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73 | II Série A - Número: 107 | 30 de Junho de 2010

A RTP precisa de uma reforma profunda. As alterações verificadas no sector — com a proliferação de canais de acesso pago, a difusão por internet e a introdução da Televisão Digital Terrestre — exigem uma redefinição do interesse público que a sustenta.
Sabemos que a relação do poder político com a comunicação social é sempre um assunto delicado, que levanta dificuldades e desafios ao próprio sistema democrático. A propriedade do Estado de um órgão de comunicação social, e em particular de uma estação de televisão, e a definição da sua missão e estratégia exigem naturalmente especiais cuidados.
No entanto, quase todos os Estados democráticos têm considerado que, perante o enorme poder que as televisões têm na vida democrática, devem reservar para si a existência de canais públicos de televisão. Eles são um meio fundamental de divulgação de ideias, cultura, hábitos cívicos e informação. O seu peso na sociedade justifica-o. Os custos envolvidos para a manutenção de canais generalistas inviabilizam um pluralismo suficientemente satisfatório por via exclusiva dos privados. Sendo o pluralismo na televisão um bem fundamental para a democracia, assim deve ser tratado pelo Estado.
A fragmentação da oferta televisiva parece atenuar a importância das televisões generalistas, mas na verdade não substitui as especiais competências da televisão de serviço público. Pelo contrário, a multiplicação dos operadores de televisão aumenta a necessidade de um referencial de qualidade que só o serviço público pode garantir. Acresce que o facto de, em Portugal, se ter optado por juntar os serviços públicos de rádio e televisão aumenta as especiais responsabilidades da tutela e a especial complexidade da relação entre empresa concessionária do serviço público de rádio e televisão e o poder político.
Só o serviço público de televisão pode garantir uma oferta universal do ponto de vista geográfico, social, cultural e financeiro (paga por todos e por isso de todos dependente); com o objectivo de ser simultaneamente uma alternativa à oferta privada e uma referência no campo da qualidade e inovação. A busca de audiências é, deste ponto vista, importante, não por razões comerciais mas por uma plena eficácia no cumprimento destes objectivos.
Dito isto, a propriedade do Estado de canais públicos de televisão deve obedecer a regras claras de separação de funções. A independência dos canais públicos de televisão — não face ao Estado, mas face aos seus responsáveis políticos conjunturais — é condição fundamental para o cumprimento das suas obrigações.
Ao longo das últimas décadas a RTP tem sido palco de instrumentalização política e de pressões permanentes. As ingerências explícitas ou veladas nas decisões editoriais têm minado o respeito público por aquele órgão de informação e assim descredibilizado o próprio conceito de serviço público.
A dependência da RTP em relação ao Governo teve também efeitos negativos no funcionamento da empresa. A escolha de administradores e directores não tem estado apoiada em critérios sólidos e transparentes, baseados na sua missão pública, e, paradoxalmente, onde a tutela política devia existir — na definição de estratégias e na definição política do conceito de serviço público — ela tem falhado.
Pretende o presente diploma fazer o caminho num sentido de defesa do serviço público de televisão, mudando a tutela da RTP, responsabilizando aqueles que a venham a dirigir, ligando a escolha dos responsáveis pela empresa a opções claras e controlando a sua execução.
Estamos conscientes das limitações da solução que aqui apresentamos. Outras, mais saudáveis, existem em vários países da Europa, em que a escolha da direcção do serviço público de televisão é feita por representantes de movimentos da sociedade civil. Mas estamos também conscientes de que a nossa ainda jovem democracia caracteriza-se por um défice de associativismo. Uma opção deste género poderia criar uma falsa representatividade, capaz de comprometer a credibilidade e autoridade da administração escolhida.
Soluções de intermediação, com a eleição política de um conselho ou autoridade que por sua vez escolhesse a administração da empresa, só serviriam para diluir responsabilidades de quem escolhe e de quem é escolhido.
A eleição pela Assembleia da República, por uma maioria qualificada de dois terços, do Presidente do Conselho de Administração da Rádio Televisão Portuguesa, SA, vinculado a um programa estratégico de serviço público, não garante em absoluto o primado da despartidarização da empresa, mas atenua as pressões sobre os seus responsáveis e legitima democraticamente os termos da sua responsabilização.
Estamos convictos de que a necessidade de encontrar um consenso que permita chegar a uma maioria qualificada para a nomeação do responsável pela empresa obrigará os responsáveis políticos a escolher quem dê garantias mínimas de imparcialidade e tenha um perfil adequado. A escolha democrática do presidente do conselho de administração da RTP é condição para evitar a pura divisão de lugares entre os principais partidos.