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0646 | II Série A - Número 018 | 04 de Dezembro de 2003

 

PROJECTO DE LEI N.º 380/IX
CRIA O INSTITUTO DO SERVIÇO PÚBLICO DE ACESSO AO DIREITO (ISPAD), VISANDO GARANTIR A INFORMAÇÃO, A CONSULTA JURÍDICA E O APOIO JUDICIÁRIO

Diz-se no preâmbulo do projecto de lei n.º 342/IV, do PCP, com a epígrafe "Garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais":
"O artigo 20.º da Constituição representa, simultaneamente, uma importante garantia da igualdade dos cidadãos e uma expressão basilar do princípio democrático, a tal ponto que bem pode dizer-se que o Estado de direito democrático estará por realizar enquanto existirem direitos definidos na lei sem que a maior parte dos cidadãos possam exercê-los ou ter sequer consciência disso."
Apesar dos avanços verificados desde então no que toca à informação e à protecção jurídica, conseguidos, nomeadamente, através de associações que prestam serviços naquelas áreas e no âmbito das suas finalidades e também através dos gabinetes de consulta jurídica, em cuja criação tem tido papel destacado a Ordem dos Advogados, apesar das melhorias entretanto introduzidas na lei, a verdade é que o sistema de que dispomos ainda está bem longe de garantir aos cidadãos carenciados o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva.
As últimas alterações à lei, que remeteram para a segurança social a apreciação do pedido de apoio judiciário, burocratizaram e complicaram os trâmites desse pedido, dificultando ainda mais o acesso dos cidadãos mais carenciados ao direito e aos tribunais, enquanto os mais expeditos e menos carenciados souberam "manipular" a aplicação da lei.
De resto, como então afirmámos durante o debate da proposta de lei, uma decisão sobre um direito fundamental não deverá ficar dependente do Executivo, que já estabelece as verbas disponíveis para o apoio judiciário, e que, daquela forma, fica com poderes para decidir também sobre a forma como tais verbas serão aplicadas.
Uma decisão sobre o reconhecimento de um direito fundamental, como é o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, deverá ser uma decisão jurisdicional e não pode ser uma mera decisão administrativa.
Existe um rico manancial de debates em torno do sistema de acesso ao direito e aos tribunais, quase exaustivamente referidos no preâmbulo do projecto de lei do PCP supra referido, que é, aliás, o seguimento do projecto de lei que também o PCP já apresentara em 15 de Janeiro de 1985.
O II Congresso dos Advogados Portugueses, realizado em Dezembro de 1985, nas suas conclusões dedicou cinco pontos à questão do acesso ao direito, claramente favoráveis à concretização de reformas que alterassem o quadro existente, considerado injusto e lamentável.
De destacar que a Ordem dos Advogados já durante o fascismo desenvolvera esforços para implantar um serviço de ajuda jurídica.
De destacar o importante debate que os advogados portugueses travaram em torno de um anteprojecto de acesso ao direito elaborado pela Ordem e publicado no seu Boletim n.º 17 de Agosto de 1983.
Com base no anteprojecto da Comissão de Acesso ao Direito, criada pelo Despacho n.º 22/78, do Ministro da Justiça (Diário da República 2.ª Série, de 14 de Outubro de 1978), o anteprojecto da Ordem dos Advogados diferia daquele, um tanto, relativamente a algumas soluções, considerando que a Ordem dos Advogados deveria ser o fulcro decisivo e dinamizador de todo o mecanismo de acesso ao direito. A própria estrutura de financiamento do sistema deveria, nos termos desse anteprojecto, funcionar junto da Ordem e ser administrada por esta.
Entretanto, alguns advogados, considerando as novas características da advocacia - da advocacia atomística e liberal passou-se à advocacia de grupo, societária, sindical, de empresas -, propugnaram a criação de um Instituto Público de Acesso ao Direito, a quem competiria a nomeação do advogado oficioso, com garantias de independência quanto ao exercício da sua actividade.
Entende o PCP que é um instituto público que claramente responsabilizará o Estado pela concretização do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva.
Não pode recair apenas sobre os advogados e a sua Ordem a responsabilização sobre o funcionamento da garantia constitucional.
Não pode a Ordem dos Advogados ficar isolada e à mercê de orçamentos minguados para cumprimento da garantia constitucional.
Perante a opinião pública serão então os advogados, com baixas tabelas remuneratórias, a arcar com a responsabilização pelas deficiências do sistema.
Assim, o projecto de lei do PCP propõe a criação do Instituto do Serviço Público de Acesso ao Direito (ISPAD), em cujo funcionamento e gestão terão efectivamente maior peso os advogados portugueses através da sua Ordem, mas que contará também com representantes do Governo, dos solicitadores e das autarquias locais.
O ISPAD é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e património próprio.
Com sede em Lisboa, com delegações regionais na sede de cada um dos distritos judiciais, e com delegados locais na área da comarca.
O ISPAD terá como órgão central de direcção um conselho superior, formado por cinco elementos, sendo o seu presidente, nomeado pelo Governo, um advogado de reconhecido mérito ouvida a Ordem dos Advogados; dois nomeados pelo Governo, sendo um deles solicitador proposto pela Câmara dos Solicitadores, e dois designados pela Ordem dos Advogados. Uma das vice-presidências caberá a um dos elementos designados pela Ordem dos Advogados, e a outra vice-presidência recairá num dos elementos designados pelo Governo.
Resulta, assim, claro que a Ordem dos Advogados tem uma intervenção decisiva na nomeação deste conselho superior, designando dois dos cinco elementos, sendo um deles vice-presidente, e dando parecer sobre um terceiro elemento que é o presidente.
Reconhece-se, desta forma, o papel importante que a Ordem deverá ter na implementação do regime de acesso ao direito.
Mas, ao mesmo tempo, claramente se responsabiliza o Estado pelo sucesso das medidas, quando neste conselho superior estão membros nomeados e designados pelo Governo.
O conselho, de acordo com as suas atribuições e competências, estabelecidas no projecto, terá, de facto, um papel fundamental na garantia da informação jurídica acessível a todos os cidadãos (por forma a que o princípio de que a ignorância da lei não aproveita a ninguém, não se torne um princípio brutal para os mais desprotegidos).