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II SÉRIE-A — NÚMERO 184 10

anteriormente integradora da incriminação do «enriquecimento ilícito», nem tão-pouco com a enunciação

expressa dos bens jurídicos protegidos.

Em seu entender o bem jurídico protegido pela norma incriminadora, seja ele um ou vários de todos aqueles

que vêm elencados no n.º 2 do artigo 335.º-A ou qualquer outro, não tem correspondência na estrutura do tipo.

7.2 – No que respeita à determinação das condutas concretamente proibidas, entende o requerente que não

é, desde logo, claro se a incriminação do «enriquecimento injustificado» incide sequer sobre uma conduta,

parecendo antes incidir sobre situações de facto.

Ao manter-se a incriminação da aquisição, posse ou detenção de património incompatível com os

rendimentos, a construção do tipo continua a não permitir a identificação da ação ou omissão que é proibida,

não tendo o legislador logrado ultrapassar o problema previamente identificado relativamente à incriminação do

«enriquecimento ilícito» (cf. ponto 8.3. do Acórdão 179/2012).

7.3 – Por último, e no que respeita ao princípio da presunção de inocência, consagrado no n.º 2 do artigo

32.º da Constituição, entende o requerente que, não obstante a construção do tipo não pressupor agora, ao

contrário do que se verificava relativamente à incriminação do «enriquecimento ilícito» (cf. penúltimo e último

parágrafos do ponto 9 do acórdão 179/2012), a demonstração positiva da ausência de toda e qualquer causa

lícita - na medida em que se eliminou o elemento «sem origem lícita determinada» -, subsiste o problema de a

norma incriminadora presumir a origem ilícita da incompatibilidade entre o património e os rendimentos e bens

declarados, imputando ao agente um crime de enriquecimento injustificado. Nas palavras do requerente (ponto

26.º do requerimento), «[...] resulta que a presunção da prática do crime é inerente ao próprio tipo penal».

B. Da política criminal em Estado de direito: enquadramento constitucional

8 – Através do Decreto 369/XII deliberou a Assembleia da República instituir um novo tipo de crime ao qual

conferiu o nome de enriquecimento injustificado. Na sequência desta deliberação, decretou que fosse aditado

ao Título V do Livro II do Código Penal (relativo aos «crimes contra o Estado») um artigo 335.º-A, que, contendo

a formulação do novo tipo, se acrescentará ao elenco dos crimes já previstos na Secção II do Capítulo I daquele

título, e que, segundo o Código, se identificam como sendo os «crimes contra a realização do Estado de direito».

Do mesmo modo, e ainda na sequência daquela sua deliberação, decretou ainda a Assembleia que fosse

aditado um artigo 27.º-A à Lei 34/87, de 16 de julho (crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos),

de modo a incluir uma previsão especial do crime de enriquecimento injustificado quando perpetrado por quem

seja titular de cargo político ou de alto cargo público, durante o período do exercício das suas funções ou nos

três anos seguintes à cessação dessas funções. São estas duas medidas, incluídas respetivamente no artigo

1.º e no artigo 2.º do Decreto 369/XII, que o requerente impugna junto do Tribunal Constitucional.

9 – Tratando-se ambas de medidas de política criminal, tomadas pela Assembleia no exercício da sua

competência para a definição de [novos] crimes e penas, deverá antes do mais dizer-se que não caberá ao

Tribunal resolver ou aprofundar as questões de dogmática jurídico-penal que a interpretação de normas

incriminadoras (estas novas, como quaisquer outras) eventualmente coloque, uma vez que esta é função que,

naturalmente, aos tribunais comuns competirá exercer.

Ao Tribunal cabe todavia averiguar de uma específica e diferente questão, que é precisamente a de saber

se foram ou não cumpridos no caso os padrões legitimadores da constitucionalidade das novas incriminações.

Com efeito - e como o Tribunal sempre tem dito, em jurisprudência ininterrupta, desde o início da sua

fundação - ao legislador ordinário deve ser reconhecida larga margem de liberdade de conformação na

prossecução do que entenda dever ser a política criminal adequada, em cada momento histórico, às exigências

de subsistência de bens coletivos fundamentais. Não sendo a Constituição um código detalhado de relações

sociais ou sequer do modo de organização do Estado, «o juízo sobre a necessidade do recurso aos meios

penais cabe, em primeira linha, ao legislador» (Acórdão 634/93, ponto 6), enquanto titular da função de primeiro

mediador, ou concretizador, da ordem jurídico-constitucional (Acórdão 347/86, ponto 7). Todavia, nem por isso

chegará a concluir-se que, em Estado de direito, é isenta de vínculos constitucionais a definição legislativa de

medidas de política criminal. Nenhum poder o é; e muito menos o será o poder de definir novos crimes e de