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II SÉRIE-B — NÚMERO 34
sor do Tribunal de 1." Instância da Comunidade Europeia com o objectivo de indagar da sua disponibilidade para elaborar um parecer sobre o assunto em causa. Para além de ter sido citado pelo juiz, era, indubitavelmente, um especialista,ña matéria. Além de a sua dissertação de mestrado em Ciências Jurídico-Políticas ter versado o tema da separação de poderes como doutrina e princípio constitucional, tem-se dedicado à investigação na área do Direito Constitucional. Com-.a sua resposta positiva e a anuência do,presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, Dr. Pedro Roseta, foi solicitado ao Dr. Nuno Piçarra, em nome da Comissão Parlamentar de Inquérito, um parecer sobre os poderes das comissões parlamentares de inquérito face ao poder judicial na Constituição de 1976.
Em 6 de Janeiro de 1994 o Dr. Nuno Piçarra entrega o seu parecer na V CPIAC subordinado ao título «Extensão e limites dos poderes de investigação próprios das autoridades judiciais atribuídos, nos termos do artigo 181.°, n.°5, da Constituição da República Portuguesa, às comissões parlamentares de inquérito». Este parecer, que foi elaborado a título gratuito, dá uma panorâmica das comissões parlamentares de inquérito no direito constitucional comparado e estuda o princípio da separação de poderes das comissões parlamentares de inquérito e tribunais na Constituição Portuguesa. A este propósito enuncia as questões de constitucionalidade suscitadas pela Lei n.° 5/93, que aprova o regime jurídico dos inquéritos parlamentares, bem como as questões de constitucionalidade suscitadas pela Resolução da Assembleia da República n.° 19/93, de 14 de Junho, que institui a V CPIAC, no qual defende que o artigo 114." da Constituição, relativo ao princípio da separação e interdependência dos órgãos de soberania, «funciona como princípio pressuposto» e «remete, no essencial, para as normas constitucionais relativas à formação, à; composição, à competência e ao funcionamento daqueles órgãos de soberania» (cf. fl. 21 do parecer). Nesse enfoque considera tratar-se de «um problema de concordância prática ou de harmonização» entre o artigo 181.°, n.° 5, e o artigo 205.° da Constituição, que «devem ser interpretados em concreto de modo que nenhum seja sacrificado em relação ao outro ea que cada um disponha da maior eficácia possível tendo em conta a Constituição na sua globalidade» (ibidem, fl. 29). Consequentemente, defende que «o núcleo essencial da função jurisdicional, bem como a independência dos tribunais estarão garantidos perante as comissões parlamentares de inquérito desde que as conclusões destas não sejam vinculativas para os tribunais nem afectem as.decisões judiciais» e considera «indefensável à face da Constituição a posição doutrinária segundo a qual não. são admissíveis inquéritos parlamentares sobre assuntos sujeitos a segredo de justiça e pendentes de decisão judicial» (ibidem, fls. 35 e seguintes.).
Conclui, assim, que os preceitos da lei e da resolução invocados pelo juiz não violam «quaisquer disposições constitucionais, nomeadamente os artigos 114.°, n.° 1, e 205.°, n.os 1 e 2» (ibidem, fl. 44).
Este parecer, remetido para a V CPIAC, também foi entregue ao Sr. Presidente da República, que o remeteu para o Tribunal Constitucional, solicitando urgência na decisão sobre o. assunto do inquérito de Camarate.
No diá 1 de Março de 1994 o Tribunal Constitucional proferiu um acórdão, o n.° 195/94, da 2' Secção, onde declara que os preceitos invocados da Lei dos Inquéritos Parlamentares não colidem com os preceitos constitucionais invocados. O acórdão do Tribunal Constitucional chega a pronunciar-se pela não «invasão por parte de comissões par-
lamentares de inquérito do núcleo essencial da competência jurisdicional dos tribunais em matéria penal» e pela inexistência de qualquer «atentado à divisão de poderes, mas antes uma forma de levá-la a cabo, já que a existência e os direitos das comissões de investigação têm, na sua base, o sistema parlamentar de governo ocupando um papel relevante dentro dos mecanismos de controlo previstos face a um Governo responsável» (cf. fls. 33 e seguintes do acórdão). Conclui, assim, o Tribunal Constitucional que «as normas da Lei n.°5/93 desaplicadas nas decisões recorridas não violam preceitos constitucionais invocados nem qualquer outra norma ou princípio constitucional» e, consequentemente, concede provimento ao recurso e revoga as decisões recorridas, que devem ser reformuladas, no que se refere à recusa do solicitado pelo presidente da V CPIAC.
Este acórdão do Tribunal Constitucional foi conhecido pela V CPIAC em 7 de Abril de 1994. Imediatamente, o Sr. Presidente da Comissão oficiou o Sr. Juiz do TIC de Lisboa no sentido de lhe serem entregues todos os elementos oportunamente requeridos. Contudo, só em Junho de 1994 foram esses elementos remetidos para a Comissão de Inquérito na sua totalidade.
4 — Reabertura dos trabalhos da Comissão Parlamentar. — Como o Dr. Morais Anes já tinha constituído, entretanto, a sua equipa, foram os documentos e outras peças processuais enviados pelo Tribunal confiados ao Dr. Morais Anes, no sentido de lhe permitir continuar o seu trabalho. Porque esse trabalho ainda demoraria algum tempo, decidiram, nessa altura, os Srs. Presidente e Vice-Presidente da V CPIAC, ouvidos os restantes membros e representantes das famílias, que os trabalhos de investigação, com o consequente levantamento da suspensão do prazo legal relativo à realização do inquérito, só seriam retomados no momento em que fossem apresentadas na Comissão as conclusões dos peritos chefiados pelo Dr. Morais Anes, de modo que não se esgotasse o prazo legal sem que a Comissão de Inquérito tivesse a oportunidade de cumprir o desiderato a que se tinha proposto.
A entrega dos relatórios elaborados pela equipa do Dr. Morais Anes só ocorreu em finais de 1994 e porque o Sr. Presidente da V CPIAC, Dr. Pedro Roseta, formulou questões complementares por escrito, as reuniões da Comissão de Inquérito apenas puderam ser retomadas em 19 de Janeiro de 1995.
Como restavam pouco mais de três meses de trabalhos de inquérito, a V CPIAC foi obrigada a multiplicar esforços no sentido de apurar os elementos novos de índole probatória que conduziam ao aprofundamento das causas e circunstâncias da tragédia de Camarate, a análise dos despachos da responsabilidade do Ministério Público conhecidos na V CPIAC, bem como as conclusões dos inquéritos promovidos pelo Governo à Polícia Judiciária, IML e DGAC.
5 — Relações com as entidades responsáveis pela investigação. — No domínio das relações com entidades responsáveis pela investigação, a Comissão ouviu o Dr. Azevedo Nunes, coordenador do inquérito à DGAC, bem como a Dr.° Maria Helena Fragoso, membro da equipa inquiridora.
Dada a falta de tempo, e em virtude do prazo legal a que os trabalhos estavam sujeitos, não foi possível ouvir os responsáveis pelo inquérito à PJ e ao IML.
No dia -28 de Abril de 1995, o M.mo Juiz do TIC de Lisboa, a solicitação do Procurador-Geral da República, decidiu reabrir a investigação criminal.
A Comissão congratulou-se com a notícia de reabertura da instrução, e decidiu remeter documentação correspondente aos seus trabalhos.