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30 DE ABRIL DE 1994

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consentimento para a realização de actos de transfusão é condicionado por razoes clínicas, inclusivamente de estrita sobrevivência, por vezes.

20 — Os portadores de hemofilia destacam-se no interior deste conjunto, sem, no entanto, deverem ser esquecidos todos os restantes indivíduos aos quais são administrados sangue ou produtos seus derivados.

21 — Assim e se é certo que o Estado não se pode furtar, por todos os meios que estejam ao seu alcance, a disponibilizar formas de apoio a todos os contaminados pelos agentes causadores da sida, haverá também de, acrescidamente, ter em conta a situação especial daqueles que se tornaram seropositivos, ainda que acrescidamente, a partir de actos médicos realizados em estabelecimentos públicos de saúde.

22 — Na verdade, pelo menos relativamente aos actos médicos de transfusão realizados em estabelecimentos públicos de saúde, o Estado assume uma posição de garante da idoneidade e qualidade dos produtos administrados. Desta posição de garante resultam deveres de cuidado, cujo cumprimento se traduz quer na produção de normas regulamentares necessárias e adequadas, quer na prática de actos individuais e concretos, quer ainda na realização de operações materiais.

23 — Analisem-se, então, as conclusões relatadas pelo referido Grupo Sida/Hemofílicos, nomeado por despacho ministerial (v. supra), para o efeito de determinar se o Estado cumpriu ou não os deveres de cuidado e diligência a que estava adstrito, em face das circunstâncias de facto, do direito vigente e em função da posição de garante que desempenha.

24 — Pode ler-se a fl. 10, do citado documento, sob o título «Conclusões»:

1) O lote n.° 810 536 da Plasmapharm podia ser susceptível de transmitir a infecção pelo vírus da sida.

2) O produto entrou no Hospital de São José em Junho de 1986 na quantidade de 500 frascos e, a partir de 18 de Agosto do mesmo ano, começou a ser utilizado, presumindo-se que foi administrado até final de Setembro de 1986.

3) O Hospital de São José não administrou o produto sem que tivesse em seu poder o certificado de análise do laboratório produtor, comprovando a negatividade para o vírus da sida.

[...]

5) Sabemos, contudo, que até à data da entrada do mesmo nos HCL, já havia pelo menos 38 hemofílicos seropositivos dos 107 estudados até então [...]

6) Há, todavia, alguns doentes em relação aos quais, embora não possa ser estabelecida uma relação linear entre a administração do produto e a seropositividade, esta eventualidade não se pode excluir. Acresce, ainda, um problema difícil de superar que diz respeito à existência de testes com resultados falsamento positivos e falsamente negativos, o que dificulta ainda mais o estabelecimento da relação causa/efeito, entre a administração do lote e a seropositividade.

[...]

11) A partir de 1987 todos os factores de coagulação e posteriormente todas as imunoglobulinas adquiridas através de concurso da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde passaram a ser testados para o v/rus da hepatite B e da sida no Instituto Português

do Sangue, não tendo sido autorizada a administração de quaisquer produtos cujos resultados mostrassem haver susceptibilidade de transmissão destas infecções.

25 — Em primeiro lugar, cumpre apreciar o cuidado por parte da Administração Pública na aquisição do lote n.° 810 536, cuja nocividade ficou comprovada decisivamente em Dezembro de 1986. Importa, pois, saber se a actuação administrativa se conformou com as normas jurídicas em vigor, ao tempo, e saber também se, nessa actuação, a Administração «empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias» (cf. artigo 493.°, n.° 2, do

Código Civil).

26 — De um lado ou de outro, não pode a actuação do Ministério da Saúde e das autoridades hospitalares ficar isenta de críticas.

27:—Com efeito, no próprio relatório citado é admitido que, apesar de as exigências formuladas quanto ao concurso para aquisição do produto permitirem a salvaguarda contra a transmissão de VIH (fl. 74), o certo é que se faz sustentar, do mesmo passo que «o método estabelecido para o controlo burocrático era criticável» (idem). De modo inequívoco, afirma-se a fl. 71:

Há que salientar, contudo, a incongruência entre as normas estabelecidas e o processo de verificação do seu cumprimento. Concretamente entre a exigência contida no artigo 3.° das «Condições especiais» e a comprovação da condição estabelecida na alínea b) dos novos requisitos.

28 — Por outras palavras: embora se exigisse às empresas concorrentes um certificado do laboratório de origem comprovando a inactivação do HTL VIU, com indicação da metodologia adoptada (v. ofício de 11 de Setembro de 1985), depois, o pedido do certificado de análise ficava na disponibilidade de cada hospital.

29 — Além deste aspecto, o relatório não deixa de enunciar outra censura. A fl. 70 lê-se:

Colocada a questão aos Serviços de Aprovisionamento da Secretaria-Geral, estes referem que o requisito desta alínea b) se reporta à marca e não a cada lote do produto como, em nosso entender, deveria ser.

Daí que nunca se tenha encontrado naqueles Serviços qualquer referência ao lote n.° 810 536.

30 — Mais se afirma no mesmo texto (fl. 70) ser estranho não existirem quaisquer boletins analíticos desse lote, quando é certo haver boletins analíticos relativos a outros lotes.

31 —Em 18 de Agosto de 1986, quando começou a ser administrado o lote n.° 810 536 —eventualmente, só uma parte, pois é admitido terem sido destruídos alguns frascos que compunham o mesmo —, encontrava-se já em vigor o Despacho n.° 12/86, de 18 de Abril.

32 — Ora, nunca até esta data foi enviado pelo Ministério da Saúde à Provedoria de Justiça documento algum que demonstre ter sido cumprido o disposto nos n.05 1 e 4 do aludido despacho. Tão-só resulta ter ficado assegurada a idoneidade da marca. E repare-se que no mesmo despacho se afirma:

4.1 — Os produtos e fracções estirados do sangue, destinados a serem utilizados para fins terapêuti-