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II SÉRIE-A — NÚMERO 184 14

seus rendimentos e bens declarados ou devam ser declarados. De seguida, faz-se corresponder a este crime,

cuja descrição típica se encontra assim perfeita, a pena de prisão até 3 anos. Sendo decisiva para a construção

do ilícito criminal a incompatibilidade entre património adquirido, possuído ou detido pelo agente (qualquer um,

por si ou por interposta pessoa) e aquele outro sujeito a declaração, os n.os 5 e 6 do preceito dedicam-se a

modular a punição, genericamente prevista no n.º 1 (prisão até 3 anos), em função do «valor» a que ascenda

tal incompatibilidade. Assim, não só é excluída a punibilidade se tal «valor» for inferior a 350 salários mínimos

mensais (n.º 5), como se alarga o limite máximo da pena de prisão - 5 anos - em caso de excesso para mais de

500 salários mínimos mensais. Por seu turno, os n.os 3 e 4 dedicam-se a determinar, não só o que se deva

entender por «património», mas também o que se deva entender «por rendimentos e bens declarados ou que

devam ser declarados». Finalmente, o n.º 2 esclarece que as «condutas previstas no número anterior atentam

contra o Estado de direito democrático, agridem interesses fundamentais do Estado, a confiança nas instituições

e no mercado, a transparência, a probidade, a idoneidade sobre a proveniência das fontes de rendimento e

património, a equidade, a livre concorrência e a igualdade de oportunidades».

12 – Deve começar por dizer-se que o facto de o legislador, neste n.º 2 do artigo 335.º-A, ter decidido

identificar os valores que, em seu entender, justificam a incriminação - por serem aqueles que, ainda segundo

o seu entendimento, as condutas agora puníveis lesam - não dispensa o Tribunal de averiguar se, no caso, se

cumpriram ou não os padrões que legitimam a constitucionalidade das normas incriminadoras.

Na verdade, não se vê que outro alcance possa ser conferido ao esclarecimento prestado pelo legislador

senão esse mesmo - o da identificação dos objetivos que o motivaram, tarefa não raras vezes cumprida pelos

preâmbulos ou «exposições de motivos» que antecedem os diplomas legais. Tal como aí sucede, as explicações

dadas pelo legislador auxiliarão seguramente o intérprete na melhor compreensão do regime legal; mas, não

fazendo parte integrante dele, não relevam elas próprias do domínio do direito instituído, carecendo por isso,

em si mesmas, de eficácia prescritiva. Se assim é em geral, por maioria de razão o será quando a «matéria

legislada» se traduzir na previsão de novas incriminações. Aí, a proclamação, por parte do legislador, das razões

pelas quais entendeu dever criminalizar certa conduta será certamente reveladora da ponderação que ele

próprio - enquanto primeiro mediador e concretizador da ordem constitucional - terá feito, quer quanto à

necessidade do crime e da pena quer quanto ao modo pelo qual procedeu à sua previsão típica. Todavia, nem

por isso a «proclamação» legislativa terá por si só qualquer virtualidade de transformar tal ponderação em coisa

por si mesma justa ou constitucionalmente válida, a dispensar ulterior reexame por parte da jurisdição

competente. Se tal ocorresse, não mais estariam as leis «nas mãos» das normas constitucionais vinculantes;

seriam antes estas últimas, e particularmente aquelas que consagram liberdades fundamentais, a encontrar-se

na inteira disponibilidade das decisões legislativas.

Certo é, no entanto, que à «proclamação» de motivos deste modo feita pelo próprio legislador não poderá o

Tribunal deixar de dedicar atenção especial. Cabendo ao poder legislativo, em primeira linha, o juízo sobre a

necessidade do recurso à intervenção penal, e dispondo por isso o legislador nesta matéria - quer quanto à

decisão de criminalizar, quer quanto ao modo por que o fez - da margem de liberdade conformadora que a

Constituição lhe reconhece, a limitação, por decisão do Tribunal, dessa ampla discricionariedade legislativa só

poderá ocorrer se puder demonstrar-se que foram in casu ultrapassados os limites impostos pelos padrões

constitucionais que legitimam, em Estado de direito, quaisquer decisões legislativas destinadas a instituir novas

incriminações. Sendo este o exato âmbito em que se desenvolve o juízo do Tribunal, para o proferir não pode

deixar de conferir-se especial atenção às razões que foram invocadas pelo próprio legislador para justificar esta

sua decisão de instituir o novo crime do enriquecimento injustificado.

13 – Decretou a Assembleia que o enriquecimento injustificado viesse a acrescer, enquanto novo tipo

criminal, ao conjunto dos «crimes contra o Estado», e, mais especificamente, no quadro desta categoria, aos

«crimes contra a realização do Estado de direito», os quais incluem já a «alteração violenta do Estado de direito»

(artigo 325.º do Código Penal), o «incitamento à guerra civil ou à alteração violenta do Estado de direito» (artigo

326.º), o «atentado contra o Presidente da República» (artigo 327.º), a «ofensa à honra do Presidente da

República» (artigo 328.º), a «sabotagem» (artigo 329.º), o «incitamento à desobediência coletiva» (artigo 330.º),

as «ligações com o estrangeiro» (artigo 331.º), a «coação contra órgãos constitucionais» (artigo 333.º), a

«perturbação do funcionamento de órgão constitucional» (artigo 334.º) e o «tráfico de influências» (artigo 335.º).