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II SÉRIE-C — NÚMERO 24

Despacho relativo ao requerimento do CDS-PP sobre a interpretação do artigo 27.2, n.94, da Lei n.9 72/93, de 30 de Novembro, na sua aplicação ao cálculo da subvenção estatal para a campanha legislativa de 1995.

1 — Está em causa, em breve resumo, o que entender pela expressão «resultados eleitorais obtidos», constante do n.°4 do artigo 27.°- da Lei n.° 72/93, de 30 de Novembro. O número de votos, como defende e justifica o Partido requerente? O número de mandatos em que esses votos foram convertidos, segundo o princípio de convertibilidade previsto no n.°5 do artigo 116° da Constituição da República, como defendem os serviços da Assembleia, a sua Secretária-Geral, o seu auditor jurídico e, por mim para o efeito ouvida, a Comissão Nacional de Eleições?

2 — Há que honestamente reconhecer que a lei está longe de ser clara e de consentir uma interpretação unívoca.

Muito provavelmente, estamos perante dúvidas e hesitações que só por via de interpretação autêntica, isto é, por via legislativa, poderão ser dirimidas.

Este facto, porém, não me isenta de decidir.

E decidindo:

Nenhuma das linhas da argumentação expendida se avantaja à outra por forma e subalternizá-la. Mas o empate é também aqui proibido, bem como o recurso à fórmula das grandes penalidades.

A uma primeira aproximação — essa consistente em mera interpretação literal — eu seria levado a admitir que a expressão «resultados eleitorais obtidos» serve melhor a tese do requerente do que a tese que se lhe opõe. Na verdade, quando em termos comuns se comparam os «resultados.eleitorais» dos partidos concorrentes, estes surgem expressos em percentagem de votos e não em número ou percentagem de mandatos.

Saída cómoda, para mim, seria estoutra: foi o próprio requerente quem sugeriu que sobre a pendência fosse ouvida a Comissão Nacional de Eleições. Esta, do alto da autoridade específica na matéria que se lhe reconhece, opinou no sentido de que a expressão «resultados eleitorais obtidos» deve entender-se como referida, não ao número de votos, mas ao número de mandatos. Podia assim limitar--me a um despacho de concordância, fundado nos seus fundamentos.

Mas era cómodo de mais.

Daí que, louvando-me embora no essencial dos seus considerandos, considere eu próprio o seguinte:

a) Vivemos em regime político representativo;

b) O sistema de representação que entre nós vigora é o da representação proporcional. O método é o da média mais alta de Hondt;

c) Este método, credenciado como o que mais reduz os restos não utilizados na conversão de votos em mandatos, ainda assim inutiliza número de votos significativo. É um facto que o nosso sistema eleitoral absorve sem qualquer sintoma de resistência, nomeadamente vinculando ao aproveitamento dos restos no círculo nacional que a Constituição admite;

d) Do que se trataria agora, no entender da Comissão Nacional de Eleições, era de um segundo nível de inutilização de votos: já não para efeitos da sua convertibilidade em mandatos, mas para efei-

tos do cálculo de subvenção para campanha eleitoral. O primeiro nível justificaria o segundo; •

e) Embora não seja entusiasmante, não repugna que se admita que a «finalidade última do sufrágio» é «a obtenção de mandatos, não de votos». Aqueles, não estes, seriam «o objectivo e o resultado prático da eleição». O Estado subvencionaria assim o que é eleitoralmente relevante;

f) Este entendimento poderia ser reforçado com as seguintes considerações: a subvenção não depende do concurso a todos os lugares sujeitos a sufrágio, mas apenas a 51 % desses lugares; esta percentagem poderia ser atingida concorrendo apenas nos maiores círculos eleitorais, com desprezo dos restantes, que poderiam até ser em maior número do que aqueles; acresce que o direito à subvenção também não depende da obtenção de um mínimo de votos, mas de um mínimo de mandatos (2 % dos lugares correspondentes ao universo a que os partidos concorram); o legislador fez assim prevalecer o número de mandatos sobre o número de votos, confirmando o referido sacrifício duplo dos votos não convertidos em mandatos; parece assim que o legislador se revelou indiferente à hipótese, aliás frequente, de um partido poder ter tantos ou mais mandatos do que qualquer outro, com igual ou menor número de votos, situação a que se reconduz o principal argumento do CDS-PP;

g) .0 argumento a contrario retirável — e retirado — do facto de, nas eleições para as autarquias locais, se considerarem «apenas os resultados obtidos em termos de número de candidatos às assembleias municipais directamente eleitos» também não abona a tese da prevalência do número de votos. O que no n.° 5 do artigo 27.° da citada lei se pretendeu foi apenas pôr fora da contagem os candidatos aos demais órgãos autárquicos. «Apenas» isso. E, se assim é, o que fica de relevante é que, quanto às assembleias municipais, o que conta é o número dos candidatos, não o dos votos, tal como na solução que a Comissão Nacional de Eleições perfilha. É de resto conhecida a falibilidade dos argumentos a contrario;

h) É este ainda — o número de Deputados e não o dos votantes ou dos votos expressos — o critério de repartição, entre as Regiões Autónomas, da subvenção estatal para as eleições às Assembleias Legislativas Regionais.

3 — Dito isto, e sem necessidade de outras considerações, a fundamentação do douto parecer da Comissão Nacional de Eleições — aqui dada por reproduzida como parte integrante deste meu despacho — poderá suprir, pronuncio-me, embora com dúvidas, no sentido de que a expressão «resultados eleitorais obtidos» se refere, não ao número de votos, mas ao de mandatos e, em consequência, indefiro o requerimento em que o CDS-PP baseia o seu pedido nà interpretação contrária.

Palácio de São Bento, 19 de Julho de 1996. — O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.