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II SÉRIE - C — NÚMERO 16

EEFP. Essas estruturas já tinham na altura os seus responsáveis nomeados: para o DAFSE estava nomeado como director-geral, e já em funções, o Dr. Pinto Coelho.

Aliás, nesta primeira candidatura estava em questão um ponto importante: a quota que caberia a Portugal, pois a que fosse atribuída nesse ano sería a que valeria para os anos futuros. A decisão política por que se optou foi a de maximizar essa quota, embora com menor rigor e menor exigência na qualidade dos cursos e no esquema montado, ou sermos extremamente rigorosos e penalizarmos o País nos anos posteriores. A quota conseguida, de 11 %, foi considerada um sucesso para o País, ao que não foi alheia a facilidade de relacionamento do então direcior-geral do DAFSE junto das instâncias comunitárias.

Em suma, no Verão de 198S, o País não estava devidamente preparado para aproveitar todas as potencialidades das verbas do FSE nem para as gerir. Não o estava na qualidade e na quantidade dos formadores, na organização do aparelho estatal (para apreciação dos dossiers, para o controlo contabilístico, para o controlo pedagógico), na definição de uma matriz de prioridades de formação, na aferição de uma tabela de custos/formação.

18 — Um dos mais altos responsáveis de um órgão de Estado — o Govemo — reconheceu ter sido o próprio Estado que optou por ser pouco rigoroso e exigente na candidatura aos cursos de formação profissional, no acompanhamento e fiscalização dos mesmos, na aferição de uma tabela de custos/formação, bem comprovada pela ausência de legislação sobre tal matéria, que aparece pela primeira vez com o Despacho Normativo n.° 54/87, de 27 de Maio, em homenagem à maximização da quota no FSE, que valeria para os anos futuros, tudo se «conjugando, assim, para a emergência e triunfo de uma situação de anomia: a enfatização superlativada das metas ou objectivos a alcançar, conjugada com o silenciamento quase total das normas correspondentes», como escreveram noutro notável parecer os ilustres professores atrás citados.

19 — A actuação de João Domingues nos diversos actos por que pretendem responsabilizá-lo, e já responsabilizaram, deveu-se grandemente à acção dos próprios órgãos do Estado, que mobilizaram meios poderosos para induzir os empresários a acorrer aos fundos comunitários.

Ora, é o mesmo Estado, mas agora noutra veste e com outra máscara, que pretende responsabilizar criminalmente os agentes de actos que ele em boa medida precipitou.

Ao fazê-lo — continuamos a basear-nos no parecer há momentos mencionado —, o Estado está de algum modo também a venire contra factum proprium e, por via disso, despido daquela superioridade ética — sem as «mãos limpas» reivindicadas pro Radbruch — que constitui o pressuposto irrenunciável da legitimação do direito e do acto de punir.

20 — Uma vez assente que as infracções por que se pretende responsabilizar João Domingues configuram, no dizer dos ilustres Profs. Figueiredo Dias e Costa Andrade, uma expressão paradigmática do crime.continuado, há que extrair daqui as necessárias conclusões:

20.1 — No plano material substantivo para efeitos de medida de pena;

20.2 — Como em sede processual, nomeadamente na perspectiva da eficácia consumptiva do caso julgado, que.

em se tratando de crime continuado, significa, como é entendimento consensual e pacífico, a preclusão definitiva de novo e ulterior conhecimento judicial de qualquer das infracções pertinentes à relação de continuação, sob pena de violação do princípio ne bis in idem, imposto pela Constituição da República (artigo 29.°, n.° 5).

21 —Do ponto de vista processual impõe-se que operem as regras de competência por conexão (artigos 24.° e seguintes do Código de Processo Penal), que implicará como consequência a apensação dos procesos que já tenham sido instaurados àquele que respeitar o crime determinante da competência por conexão (artigo 29.° do Código de Processo Penal), havendo apenas que respeitar o limite imposto pelo artigo 24.°, n.° 2, do mesmo diploma; a conexão só opera relativamente a processos que se encontrem simultaneamente na fase de inquérito, de instrução ou de julgamento.

22 — Após a emissão do parecer a que nos vimos referindo, tentou João Domingues conseguir que os processos em que está acusado fossem apensados, mas sem êxito.

23 — Mas mesmo que os tribunais detentores de processos com acusação feita contra João Domingues se decidissem pela apensação de tais processos, sempre restariam ainda algumas dezenas em fase de inquérito ou de instrução.

24 — Que sempre obrigariam a novos julgamentos, com eventuais julgados contraditórios, com desprestígio da justiça, dos juízes e dos tribunais.

25 — E gravíssimos prejuízos morais e materiais para João Domingues, a mulher e os dois jovens filhos, que não compreendem que a sua conduta relativamente a processos de formação profissional subsidiados pelo FSE tenham merecido um tratamento judicial muito mais severo do que o concedido aos mais execráveis criminosos que violaram os mais fundamentais direitos dos cidadãos.

26 — É incompreensível para o comum dos cidadãos que a conduta de João Domingues em processo do FSE tida desde meados de 1985 até meados de 1988, portanto durante 3 anos, demore a ser investigada, apreciada e julgada durante 4, 8, 12 ou mais anos, tendo em conta que nestes últimos 4 anos apenas foram julgados definitivamente 11 casos, quando a GESCOL, L."-2, interveio em mais de centena e meia por cada ano.

27 — Impõe-se, pois, a todas as luzes e com carácter de urgência, uma medida legislativa, que não pode aguardar a revisão do Código de Processo Penal em curso, que encare em novos moldes a regulamentação da competência por conexão e da apensação de processos, que, sacrificando embora a celeridade processual, defenda as exigências da justiça material, da praticabilidade e da economia processual, que em boa medida sustentam a figura e o regime do crime continuado.

28 — Só uma medida legislativa dessas a curto prazo poderá corrigir o que se tem feito nos julgamentos parcelares da conduta de João Domingues, que tem de ser apreciada e ponderada no conjunto de todas as acções em que interveio, e dar-lhe-á a esperança de voltar à liberdade, por que sempre se bateu, ao seio da família, que sempre estremeceu, e dos muitos amigos que, por todos os lados, na vida social, profissional, e política, granjeou.

29 — Por outro lado, fará que casos semelhantes a estes sejam julgados como impõe a figura do crime continuado, com claro benefício da justiça e dos tribunais.

Porto de Mós, 19 de Outubro de 1992. — O 1.° Subscritor, Licínio Moreira da Silva.

Nota. — Desta petição foram subscritores 2872 cidadãos.