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0009 | II Série A - Número 073 | 07 de Janeiro de 2006

 

Pode-se, pois, quiçá, afirmar que o direito de mera ordenação social constitui uma espécie de "direito penal menor", o que parece decorrer, também, da análise do Professor Eduardo Correia : "é manifesto que o direito criminal não tem que proteger todos os valores eticamente fundamentáveis. Cabe-lhe realizar tão-só a tutela daquele "mínimo ético", de que falava Jellineck, essencial à vida em sociedade".
Neste contexto, coexistem, já hoje, no nosso ordenamento jurídico um regime geral de contra-ordenações - o aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, e alterado pelo Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de Outubro, pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, pelo Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro -, a par de regimes especiais, como o relativo às contra-ordenações laborais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 491/85, de 26 de Novembro.
Tendo o direito contra-ordenacional vindo a ampliar a sua área actuação às várias actividades económicas e revestindo as disciplinas ambientais um carácter transversal aos vários cenários da actuação humana, precisamente por tutelarem a salvaguarda de valores fundamentais para a saúde, qualidade de vida do homem e da natureza, torna-se imperioso, também, dotar ex novo o nosso ordenamento jurídico de um instrumento normativo que permita, designadamente, processar e punir, de uma forma específica, as condutas socialmente relevantes que, por ofensa àquele tipo de bens jurídicos, não se configuram, contudo, como suficientemente graves para serem subsumidas no típico ilícito criminal.

C) Esboço histórico dos problemas suscitados

O Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho, veio instituir, pela primeira vez, no nosso ordenamento jurídico, o instituto do ilícito de mera ordenação social, numa perspectiva de dotar o sistema de um quadro legal e processual sancionatório alternativo e diferente do direito criminal. No preâmbulo desse diploma o legislador reconhecia expressamente que se trata de um "ordenamento que permita libertar este ramo de direito (o direito penal) das infracções que prestam homenagem a dogmatismos morais ultrapassados e desajustados no quadro de sociedades democráticas e plurais, bem como do número inflacionário e incontrolável das infracções destinadas a assegurar a eficácia dos comandos normativos da Administração, cuja desobediência se não reveste da ressonância moral característica do direito penal. E que permita, outrossim, reservar a intervenção do direito penal para a tutela dos valores ético-sociais fundamentais e salvaguardar a sua plena disponibilidade para retribuir e prevenir com eficácia a onda crescente de criminalidade, nomeadamente da criminalidade violenta."
Concomitantemente, propunha-se este novo normativo, numa perspectiva de direito comparado, "encurtar a distância que, a este propósito", separava "a ordem jurídica portuguesa do direito contemporâneo vigente noutros Estados", os quais haviam já, por um lado, superado definitivamente o modelo do Estado liberal e, por outro, acolhido o movimento da descriminalização.
A aprovação do Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho, representava, pois, em definitivo, a entrada do nosso país no "clube" dos Estados chamados às tarefas de planificação, propulsão e conformação da sua vida económica e social, por pugnarem por um triunfo progressivo, nas respectivas comunidades, de critérios de justiça social e de elevação dos índices da qualidade de vida e do bem-estar material e cultural dos seus cidadãos.
Contudo, a aprovação posterior do Decreto-Lei n.º 411-A/79, de 1 de Outubro, que veio revogar n.os 3 e 4 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho, acabou por retirar a este último regime toda e qualquer eficácia directa e própria - com o fundamento de que ele suscitava problemas vários de aplicação prática, para além de dúvidas sobre a sua constitucionalidade. A aplicação tout court do Decreto-Lei n.º 232/79 implicaria, segundo o legislador do Decreto-Lei n.º 411-A/79, "alterações mais ou menos sensíveis na actividade e organização de vários serviços da Administração, que passariam eles próprios a aplicar as sanções previstas no diploma. Impor-se-ia, assim, uma prévia readaptação das entidades intervenientes, com exacta identificação dos problemas que teriam de ser enfrentados, e que deveriam estar resolvidos quando o novo ordenamento entrasse em vigor."
Assim se chega ao ano de 1982, quando, finalmente, é aprovado o Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, que instituiu o ilícito de mera ordenação social e o respectivo processo, estabelecendo o regime geral em matéria contra-ordenacional.
E é neste enquadramento que, de uma forma avulsa, diploma a diploma, foram sendo incorporadas no ordenamento jurídico interno as várias contra-ordenações e respectivas coimas ainda hoje vigentes em matéria de ambiente.
Continuava, contudo, a faltar um instrumento normativo que permitisse identificar, processar e punir, de forma específica e autónoma, as condutas socialmente relevantes no domínio ambiental que, por ofensa a tais

In Boletim da Faculdade de Direito, vol. XLIX, pág. 266.
Que estabeleciam, respectivamente:

"3 - São equiparáveis às contra-ordenações as contravenções ou transgressões previstas pela lei vigente a que sejam aplicadas sanções pecuniárias.
4 - Ao mesmo regime podem ser submetidos os casos indicados na lei."