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2309 | II Série A - Número 052 | 17 de Abril de 2004

 

artigo que, desde que fundamentada em necessidades prementes das entidades envolvidas ou em razões de economia, eficácia e eficiência na prossecução das respectivas atribuições, a cedência não exige o acordo do trabalhador.
Pondera o requerente que a norma do artigo 14.º, n.º 2, na medida em que prevê a possibilidade de cedência de um trabalhador, mesmo sem o seu acordo expresso, a outra pessoa colectiva pública, pode considerar-se inconstitucional por violação do princípio da dignidade da pessoa humana, inscrito no artigo 1.º da Constituição, e por violação da concretização deste princípio na garantia constitucional de organização do trabalho em condições socialmente dignificantes que consta do artigo 59.º, n.º 1, alínea b) da Constituição.
É no princípio da dignidade da pessoa humana, proclamado logo no artigo 1.º da Constituição, que repousa a unidade de sentido, de valor e de concordância prática do sistema de direitos fundamentais. A dignidade da pessoa humana, como princípio axiológico fundamental da República, fundamenta e confere unidade aos direitos fundamentais, desde os direitos pessoais (direito à vida, à integridade física e moral, etc.), até aos direitos sociais (direito ao trabalho, à saúde, à habitação), passando pelos direitos dos trabalhadores (direito à segurança no emprego, liberdade sindical, etc.) (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição …, p. 58, Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 2ª ed., pp.93 e segs., Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, IV, pp. 180 e segs. ).
Isto posto não é, todavia, exacto que, ponderadas as especificidades do emprego público, a cedência ocasional de trabalhadores entre pessoas colectivas públicas, nas condições previstas na norma, se traduza numa reificação do trabalhador, com aviltamento da sua dignidade pessoal, como a carga semântica da palavra cedência parece ter inculcado.
Por um lado, como o requerente não deixa de reconhecer, a cedência processa-se no universo das pessoas colectivas públicas e está salvaguardada a não diminuição dos direitos dos trabalhadores cedidos e a aplicação das regras sobre mobilidade funcional e geográfica e tempo de trabalho previstas no Código do Trabalho (artigo 14.º, n.º 3).
Por outro lado, além de só poder ocorrer no universo da Administração Pública, a cedência tem de processar-se "no quadro da colaboração entre pessoas colectivas públicas" e tem de ser fundamentada em necessidades prementes das entidades envolvidas ou em razões de economia, eficácia e eficiência na prossecução das respectivas atribuições. Não é, portanto, um mero instrumento de gestão ordinária de pessoal, mas um modo de prosseguir a tarefa fundamentalmente unitária da Administração Pública e assegurar racionalidade na utilização dos meios humanos e materiais ao seu serviço.
A Administração Pública, ainda quando se serve de instrumentos de direito privado, não é um empregador como outro qualquer. Está sempre subordinada aos princípios da prossecução do interesse público e da legalidade (e não ao da autonomia da vontade; só pode fazer aquilo que for permitido e não tudo aquilo que não for proibido)
Efectivamente, embora pareça exacto que constitucionalmente não existe um princípio de unicidade mas sim um princípio de pluralidade de administrações públicas (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição …, p. 921), o polimorfismo das estruturas organizatórias e a pluralidade das pessoas colectivas públicas são um instrumento para prosseguir as tarefas da administração pública em sentido objectivo, como função ou actividade administrativa. Além disso, a eficiência da Administração Pública traduz também um valor com assento constitucional. É o que deflui do artigo 267.º da Constituição, designadamente ao estabelecer que as formas de descentralização e desconcentração administrativa não devem prejudicar a "necessária eficácia e unidade de acção da Administração". [A doutrina alemã admite o princípio da eficiência como "um princípio constitucional pré-dado". Vd. J. C. Gonçalves Loureiro, O Procedimento Administrativo entre a Eficiência e a Garantia dos Particulares, p. 133].
Nem se objecte com a menor densificação das condições em que pode ter lugar o uso de tal instrumento de mobilidade. Embora o legislador tenha recorrido a conceitos relativamente indeterminados (necessidades prementes, razões de economia, eficácia e eficiência na prossecução das respectivas atribuições), conferindo à pessoa colectiva pública empregadora (recte aos seus órgãos) prerrogativa de avaliação, a interpretação e aplicação que deles seja feita é susceptível de controlo judicial, designadamente nos casos de utilização abusiva ou de erro manifesto de apreciação.
[Recorde-se finalmente que não está aqui em causa "uma relação de trabalho forçada" como, por exemplo, na situação apreciada pelo Acórdão n.º 154/86, publicado no Diário da República, I Série, de 12/6/86 (extinção do quadro geral de adidos), porque não se opera a transferência do trabalhador para outro empregador nem qualquer modificação substancial do regime da relação de emprego. Veja-se também o Acórdão n.º 285/92, publicado no Diário da República, I Série A, de 17 de Agosto de 1992 (racionalização dos recursos humanos na Administração Pública - QEI)].
Tanto basta para considerar que o n.º 2 do artigo 14.º do referido Decreto não viola o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1.º da CRP) e o direito dos trabalhadores à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes (artigo 59.º, n.º 1, alínea b), da CRP), que constitui sua refracção.

III - Decisão

Pelo exposto, ao abrigo do artigo 278.º da Constituição, o Tribunal Constitucional decide:

a) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade da norma constante do n.º 4 do artigo 7.º do Decreto da Assembleia da República n.º 157/IX, na parte em que determina a nulidade dos contratos de trabalho celebrados com violação do n.º 1 do mesmo artigo 7.º;
b) Pronunciar-se pela inconstitucionalidade, por violação do princípio da proporcionalidade, da norma do n.º 5 do artigo 7.º do mesmo Decreto, na parte em que determina a nulidade do contrato de trabalho para a falta de autorização do Ministro das Finanças quando o contrato envolva encargos com remunerações globais superiores aos que resultam da aplicação de regulamentos internos ou dos instrumentos de regulamentação colectiva, mas apenas na medida em que comina a nulidade total do contrato;
c) Pronunciar-se pela inconstitucionalidade, por violação do princípio da proporcionalidade, da norma do n.º 3 do artigo 8.º do mesmo Decreto, na