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II SÉRIE-A — NÚMERO 170

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Para a análise e discussão do objeto do presente projeto de lei, salientam-se dois artigos da Constituição da

República Portuguesa (CRP), em parte já suscitados na análise ao objeto e conteúdo da iniciativa, referentes a

direitos, liberdades e garantias e a direitos e deveres sociais.

Consagra a CRP, no n.º 7 do artigo 36.º, integrado no capítulo dedicado aos direitos, liberdades e garantias

pessoais, que a adoção é regulada e protegida nos termos da lei, a qual deve estabelecer formas céleres para

a respetiva tramitação. Como refere a nota técnica, citando Rui Medeiros, ao prever a adoção autonomamente

no n.º 7 do artigo 36.º, o texto constitucional confere-lhe «uma dupla relevância: se por um lado constitui ainda

uma forma de constituir família, não deixa também de ser um instrumento fundamental de proteção das crianças

abandonadas, discriminadas, oprimidas ou abusadas (artigo 67.º, n.º 1)». Como refere também o autor, citado

pela nota técnica: «a Constituição, embora proteja a adoção, defere para a lei a sua regulação e proteção. O

legislador ordinário dispõe, por isso, de uma ampla margem de liberdade neste domínio (…). A Constituição

protege, no entanto, o instituto da adoção, impondo, como é próprio de uma garantia institucional, a preservação

da sua existência e da sua estrutura fundamental, “não podendo, pois, o legislador ordinário suprimi-la nem tão

pouco desfigurá-la ou descaracterizá-la essencialmente. Assim, por exemplo, seria inconstitucional uma lei que

extinguisse a adoção, ou que, modificando o regime da adoção plena, deixasse de considerar o adotado como

filho do adotante”».

Se o artigo 36.º prevê expressamente o instituto da adoção, é o artigo 69.º, inserido no capítulo dos direitos

e deveres sociais, que consagra o direito das crianças à proteção, prevendo especificamente a proteção para

crianças em situações de maior vulnerabilidade. Mais especificamente, o n.º 1 estatui que «as crianças têm

direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra

todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na

família e nas demais instituições» e o n.º 2 garante que «o Estado assegura especial proteção às crianças órfãs,

abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal». Convém recordar que a CRP,

particularmente os artigos a que aqui se alude, são anteriores à Convenção sobre os Direitos da Criança,

adotada pela Assembleia Geral da ONU em 20 de novembro de 1989 e entrada em vigor em 2 de setembro de

1990. Foi ratificada pela República Portuguesa em 21 de setembro de 1990 (Decreto do Presidente da República

n.º 49/90, de 12 de setembro). Citando ainda Rui Medeiros, como se transcreve da nota técnica: o «artigo 69.º

[da CRP] coloca assim o epicentro da intervenção da sociedade e do Estado na promoção dos direitos da

criança, enquanto ator social e titular de direitos fundamentais (…). Por isso, o Estado, vinculado positivamente

pelos direitos fundamentais, tem o dever de proteger o interesse dos filhos e, em última análise, o dever de

proteger a vida, a integridade pessoal, o desenvolvimento da personalidade e outros direitos fundamentais das

crianças. (…) A conclusão impõe-se, em particular, perante «crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma

privadas de um ambiente familiar normal» — ou que se encontrem em situação análoga —, assumindo aqui o

«dever de proteção do Estado uma especial intensidade».

Neste seguimento, importa salientar o preâmbulo da Convenção sobre os Direitos da Criança que, uma vez

ratificada, vincula os países signatários, como Portugal. O preâmbulo reconhece «que a criança, para o

desenvolvimento harmonioso da sua personalidade, deve crescer num ambiente familiar, em clima de felicidade,

amor e compreensão», mas não deixa de explicitamente recordar «as disposições da Declaração sobre os

Princípios Sociais e Jurídicos Aplicáveis à Proteção e Bem-Estar das Crianças, com especial referência à

Adoção e Colocação Familiar nos Planos Nacional e Internacional (Resolução n.º 41/85 da Assembleia Geral,

de 3 de dezembro de 1986), o Conjunto de Regras Mínimas das Nações Unidas relativas à Administração de

Justiça de Jovens (Regras de Beijing) (Resolução n.º 40/33 da Assembleia Geral, de 29 de Novembro de 1985)

e a Declaração sobre Proteção de Mulheres e Crianças em Situação de Emergência ou de Conflito Armado

[Resolução n.º 3318 (XXIX) da Assembleia Geral, de 14 de dezembro de 1974]». Esta dupla referência,

simultaneamente ao desenvolvimento integral da criança e à criança em situação de vulnerabilidade, é

particularmente relevante no contexto da apreciação que neste projeto de lei, e na discussão que suscita, se

procura fazer.

Como acima se referia, embora a CRP proteja a adoção, defere para a lei a sua regulação e proteção. O

legislador ordinário dispõe de margem de liberdade para a sua regulação, pelo que, propondo-se uma alteração

aos limites de idade para adoção, mais concretamente aos limites à data do requerimento de adoção, importará

compreender, ainda que sem pretensão de exaustividade, a evolução legislativa do artigo do Código Civil sobre

quem pode ser adotado.