina e metadona — e ãlucinogéneos, bem como dos derivados dos canabinóides (classe A), remetendo as benzodiazepinas para o último grau (classe C). Sem que se faça referência expressa a drogas duras ou leves.
Segundo a lei italiana, revista pela Lei n.° 162, de 26 de Junho de 1990, existe uma diferença clara entre a punição do tráfico de drogas previstas nas suas tabelas i e tu (drogas duras) e o tráfico de drogas das tabelas n e ív (drogas leves).
Assim como assim, a gradação das penas aplicáveis ao tráfico, tendo em conta a real perigosidade das respectivas drogas, afigura-se ser a posição mais compatível com a ideia de proporcionalidade. E, a nosso ver, não implicará adesão à distinção entre drogas duras e leves, muito menos às ilações extraídas por alguns países no campo da descriminalização ou despenalização do consumo.
Simplesmente, a decisão de uma gradação mais ajustada tem de assentar na aferição científica rigorosa da perigosidade das drogas nos seus diversos aspectos, o que tem a ver com o desenvolvimento de estudos a montante das decisões legislativas subsequentes.
E tal perigosidade tem a ver também com motivações que ultrapassam o domínio científico para relevarem de considerandos de natureza sócio-culturãl não minimizáveis. A idade dos compradores e a efectiva possibilidade de «escalada» dos canabinóides — a tabela que inicialmente se pensou poder ser deslocada — para a cocaína e a heroína associada à rejeição da ideia de «tomadas de decisão de larwratório», inlluenciaram o abandono da expectativa inicial.
Tudo para concluir que a matéria da (re)organização das tabelas merece ponderação futura, a efectuar no tempo e sede própria não conciliável com a urgência da revisão agora proposta.
Idêntica postura pareceu de adoptar quanto ao irálico no alto mar. A despeito do relevo crescente que assume como meio preferencial de circulação da droga, aproveitando os traficantes em seu benefício da reduzida capacidade de intervenção dos Estados em águas internacionais, não se encontraram fórmulas que permitissem intensificar o controlo, desde logo pela posição reducionista que advém do próprio artigo 17." da Convenção de 1988.
Com efeito, a predominância conferida ao país do pavilhão, mesmo quando haja suspeita séria de que o navio abusa da liberdade de circulação que o direito internacional garante para se dedicar ao tráfico ilícito, só limitável mediante tratado, acordo ou protocolo, é um sinal de prevalência de certos interesses, nomeadamente os comerciais, como expressamente se reconhece no n.° 5 do artigo 17." , sobre os da saúde e bem-estar da população de todo o mundo.
Esta temática preocupa especialmente os países que fazem parte do Conselho da Europa (Grupo Pompiúoú).
A via do tratado bilateral começa a ser seguida entre países da Região (caso recente da Itália e Espanha). O caminho encetado pela França parecer ser o de alargar a área da intervenção das suas autoridades, de modo expresso, à zona contígua compreendida entre 12 e 24 milhas marítimas, medidas a partir da linha base do mar territorial.