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15 | II Série A - Número: 107 | 7 de Maio de 2014

3. Da mesma forma, a relatora não entende que se inscreva como dever o dever de tutela, quando a tutela tem o significado preciso que conhecemos em direito público, que é o caso: o poder de fiscalização e orientação de uma entidade ou de órgão da administração em relação a outro órgão ou a outra entidade administrativa. 4. O desdobramento de deveres já incluídos noutros ou a introdução de deveres que não parecem, pelo menos no seu nome, reconduzirem-se à categoria em causa devem ser apontados como problemas de técnica legislativa a merecer, na opinião da relatora, melhor arrumo, mas não mais do que isso.
5. Deve ser especificado que a publicação das decisões dos recursos disciplinares e das penas disciplinares, previstas no artigo 36º, não pode ser feita na internet, como sublinhou a CNPD, uma vez que “a divulgação de informação pessoal desta natureza por esta via corresponderia a uma pena acessória por um período ilimitado, o que não é admissível na ordem jurídica constitucional portuguesa”.
6. Ter-se por infração disciplinar (artigo 4.º), e portanto passível de aplicação de penas, um facto meramente negligente é, crê-se, uma violação do princípio da proporcionalidade. Não se vislumbra que as restrições previstas no diploma (penas), as quais naturalmente se justificam para salvaguardar o respeito pelos deveres essenciais ao funcionamento regular da GNR, sobrevivam a um juízo de adequação a um comportamento meramente negligente. Ou que a punição, se se quiser, de um comportamento meramente negligente seja exigível para a salvaguarda dos interesses e valores em presença. Daí que se tenha, também, por consequentemente inconstitucionais o artigos 19.º - que classifica como infrações disciplinares leves comportamentos cometidos com negligência simples de que não resulte dano ou prejuízo para o serviço ou para terceiros e que não ponham em causa o prestígio e o bom nome da instituição – e o preceito que em cada caso seja invocado, consequentemente, para aplicar uma das penas previstas no artigo 27.º. Se a desproporcionalidade de se punir quem com mera negligência nada causou em termos de dano surge como evidente, não menos evidente parece ser a violação do princípio da culpa. De resto, antes mesmo da apresentação desta PL, já se constatava o excesso na aplicação das penas disciplinares. Em Maio de 2012 a Associação Sócio-Profissional Independente da Guarda Nacional Republicana (ASPIG) emitiu um comunicado constatando que, ao longo dos anos, a Inspeção Geral da Administração Interna (IGAI) tem, sistematicamente, aplicado penas disciplinares a militares da Guarda que, na sua perspetiva seriam “exageradas”.
7. Os artigos 20.º e 21.º conferem, em face da redação de duas faces dos preceitos, uma discricionariedade ao decisor que põe em causa o princípio da legalidade. Note-se que se classifica como infrações disciplinares graves os comportamentos cometidos com negligência grosseira ou dolo (artigo 20.º) e, de seguida, classifica-se como infrações disciplinares muito graves os comportamentos cometidos com negligência grosseira ou dolo (artigo 2.º). O decisor depara-se, assim, com duas classificações à escolha, com consequências naturalmente diferentes no grau de intensidade da pena, com um elemento comum – o dolo.
Havendo dolo, nada na letra ou no espírito das normas permitem um escrutínio da classificação da infração disciplinar como grave ou muito grave. 8. Tem-se por problemático, do ponto de vista da sua constitucionalidade, o n.º 3 do artigo 27.º, isto é, a determinação da transferência compulsiva como uma pena acessória das principais, como a suspensão. O preceito viola o artigo 30.ª, n.ª 4, da Constituição (CRP), segundo o qual “nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos”. Na anotação a este comando constitucional, referem os Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, pág. 198) que “o que se pretende ç proibir que á condenação em certas penas se acrescente de forma automática, mecanicamente, independentemente de decisão judicial, por efeito direto da lei, uma outra pena daquela natureza”. Os mesmos autores acrescentam que “a teleologia intrínseca da norma consiste em retirar às penas efeitos estigmatizantes, impossibilitadores da readaptação social do delinquente e impedir que, de forma mecânica, sem atender aos princípios de culpa, da necessidade e da jurisdicionalidade, se decrete a morte civil, profissional ou política do cidadão (cf. Ac TC n.º 16/84, 91/84, 310/85, 75/86, entre outros) ”. Como tem decidido o TC em vários acórdãos, os efeitos das penas traduzem-se materialmente numa verdadeira pena, que não pode deixar de estar sujeita, na sua aplicação, às regras próprias do Estado de Direito democrático, designadamente reserva judicial, princípio da culpa, proporcionalidade da pena, etc.
(Acórdãos do TC n/s 127/84 e 16/84). Como é sabido, a doutrina do artigo 30.º n.º 4 não se deve restringir à matéria criminal, justificando-se a sua aplicação aos demais domínios sancionatórios, e portanto também em sede de ilícito disciplinar (cf. Ac. 282/86).