18 DE NOVEMBRO DE 1994
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PROJECTO DE LEI N.s 459/VI LEI DE BASES DO DESENVOLVIMENTO FLORESTAL
Exposição de motivos
A floresta portuguesa, que só por si ocupa 36,5 % do território nacional, constitui, pela sua importância económica, social e ambiental, um enorme recurso natural renovável do País que justifica, de há muito, um quadro geral orientador.
Abrangendo, segundo os dados disponíveis do Instituto Florestal, 3248 milhões de hectares, as exportações de produtos florestais, na ordem dos 300 milhões de contos anuais, representam cerca de 65 % das exportações agro-florestais do País (e 15 % do total global da balança de exportações), estimando-se em 100000 o número de postos de trabalho existentes nas cerca de 4500 unidades da fileira silvo-industrial.
Portugal é o único país exportador líquido de produtos florestais na União Europeia. No entanto, a importância da fileira não se mede somente pela sua dimensão macroeconómica, mas também pelo seu papel insubstituível na defesa da biodiversidade do planeta, no equilíbrio das condições climatéricas e como factor de povoamento do mundo rural.
Dos cerca de 500 000 proprietários florestais existentes no País, 355 000 (71 %) detêm explorações com menos de 4 ha. A floresta, bem como os produtos por esta proporcionados, são uma significativa fonte ou complemento do rendimento agrícola atestado pelo facto de 60 % da floresta se integrar em explorações agrícolas.
A floresta portuguesa situa-se maioritariamente no interior do País, nas zonas desfavorecidas e de montanha, tendo adquirido, por isso mesmo, uma particular importância como factor de desenvolvimento regional e de fixação das populações.
Os produtos lenhosos e não lenhosos e os recursos naturais associados à floresta (desde a madeira à cortiça, à resina, à apicultura, à caça, à silvo-pastorícia, aos frutos secos, ao turismo e ainda aos recursos hídricos) constituem uma multiplicidade de oferta de enorme importância económica e social.
Em Portugal não tem existido uma política global e coerente de defesa e de desenvolvimento da floresta portuguesa nem existe coordenação efectiva entre os vários departamentos com atribuições ou interesses neste domínio, designadamente o Instituto Florestal e entidades com competência em matéria de ambiente e ordenamento do território. A múltipla legislação avulsa existente, bastas vezes publicada em função de interesses particulares e razões conjunturais, não criou até ao momento uma linha orientadora que a prazo seja a base do necessário ordenamento da floresta portuguesa que lhe permita um crescimento equilibrado e sustentado, não exclusivamente ditado por interesses económicos imediatistas, que têm conduzido, inclusivamente, a grandes dificuldades de abastecimento das indústrias transformadoras. Linha orientadora essa que deverá ser também um instrumento de defesa da floresta contra os factores que a têm delapidado, em particular os fogos florestais.
É sabido que na última década o fogo percorreu mais de 1 milhão de hectares de floresta. A rearborização de vastas áreas não tem sido feita, ou tem-no sido na base da regeneração natural ou da sua reconversão artificial para o eucalipto, ou repetindo, predominantemente, os povoamentos anteriores existentes com grandes manchas monoculturais de resinosas.
Por tudo isto, a evolução das áreas florestais em Portugal não se tem processado de modo a perspectivar a recuperação de, pelo menos, parte da nossa vegetação natural nem a pôr
termo às grandes manchas monoculturais de resinosas e, hoje, de eucalipto, a espécie que tem tido um crescimento mais acentuado, traduzindo-se num aumento de cerca de 40 % da sua'área só na última década.
A composição da floresta portuguesa é hoje constituída em cerca de 70 % por quatro espécies, sendo que apenas 14% da sua área é ocupada por povoamentos mistos:
•Pinheiro: 1 047 000 ha; •Sobreiro: 670 000 ha; Eucalipto: 540 000 ha; Azinheira: 470 000 ha.
Importa, contudo, registar que a ausência, por parte do Estado, de actualização do inventário florestal nacional dificulta o conhecimento com rigor e em detalhe da actual estrutura da floresta portuguesa.
Acresce a situação de crise que tem vivido o sector nos últimos três anos, resultado de uma política de navegação à vista, que corre atrás dos interesses e lucros imediatos, sem uma perspectiva sustentada de futuro.
Em resumo, a importância social, económica e ambiental da floresta portuguesa, a sua evolução desordenada, a gravidade dos incêndios florestais e a aceleração do processo de desertificação e erosão de extensas áreas florestais impõem a aprovação de uma lei de bases do desenvolvimento florestal, que o Governo tantas vezes prometeu mas que foi incapaz de propor até ao momento.
Acresce que o previsível alargamento da União Europeia aos países nórdicos, com um forte peso da componente florestal e consequentes efeitos no mercado de produtos florestais, e, por outro lado, no plano interno, as renovadas pressões das empresas de celuloses para uma expansão desregrada das áreas de eucalipto mais impõem a urgência de um quadro estratégico orientador que o Grupo Parlamentar do PCP tem orgulho em apresentar.
A lei de bases do desenvolvimento florestal que o PCP apresenta tem em conta que Portugal é um país, no essencial, de floresta minifundiária, privada e absentista. Em Portugal, o Estado dispõe somente de 2,5 % da área florestal, contra 38 %, em média, na União Europeia. Impõe-se, por isto tudo, um esforço orientador acentuado do Estado que, em cooperação com os produtos florestais, contribua para a modernização, ordenamento, protecção e desenvolvimento da floresta portuguesa, com vista à criação de uma floresta multifuncional e sustentada, factor de povoamento e de desenvolvimento do mundo rural, que privilegie as espécies mais adequadas à nossa inserção no espaço mediterrânico.
Não se ignora que a lei de bases proposta é um diploma de efeitos seguros a médio e longo prazos e que a floresta exige simultaneamente medidas de muito curto prazo. Por isso, e relembrando anteriores iniciativas legislativas do PCP — «Programa de emergência para a floresta portuguesa» e «Medidas de rearborização das áreas ardidas» —, o projecto que agora se apresenta inclui um capítulo dedicado a medidas de emergência e acções com carácter prioritário.
Nestes termos, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, apresentam o seguinte projecto de lei:
CAPÍTULO I Princípios e objectivos da política florestal nacional
Artigo l.° Política florestal
1 — A exploração, conservação, reconversão e expansão da floresta são de interesse público, sem prejuízo do regime jurídico da propriedade.