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58 | II Série A - Número: 053 | 18 de Dezembro de 2010

Tem havido, de resto, sinais crescentes desta transferência de poderes e do papel mais secundário a que, uns e outros, pretendem remeter os Parlamentos nacionais. Veja-se, por exemplo, a questão de Portugal e a Estratégia Europa 2020.
Não fora pelo facto de alguns partidos políticos terem tentado colocar a discussão na agenda política desta Assembleia, quer na Comissão de Assuntos Económicos quer na Comissão de Assuntos Europeus, e terem chamado o Governo a alguma discussão, as linhas estratégicas que dizem respeito ao nosso país teriam sido entregues em Bruxelas sem qualquer participação do Parlamento nacional.
E, que fique claro, este exemplo que aqui dou não tem uma motivação politicamente dirigida. Acredito que o mesmo se tenha passado noutros países da União Europeia com governos de inclinações distintas.
Quase se poderá dizer que o actual ambiente político europeu privilegia a acção directa (ou relação directa, para não ferir susceptibilidades) entre governos e Comissão e um quase esquecimento do papel dos Parlamentos nacionais.
Refira-se, aliás, como muito preocupante o facto de em toda a União ter havido apenas um país (Reino Unido) que manifestou reservas ao facto do «semestre europeu» obrigar os países a apresentar os seus planos e orçamento à Comissão ainda antes de serem discutidos nos Parlamentos nacionais. E foi também o Reino Unido o único que fez depender da sua concordância a este pacote de medidas de melhoria da Governação Económica da Europa a inclusão de uma ressalva explícita de que não será obrigado a cumprir essa medida em particular. Nós por cá, aliás como na maioria dos países, fomos colocados perante um facto consumado… Vinte anos após a reunificação da Alemanha, quase nove anos após a entrada em vigor do euro, a Europa está carente de líderes políticos à dimensão continental. A crise económica acentua diferenças e leva os países economicamente mais fortes a preocuparem-se mais com a respectiva economia nacional e menos com o projecto europeu.
A verdade e a realidade não são monocromáticas. Com a linha de pensamento anterior cruza-se, pois, uma outra. O aumento de regulação e supervisão do sistema financeiro e das economias nacionais acaba sendo uma consequência natural dos riscos de contágio de problemas económico-financeiros de um país, mesmo pequeno, para outro, num contexto económico de cada vez maiores interdependências.
Parece que foi já há muito tempo mas foi apenas há dois anos que um dos bancos de investimento mais famosos do mundo faliu. O efeito que se seguiu poderia ter tido consequências bem mais gravosas para o sistema financeiro e para a economia mundial, caso se não tivesse estancado a hemorragia.
A questão fulcral neste momento é a de saber qual a melhor maneira de fazer com que sistemas com economias cada vez mais interligadas sejam regulados da melhor forma, evitando, assim, que o colapso de uma tenha efeito dominó nas outras.
Se é verdade que muito se tem falado nas tais instituições demasiado grandes para poder falhar, no caso dos países já se percebeu que também não há países demasiado pequenos para poderem ser deixados falhar. Entre o colapso de uma «pequena» Islândia e os efeitos num «grande» Reino Unido a distância não é tão grande como poderia imaginar-se há duas décadas.
A tentativa de melhoria do modelo de governação económica da Europa surge, pois, com naturalidade no contexto em que ocorre. Importa saber é se será suficiente para de facto melhorar alguma coisa. E, tal como atrás escrevi, fica-me a dúvida se não terá sido este um pretexto conveniente para uma reforma que vai para além da mera melhoria da supervisão e governação económica.
Algumas das medidas propostas pela Comissão, e neste parecer já abordadas, são necessariamente polémicas por entrarem mais fundo no último reduto de independência económica de que os países da Zona Euro ainda gozavam.
A Comunidade Europeia do Carvão e do Aço evoluiu para algo mais substancial. E as diversas etapas da actual crise económica e financeira puseram a nu o facto de ser muito difícil a uma União política que evoluiu no sentido de uma União monetária não ter mecanismos de co-responsabilização e governança em termos de gestão orçamental. Mas não seriam já suficientes as sanções previstas no anterior Pacto de Estabilidade e Crescimento desde que, bem entendido, fossem aplicadas a todos, chamem-se França ou Portugal? Pagando direitos de autor por uma expressão recentemente utilizada para justificar pecados próprios e má fortuna, de facto, «o mundo mudou».