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II SÉRIE-C — NÚMERO 23

18 — Admitindo, por hipótese, que não tenha sido violado o citado despacho, teria de concluir-se pela insuficiência deste; facto que nunca permitiria ao Estado esquivar--se à assunção de responsabilidades perante os lesados, pois dar-se-ia o caso de uma responsabilidade por omissão em tempo útil de medidas normativas indispensáveis, no mesmo sentido em que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem condenou a República Francesa por Acórdão de 31 de Março de 1992, em circunstâncias muito semelhantes (cf. fl. 25 do documento n.° 1).

19 — Prontamente, S. Ex." o Ministro da Saúde fez cumprir, em 21 de Fevereiro de 1994, o dever de comunicação inscrito no artigo 38.°, n.° 2, da Lei n.° 91 91, de 9 de Abril, embora para justificar o não acatamento da recomendação que lhe fora endereçada em 27 de Dezembro próximo passado (cf. documento n.° 2).

20 — Neste documento sustentou a Administração Pública que no decurso do ano de 1986 terão sido utilizados os meios de controlo considerados eficazes, referindo também que as suspeitas lançadas à época pela Associação Portuguesa dos Hemofílicos (APH) e veiculadas pela imprensa se confinavam a produtos da Plasmapharm-Sera que não o factor viu. A comissão nomeada para adjudicação ter-se-á satisfeito com a garantia de o laboratório austríaco se encontrar submetido a gestão pública e não ter havido, quanto àquela marca, notícia de contaminação de factor viu.

21 —Refutando a argumentação deste órgão do Estado quanto à necessidade de ter ficado registada a ligação entre o lote administrado e o indivíduo que o haja recebido, entende o Ministério da Saúde que apenas se seguiu a prática clínica corrente, confundindo, acrescidamente, aquilo que fora defendido na recomendação sobre a inversão do ónus da prova do nexo de causalidade com a produção de prova, hoje superabundante, da contaminação do lote

"n.° 810 536.

22 — Mais afirma S. Ex.* que o Estado, ao consagrar a solução arbitral, assumiria a responsabilidade pelo risco e acrescenta, no mesmo texto, que a adesão dos hemofílicos à convenção de arbitragem partiu de um acto livre e consensual..

23 — Por fim, escudou-se o Ministério da Saúde em argumentação sufragada pela APH sobre a recomendação, quanto às relações entre a comissão sugerida e o tribunal arbitral, argumentação essa que partia de uma deficiente compreensão jurídica, mau grado persistentes esforços empregues junto daquela respeitada Associação, com vista a esclarecer o alcance, conteúdo e significado de uma solução paralela, extrajudicial, aliás, regida pelo Código de Processo Civil, nos termos gerais.

24 — Verificando que a resposta de S. Ex.* o Ministro da Saúde evidenciava algumas petições de princípio, porventura resultantes de uma menor clareza do texto, decidi contraditar e reenunciar os aspectos mais basilares da recomendação formulada. Assim, em 4 de Março próximo passado, remeti ao Ministério da Saúde esclarecimentos complementares (documento n.° 3), onde pude afirmar não ter encontrado razões suficientes que tornassem vencida ou sequer convencida a posição deste órgão do Estado.

25 — Renovei as considerações efectuadas quanto à insuficiência das garantias retiradas do certificado de qualidade referente ao sempre citado lote austríaco, fundando--me, em boa parte, no relatório do Grupo de Trabalho Sida/ \fe!fcCiÇí!Ácos, cuja nomeação partira do Ministério da Saúde, através de despacho de 23 de Dezembro de 1991

(Diário da República, 2.' série, de 24 de Janeiro de 1992). De novo sustentei «que elementares razões de precaução, ainda quando apreciadas na posição 'de um bom pai de família', em face das circunstâncias do caso (v. artigo 487.°, n.° 2, do Código Civil), exigiam a sustação da administração do produto até ser obtida completa dissipação das menores dúvidas quanto à sua nocividade» (cf. documento n.° 3, a fl. 3). Acrescentei ainda, confortado por transcrição de uma intervenção do Sr. Prof. Machado Caetano, ser o lote em causa indesejado, mesmo à \uz de outras exigências de qualidade autónomas da despistagem do HTV, dado que apresentaria uma excessiva quantidade de fibrogénio.

26 — No que diz respeito à ilegalidade da conduta praticada pela Secretaria-Geral do Ministério da Saúde, por violação das regras contidas nos n.os 1 e 4 do Despacho n.° 12/86, de 18 de Abril, entendeu S. Ex.* o Ministro da Saúde não dever inflectir a posição do provedor de Justiça. Quanto a este aspecto, apesar de não incidir sobre a Administração Pública o ónus da impugnação especificada, não deixarão por certo VV. Ex.", Srs. Deputados, de retirar as devidas conclusões, sendo certo que, em última instância, a decisão sobre a ilegalidade cometida caberá aos tribunais.

27 — A prática clínica da época não pode servir de causa justificativa da omissão administrativa de um registo onde fossem cruzadas as referências lote/doente. «Se era essa a prática clínica da época, configurava-se como descuidada e, como tal, insusceptível de justificar a ilicitude dos actos praticados ao seu abrigo.» (Cf. documento n.° 3, a fl. 5.)

28 — Não ficou sem reacção, também, a parte da resposta sobre as virtualidades do sistema definido a partir do Decreto-Lei n.° 237/93, de 3 de Julho. Comecei por reiterar que «o processo alternativo de resolução do litígio, através da constituição de um tribunal arbitral, não é, por si só, objecto de crítica ou reparo na recomendação do provedor de Justiça, excepto no que tardou» (cf. documento n.° 3, a fl. 7). A censura deve-se à posição débil e iníqua em que os aderentes ficaram situados, tal como fora sustentado na recomendação.

29 — Em 22 de Fevereiro próximo passado, S. Ex." o Ministro da Saúde cumpriu formalmente, uma vez mais, o dever de colaboração para com este órgão do Estado, retorquindo às objecções que complementarmente haviam sido enunciadas. Infelizmente, uma vez mais, manteve o não acatamento da recomendação e, embora lançando mão de argumentação melhor desenvolvida sob o ponto de vista sistemático, continuou sem convencer o provedor de Justiça, nem retirar validade às asserções contidas na recomendação de 27 de Dezembro próxima passado.

30 — Afirma S. Ex.": «A análise cega do produto demorou seis meses, era necessário tratar os doentes, o hospital esperou dois meses até receber o certificado de garantia do lote em causa.» (Cf. documento n.° 4, a fl. 3.) É este o cerne da justificação pretendida pela Administração Pública, ao qual não pode deixar de acrescentar-se que o certificado de qualidade reportava-se, em abstracto, à marca e não ao lote em questão.

31 — No tocante ao excessivo volume de fibrogénio, foi retorquido, o que, com o devido respeito, era desnecessário, ou seja, explicar que este elemento nada tem que ver com o HIV. Com efeito, o que fora afirmado era simplesmente que o lote n.° 810 536 nem sequer segundo critérios de qualidade genéricos deveria, alguma vez, ter sido adjudicado.