O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

II SÉRIE-A — NÚMERO 147

28

Maria Lúcia Amaral.

DECLARAÇÃO DE VOTO

Vencido quanto à pronúncia pela inconstitucionalidade constante da alínea (ii) da decisão, pelas seguintes

razões essenciais:

A) Embora acompanhando, de um modo geral, as considerações do acórdão acerca do princípio da

“reserva de lei” a que, nos termos do n.º 2 do art.º 111.º da Constituição, está sujeita a delegação de poderes,

entendo que a norma habilitante em causa satisfaz, no contexto em que se destina a operar a delegação

intersubjetiva a que respeita, os requisitos de determinação de conteúdo e de identificação dos sujeitos da

delegação que, em função das razões que constitucionalmente a justificam, se impõem ao legislador

preservar.

Com efeito, o instrumento da delegação é um contrato interadministrativo (cfr. art.º 338.º do Código dos

Contratos Públicos), cujas linhas gerais constam dos art.os

103.º a 109.º do diploma que, aliás, o acórdão

destaca. Desde logo, o caracter bilateral e as exigências a que a celebração, execução e cessação do contrato

delegatório obedece são idóneos a preservar as condições jurídicas e materiais da autonomia dos entes que

recebem a delegação, pelo que esta vertente da função da reserva de lei não está em risco. Os intervenientes

intervêm, num plano de igualdade jurídica e numa perspetiva de harmonização do desempenho das

atribuições dos entes respetivos. A questão da insuficiente determinação de conteúdo da norma habilitante só

poderia ser problemática na vertente do risco de “autoexoneração” das tarefas legalmente cometidas ao

delegante que a relativa indeterminação resultante do uso de cláusulas gerais poderia potenciar.

Para tanto, porém, no juízo sobre os requisitos constitucionalmente exigidos à norma habilitante, não pode

abstrair-se do concreto domínio material e de organização administrativa em que a delegação se destina a

operar. Na hipótese, estamos num quadro de cooperação interadministrativa, destinada a tornar mais eficiente

e eficaz a atuação da Administração Pública, permitindo uma individualização apropriada às situações de

“interesses próprios das populações” da autarquia respetiva que o enunciado legal dificilmente pode elencar

de modo exaustivo perante o concurso de atribuições de pessoas coletivas de fins múltiplos. Para cumprir a

exigência de delimitação do âmbito material de delegação competências do Estado (rectius, de órgãos do

Estado) nas autarquias, a lei estabelece um limite negativo (a intangibilidade das atribuições estaduais), um

limite positivo (todos os domínios dos interesses próprios das populações das autarquias locais, em especial

no âmbito das funções económicas e sociais) e uma vinculação teleológica (a promoção da coesão territorial,

o reforço da solidariedade inter-regional, a melhoria da qualidade dos serviços prestados às populações e a

racionalização dos recursos disponíveis). Trata-se do desempenho de tarefas e do exercício de poderes

administrativos conferidos por lei, em zonas de confluência de atribuições do poder central e do poder local.

Na substancia das coisas, a técnica legislativa utilizada não oferece menor préstimo para o controlo do

exercício do poder correspondente (por parte da Administração, dos particulares e dos tribunais) do que as

alternativas razoavelmente concebíveis, que dificilmente poderiam ir além de uma lista genérica de domínios

de atribuições em que a competência (os poderes legalmente conferidos aos órgãos do Estado) é delegável

(cfr. v. gr. art. 13.º do Decreto-Lei n.º 159/99, de 14 de setembro).

Por outro lado, o regime em apreço também não merece a censura que o acórdão lhe faz por

indeterminação dos órgãos do Estado com competência para delegar. A delegação surge no diploma em

causa como uma forma de articulação de atribuições (art.º 100.º, n.º 1), no âmbito da função administrativa do

Estado. Abstratamente, podem delegar poderes todos os órgãos do Estado no âmbito da sua função

administrativa, desde que observado o regime competencial para se obrigar em contrato interadministrativo e

os referidos limites materiais. Mas os poderes delegados só podem ser aqueles que, no âmbito das atribuições

do Estado com incidência nos interesses próprios das populações da autarquia, surjam no elenco de

competências que a lei (diploma orgânico, atribuição legal avulsa ou especial) comete a cada órgão do Estado

Assim, a titularidade da competência dispositiva primária no âmbito suscetível de delegação considerado torna