O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

88

II SÉRIE - C — NÚMERO 8

Declaração da Mesa da Assembleia da República sobre a compatibilidade ou incompatibilidade do mandato dò Deputado do PS Henrique Neto, à luz da alínea a) do n.9 3 do artigo 21.s do Estatuto dos Deputados.

1 — Primeira questão prévia:

Antes de mais convém esclarecer qual o conteúdo da competência da Mesa da Assembleia da República para «declarar [...] a perda do mandato em que ocorra qualquer Deputado» (artigo 25.° do Regimento da Assembleia da República).

Competência meramente declarativa ou verdadeiramente decisória?

A dúvida prende-se com a natureza vinculativa ou não vinculativa dos pareceres da Comissão de Ética e da 1Comissão. E reforça-se com os termos concretos em que aquelas comissões concluem os seus pareceres, a propósito do Deputado Henrique Neto, pendente de declaração final da Mesa da Assembleia da República.

Diz a Comissão de Ética na carta que dirige ao Presidente da Assembleia da República, acompanhando o seu parecer relativo àquele Deputado:

Venho dar conhecimento a V. Ex.* da situação de impedimento que afecta o Sr. Deputado Henrique José de Sousa Neto, a fim de a Mesa da Assembleia da República declarar, se assim o entender, a perda do mandato em que este Sr. Deputado está investido.

Reconhece-se assim que a Mesa da Assembleia da República pode não declarar a perda do mandato /daquele Sr. Deputado, o que vale por dizer que o parecer daquela Comissão não é vinculativo, decisória sendo a declaração da Mesa..

Diversamente, a 1." Comissão, no final do seu relatório, depois de concluir que «não está verificada a situação de impedimento [...] relativamente ao Sr. Deputado Henrique José de Sousa Neto», conclui nestes termos:

Por isso, a Mesa não poderá declarar com base nos factos comunicados, a perda do mandato em que o mesmo Sr. Deputado está investido.

Como se vê, a caracterizada questão prévia existe e deve ser dilucidada.

Seria cómodo, para a Mesa da Assembleia da República, não ter de tomar posição em matéria de tanto melindre. A 1." Comissão teria decidido a título definitivo, restando à Mesa da Assembleia da República a declaração formal dessa decisão, porventura para que da mesma pudesse ser interposto recurso para o Plenário da Assembleia da República.

Mas é outro o entendimento da Mesa, pelo que não pode refugiar-se naquela comodidade. É outro com base nas seguintes razões:

É próprio da natureza dos pareceres não serem vinculativos. Quando se pretende que o sejam, o legislador, em regra, não se esquece de dizê-lo.

O artigo 25.°, que consagra a referida competência da Mesa, insere-se no contexto sistémico do Regimento da Assembleia da República, cujo artigo 38.°, que arrola as competências da Comissão de Regimento e Mandatos (hoje La Comissão) comete aquela Comissão (hoje esta) competência para «instruir os processos de impugnação de elegibilidade e de perda do mandato» [alínea d)] e para

«emitir parecer sobre a suspensão e perda do mandato» [alínea c)).

Se o legislador tivesse querido atribuir àquela Comissão um poder de decisão dos processos por ela mesma instruídos, teria, seguramente, redigido aquela alínea c) de maneira diferente!

Acresce que, como regra, os relatórios e pareceres das comissões especializadas não são vinculativos. E se a regra é essa, mister seria que se tivessem redigido aquelas alíneas do artigo 38." em termos de excepção.

O artigo 28." do Estatuto dos Deputados (na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto, que criou a Comissão de Ética) comete a esta «verificar os casos de impedimento e, em caso de violação, instruir os respectivos processos». Fala-se aqui em impedimento, não em incompatibilidade, conceitos que tecnicamente diferem. E mesmo quando lhe comete a apreciação de eventuais conflitos de interesses é para a incumbir de dar sobre eles o seu parecer.

Conclui-se, assim, sem necessidade de mais fundas indagações, que a Mesa da Assembleia da República tem competência decisória, embora sujeita a ver a sua decisão reapreciada pelo Plenário da Assembleia da República por via de recurso.

Não há pois outro remédio senão decidir.

2.1 — Segunda questão prévia:

Quer no parecer da Comissão de Ética, quer no parecer da 1." Comissão —ambos revestidos do maior brilho técnico-jurídico —, é levantada a questão — com respostas divergentes — de saber como conciliar (ou não conciliar!) a competência que a alínea d) do n.° 3 do artigo 28.° do Estatuto dos Deputados confere à Comissão de Ética, consistente em «verificar os casos de impedimento e, em caso de violação, instruir os respectivos processos», com a competência que as alíneas c) e d) do artigo 38.° do Regimento da Assembleia da República cometem à Comissão de Regimento de Mandatos (hoje l." Comissão) e que esta tem por cumulativa.

Com efeito, pela primeira destas alíneas, a 1Comissão é competente para «emitir parecer sobre a suspensão e a perda do mandato», enquanto que, pela segunda, é competente para «insumir os processos de impugnação de. elegibilidade e de perda do mandato».

Ainda com atinencia a esta matéria,- é invocável o disposto na alínea a) do n.c 1 do artigo 25.° do Regimento da Assembleia da República, segundo o qual «compete à Mesa declarar, nos termos do artigo 4.°, a perda do mandato em que incorra qualquer Deputado».

Daí que venham colocadas estas duas indagações, em breve síntese:

Estaremos em face de dispositivos inconciliáveis, de tal modo que a questão só pode resolver-se considerando revogados pelo artigo 28.° do Estatuto dos Deputados os citados dispositivos regimentais (posição defendida no douto parecer da Comissão de Ética)?

Ou antes, em face de dispositivos susceptíveis de conciliação, através da vigência de umas e outras, e da consagração por elas de uma competência cumulativa das duas referidas comissões, com precedência temporal, no que se refere ao seu exercício, da competência da Comissão de Ética sobre a competência da 1." Comissão, tese esta defendida no douto parecer desta Comissão?

Eis a questão. E ei-la agravada pelo facto de, tendo-se o Presidente da Assembleia da República sentido vinculado a cumprir o Regimento e solicitado à ].* Comissão o seu parecer, depois de ter recebido o parecer da Comissão de