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0009 | II Série A - Número 085 | 11 de Fevereiro de 2006

 

faculdade de divórcio. O casamento passou a ser encarado como um encontro de vontades das partes contratantes, e a consumação foi substituída pelo consentimento. É a escolha individual que prevalece, devendo o direito garantir essa liberdade.
Em Portugal o Código Civil de 1867, de influência napoleónica, define o casamento como "um contrato perpétuo feito entre duas pessoas de sexo diferente, com o fim de constituírem legitimamente a família" (artigo 1056.º). Esta presunção de perpetualidade mantém-se, inclusivamente, com a introdução em 1910 do direito de divórcio.
Com o Estado Novo, baseado na doutrina "Deus, Pátria e Família", é repudiada a visão de simples contrato de direito e imposta uma concepção social do casamento como uma das mais importantes instituições sociais. A família é a base social do regime.
Assim, embora conceptualmente se encare actualmente o casamento como um encontro de vontades, pairam ainda resquícios da concepção de família do Estado Novo.
Ora, não sendo já a reprodução considerada como o fim último deste instituto jurídico, ficando tal decisão dependente da escolha livre dos cônjuges, e perante o actual reconhecimento da pluralidade de formas de família, não faz qualquer sentido manter a limitação da celebração do casamento a pessoas de sexo diferente. O Código Civil não impõe qualquer limite de idade para a celebração do casamento, nem obsta ao casamento de qualquer pessoa infértil ou impotente, nem impõe a concepção. A realidade actual demonstra que a reprodução é uma realidade bem diversa do casamento, pelo que também não se pode insistir na manutenção dessa linha argumentativa para impedir pessoas do mesmo sexo do exercício de um direito fundamental.

Realidade europeia e internacional

A Holanda foi o primeiro país a adoptar legalmente o casamento de pessoas do mesmo sexo a 12 de Setembro de 2000, tendo aprovado, em Junho de 2005, alterações a essa mesma legislação de modo a permitir a adopção por casais homossexuais.
Na Bélgica realizam-se casamentos homossexuais desde Julho de 2003, tendo seguido um trajecto semelhante à Holanda no que se refere à adopção.
Em Espanha é possível a celebração de casamentos entre pessoas do mesmo sexo desde 2 de Julho de 2005.
Os países escandinavos e o Reino Unido optaram por criar um novo instituto jurídico que confere às uniões de pessoas do mesmo sexo os mesmos direitos e benefícios do casamento.
Em França existe um contrato específico para as uniões entre pessoas do mesmo sexo, o que em si mesmo constitui uma forma de discriminação.
No Canadá foi aprovada, a 29 de Junho de 2005, a lei que permite a realização de casamentos homossexuais, estendendo, assim, a todo o território uma realidade que já era possível em sete das províncias.
Nos Estados Unidos da América o casamento entre pessoas do mesmo sexo é legal no Estado de Massachussets.
Na África do Sul, no início de Dezembro de 2005, o Tribunal Constitucional concluiu que era ilegal os homossexuais não poderem aceder aos benefícios legais do casamento civil, tendo sido concedido o prazo de um ano ao Parlamento para alterar a legislação de modo a permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

A iniciativa do Bloco de Esquerda

O Bloco de Esquerda considera fundamental a alteração do Código Civil de modo a eliminar uma forma de discriminação, conformando a lei ordinária com a lei constitucional, e conformando essencialmente a lei com a realidade social, permitindo, assim, a celebração do casamento independentemente de se tratar de pessoas de sexo diferente ou do mesmo sexo.
Por isso propõe a alteração do conceito de casamento, quer reformulando o próprio conceito quer retirando a referência a pessoas de sexo diferente. De facto, no casamento o que verdadeiramente está em causa são aspectos pessoais e afectivos que não são disponíveis negocialmente nem de forma duradoura, pelo que não tem qualquer sentido a designação de contrato. O casamento é efectivamente um encontro de duas vontades, que segue uma forma solene. Tal como referiu o Professor Carlos Pamplona Corte-Real, na sua alocução no âmbito do Fórum do casamento entre pessoas do mesmo sexo, "(…) A convenção antenupcial, pela sua índole patrimonial, não pode, aliás, ser tomada como um contrato acessório do casamento. Será, contudo, o único vínculo negocial conjugal de natureza contratual, com uma eficácia dependente e condicionada à do próprio casamento, mas com consequências jurídicas situadas no plano estritamente civilístico-patrimonial. Ou seja: o casamento, em si mesmo, não é qua tale um contrato (é-o a convenção antenupcial) em termos técnicos, por não o poder ser, pura e simplesmente, por estarem em causa situações de natureza indisponível (…) (in http://pwp.netcabo.pt/0170871001/CarlosPamplonaCorteReal.pdf).
Por último, propõe-se a eliminação do casamento contraído por duas pessoas do mesmo sexo como causa de inexistência jurídica.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei: