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I

27 DE JANEIRO DE 1990

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Essa publicidade ganha um maior e imprescindível relevo quando respeita aos actos de governação do Executivo e da Administração.

É que os actos do Governo e da Administração têm uma incidência directa na esfera dos direitos fundamentais do cidadão e, consequentemente, no plano dos direitos do homem.

Por estas anotadas razões, ainda que de forma apressada e breve, os Estados modernos fixaram nos seus diplomas fundamentais os processos e os meios pelos quais se garante aquela publicidade.

Porque a soberania reside no povo, este tem o supremo direito de conhecer e saber da razão, dos motivos, dos conteúdos, dos custos, das consequências previsíveis e do modo de efectivação de todos os actos que respeitam à conservação, administração e defesa dos seus interesses, tomados na acepção da vontade colectiva da sociedade a que pertencem.

Os órgãos constitucionalmente definidos, para darem expressão àquela vontade, estão sob controlo do seu império. Para tanto, processos, meios e órgãos, os mais diversos e diferenciados, de Estado para Estado, para que não só se garanta aquela publicidade mas se assegure também a correspondente fiscalização daqueles actos.

Sem aquela garantia e sem esta fiscalização, o povo, titular da soberania, poderia ser usurpado do fundamento mais essencial e indiscutível que permitiu a constituição do Estado democrático e pluralista como Estado de direito: a sua própria soberania.

Daí que os princípios da publicidade, controlo ou fiscalização dos actos do Governo e da Administração tenham merecido na Constituição daqueles Estados uma particular relevância.

Importa, porém, anotar que o princípio da publicidade, bem como o do controlo ou fiscalização, não têm carácter tão absoluto que não permita excepções.

Na verdade, o «interesse comum» da sociedade, ditado por razões da própria defesa ou da necessidade de garantir uma maior eficácia e eficiência àqueles actos, impõe, por vezes e excepcionalmente, a transferência daquela publicidade para ocasião mais oportuna, e a fiscalização é deferida para ocasião mais própria, segundo os critérios de oportunidade que a política justifica, em formação daquele «interesse comum».

A história julgará, mais cedo ou mais tarde, da justeza daqueles critérios.

Nas sociedades democráticas pluralistas são normalmente os parlamentos, ainda que não de forma exclusiva, que desempenham a função da garantia democrática, como fórum de publicidade da actuação dos poderes públicos, a fim de que o povo, titular da soberania, possa conhecer da forma e objectivos do exercício daqueles poderes.

Os actos de fiscalização representam uma substancial garantia pela possibilidade de levar à cena politica, e frente à opinião pública, os actos e decisões que, de outra forma, permaneceriam à margem do controlo popular e do conhecimento do País.

Os parlamentos cumprem, assim, principalmente através da função de fiscalização dos executivos, uma tarefa fundamental ao levar ao povo, de que são legítimos representantes, a informação sem a qual não seria possível o exercido da soberania popular, já que, para julgar e decidir, é preciso conhecer.

Num Estado de direito, próprio das democracias pluralistas, é essencial conhecer e saber se os actos dos agentes do poder estão ou não em conformidade com os princípios democráticos e com a Constituição e as leis. O princípio da publicidade e a necessidade de fiscalização de tais actos inserem-se no que há de mais fundamental quanto à defesa e desenvolvimento da própria democracia.

A Constituição da República Portuguesa acolheu de forma expressa muitos dos princípios e conceitos que deixámos aflorados.

Vejamos em que medida eles fazem parte do nosso diploma fundamental.

2 — O princípio da publicidade e os processos de fiscalização no contexto constitucional português

Infelizmente, em Portugal o «direito parlamentar» não tem merecido, por parte dos nossos mestres de direito, a análise e o estudo que ressaltam da sua importância. Ele parece ser julgado como direito menor, como um direito adjectivo, e de tal modo que passa à margem da exploração e da investigação na produção literária e jurídica dos mais capazes e conhecedores da hermenêutica dos normativos. Muito especialmente no que respeita ao Regimento da Assembleia da República, apesar de constituir o filtro condicionante de toda a actividade política e legislativa do nosso Parlamento, sede da democracia e «caixa de ressonância da opinião pública».

O mesmo se não passa, porém, e ainda bem, no que respeita ao direito constitucional e ao complexo acervo das leis.

Aquela falta de análise e estudo sistemático tem-nos colocado, não poucas vezes, em grandes dificuldades de interpretação do Regimento, não só por falta de doutrina própria que caracterize os seus princípios informadores, mas também porque são muitas as omissões que vão sendo colmatadas de forma demasiadamente pragmática e, por isso, excessivamente flutuante, em razão de conjunturas que nem sempre asseguram o pluralismo que informa o nosso sistema político.

Saber em que circunstâncias o «princípio da publicidade» deve ceder e esclarecer o fundamento e modo de exercício de cada um dos processos de controlo ou fiscalização parlamentar são espaços que se encontram quase virgens no que respeita à fundamentação científico-jurídica do nosso ordenamento parlamentar.

A forma casuística como se vêm dando soluções aos problemas de interpretação e de preenchimento das lacunas verificadas é prova da falta que apontamos.

Porém, ela não pode impedir-nos de dar resposta às questões que são causa deste relatório e parecer.

Sabemos que os processos de manifestação do Parlamento são fundamentalmente políticos.

Contudo, o seu fundamento e formas de exercício têm quadros jurídicos próprios e regras que são de reconhecer e exigir num Estado de direito.

Por tal motivo, e para sintetizar a fundamentação do nosso parecer, socorremo-nos do texto constitucional, do Regimento e da lei, no que concerne à Assembleia da República.

3 — Quanto à Constituição

a) Princípio da publicidade. — As reuniões das assembleias que funcionem como órgãos de soberania,