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II SÉRIE - A — NÚMERO 6

Por outras palavras e em resumo: para assegurar a independência dos juízes, a regra é a sua irresponsabilidade.

A responsabilidade civil dos juízes surge assim num quadro de excepcionalidade e não pode, portanto, ser analogicamente equiparada à dos funcionários públicos.

Este regime de irresponsabilidade dos magistrados judiciais é, aliás, confirmado expressamente por diversos diplomas legais (")•

Nos casos em que está expressamente prevista a responsabilidade directa do Estado, como acontece com os cidadãos vítimas de erro judiciário penal (12) e de prisão ilegal (I3), a responsabilidade não é solidária.

Nas situações em que o juiz pode ser criminalmente condenado por peita, prevaricação, denegação de justiça e corrupção (M) a responsabilidade daquele também é directa e não é solidária.

Mas a hipótese prevista no artigo 22.° da Constituição e desenvolvida no projecto é diferente: trata-se de responsabilidade do Estado solidária com a do juiz.

Há, portanto, que definir legalmente o regime excepcional de responsabilidade civil dos juízes.

Esta questão, da responsabilidade civil dos juízes, tem sido, aliás, objecto de preocupação, debate e formalização em muitos países.

A função jurisdicional deve ser exercida com independência. E esta só é efectiva com a irresponsabilidade.

As situações de responsabilização dos juízes serão assim excepcionais e terão de ser definidas como tal.

A dificuldade, cada vez mais actual, está em encontrar a justa medida de responsabilidade que não colida com a indispensável independência dos magistrados judiciais.

Parece evidente que a consagração prática dos direitos fundamentais terá de passar por uma melhoria da sua tutela judicial.

Isto implicará necessariamente uma redefinição dos casos excepcionais de responsabilização civil dos juízes.

O caminho que nos é apontado pelo direito comparado é, antes de mais, o da salvaguarda imediata dos direitos dos cidadãos prejudicados, o que é conseguido efectivamente com a responsabilidade solidária do Estado.

Mas isso não dispensa a definição simultânea da responsabilidade civil concreta dos juízes, em termos de excepção, com a indicação das situações em que o Estado tem direito de regresso.

Só há responsabilidade solidária do Estado quando existir responsabilidade directa dos juízes.

E para isso é indispensável estabelecer os limites materiais da responsabilidade excepciona] dos juízes e, eventualmente, os seus limites processuais.

4 — O projecto de lei n.° 23/VI não define como solidária a responsabilidade do Estado por actos jurisdicionais que violem os direitos, liberdades e garantias —artigos 1.° e 2.°— como impõe o artigo 22." da Constituição da República.

E como não indica os limites materiais excepcionais em que os juízes, titulares dos órgãos jurisdicionais, serão ci-

(") Entre outra1;, a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais (Lei n.° 38/ 87, de 23 de Dezembro, artigo 3.°, n.° 3) e o Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei n." 21/85, de 3 de Julho, artigo 5.").

(1J) Artigo 29°, n,° 6, da Constituição da República Portuguesa.

(1}) Artigo 27°, n." 5, da Constituição da República Portuguesa e artigo 225.° do Código de Processo Penal.

(") Arúgos 411.°, 415°, 416°, 417.° e 420." do Código Penal.

vilmente responsáveis, o artigo 12° do projecto —que prevê o direito de regresso — é inválido e não pode produzir quaisquer efeitos.

V

Nos termos expostos e no seguimento da apreciação sumária atrás produzida, emite-se parecer no sentido de que o projecto de lei n.° 23/VI nao se encontra em conformidade com os dispositivos constitucionais, nomeadamente com os artigos 22.° e 218.°, n.° 2, da Constituição da República.

Palácio de São Bento, 28 de Outubro de 1992. — O Deputado Relator, Fernando Correia Afonso. — O Deputado Presidente da Comissão, Guilherme Silva.

Nota. — Em anexo publica-se a declaração de voto do PCP relativamente ao presente parecer.

ANEXO Declaração de voto do PCP

No Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 153/90 admite-se que o artigo 22.° da Constituição da República prevê, a par da responsabilidade extracontratual do Estado decorrente de factos ilícitos, outras formas de responsabilidade extracontratual (danos provocados por actos lícitos e responsabilidade pelo risco).

A doutrina dominante entende que o artigo 22.° da Constituição da República abrange os casos de responsabilidade do Estado por actos lícitos, mesmo os praticados no exercício da função jurisdicional (v. Jorge Miranda, Gomes Canotilho, Vital Moreira e Vieira de Andrade).

O projecto de lei do PCP insere-se no objectivo de garantir os direitos individuais mesmo face a actos lícitos do Estado.

O artigo 22.° da Constituição da República prevê a responsabilidade civil solidária do Estado e das demais entidades públicas civilmente responsáveis com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes.

Adianta-se, desde já, que o bom entendimento a dar a este preceito constitucional é o seguinte: sempre que as entidades públicas sejam civilmente «irresponsáveis» não deixará, por isso, de ser responsabilizado o Estado.

Assim o entende, por exemplo, Rui Medeiros, no seu ensaio sobre a responsabilidade civil do Estado por actos legislativos.

Embora adoptando o entendimento de que o artigo 22." da Constituição da República Portuguesa apenas se reporta a factos ilícitos e culposos, aquele autor refere que o princípio da solidariedade é apenas um princípio geral que comporta derrogações de carácter excepcional.

De facto, tal como se realça no referido ensaio, a estatuição da solidariedade destina-se, essencialmente, à protecção do lesado.

A possibilidade de accionar o Estado constitui uma garantia do cidadão perante o risco de insolvência do titular do órgão, funcionário ou agente.

Assim, se o preceito constitucional, ao prever a solidariedade, tem como objectivo reforçar o direito à reparação