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II SÉRIE-A — NÚMERO 14

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adequado e intersectorial, estão mais capacitadas para desenvolver uma atitude mais ajustada face à sua experiência do crime.

A vitimação secundária tem vindo a ser apontada por diversas associações que apoiam vítimas como um dos principais motivos pelos quais estas não apresentam queixa junto das entidades competentes. A eliminação desta violência perpetuada pelo aparelho estatal deve ser uma prioridade, de modo a assegurar a efetiva proteção das vítimas, em particular, mulheres e jovens.

Urge, assim, melhorar o tratamento das vítimas de crimes sexuais na sua interação com o sistema de justiça, de modo a facilitar e incentivar a denúncia destes delitos. Esta deve ser uma prioridade, tendo em conta que, de acordo com os dados do Relatório Anual de Segurança Interna de 2020, houve menos 116 participações do crime violação do que no ano anterior. Ingénuo será pensar que, de facto, a violência sexual em Portugal diminuiu, num ano em que inúmeras mulheres se viram forçadas a ficar em casa, nomeadamente com os agressores. As estatísticas da justiça e da administração interna, apesar de nos proporcionarem dados importantíssimos, dizem apenas respeito aos crimes participados, que contemplam uma ínfima parte dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual. A diminuição do número de participações destes crimes deve ser entendida como fruto da desconfiança das mulheres no aparelho estatal. Importa agora melhorar os cuidados proporcionados às vítimas e fomentar a confiança das mesmas no sistema de justiça e nos seus intervenientes, de modo a minorar as instâncias em que a vítima poderá ser alvo de retraumatização e de vitimação secundária.

Para este efeito, propomos que as vítimas especialmente vulneráveis, tal como o arguido, tenham acesso imediato a defensor oficioso, sendo que se preferirem podem constituir mandatário.

Cremos que a nomeação de defensor oficioso, no momento em que é atribuído o estatuto de vítima especialmente vulnerável, é fundamental para o cabal esclarecimento da vítima quanto aos seus direitos, nomeadamente quanto às eventuais medidas de coação a requerer, declarações para memória futura, suspensão provisória do processo, pedido de indemnização cível e, consequentemente, para a prevenção da revitimização. Esta necessidade justifica-se pelo facto destas vítimas apresentarem uma maior fragilidade em resultado das sequelas deixadas pelo crime, da sua saúde física, da relação com o arguido, da sua idade prematura3. Tal como Paulo Pinto Albuquerque defende «a proteção das vítimas em relação à vitimização primária, repetida e secundária é inerente ao Estado de Direito (artigo 2.º da CRP), impondo-se quer como forma de proteção imediata de certos direitos fundamentais (…) diante das insuficiências e deficiências das respostas do Estado e de outras entidades públicas (…) O direito constitucional de proteção contra a vitimização (…) é um direito constitucional de natureza análoga (…)»4.

Assim, propõe-se a alteração do Estatuto de Vítima e da Lei do Acesso ao Direito, para que ambas prevejam a possibilidade de nomeação imediata de defensor oficioso a estas vítimas, através das escalas de prevenção.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º Objeto

O presente diploma visa incluir a nomeação de advogado em escalas de prevenção para as vítimas

especialmente vulneráveis.

Artigo 2.º Alteração à Lei n.º 130/2015, de 4 de setembro

São alterados os artigos 11.º e 21.º do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei n.º 130/2015, de 4 de setembro,

os quais passam a ter a seguinte redação:

3 Filipa Pereira – O Papel da Vítima no Processo Penal Português, 2019, Universidade Católica Editora. 4 Paulo Pinto de Albuquerque – O Estatuto das Vítimas de crimes à luz da Constituição e da CEDH, em Vítimas & Mediação, página 91 – 102, APAV, 2008, disponível online em https://apav.pt/publiproj/images/yootheme/PDF/Victims_Mediation_PT.pdf.