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23 | II Série A - Número: 078 | 7 de Março de 2014

candidaturas deve ser harmonizado com a liberdade editorial dos jornalistas e dos órgãos de comunicação social. Reclama-se uma ponderação entre realidades de igual dignidade constitucional, uma vez que ambos beneficiam do regime de proteção dos direitos, liberdades e garantias, nos termos do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Contudo, o progressivo défice de adaptação à realidade jornalística dos distintos regimes que regulam as campanhas eleitorais e a contradição crescente entre estes conduziram a uma lógica de inexequibilidade das regras existentes, o que se tornou patente na campanha eleitoral para a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais de 2013.
A omissão de cobertura jornalística por parte de muitos órgãos de comunicação social que então se verificou prejudicou o esclarecimento dos eleitores e retirou dimensão social a esse ato que deveria coroar plenamente a democracia.
Muitas foram as exortações provenientes da sociedade civil e de titulares de órgãos de soberania, nomeadamente o Sr. Presidente da República, para que se criassem condições que permitissem superar a situação.
O poder legislativo não poderia ficar indiferente a este impasse democrático.
Por um lado, está em causa o princípio da igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas, previsto no artigo 113.º, n.º 3, alínea a) da CRP, que constitui uma concretização, em sede de direito eleitoral, do princípio geral da igualdade (artigo 13.º). Por outro, releva a liberdade de informação e de imprensa, constituindo a garantia dos direitos dos jornalistas uma dimensão concretizadora do direito à liberdade de imprensa. O artigo 38.º da CRP eleva os direitos dos jornalistas à dignidade de direito formalmente constitucional e isso reveste a maior importância, imunizando-os contra qualquer tipo de funcionalização do seu exercício.
Um dos fatores que mais tem contribuído para o conflito potencial entre os princípios da liberdade editorial e o da igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas resulta da equiparação integral entre os períodos de pré-campanha e de campanha eleitoral que tem sido feito por alguma jurisprudência e doutrina. Urge separar legislativamente os dois períodos que são substancialmente distintos, permitindo que ambos se complementem com evidentes vantagens para o processo democrático.
Conforme resulta da interpretação conjugada dos artigos 37.º e 38.º da CRP, esta protege especificamente a atividade dos meios de comunicação social como veículos da liberdade de expressão e de informação.
Neste contexto, note-se que uma das dimensões fundamentais da liberdade de radiodifusão consiste precisamente na liberdade de conformação da programação, sendo esta definida de acordo com as ideias de criatividade e de trabalho editorial ou redatorial 1; Por isso, a liberdade de programação deve ser entendida como direito negativo, de defesa contra o Estado e através dele, justificando-se uma forte suspeita de inconstitucionalidade sobre todas as interferências do Estado, diretas ou indiretas, na definição de conteúdos conformados pela liberdade editorial e protegidos pelos direitos constitucionais dos jornalistas.
No ano em que se comemoram 40 anos da revolução do 25 de abril, cumpre-nos constatar que a questão do tratamento jornalístico das campanhas eleitorais tem sido contaminada por uma turbulência conceptual em sede legislativa entre realidades potencialmente antagónicas: jornalismo/informação e propaganda eleitoral.
Aliás, é mesmo possível sustentar que, em princípio, no plano constitucional, aquilo que torna estes dois conceitos especialmente valiosos em específico ambiente eleitoral reclama, precisamente a sua autonomia recíproca. Acresce a este quadro a confusão legislativa e jurisprudencial sobre esta matéria que perturba a proteção da confiança a que o Estado deve especial atenção.
O problema adquire expressão plena no Decreto-lei n.º 85-D/75 (lei especial destinada a regular a campanha eleitoral para a Assembleia Constituinte). Alguma doutrina constitucional tem inclusivamente sustentado que este Decreto-Lei padece de inconstitucionalidade superveniente, por força da entrada em vigor da Constituição de 1976, não resistindo a uma análise de conformidade material com o novo ordenamento jurídico-constitucional, conforme determina o artigo 290.º, n.º 2, da CRP, e que deveria considerar-se 1 Jónatas Machado, (2002), Liberdade de Expressão: Dimensões Constitucionais da Esfera Pública no Sistema Social, Coimbra Editora: Coimbra; p. 632.