O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

29 DE MAIO DE 1991

121

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

A — Enunciação do problema:

Ao abrigo do disposto no n.° 2 do artigo 253.° do Regimento da Assembleia da República e por força do preceituado no n.° 4 do artigo 181.° da Constituição da República Portuguesa, um grupo de 50 deputados requereu a constituição de «uma nova comissão eventual de inquérito a actos administrativos na área do Ministério da Saúde».

O referido requerimento indica os fundamentos e o correspondente objecto.

Porém, S. Ex.a, o Presidente da Assembleia da República, não deu cumprimento, em tempo oportuno, ao que vem disposto no n.° 3 do artigo 153.° do Regimento, certamente porque o texto daquele requerimento lhe suscitou dúvidas.

Estas poder-se-ão consubstanciar na seguinte questão:

O que vem requerido estará em conformidade com as exigências formais e substantivas resultantes da Constituição, da lei e do Regimento para que se possa e deva constituir a consequente comissão de inquérito?

Para esclarecimento das referidas dúvidas, e certamente para obter resposta à questão que formulámos, S. Ex." entendeu por bem pedir parecer à Consultadoria Jurídica da Assembleia da República.

Esta produziu douto parecer, elaborado e subscrito pelo Ex.mo Sr. Dr. Morais Sarmento, que, de forma concisa e clara, nos dá conta das dúvidas suscitadas por aquele requerimento, bem como das dificuldades na solução dos problemas que levanta.

Na parte final daquele apreciado parecer sugere-se que as questões suscitadas sejam submetidas à Comissão de Regimento e Mandatos, ao abrigo do artigo 35.°, alínea/), e 288.°, n.° 1, do Regimento, visto que se trata «... de matéria omissa, situação que cabe no artigo 288.° do Regimento e de especial melindre e dificuldade, ...».

S. Ex.a devolveu o processo a esta Comissão, tal como fora sugerido.

Cumpre-nos, por isso, analisar as questões e dar parecer.

B — Análise das questões:

Daquele bem elaborado parecer retiramos as seguintes ilações:

1.° O direito consignado no n.° 4 do artigo 181.° da Constituição da República Portuguesa é um direito potestativo. Porém, para se verificar o seu exercício;

2.° Não basta a sua consagração constitucional. Torna-se necessário, em cada caso concreto, verificar se estão preenchidos os pressupostos e as exigências formais e substantivas que o justificam.

A Constituição, a lei e o Regimento não contemplam esta última questão. Trata-se, efectivamente, «de matéria omissa».

Mas ela tem uma importância decisiva para o exercício do direito invocado. Contudo, o seu exercício não se encontra suficientemente regulamentado, e de tal sorte que a omissão apontada poderá pôr em causa a sua efectivação concreta. Efectivamente, pensamos que a realização e a aplicação práticas do direito só são possíveis quando está legalmente estabelecido o processo do seu exercício.

É neste quadro de pensamento que nos propomos analisar aquelas questões.

É dado adquirido e incontestável que o requerimento em apreço foi formulado ao abrigo de um direito que tem a natureza de direito potestativo.

A consagração constitucional desse direito constitui uma aplaudida conquista da democracia.

Na verdade, o direito potestativo de constituir comissões de inquérito à revelia da vontade da maioria parlamentar traduz o reconhecimento do valor das minorias ou da oposição, no papel que lhes cabe no desenvolvimento e afirmação da democracia pluralista. - É que, como escreveu Karl Popper, «a essência da democracia não é o governo da maioria, mas o controlo sobre os governos».

Por virtude da consagração constitucional daquele direito, as oposições passaram a dispor de um especial e importante instrumento no quadro da competência fiscalizadora da Assembleia da República.

Com o reconhecimento de tal direito ganham os governos, ganha a Administração e ganha a democracia.

Foi certamente por estas e outras razões, que aqui não importa aflorar, que a consagração de tal direito fora o resultado de uma votação unânime aquando da 2.a revisão constitucional. Ele expressa um dos mais relevantes princípios em favor da verdade, da transparência e da responsabilidade com que deve ser desenvolvida a actividade dos agentes públicos e políticos.

É certo que, segundo pensamos, aquele consagrado direito está ainda muito limitado quanto ao seu conteúdo e respectivos efeitos.

Na verdade, como direito potestativo, ele circunscreve-se, tão-só, à iniciativa de requerer a constituição obrigatória de comissão de inquérito.

Tudo o mais, quer quanto à constituição da comissão, quer quanto à sua organização interna, desenvolvimento, processos e meios de actuação, está sujeito aos princípios regimentais que regulam as comissões de inquérito, que têm a sua fonte no reconhecimento de outras iniciativas.

Sucede, porém, que o referido direito é posterior à Lei n.° 43/77 e o Regimento não contemplou, nas suas revisões posteriores, a regulamentação daquele direito potestativo.

Estão por isso em aberto algumas questões de solução difícil e delicada, porque falta o suporte jurídico regulamentar para a conduzir.

É que, consagrado o princípio, fixado o direito, importava regulamentar a forma, modo e termos do seu exercício.

Efectivamente, não basta invocar princípios e direitos, quando se trata da sua realização concreta. O tempo, o modo, a forma e termos da sua realização concreta têm muito a ver com as situações reais da aplicação do direito, mesmo quando se trata de direitos potestativos.

E se o que deixo referido quanto ao exercício generalizado dos direitos tem alguma importância, cia é ver-