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2 DE JULHO DE 1994

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O estilo arquitectónico original da abadia, a que D. Maur Cocheril (monge estudioso da Ordem de Cister e de Alcobaça) chamou o «mosteiro do vale», é o da transição do românico para o gótico. A igreja é a maior de Portugal e uma das maiores da Europa, sendo justamente considerada um dos melhores exemplares da arquitectura dos cistercienses. O interior é simples, apesar de grandioso, e quase despojado de elementos decorativos, que apenas se observam nos motivos vegetais dos capitéis. Porém, coexistem no Mosteiro, fruto de intervenções frequentes, diferentes estilos arquitectónicos.

A planta do Mosteiro reproduz Claraval. Depois da consagração, em 1252, da majestosa e austera igreja de abóbadas ogivais, constituída por uma nave central, duas colaterais, um transepto e um coro, as obras prosseguiram, prolongando para poente a nave central da igreja, acres-centando-lhe um deambulatório com nove capelas radiais e, mais tarde, a Sala do Capítulo, a Sala dos Monges, o dormitório, o calefactório, o magnífico refeitório e o claustro de D. Dinis (o maior claustro gótico de Portugal). Este conjunto estava completo no final do século xiv. A igreja ocupava um dos extremos do quadrilátero.

Posteriormente, no século xvi, foram construídos dois claustros do lado nascente: o Claustro do Cardeal, ou dos Noviços, atravessado por uma corrente desviada do rio Alcoa (a Levadinha), e o Claustro do Rachadouro, ou da Biblioteca. Durante os séculos xvi e xvii foi edificada a ala norte, com a Sala dos Reis, a Sala das Conclusões e, no 1.° andar, a hospedaria. Nesta ala norte situa-se um claustro interior, chamado de D. Afonso VI, e outro pequeno claustro. Também no século xvi é construída uma imponente sacristia manuelina, destruída pelo terramoto de 1755, mas de que se conservam o átrio e o portal. A sacristia encerra ainda um excepcional relicário: o «Santuário». Em frente à nova sacristia é edificada uma capela dedicada ao Senhor dos Passos e no braço sul do transepto erige-se um panteão real, que acolhe alguns túmulos dos séculos xiii e xiv. Desligada do corpo do Mosteiro, é construída em etilo barroco, próximo da sacristia manuelina, a Capela de Nossa Senhora do Desterro, completa em 1690. No século xvrn foi dada à igreja uma fachada nova — que todavia manteve o velho portal do século xin —, onde se incrustam imagens de São Bernardo e São Bento, quatro imagens simbolizando as virtudes cardeais e uma imagem de Nossa Senhora da Assunção, padroeira dos mosteiros cistercienses, e que integra ainda uma enorme rosácea e duas torres sineiras. No mesmo século, o Mosteiro foi dotado de uma cozinha moderna (por onde passa uma pequena corrente do rio Alcoa), com uma chaminé monumental, para facilitar o escoamento do fumo. Dentro da cerca do Mosteiro, do lado sul, existiam jardins de inspiração francesa, hortas e pomares. Destes jardins subsiste o pequeno Jardim das Murtas e um tanque, onde, ao centro, foi colocado um obelisco.

Os monges dispunham de uma vasta biblioteca, contendo valiosos códices, que eles próprios copiavam, e livros impressos, que instalaram, mais tarde, em novo espaço na zona sudeste do Mosteiro. No final do século xvi mandaram vir de Lisboa, temporariamente, uma tipografia para a composição dos trabalhos de frei Bernardo de Brito.

A simetria, que a fachada do mosteiro cisterciense não tinha, foi composta no século xvm, com a construção da ala sul, para aí funcionar o Colégio de Nossa Senhora da Conceição, inicialmente instalado próximo da actual igreja homónima e que foi destruído pelo terramoto de 1755.

Este colégio de ensino superior, fundado em 1648, e onde se ministravam as disciplinas de Artes (Literatura, História, Filosofia e Línguas), concedia diplomas iguais aos da Universidade de Coimbra. O ensino era dirigido aos jovens monges e a leigos, que, atraídos pela sua qualidade, foram depois surgindo.

Na igreja do Mosteiro jazem D. Pedro I e D. Inês de Castro, em túmulos colocados, respectivamente, nos braços sul e norte do transepto, delicadamente trabalhados, obras-primas da escultura do século xiv que a tese mais aceite atribui a mestres portugueses. O Mosteiro alberga ainda as imagens de Nossa Senhora do Castelo, ou da Pena, e a Virgem do Claustro. Da escultura de estilo barroco, realizada pelos monges artistas, podem ser admiradas as imagens do Relicário, em talha e barro policromado do final do século xvii, o «Trânsito de São Bernardo» (no braço sul do transepto), igualmente em barro policromado do século xvm, as estátuas dos reis de Portugal até D. José, do Papa e de São Bernardo, na Sala dos Reis, e algumas esculturas retiradas das capelas, do coro e do órgão aquando da controversa reintegração que o Mosteiro conheceu nos anos 30.

A Sala dos Reis tem as paredes revestidas com painéis de azulejos, oriundos da fábrica de louça do Juncal do final do século xvm, que representam uma alegoria da fundação do Mosteiro. A arte do barro teve, além da estatuária, outra aplicação nos mosaicos vidrados, de que era pavimentada originalmente a igreja.

Embora a Ordem prescrevesse a austeridade, os vitrais tiveram alguns artistas entre os monges. Infelizmente, dessas obras, implantadas nas janelas da igreja e salas do Mosteiro, nada mais chegou aos nossos dias que os relatos da sua existência.

Os monges dividiam-se em dois grupos: os monges de coro e os irmãos conversos, estes mais numerosos. Todos seguiam a austera Regra de São Bento, que obriga também ao respeito de um rigoroso silêncio. No século xvi a observância da regra tornou-se mais suave, tendo os monges passado a dedicar mais tempo ao estudo e à arte, embora, tempos depois, tenha aumentado novamente o rigor. Todavia, a vida no Mosteiro esteve, mesmo nessa altura, bem longe daquela que lhe foi atribuída por escritores mal-intencionados.

Pelos seus domínios estabeleceram granjas dedicadas à exploração agrícola e administradas pelos conversos, que aí trabalhavam sob a direcção de um «mestre». Algumas granjas deram origem a vilas, às quais o abade concedeu foral já no século xin: Alfeizerão, Aljubarrota, Cela, Cós, Évora, Maiorga, Paredes, São Martinho do Porto, Turquel, Alvorninha, SaJir de Matos, Santa Catarina e Pederneira. Estes forais foram reformados por D. Manuel no início do século xvi. Questiona-se a autenticidade do foral de Alcobaça datado de 1210, atribuído ao abade D. Fernando Mendes, que Alexandre Herculano publicou, uma vez que, segundo a Dr.* Iria Gonçalves, não passa de uma cópia tardia (do século xvi) de um documento cujo original se desconhece.

Por virtude da carta de 1153, os «coutos» eram lugares fora da jurisdição do rei e sujeitos apenas à jurisdição do abade. Em zonas menos atractivas, que queriam povoar, facilitavam o estabelecimento de colonos. Na actual vila de Alcobaça existia o chamado «couto dos homiziados», onde se podiam acolher fugitivos a contas com a justiça do rei. As populações habituaram-se à protecção do abade e, ao contrário do resto do reino, em situação de perigo não gritavam «Aqui d'el-Rei», mas «Aqui do Abade».