O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

10 DE FEVEREIRO DE 199S

87

Do Direito aplicável

18." Esta matéria é tratada por dois artigos de lei, mas que não têm, um e outro, a mesma hierarquia normativa.

19." A propósito dos direitos e regalias dos parlamentares, prescreve o n.° 1 do artigo 161.° da Constituição da República.

20.° «Os Deputados não podem ser jurados, peritos ou testemunhas sem autorização da Assembleia, durante o período de funcionamento efectivo desta.»

21.° Por sua vez, a Lei n.° 7/93, de 1 de Março (Estatuto dos Deputados) que melhor explicita aquele preceito constitucional, reza assim na previsão do seu artigo 14.°:

1 — Os Deputados não podem, sem autorização da Assembleia, ser jurados, peritos ou testemunhas nem ser ouvidos como declarantes nem como arguidos, excepto, neste último caso, quando presos em flagrante delito ou quando suspeitos de crime a que corresponda pena superior a três anos.

2 — A autorização referida no número anterior ou a recusa será precedida de audição do Deputado.

3 — A falta de Deputado por causa das reuniões ou missões da Assembleia a actos ou diligências oficiais a ela estranhos constitui sempre motivo justificado de adiamento destes, sem qualquer encargo.

4 — O Deputado não poderá invocar o fundamento previsto no número anterior mais de uma vez,

' em qualquer acto ou diligência oficial.

22.° Ora, quer da leitura do preceito constitucional (artigo 161.°, n.° 1), quer da interpretação dos normativos acima transcritos da Lei n.° 7/93 (artigo 14.° e seus n.os 1, 2 e 3) se infere que a ratio de um e de outro radica, tem de radicar, em razões institucionais sólidas, de matriz ética valorativa.

23.° A estatuição de tais preceitos não objectivou, como se sabe, nem era esse, seguramente, o propósito dos Deputados e do legislador, estabelecerem para si próprios privilégios que a democracia, numa óptica de igualdade, nega a outras categorias de pessoas.

24." Não! Estamos certos e seguros de que a ideia que enformou o poder constituinte e o legislador ordinário não foi essa, mas outra totalmente diferente e bem mais sólida, lógica e justa que aquela.

25." A saber, a ratio de tais preceitos deve buscar-se numa mesma e fundamental ideia: a de assegurar e proteger a dignidade e o bom nome da instituição parlamentar, a normalidade da sua agenda ou ordem de trabalhos, o seu regular funcionamento, o seu quórum bem como a sua eficácia e prestígio enquanto sede por excelência da nossa democracia representativa.

26." Trata-se, portanto, de comandos constitucionais e legais que não têm um mero carácter facultativo, visto tratar-se de normas de ordem pública, que, por sua natureza, são cogentes e impositivas.

27.° Quer isto significar que pairam acima da vontade individual do Deputado eleito ou de qualquer outro particular, que não as pode derrogar ou modificar a seu livre alvedrio.

28.° De resto, que assim é, bastará fazer uma pesquisa do exacto sentido e alcance do prescrito no citado n.°2 do artigo 14.° da Lei n.° 7/93 para se concluir que nela pontificam, sobretudo, os superiores interesses públicos da Câmara e só muito reflexamente os do Deputado.

29.° Achada, pois, a matriz publicística das duas referidas disposições de lei, encontrada estará, também, a solução a dar à questão posta no artigo 17.°, alínea b), deste relatório.

30.° Até porque, se assim não fosse, estaria encontrada a forma de violar e comprometer seriamente os altos fins e valores enumerados no artigo 25.° deste relatório.

31.° Nesta linha de pensamento, pois, deve a Assembleia da República fixar doutrina para o caso sub judice, que deve ser válida para todas as situações futuras análogas, assentando no seguinte entendimento.

32.° Sempre que a Câmara, nos termos regimentais, autorize que um seu Deputado, a solicitação dos tribunais, compareça para prestar, como testemunha, o seu depoimento ou outra qualquer diligência processual...

33." E, tendo este, em cumprimento de notificação judicial para o efeito recebida, pessoalmente comparecido na primeira diligência agendada pelo respectivo tribunal, deve entender-se que tal autorização apenas é válida e eficaz para a mesma, nela se esgotando.

34.° Consequentemente, para cada nova diligência subsequente ao adiamento da primeira designada pelo tribunal deverá este obter da Assembleia da República nova autorização para que, ouvido o seu eleito, possa este, mais uma vez, comparecer no novo dia e hora determinados para esse fim pelo Tribunal.

35.° No que toca à questão enunciada no artigo 17.°, alínea a), deste relato, também colocada pelo Deputado requerente, e que consiste em saber que dever, de entre os dois a que, naquele dia, estava igualmente obrigado, deveria satisfazer, sendo certo que o cumprimento de um deles lógica e cronologicamente excluía o adimplemento do outro.

36.° Em nosso entender, salvo sempre melhor opinião em contrário, face ao conflito óbvio, haveria que ter presente que a Lei n.° 7/93 é um diploma especial que, como tal, prevalece sobre a lei geral (Código de Processo Penal), porque se destina a uma determinada categoria de pessoas, no caso os Deputados.

37.° Nessa medida, haveria que ter em conta que os direitos e regalias dos Deputados, elencados, aliás, nos aludidos artigos 161.°, n.° 1, da Constituição política, e 14.° da Lei n.° 7/93, são prerrogativas parlamentares e, por isso, de natureza política, somente podem e devem ser consideradas sob o critério político.

38.° A ser assim, como parece que é, caberá à Assembleia da República e só a ela formular o tal juízo sobre o carácter inadiável dos trabalhos parlamentares invocados no processo pelo Sr. Deputado.

39.° É que, a não ser assim, isto é, se fossem os tribunais a decidir sobre tal matéria, correríamos sérios riscos de se poder estar a violar o basilar princípio constitucional da divisão e interdependência dos poderes do Estado (cf. artigo 114.° da Constituição política).

40.° Relativamente às multas aludidas nos artigos 12.° e 15.° já aplicadas'e pagas, nada haverá a fazer, dado tratar-se de decisões definitivas, irrecorríveis e, por isso, já transitadas em julgado.

41.° No entanto, para que esta situação não se arraste por mais tempo, pondo cobro aos inconvenientes atrás descritos, opinamos no sentido de que a Assembleia, respeitando os formalismos próprios do Regimento, decíate, esgotada a autorização concedida ao Sr. Deputado Luís Filipe Madeira para prestar o seu depoimento no aludido processo crime n.° 83/93 pendente no Tribuna) óe Lagos.