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II SÉRIE-B — NÚMERO 50

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além de entender que trará «grande pressão ao planeamento e gestão urbanística» (Jornal de Notícias, 30

dezembro 2024 p.14). A Associação Nacional de Assembleias Municipais alertou para a necessidade de se

tomarem medidas de capacitação destes órgãos do poder local democrático por forma a permitir «acompanhar

o aumento de responsabilidades» – algo omisso no diploma em apreço. Já a associação ambientalista ZERO

refere que o diploma resulta num «facilitismo que vai ter custos ambientais, económicos e sociais» e que «se

Portugal tem preocupações com a diminuição de riscos associados à crise climática, com a biodiversidade, com

o combate à desertificação, não pode fomentar este tipo de ocupação livre de solos rústicos tão relevante». A

Associação Frente Cívica, através de João Paulo Batalha, diz em entrevista à Rádio Renascença que «o

Parlamento tem de chamar a si e travar, por via legislativa, este assalto, porque o que se está a fazer é um

assalto ao território» e que este «tem de agir, e tem de agir imediatamente, suscitando o mais depressa possível,

com urgência, a revisão deste decreto-lei, impedindo que ele venha a produzir efeitos».

Na exposição de motivos do Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro, é também referido que «este

regime especial de reclassificação assegura, ainda, que pelo menos 700/1000 da área total de construção acima

do solo se destina a habitação pública ou a habitação de valor moderado.» Significa isto que esta alteração não

pretende apenas responder, como ocorria em anteriores alterações, à necessidade de habitação pública para

fazer face à enorme falta de habitação com preços que um rendimento médio em Portugal possa pagar, mas

sim que existirá promoção privada com valores superiores aos dos estipulados pela renda acessível, esta já de

difícil acesso por parte de muitos agregados no país. Para que conste, o valor moderado vem disposto neste

decreto-lei no artigo 2.º que altera diversos artigos do RJIGT, nomeadamente na alteração feita ao artigo 72.º-B

no ponto 8 em que se pode ler que se considera «habitação de valor moderado, toda aquela em que o preço

por m2 de área bruta privativa não exceda o valor da mediana de preço de venda por m2 de habitação para o

território nacional ou, se superior, 125 % do valor da mediana de preço de venda por m2 de habitação para o

concelho da localização do imóvel, até ao máximo de 225 % do valor da mediana nacional.» Segundo os dados

do Instituto Nacional de Estatística, relativos ao segundo trimestre de 2024, o valor mediano das vendas por m2

nacional situa-se nos 1661 euros/m2, o que significa que nos concelhos em que a mediana é inferior, um

apartamento de 80 m2 pode custar até quase 133 mil euros e nos concelhos onde este valor seja superior pode

ser aumentado em 25 % da mediana do concelho e até um total de 3737,25 euros o m2 (225 %). Isto implica

que podemos estar a falar em valores próximos de 300 mil euros, o que, em territórios em consolidação,

representa um aumento de preços muito elevado e em espiral.

A título de exemplo, no Porto a mediana situa-se em 2992 euros/m2, em Matosinhos 2619 euros/m2. No Porto

falamos de valores por m2 de 3737,25 euros e em Matosinhos de 3272,75 euros. À exceção de Lisboa e Cascais,

todos os municípios poderão ver os seus preços aumentar relativamente à mediana nacional e até ao referido

limite desde que não ultrapassem 25 % da mediana do concelho, o que significa um aumento generalizado dos

preços de venda de habitação.

Há ainda outro fator a agravar o preço da habitação nestas áreas. A operação administrativa de transformar

solo rústico em urbano aumenta drasticamente o preço desse mesmo solo, o que é repercutido no preço da

habitação aí a edificar. Este efeito sempre foi pernicioso para a concretização do direito à habitação. No atual

contexto de crise habitacional com preços elevados, trata-se de uma medida a evitar de forma a conter os custos

da habitação. Também neste âmbito há medidas de outra natureza que podem ser aplicadas.

Este é, portanto, um decreto-lei que contraria todo o conhecimento acumulado sobre a possibilidade de

redução de movimentos especulativos, sobre o impacto da artificialização do território, sobre o combate às

alterações climáticas e mitigação dos seus efeitos e sobre a necessária transparência e controlo das iniciativas

imobiliárias. Para além disso, está longe de garantir habitação que os rendimentos médios de quem vive e

trabalha em Portugal possa pagar, não respondendo, por isto, responsavelmente, aos desafios e urgências

sociais e ambientais que o País enfrenta, contribuindo antes para o seu agravamento.

Assim, as Deputadas e os Deputados abaixo assinados vêm requerer, nos termos e para os efeitos da alínea

c) do artigo 162.º e do artigo 169.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 189.º do Regimento da

Assembleia da República, a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro, que altera

o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, publicado no Diário da República n.º 252/2024, Série

I, de 30 de dezembro de 2024.