0153 | II Série A - Número 004 | 26 de Setembro de 2003
a prova da coabitação há mais de dois anos. Sendo também necessário provar a necessidade de alimentos, a cargo da herança do falecido, por parte do sobrevivo, e a impossibilidade de os obter dos seus familiares consanguíneos obrigados à prestação alimentar. (Vide neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 1995, que decidiu que "não pode autonomizar-se o direito a uma pensão de sobrevivência no contexto da união de facto e colocá-lo em paralelo com o mesmo direito no contexto do casamento, face às normas legais já referenciadas")
Mas, por exemplo, o Tribunal de Círculo de Portalegre, na acção ordinária n.º 46/96, decidiu que, para ter direito às prestações por morte, quer no regime geral quer no regime da Função Pública, é apenas necessário demonstrar que à data da morte de beneficiário não casado ou separado judicialmente de pessoas e bens, se vivia com ele, há mais de dois anos, em condições análogas às dos cônjuges"
Por outro lado, também quanto à forma de obter o reconhecimento do direito às prestações, houve nos tribunais soluções divergentes.
E é assim que na acção decidida pelo Tribunal de Portalegre contra a argumentação de que para obter o reconhecimento do direito às prestações seria necessário duas acções judiciais, se veio estabelecer, na sentença, que bastaria uma acção.
Mas o acórdão da Relação de Coimbra de 3 de Outubro de 1995, aliás invocando o Decreto Regulamentar n.º 1/94, decidiu que seriam sempre necessárias duas acções. Uma contra a herança do falecido, para provar o direito a alimentos, e outra, a propor contra a instituição a quem cabe atribuir as pensões, para obter a declaração do direito às prestações por morte.
Perante as dificuldades que, com base na interpretação de disposições legais, se têm colocado ao exercício de direitos a prestações por morte, não admira que só 36 pessoas que viveram em união de facto, estejam a receber pensões da Caixa Geral de Aposentações.
A Lei n.º 7/2001 manteve ainda algumas indefinições que convém superar.
As indefinições são mais flagrantes no que toca às prestações por morte.
Na verdade, no artigo 6.º da lei estabelece-se que, para a atribuição das prestações por morte no âmbito da segurança social, dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, e das pensões por preço de sangue e por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, será necessário reunir as condições constantes do artigo 2020.º do Código Civil.
O que colocará ainda o problema da caducidade pela não propositura da acção no prazo de dois anos.
No caso dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, a referida disposição da Lei n.º 7/2001 contraria até o que a Lei n.º 100/97 estabelece. Na verdade, segundo esta lei específica sobre a sinistralidade laboral, bastará provar que o(a) sinistrado(a) viveu em união de facto com o(a) beneficiário(a). Não sendo assim, necessário, fazer a prova dos outros requisitos do artigo 2020.º do Código Civil. [vide artigo 20.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3 do mesmo artigo, e artigo 22.º, n.º 1, alíneas a) e b) daquela lei].
É certo que no n.º 2 do artigo 1.º se estabelece que a Lei n.º 7/2001 não prejudica a aplicação de qualquer disposição legal ou regulamentar tendente à protecção jurídica das uniões de facto.
Mas então o artigo 6.º bem poderia ter sido compaginado com a lei dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.
Por outro lado, relativamente à forma de exercício dos direitos às prestações por morte, também a lei não toma posição clara sobre a necessidade de uma ou duas acções.
Ora, estamos de acordo com os que defendem que o fundamento da atribuição do direito a alimentos a favor da pessoa que vivia com o falecido, em união de facto estável e duradoura (há mais de dois anos, como marido e mulher), e à custa dos bens da herança do falecido, caso existam e sejam suficientes, radica no estatuto das relações parafamiliares. O também direito a receber alimentos dos próprios parentes, pela pessoa sobreviva, desde que a situação patrimonial destes o possibilite, reside nos laços de parentesco familiar dessa pessoa.
Esse é, de facto, o quadro civilista, no âmbito da aplicação dos artigos 2020.º e 2009.º , alíneas a) e d).
Concordamos com os que defendem que outra é a razão de ser da atribuição do direito à pensão de sobrevivência a haver pela pessoa sobrevivente da união de facto - uma vida em comum em condições análogas às dos cônjuges - da instituição de segurança social competente para essa atribuição, pois a razão deriva do aforro que foi realizado pela pessoa falecida, no decurso de toda uma vida de trabalho, por via dos descontos nas remunerações que foram sendo legalmente e pontualmente depositados à ordem dessa instituição.
França Pitão no seu livro "União de Facto no Direito Português" (Almedina, págs. 177 e seg.s) vai ao encontro do exposto, afirmando:
"(...) o novo preceito estabelece que o companheiro sobrevivo beneficiará das prestações sociais desde que reúna as condições previstas no artigo 2020.º do Código Civil. Ora, seguramente, tal preceito não se refere à necessidade do alimentando nem às possibilidades do alimentante, já que estas condições decorrem daquele outro princípio geral do artigo 2004.º do mesmo diploma. Bastará, por isso, que se faça, a prova do preenchimento dos requisitos legalmente impostos para a eficácia da união de facto, sendo irrelevante, nesta matéria, saber se o companheiro sobrevivo necessita ou não dessas prestações para assegurar a sua sobrevivência ou como mero complemento a esta. Efectivamente, ao estabelecer-se o acesso às prestações sociais pretende-se tão só permitir ao beneficiário um complemento para a sua subsistência, decorrente do 'aforro' que foi efectuado pelo seu falecido companheiro, ao longo da sua vida de trabalho, mediante os descontos mensais depositados à ordem da instituição de segurança social. Por isso, a esta é indiferente saber se o potencial beneficiário tem ou não meios de subsistência próprios, já que as referidas prestações resultam de um direito que lhe assiste incondicionalmente, para além das próprias necessidades comprovadas do seu titular."
Relativamente às pensões de preço de sangue e às pensões por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, realça-se que têm natureza indemnizatória. (Natureza indemnizatória têm também as pensões por acidentes de trabalho e doenças profissionais; mas nessa matéria cremos que o problema está solucionado pois existe legislação específica).
Ora, sobre uma questão relacionada com o direito a prestações de natureza indemnizatória, já o Tribunal Constitucional no acórdão 275/2002 publicado no Diário da República, II Série, n.º 169, de 24 de Julho de 2002, se