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II SÉRIE-A — NÚMERO 153

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PROJETO DE LEI N.º 881/XIV/2.ª

CRIA O CRIME DE OCULTAÇÃO DE RIQUEZA COM VISTA À PREVENÇÃO DA CORRUPÇÃO E

AUMENTO DA INTEGRIDADE PÚBLICA

Exposição de motivos

A Organização das Nações Unidas (ONU) reconhece, entre outras coisas, que a corrupção coloca em causa

a estabilidade e a segurança das sociedades, pois tem a possibilidade de minar a confiança dos cidadãos tanto

nas instituições como nos valores democráticos; que os casos de corrupção envolvem, em muitos casos,

recursos dos Estados e que a aquisição ilícita de riqueza pessoal pode ser particularmente prejudicial para as

instituições democráticas, as economias nacionais e o Estado de direito. Por estas razões, a ONU aprovou a

Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção tendo como objetivos a prevenção e a repressão da

corrupção, prevendo a perda e restituição do produto das infrações.

No que diz respeito às medidas preventivas, determina que «Cada Estado Parte deverá, em conformidade

com os princípios fundamentais do seu sistema jurídico, desenvolver e implementar ou manter políticas de

prevenção e de luta contra a corrupção, eficazes e coordenadas, que promovam a participação da sociedade e

reflitam os princípios do Estado de direito, da boa gestão dos assuntos e bens públicos, da integridade, da

transparência e da responsabilidade». É conhecido que a legislação em vigor apresenta ainda falhas que

permitam um efetivo cumprimento destes objetivos, nomeadamente no que diz respeito à falta de consequências

penais para o enriquecimento ilícito e ocultação de riqueza.

Na décima segunda Legislatura houve duas tentativas de legislar sobre esta matéria, através da aprovação

do Decreto n.º 37/XII e do Decreto n.º 369/XII da Assembleia da República. Acontece que, em ambos os casos,

o Presidente da República suscitou a fiscalização da constitucionalidade, tendo o Tribunal Constitucional vindo

a pronunciar-se pela inconstitucionalidade de alguns artigos, através dos Acórdãos n.º 179/2012 e 377/2015.

A pronúncia de inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional assentou em três fundamentos essenciais:

i) A indefinição do bem jurídico protegido;

ii) A indeterminação da ação ou omissão concretamente proibida;

iii) A violação do princípio da presunção de inocência.

Estes são, por isso, aspetos a serem considerados.

No âmbito da consulta pública sobre a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção, a associação sindical

dos juízes defendeu que «Bastará acrescentar aos atuais dispositivos legais que regulam a fiscalização dos

rendimentos e património dos titulares de cargos públicos o dever de justificar a aquisição de património durante

o exercício do cargo acima de certo valor – e não apenas declarar a aquisição desse, como agora – e fazer

corresponder o novo crime à violação desse dever.»

Assim, o que acontece é que, a conduta criminosa deixa de ser a existência de determinada riqueza, mas

sim a falta de declaração e respetiva justificação. Portanto, não só não existe qualquer presunção de

enriquecimento ilícito como também não há qualquer inversão do ónus da prova e, por conseguinte, o princípio

da presunção de inocência mantém-se incólume. Para além disso, fica também clara qual a ação ou omissão

concretamente proibida, que no caso é a declaração da proveniência da riqueza acima de um determinado valor.

No que diz respeito ao bem jurídico, tal como mencionado na Declaração de Voto do Juiz Conselheiro Carlos

Fernandes Cadilha, «O bem jurídico que parece pretender tutelar-se, em qualquer dos tipos legais em causa, é

o da transparência das fontes de rendimento, que tem já diversas concretizações no sistema legal, mormente

por via da obrigatoriedade da declaração de rendimentos para efeitos de controlo público da riqueza dos titulares

de cargos públicos (Lei n.º 4/83, de 2 de abril). E não pode deixar de reconhecer-se que se trata de um bem em

si mesmo socialmente relevante, com particular reflexo na prevenção geral da criminalidade económica e fiscal,

e que, em última análise, radica nos deveres inerentes à funcionalidade e justiça do sistema social, sabendo-se

que entre os valores e bens consagrados na Constituição e os bens jurídicos dignos de tutela penal não tem de

existir uma relação de identidade, mas apenas uma relação de analogia material.»

Bem assim como na do Juiz Conselheiro Vítor Gomes, «a transparência da situação patrimonial dos titulares