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II SÉRIE-B — NÚMERO 13
A integração numa universidade vai trazer algumas limitações quanto à capacidade de decisão no que respeita ao desenho institucional da faculdade. A forma de governo da nova instituição terá de ser compatível com os regulamentos da universidade, que por sua vez dependem
fortemente do que a Lei de Autonomia e o ECDU estabelecem. Não é possível, sem conhecer essa universidade, avaliar estas limitações, mas importa aqui apenas sublinhar que, no nosso entendimento, embora as leis gerais imponham de facto algumas limitações sérias a um bom desenho institucional, essas limitações não são de molde a inviabilizar o pretendido. E possível em teoria, e há exemplos disso na prática nacional, que os estatutos de uma universidade e a forma como são aplicados sejam impeditivos de um funcionamento minimamente razoável e inovador de novas unidades. Mas também estamos convictos, pelo que conhecemos das universidades portuguesas, de que esta questão do desenho institucional da nova unidade e da sua articulação com os órgãos centrais e as outras unidades da universidade onde venha a integrar-se será passível de solução aceitável. Mas o facto de ser um problema em princípio resolúvel não significa que seja de solução automática. É uma questão crucial e importa sobremaneira definir o processo decisório de forma a garantir tanto quanto possível que este tipo de considerações é tido em conta. Os detalhes do desenho institucional são uma das principais preocupações iniciais de uma eventual comissão instaladora e terão de depender muito do contexto específico da nova instituição. Não faz sentido que este grupo de trabalho tente substituir-se a essa comissão, definindo esses pontos em concreto. Na realidade um bom desenho institucional é crucial para permitir que gente de qualidade possa desenvolver bom trabalho. Mas não há desenho institucional que só por,si garanta a qualidade de uma instituição. Importa sobretudo nesta fase assegurar que não haverá, deste ponto de vista, obstáculos que se revelem limitadores das decisões futuras, que só terão a qualidade que as pessoas que liderarem o processo também possuírem.
A Medicina e as Ciências da Vida em geral são áreas científicas onde existem padrões internacionais de qualidade que não são difíceis de adoptar, caso se queira. Não é possível, por exemplo, argumentar que haja uma investigação científica nestes domínios que seja especificamente portuguesa e que portanto deva ser avaliada por padrões também específicos e diferentes do que é a prática internacional. A selecção do corpo académico com as características desejáveis é muito facilitada por este facto. Há suficientes cientistas portugueses nos diferentes estádios da vida profissional para ser perfeitamente possível encarar com optimismo a possibilidade de recrutar rapidamente um núcleo inicial de pessoas com as características desejáveis. Muitos destes terão experiências internacionais relevantes nos seus currículos e alguns poderão até não estar no momento em Portugal. Em certos casos poder-se-á até recorrer a não portugueses. Houve um grande esforço de investimento na formação científica de quadros científicos, nestas, como em outras áreas, donde resultou um pool de pessoas onde se poderia certamente ir buscar talentos promissores, ao nível mais júnior. Em termos de recursos humanos potencialmente disponíveis, pelo menos na parte académica, as circunstâncias parecem ser particularmente favoráveis nos próximos anos. O caso muda de figura quando se pensa no corpo clínico. Aí parece bem mais difícil pensar em razões para optimismo sobre a possibilidade de encontrar um pool de recursos onde seja fácil ir
fazer um recrutamento adequado. Estará aqui provavelmente a maior restrição em termos dos recursos humanos necessários.
3.3 —Importância da equipa e liderança iniciais
Um projecto desta natureza precisa de um conjunto de condições para ser viável, e um conjunto ainda mais exigente para ser bem sucedido no objectivo de introduzir um paradigma novo no ensino da Medicina. A inovação que é necessária trazer nas múltiplas dimensões — pedagógica, científica, de gestão da faculdade e das unidades de saúde envolvidas e respectiva articulação — não se compadece com uma aposta «neutra» do Governo, em particular dos Ministérios da Educação, da Saúde e da Ciência e Tecnologia. Já apresentámos acima algumas razões pelas quais julgamos necessário tentar, tanto quanto possível, criar esta instituição sem a necessidade de acomodar práticas e interesses já estabelecidos, e que podem contrariar a adopção dessa postura inovadora. É muito mais fácil imprimir um certo carácter a uma instituição que arranca do que mudar a cultura, muitas vezes firmemente entrincheirada, de uma instituição preexistente, sobretudo quando se pretende, como é o caso, um rompimento com práticas consagradas.
A preocupação com esta questão é crucial para que o projecto faça sentido e possa vir a ler uma utilidade social que o justifique. A cultura organizacional que é criada e desenvolvida nos anos iniciais vai tender a perpetuar-se em certa medida. E essa cultura vai ser em grande parte determinada pelas decisões de desenho institucional, de definição de poderes dentro da organização e de recrutamento dos primeiros colaboradores. Estas decisões, tão determinantes, vão ser tomadas por um pequeno número de pessoas que terão a missão de proceder ao arranque da instituição, seja com a figura de uma «comissão instaladora» ou outra. A escolha criteriosa deste pequeno grupo, e em particular do seu «presidente», é uma das mais importantes, se não a mais importante das condições prévias que vão afectar a possibilidade de sucesso e portanto o interesse deste projecto.
Tem de ter um prestígio científico e profissional indiscutíveis, e tanto mais quanto maior for o rompimento que venha a fazer com os paradigmas dominantes. O prestígio da nova instituição e a aceitação por parte de potenciais colaboradores de que esta pode ser uma experiência ct\ que valha a pena participar depende essencialmente do prestígio e credibilidade desta pessoa e da sua equipa inicial. Tanto mais que, pelo menos para muitos, haverá custos de aderir que podem ser significativos. Terá de aparecer aos olhos destes como uma oportunidade que também pode ter grandes custos perder. Simultaneamente tem de ter a distância suficiente em relação ao meio ambiente que lhe permita conceber esquemas alternativos de funcionamento, mas que têm de ser operacionais no contexto português, de que nunca se pode isolar, mesmo quando se baseie em exemplos de experiências internacionais bem sucedidas.
Esta equipa inicial tem de se identificar completamente com o projecto e com os seus aspectos inovadores. Nesse sentido, têm de ser criadas as condições para que esta «comissão instaladora» seja formada por personalidades que aceitem passar para a nova instituição. Uma péssima solução seria deixar que esta funcionasse como uma «colónia» ou extensão de outras unidades já instaladas. As