11 DE MARÇO DE 1996
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Portanto, é em relação a esse conjunto que dizemos que, em 1996, elas ficarão seguramente abaixo, algumas centenas de milhares de contos, da margem de segurança que permite manter o défice abaixo de 4,25, neste caso 4,23. Isto significa que, se pensarmos em limites de convergência, está sempre abaixo de 4,3; se pensarmos em arredondamento, mantém a ordem de grandeza de 4,2 que tinha sido e é o objectivo central da proposta que o Governo apresentou.
Quanto à incidência em 1997, devo dizer que não me parece que seja adequado, neste momento, estar a apontar números do Orçamento de 1997 — cada coisa a seu tempo; não temos programações plurianuais, pelo que não vamos aqui discutir o Orçamento de 1997, que será preparado na devida altura e será analisado igualmente na devida altura. Mas devo dizer que tenho visto números que são manifestamente exagerados e toda a incidência possível no Orçamento de 1997 das medidas encaradas em sede de IRS e de IRC não excederá algumas dezenas de milhões de contos. Dou por exemplo dois casos, aliás, largamente reclamados por muitos sectores de opinião, tal como várias das outras medidas que consideramos também o foram: a elevação dos limites dos PPR e das Contas Poupança-Habitação, com os limites fixados — os exercícios de simulação que temos apontam para 1,9 e 2 milhões de contos em cada um dos casos. Isto significa que, mesmo com incidência em 1997, aquelas medidas que correspondem a benefícios fiscais são relativamente moderadas. É evidente que há normas de tipo programático que apontam para transformações do sistema fiscal e aí não se pode falar de custos, porque um novo regime dos impostos sobre o património é algo que só depois de estar traçado é que se saberá que consequências financeiras terá. Como já disse e sublinho de novo, essa proposta do PP corresponde a algo que já estava no programa do Governo, a revisão da sisa e do imposto sobre sucessões e doações, no âmbito de uma reformulação geral dos impostos sobre o património.
Portanto, em resumo, penso que será absolutamente inseguro, inviável e, por mim, não entraria por este caminho, fazer o cálculo dos efeitos diferidos para 1997 e, muito menos, de efeitos de medidas que são de reforma fiscal e que só quando ela for concretizada é que se poderá ver quais são, porque até pode daí resultar aumento e não diminuição de receita. Penso, aliás, que uma boa reforma do sistema de impostos sobre o património, que tem bases muito baixas e níveis de evasão fiscal generalizada muito elevados, será causa de aumento de receita e de aumento de justiça social e não diminuição. Diria até que, nas propostas a que se refere, relativamente a 1997 e anos seguintes, muitas delas poderão determinar aumento de receita e outras redução e essa é mais uma razão para não poder fazer um cálculo global que a seu tempo será feito. Naturalmente, naquilo que é possível, quando vier a proposta de orçamento para 1997, apresentaremos uma proposta coerente, onde os efeitos desta ou daquela despesa fiscal estarão integrados numa política de conjunto relativa ao objectivo do défice pretendido e aos instrumentos de cobrança de receitas e de realização de despesas.
Penso, portanto, que não há base, neste momento, para fazer esse cálculo global e é importante sublinhar que bom número de medidas que estão incluídas no conjunto de propostas de várias bancadas, que o Governo aceitou, é um conjunto de medidas que poderá ter como consequência o aumento da receita fiscal ou, simplesmente, um aumento em termos de maior ajustamento de eficiência às
situações tributadas ou de justiça, como é o caso, por exemplo, da revisão do regime do IRS para os pescadores ou o caso da revisão dos impostos sobre o património; de tudo isso poderá resultar um melhor ajustamento às situações e, quando isso acontece, em muitos casos, o que ocorre não é quebra de receita.
A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.
O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): — Sr." Presidente, Sr. Ministro, queria colocar-lhe uma questão relativa a um dos artigos incluídos na proposta de lei do Orçamento, mais especificamente, o artigo 58.°, que tem por epígrafe «Mobilização de activos e recuperação de créditos». Esse artigo permite, no fundo, que o Governo ou que o Ministro das Finanças possa vender créditos fiscais ou converter créditos fiscais em capital dos devedores e permite vender esses créditos fiscais oü realizar essa conversão ao valor nominal dos créditos ou a valores aproximados do mercado.
Sr. Ministro, vivi o suficiente na Universidade, e quero viver ainda mais, para saber que, de facto, nem sempre o que se ensina durante muito tempo é verdade (as coisas mudam!) e era costume ensinar ou falar da chamada indisponibilidade dos créditos fiscais. O Estado não pode vender, não pode transmitir nem pode perdoar esse crédito por ele ser indisponível e sublinho que não pode perdoar porque isso está aqui em presença. Se houver uma redução na venda ou na conversão do valor nominal dos créditos, haverá sempre um perdão.
Devo dizer que sou mais liberal nesta matéria do que a doutrina tradicional e não entendo, porque não vejo razões para tal, que, de facto, hão possa ocorrer a alienação de créditos fiscais, nem entendo que seja absolutamente impossível, face à Constituição, a concessão de um perdão, num certo sentido, pela via da redução do valor nominal dos créditos segundo as condições de mercado, o que abrange também a conversão, o que me custa mais a aceitar é que não seja necessária uma lei com alguns critérios.
Se não vejamos como funcionam as coisas na prática. Suponhamos um processo de recuperação de empresas — nestes processos, aparece o representante da Fazenda Pública, por exemplo, a aceitar uma solução para a empresa em dificuldade, como seja converter o crédito em capital dessa empresa, ou a admitir a alienação do crédito a um terceiro que o queira comprar por um valor inferior ao valor nominal. Ora bem, não será necessário, ao menos para respeitar alguma coisa que fique do princípio da legalidade, estabelecer legislativamente alguns critérios para esta intervenção? O representante da Fazenda Pública típico, que aparece nesses processos de recuperação de empresas, será aceitável que possa, efectivamente, participar, como os outros credores, com o mesmo poder negocial, com a mesma capacidade de dizer o que é que cede, como cede e até quando é que cede?
Julgo que será difícil e, Sr. Ministro, não sei se concordará mas este poder de negociar créditos fiscais com esta amplitude, isto é, sem alguma baliza ou sem se anunciar uma lei que estabeleça algumas regras, é um poder complicado porque pode distorcer gravemente a concorrência conforme as localizações ou conforme o humor do representante da Fazenda. Este poder de converter créditos ou de os perdoar é um poder que devia ser enquadrado de algum modo e ele não deveria, porventura, ser exercido pelos mesmos agentes que comparecem tradicio-