O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

II SÉRIE-A — NÚMERO 31

2

PROPOSTA DE LEI N.º 11/XV/1.ª

REGULA O ACESSO A METADADOS REFERENTES A COMUNICAÇÕES ELETRÓNICAS PARA FINS

DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

Exposição de motivos

A investigação, deteção e repressão da criminalidade, especialmente da criminalidade grave e organizada,

constitui uma das principais atribuições de um Estado de direito democrático, sendo fundamental para garantir

a segurança e a paz públicas.

Para tanto, é essencial que os órgãos de polícia criminal e as autoridades judiciárias sejam dotados de meios

de investigação e de prova adequados, assegurando-se simultaneamente um prudente equilíbrio com os direitos

fundamentais de cada cidadão, de que o direito à reserva da intimidade da vida privada é exemplo.

Como é consabido, o Tribunal Constitucional, através do Acórdão n.º 268/2022, declarou a

inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, de normas contidas na Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, que

transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva 2006/24/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de

março de 2006, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de

comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações. Especificamente,

foram declaradas inconstitucionais a norma constante do artigo 4.º, conjugada com o artigo 6.º, e a norma

constante do artigo 9.º, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados conservados

foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal, a partir do momento em que tal comunicação não

seja suscetível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros.

Por sua vez, a Diretiva acima mencionada já havia sido declarada inválida pelo Tribunal de Justiça da União

Europeia, por Acórdão de 8 de abril de 2014, proferido no âmbito dos processos C-293/12 (Digital Rights Ireland)

e C-594/12 (Seitlinger e outros), porquanto, e em síntese, foi entendido que aquela possibilitava uma ingerência

nos direitos fundamentais consagrados nos artigos 7.° e 8.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União

Europeia sem que, contudo, essa ingerência se mostrasse enquadrada com precisão por disposições que

garantissem que se limitava ao estritamente necessário.

Acresce ainda que, posteriormente, o Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu, no Acórdão de 21 de

dezembro de 2016, proferido no âmbito dos processos C‑203/15 (Tele2 Sverige AB) e C‑698/15, que era

incompatível com o direito da União Europeia uma regulamentação nacional que previsse, para efeitos de luta

contra a criminalidade, a conservação geral e indiscriminada dos dados de tráfego e de localização dos

assinantes e utilizadores registados em relação à totalidade dos meios de comunicação.

Ante o exposto, e considerando o direito constitucional português e o direito da União Europeia, parece

resultar o entendimento de que é proibida a conservação geral e indiscriminada de dados de tráfego e de

localização dos assinantes e utilizadores registados em relação à totalidade dos meios de comunicação, para

fins específicos de investigação, deteção e repressão de crimes, independentemente da sua natureza.

Porém, tal proibição de conservação de dados não obsta, nem deve obstar, a que as autoridades judiciárias

possam continuar a aceder a metadados para fins exclusivos de investigação criminal, sob pena de ficar

absolutamente comprometido o direito à realização da justiça e à segurança e paz públicas.

Por um lado, e como se sabe, as organizações criminosas recorrem frequentemente à Internet

(nomeadamente à dark web) e às telecomunicações móveis, sob encriptação e possível anonimato, para

cometer crimes graves e violentos, como sejam, por exemplo, os de terrorismo, homicídio, ofensas à integridade

física, rapto, sequestro ou tráfico de órgãos, sendo essencial dotar as autoridades competentes dos meios de

obtenção de prova necessários à investigação de tais crimes. Por outro lado, os meios eletrónicos de prova são

muitas vezes os únicos meios disponíveis para o apuramento da verdade material, mormente no caso de crimes

cometidos por meio de sistema informático.

Não sendo possível que a lei determine a conservação de dados com o único intuito de investigar, detetar e

reprimir a comissão de crimes, entende-se que deve ser possível garantir o acesso a dados que hoje já são

conservados, para efeitos de faturação, pelas empresas que oferecem redes e ou serviços de comunicações

eletrónicas, e cujo regime já se mostra conforme ao Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do

Conselho, de 27 de abril de 2016, e às Leis n.os 58/2019 e 59/2019, de 8 de agosto, incluindo quanto à obrigação