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24 DE ABRIL DE 2023

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efetivo da especulação ou de aumento real dos salários e a obsessão pela redução irresponsável do défice

continuará a ser feita à custa dos rendimentos e do investimento.

Entre a resignação face aos problemas do País e a timidez das respostas, o Governo insiste na estratégia

que tem seguido desde o início da invasão russa da Ucrânia e do agravamento da pressão inflacionista:

enquanto garante a proteção da elite que especula com os preços dos bens essenciais, condena à incerteza a

vida de milhões de pessoas que vivem do seu trabalho ou da sua pensão.

A 7 de abril de 2022, na Assembleia da República, António Costa garantia que a inflação seria conjuntural e

transitória. Tal garantia serviria para justificar a recusa, então assumida, de medidas robustas para apoiar as

famílias perante o choque inflacionista. As consequências dessa opção tornaram-se dramaticamente evidentes

no último ano: os rendimentos do trabalho perderam valor real, penalizando particularmente os rendimentos

mais baixos, enquanto a inflação se faz sentir particularmente nos produtos essenciais. Desta forma, a par dos

custos da energia, os bens alimentares experimentaram aumentos sem paralelo nas últimas décadas: sabemos

hoje que os produtos de mercearia tiveram um aumento de 26,2 % face ao início de 2022, o preço da carne

aumentou 24,8 %, os laticínios 24,7 %, as frutas e legumes 21,6 %.

Ora, o Governo que garantia o carácter conjuntural da inflação reconhece agora, apenas um ano depois, que

os preços continuarão a subir. O Programa de Estabilidade 2023-2027 prevê até uma inflação de 5,1 % para

este ano, acima dos 4 % estimados em outubro. As previsões da inflação, ainda que apresentando variações,

são a demonstração do erro do Governo: Os preços que subiram até agora não vão descer, a inflação não é

(nunca foi) transitória. Na previsão económica, como na resposta política, o Governo falhou ao País.

Ao longo do último ano, o Governo, recusando uma resposta robusta à inflação, assumiu duas opções. A

primeira foi a recusa de travar a especulação dos bens essenciais, optando por deixar à boa vontade da grande

distribuição a aplicação de uma medida fiscal mínima com incidência limitada a alguns produtos. A segunda foi

a recusa de uma estratégia de valorização real dos salários, preferindo deixar à boa vontade das confederações

patronais a aplicação de um tímido acordo de rendimentos. Afastando a imposição de regras que protejam os

consumidores do abuso da especulação, condena as famílias a variações inexplicáveis do preço dos alimentos

e de outros bens essenciais. Afastando todas as soluções efetivas para conter o efeito do aumento dos juros na

habitação ou para baixar o preço do arrendamento, condena gerações à maior crise da habitação. Afastando

uma política determinada de valorização dos rendimentos, condena trabalhadores e pensionistas à incerteza de

apoios pontuais que, sempre limitados, obedecem sobretudo ao cálculo político do Governo a cada momento.

Enquanto condena trabalhadores e pensionistas à incerteza de apoios pontuais que não respondem à crise

inflacionista, o Governo confirma a sua obsessão com a redução irresponsável do défice orçamental. O défice

de 0,4 %, valor que o Governo prevê agora manter depois de ter reduzido brutalmente o valor estimado para

2022, foi conseguido por força da perda de poder de compra da população portuguesa e da visível degradação

dos serviços públicos. Acresce que o aumento da carga fiscal, explicado sobretudo pelo aumento da receita

fiscal nos impostos indiretos, está longe de ser refletido na qualidade dos serviços públicos. Das escolas aos

centros de saúde, passando pelos tribunais ou pelos transportes públicos, o sucessivo adiamento do

investimento público deixa em rutura setores essenciais.

Uma economia decente baseia-se num sistema fiscal justo e num Estado social que, particularmente em

momentos de crise, responde à exigência de igualdade. A opção económica do Governo na resposta à crise da

inflação, agora reiterada no Programa de Estabilidade 2023-2027, falha todos estes objetivos.

Assim, a Assembleia da República delibera:

A rejeição do Programa de Estabilidade 2023-2027, e a sua reformulação, tendo em conta os objetivos de

proteção dos rendimentos face à inflação e de reforço do investimento dos serviços públicos.

Assembleia da República, 24 de abril de 2023.

As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Isabel

Pires — Joana Mortágua.

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