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II SÉRIE-A — NÚMERO 20

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1479/XIV/3.ª

PELA PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE E DA PRODUÇÃO AGRÍCOLA NO PROJETO DA PONTE-

AÇUDE NO BAIXO VOUGA LAGUNAR

Em setembro deste ano, a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro adjudicou ao Grupo ABB, por 9,9

milhões de euros, acrescidos de IVA, a construção da ponte-açude do rio Novo do Príncipe em Cacia, no

concelho de Aveiro. Segundo os proponentes, o projeto visa a melhoraria da defesa contra cheias e marés da

zona do Baixo Vouga Lagunar. Além disso, a ponte-açude tem como objetivos travar o avanço da cunha salina

e aumentar a disponibilidade de água doce para fins agrícolas, bem como para a unidade industrial de produção

de pasta de papel da propriedade da empresa Navigator.

A construção da ponte-açude no Baixo Vouga Lagunar, em plena Zona Especial de Proteção da Ria de

Aveiro, constituirá uma barreira à continuidade longitudinal daquele ecossistema, impedindo o acesso de

importantes populações de espécies de peixes migradores anádromos a locais de desova nos rios Vouga,

Águeda e Alfusqueiro. Algumas destas espécies que ainda ocorrem no Baixo Vouga Lagunar, como a lampreia-

marinha (Petromyzon marinus), o sável (Alosa alosa) e a truta-marisca (Salmo trutta) estão muito ameaçadas

em Portugal, apresentando estatutos de conservação desfavoráveis.

Na última edição do Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, publicada em 2005, o sável está

classificado como «Em perigo» e a lampreia-marinha e a truta-marisca como «Criticamente em perigo» de

extinção. Segundo especialistas1, não se prevê que a revisão do Livro Vermelho dos Peixes Dulçaquícolas e

Migradores altere os estatutos de conservação desfavoráveis destas espécies. Como tal, importa envidar todos

os esforços para salvaguardar as importantes populações de peixes migradores do Baixo Vouga Lagunar,

salvaguardando-as de impactes negativos que coloquem em risco a sua viabilidade.

Para assegurar o acesso das populações de peixe migradores às áreas de desova é necessário garantir a

instalação de dispositivos de passagem nas barreiras fluviais. Mas o atual projeto para a construção da ponte-

açude em Cacia não prevê a instalação de qualquer passagem. Incompreensivelmente, tanto a Agência

Portuguesa do Ambiente (APA), como o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) não o

exigiram. Apenas determinaram que a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro deve apresentar um

estudo que estipule as regras de funcionamento das comportas da ponte-açude para que estas não interfiram

com a passagem dos peixes. Se o promotor for incapaz de demonstrar que a infraestrutura permite a circulação

de peixes – o que é provável dado que as comportas estarão fechadas durante boa parte do ano e, quando

abertas, são capazes de gerar forças hidráulicas que os peixes não conseguem contrariar –, aí assim terá de

instalar um dispositivo que permita a passagem das populações piscícolas.

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda entende que a posição da APA e do ICNF é inaceitável porque

contraria o princípio preventivo do procedimento de avaliação de impacte ambiental. Também organizações não

governamentais de ambiente, como a Zero e a Quercus, mostraram a sua preocupação pela ausência de

estudos e avaliações prévias à construção do açude. As entidades tuteladas pelo Ministério do Ambiente e da

Ação Climática preferem esperar que a obra avance para só depois avaliar os previsíveis e prováveis efeitos

negativos da barreira no ecossistema estuarino, ao invés de agir proactivamente para evitar os impactes

negativos provocados por este tipo de infraestruturas. A instalação de passagens para peixes não resolve todos

os problemas criados pelas barreiras fluviais, mas se for acompanhada da respetiva monitorização para se

avaliar a sua eficácia – e se forem aplicadas medidas de conservação e recuperação de habitats para a desova

–, contribui para mitigar os efeitos das barreiras. A título de exemplo, na bacia hidrográfica do rio Douro, a

proliferação de barragens, açudes e outras barreiras, muitas delas sem passagens para peixes ou com

dispositivos ineficazes, levou a que populações inteiras de espécies migradoras anádromas tenham

desaparecido daquela bacia hidrográfica.

Além de um dispositivo de passagem para peixes, o projeto da ponte-açude requer também uma avaliação

de impacte ambiental adequada. Não é razoável que as entidades competentes considerem válida uma

declaração de impacte ambiental favorável de 2003, com mais de 18 anos, atribuída a um projeto que nada tem

a ver com o atual e que desconsidera a nova situação de referência. O estudo de impacte ambiental utilizado

para viabilizar o atual projeto da ponte-açude diz respeito a infraestruturas hidráulicas de uma pista olímpica de

1 https://www.wilder.pt/historias/peixes-migradores-a-construcao-de-uma-ponte-acude-em-pleno-estuario-do-vouga-tera-consequencias-um ito-negativas/.